Jean não conseguia dormir.
Já passavam das duas da manhã, e os membros da Tropa de Exploração teriam muito trabalho no dia seguinte. Mas o cansaço que sentia não parecia ser o suficiente para fazê-lo adormecer, mesmo que se revirasse na cama em busca de uma posição mais confortável.
Bufou, frustrado. Sua mente parecia mais acordada do que nunca, e se tornou inevitável divagar em pensamentos que ele lutava com tudo o que tinha para suprimir. Aquela aflição sem fim o consumia de forma quase insuportável, e o motivo para tudo isso estava no quarto ao lado, provavelmente ressonando tranquilamente.
Quando foi que havia se tornado tão emocionado, afinal?
Ele nunca foi alguém ligado a sentimentos. Há muito que seu coração se direcionava apenas em sua vida profissional, na época em que desejava juntar-se à Polícia Militar. Contudo, seu interior mudou depois de se apegar, mesmo que inconscientemente, aos outros cadetes da centésima quarta divisão.
Ele entrou para a Tropa de Exploração e nunca se arrependeu verdadeiramente dessa decisão. Lutar na linha de frente de alguma forma fazia com que o sentimento de perda constante tivesse algum valor, mesmo que ver um companheiro querido sendo morto diante dos seus olhos doesse como o inferno.
Kirstein nunca pensou que se ligaria tão fortemente a alguém, mas foi inevitável. Sasha e Connie, que sempre estiveram ao seu lado, Mikasa e até mesmo Eren. Todos eram especiais, mesmo que nunca dissesse em voz alta, porque ele nunca foi bom com palavras.
Ah, e tinha Armin. O garoto que aos seus olhos, no passado, não passava de um fracote que vivia grudado em Eren, fantasiando sobre o que teria além das muralhas.
Mas claro que ele não era nada daquilo. A convivência mostrou que Arlert era um soldado extremamente corajoso que se colocava em perigo e fazia de tudo pelos seus. Ele era, provavelmente, o mais inteligente de toda a tropa e nunca deixou de ser gentil com todos à sua volta. Incluindo Jean, que era ríspido o quanto podia.
A cada missão, a cada momento com o garoto, Jean via o quão errado estava a respeito de seu valor. Armin o salvara inúmeras vezes, com uma consideração em seus olhos que nunca havia visto em ninguém antes. Quando se deu conta, já estava ridiculamente atraído por Arlert.
Jean Kirstein não sabia quando, como e muito menos o porquê, mas em algum momento, de alguma forma e por algum motivo, Armin Arlert deixou de ser apenas um companheiro ou até mesmo um amigo. Não, ele era muito mais. Ele era tão incrível, importante e brilhante que poderia ser comparado à própria lua. Sua lua.
Constatar aquilo o devastou e o fez se sentir ridículo com os pensamentos românticos que passou a ter. Foi assim que descobriu sobre sua sexualidade, que contradizia todas as falas preconceituosas que já teve. Ele era mesmo patético, e sabia que devia guardar aquilo apenas para ele.
Bom, conseguiria fazer isso tranquilamente se Armin não fosse tão atencioso e protetor consigo. Sempre cuidava dele quando se feria, sempre demonstrava se importar muito e o olhava tão afetivamente que aquilo mexia com seu coração e mente. Será que aquele sentimento era recíproco?
Desistindo de tentar dormir, Jean resolveu ceder aos devaneios de sua mente traidora e passou a se recordar de todos os seus momentos com o loiro. Poderia se considerar masoquista, porque fazer aquilo era uma tortura que deixava seu coração quentinho.
Gostava de recordar dos jantares em que conseguiu sentar ao seu lado, conversar e sentir seu cheirinho por conta da proximidade. Ele também gostava das memórias das vezes em que completaram alguma missão, admiraram alguma paisagem ou riram de alguém caindo, juntos.
Jean pensou que seria sempre feliz apenas tendo a companhia dele, assim como as estrelas parecem mais bonitas quando a lua está cheia.
Uma súbita vontade esmagadora se apossou de seu ser, fazendo-o levantar num pulo. Precisava vê-lo. Repentino? A lua estava cheia, era uma noite única. Ele queria apenas fitar aquele rosto, talvez assim conseguisse dormir.
