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História Aquela noite - Doa x Orochi - Capítulo quatro


Escrita por: Titio_Luh

Notas do Autor


entreRAM em minha casa e corterao minha internet !

oi jente haha <333 desculpa a demora eh q corteRAM MINHA net (tava com preguiça de fazer uma modificação no capitulo e procrastinei horrores
min perdao

Capítulo 4 - Capítulo quatro


Era mais de meia noite quando eles entraram em call. 

 

Não era um combinado. Eles tampouco tinham horário fixo para ligar. Parecia apenas um consenso mudo onde toda noite, sem falta, ligavam para jogar juntos. 

 

Pedro sempre ansiava por esses momentos e se perguntava se talvez Doa também, mas a resposta seria um provável não. O único desocupado era ele. 

 

“E aí, mano.”

 

“Fala,” respondeu Doa do outro lado. Mesmo chiado, não mais um incômodo, agora apenas familiar. Sua voz, por outro lado, estava um pouco afetada. Ele suspirou. “mano, se pa hoje não tem como nois jogar.”

 

Pedro franziu as sobrancelhas. “Por que?”

 

“Cortaram a Internet,” soltou baixo e por mais que fosse velado o rápido tom frustrado ressoou.

 

Pedro não conseguiu controlar a risada que o escapou. Não que ter a internet cortada fosse engraçado – ok, talvez fosse –, ele apenas não estava esperando essa resposta. “Como assim, vei?” soprou entre risos. 

 

Um farfalhar foi audível e então um conjunto de chiados estranhos e por um segundo aterrorizante Pedro cogitou que Doa estivesse chorando, seu corpo paralisando no lugar, mas se desfez como gelo em brasa quando o áudio se ajustou melhor e as risadas ficaram fáceis de identificar. Doa ria mas parecia tão sofrido quanto um choro propriamente dito. “Cortaram a Internet porque eu não paguei.”

 

“E por que caralho você não pagou?”

 

“Porque eu usei o dinheiro da Internet pra fazer as tranças,” respondeu como se não fosse nada. 

 

Pedro parou onde estava, rosto congelado ainda no fraco sorriso enquanto seu pequeno cérebro digeria o que acabara de ouvir. Aos poucos, sua feição foi se desmanchando e suas sobrancelhas se juntaram. 

 

“Você o que.”

 

“Ah, vei…” Doa suspirou fundo. “o demônio sussurrou no meu ouvido, tá ligado…”

 

“Doa,” ele ainda estava sem reação o suficiente para sequer formular uma frase. 

 

“Eu não matei minha família a troco de bala, eu só fiz uma escolha. Uma escolha difícil mas não uma escolha inteiramente ruim.”

 

“Pera, pera…” ele balançou a cabeça. “ce roubou esse dinheiro da sua mãe?”

 

“Aooôh… Calma lá, caraio, fui taxado de ladrão agora,” se Pedro pudesse deduzir, diria que Doa ergueu as mãos. “é papo de cor a parada?”

 

“Vai se foder,” ergueu as sobrancelhas, riso nasalado. 

 

“Tá, escuta, não é roubo, eu vou devolver esse dinheiro pra ela, Zé,” constatou e não pareciam as falas de um homem com remorso. “eu tô vendo se eu consigo vender uma conta minha num jogo aqui e depois é só felicidade e sem ressentimentos. E não é como se ela não tivesse os dados móveis e a Internet da vizinha no celular dela pra poder usar o facebook na paz que uma mulher de meia idade precisa.”

 

“E o que ela falou disso?”

 

“Ela não falou nada. Só tentou me bater com o fio do carregador enquanto eu tentava explicar. O foda é isso…”

 

E Pedro quebrou novamente. Dessa vez em risadas alta e foda-se o horário. Numa situação pior que a de Doa com a mãe dele, ele não ficaria. 

 

“Mano, namoral, tu é imbecil?”

 

“Te banquei um sorvete com o dinheiro do meu crime, Pedro,” disse quase prepotente o suficiente para o sorriso ladino ser palpável pelo fone. “como se sente?”

 

Pedro pressionou as mãos nos olhos. Um misto de emoções estava o tentando tomar conta, uma mais distinta que a outra. Por um lado, seu corpo vibrou e ele achou aquilo tão foda e libertino que seria capaz de soltar um grito fino patético, mas por outro lado, ele temeu o reconhecimento dessa confissão tanto quanto como se ele próprio tivesse feito isso. “Mulher de bandido.”