Os passos pareciam automáticos, não era como se de fato estivesse pensando em algo. Saiu de seu quarto e parou na porta ao lado. Ofegou.
Levantou a mão lentamente, agora sentindo-se um tolo. O que fazia ali? Sequer sabia o que diria a Armin. Na verdade, sabia o que queria dizer, mas não tinha coragem. Era um covarde, afinal.
Fitou a janela aberta que permitia que a luz da lua iluminasse o corredor vazio. Era uma bela visão, mas ele preferia fitar os olhos que estavam do outro lado da porta. Aquilo o deixou mais calmo.
Com as mãos trêmulas, bateu na porta o mais suavemente que pôde. O toc-toc ecoou pelo recinto soando exatamente como o prelúdio de um grande feito deveria soar. Tenso.
A porta não foi aberta de imediato. Jean conseguiu contar até dez mentalmente antes que ouvisse uma movimentação no interior do quarto, o que fez sua calma recém conquistada ir pelos ares.
A maçaneta girou. Será que dava tempo de fugir? Não, não dava mais tempo. Agora ele teria que dizer algo.
Antes que pudesse perceber, ele finalmente estava à sua frente. Jean perdeu o fôlego ao vê-lo. Armin estava lindo.
O cabelo dourado, que atualmente estava mais curto do que quando se conheceram, estava bagunçado. Os olhos estavam pesados, sinal de que estava cansado. Mas ao olhar para seu rosto como um todo, ele não parecia estar dormindo antes de atender a porta.
— Jean? São quase três da manhã, o que faz aqui? — perguntou, a voz doce arrepiando todos os pelos de seus braços. Pigarreou, em pânico.
— Armin — disse, olhando para seus olhos azuis que o encaravam com interesse. — Eu…
— Você…? — Arqueou uma sobrancelha. Jean estava mais abobado do que de costume e aparentava estar indefeso.
Kirstein desviou o olhar para a lua, de novo. Ela o lembrava tanto Armin que virou uma espécie de refúgio, já que nem sempre podia estar perto de Arlert, que era seu verdadeiro porto seguro. Olhando as estrelas em volta, elas pareciam amar a lua tanto quanto Jean amava Armin.
Foi então que ele soube exatamente o que dizer.
Fitou seu rosto novamente, se aproximando e segurando as mãos dele entre as suas. Os olhos azuis se arregalaram levemente pelo contato repentino, mas ele não se afastou.
— Armin — repetiu, e o outro continuou encarando seu rosto em expectativa. — A lua… A lua está linda hoje, não está?
As mãos que segurava tremeram e os olhos azuis se arregalaram ainda mais. Jean sentia seu coração bater forte como os passos do Titã Colossal; este que se encontrava ainda em choque, aparentemente. Ele havia entendido, não é?
De repente, os lábios do loiro se curvaram levemente para cima num sorriso pequeno, mas cheio de significado. Deu um passo à frente, aumentando ainda mais a proximidade.
Jean estremeceu, sem saber o que pensar. Ele não havia planejado o que faria depois daquilo.
— Sim, Jean, ela está — disse Armin, com as bochechas coradas. — E… As estrelas também estão.
Jean sentiu suas pernas ficarem moles, e o fato de Armin ser incrivelmente romântico tornava sua situação ainda mais crítica. Merda, ele o amava tanto.
Levou uma das mãos trêmulas ao rosto de Arlert, da forma que sempre sonhou em fazer. Tão macio, pensou, enquanto tentava controlar sua taquicardia diante daquela situação inédita.
— Isso… É bom, né?
— Sim… É.
Jean não era bom com palavras, e não havia ninguém melhor do que Armin para entender isso. O sorriso que trocaram naquele singelo momento foi o suficiente para confirmar que sim, a lua estava linda, assim como as estrelas.
Foi difícil para Jean voltar para seu quarto depois daquilo, mas o beijinho de boa noite que ganhou foi o suficiente para que voltasse para a cama com um sorriso idiota no rosto, adormecendo enquanto admirava a lua pela janela de seu quarto.
Era grato a ela por ter lhe dado coragem, e por agora saber que sua lua particular também pensava nele no quarto do lado.
E ele seria a constelação que Armin merecia.
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