 

“Se alguém raspar sua cabeça provavelmente vai ser minha mãe,” apontou Doa em tom descontraído demais para quem estava nessa  situação deplorável. “mas ela vai raspar a minha também. Ficar careca é menos doloroso em dupla do que sozinho, pense nisso.”

 

“Não tô afim de fazer parte de uma dupla de cabeça de pica não, mano, valeu aí. Mas sério, tu foi muito burro, puta que pariu…” Pedro balançou a cabeça ainda sem acreditar. “por que tu só não esperou vender a conta primeiro?”

 

“Porque eu achei que fosse demorar pra caralho, não tava conseguindo nada com o cara lá, e como eu disse, o diabo cantou bonito pra mim. Mas eu consegui desenrolar com outro cara agorinha e tá tudo indo bem, isso se ele não decidir que minha conta é uma bosta e desistir. Aí sim eu declaro estado de crise.”

 

“Você literalmente apostou num negócio que pode ou não acontecer,” apontou Pedro tolamente. 

 

“É, meio que isso. Mas tem o bagulho lá da lei da atração, fi, vou fazer isso até enquanto durmo. Vai dar certo.”

 

“Viadagem.”

 

“Se quiser eu coloco isso também.”

 

“Sai fora, mané,” Pedro riu. Ele coçou o início de uma barba nascendo em seu queixo e então olhou para o monitor à frente. O lol estava aberto, mas não parecia mais interessante. Ele fechou a aba. “ce tem dados móveis também?” perguntou quando a dúvida sobre como que Doa estava falando com ele sem Internet na casa surgiu. 

 

“Não. Roubei do meu irmão. Eu até podia pedir a senha da vizinha pra mim também mas a essa altura minha mãe já foi falar mal de mim pra ela.”

 

“Bem feito, muleque burro do caralho.”

 

“Você foi lá comigo, Pedro, você viu o resultado, ce viu como ficou foda. Ce vai dizer agora que não valeu a pena?”

 

Pedro jogou a cabeça para trás e fitou o teto, dedos tamborilando no braço da cadeira. As imagens eram vívidas em sua mente ainda. Vermelho escuro enrolado contrastado com o dourado, emoldurando aquele rosto tão malditamente contorcido em um sorriso eufórico. O crime realmente compensava? 

 

“Não vou ser seu cúmplice, mano, só porque eu achei bonito não quer dizer que eu faço parte dessa trambicagem sua aí.”

 

“Ih, papinho furado. Mas foda-se também, já falei que vou pagar essa porra.”

 

“Ce vai é pegar esse dinheiro da conta e fugir da cidade.”

 

“Num da ideia não, fi.”

 

Por um momento, Pedro quase perguntou se não poderia ir junto também, mas há níveis aceitáveis de autossabotagem e felizmente ele estava ciente. 

 

“É isso,” Doa arrastou uns segundos depois, um suspiro o seguindo. “sem lolzinho hoje e talvez amanhã também, se pa. Não vou poder tá aí pra gankar os cara contigo.”

 

“Ah, se foda essa bosta de jogo também,” Pedro deu de ombros e fechou a aba do jogo. “tô precisando de dois dias de folga desse pandemônio mesmo.”

 

Doa não respondeu de imediato mas quando o fez o tom de sorriso era audível. “Vai esperar eu voltar?”

 

“Vou,” assumiu sem muito esforço. “é sem graça sem você.”

 

Quando o silêncio se estendeu por alguns segundos a fio Pedro franziu o cenho. O clima ficou um pouco espesso. Talvez apenas para Pedro, que tinha agora que escutar os baixos risos que Doa soltava e tentou ignorar a qualquer custo seu peito quente.

 

“Beleza, vou desligar,” não era uma estratégia de fuga. “pra você não gastar os crédito do seu irmão atoa confessando crime.”

 

“Aquele fodido tem plano da Tim. Não vai acabar, fi, relaxa,” rebateu e logo então barulho de movimento. Um farfalhar de tecido junto com um ranger de madeira e Pedro deduziu que Doa havia ido para a cama. “a não ser que ce queira desligar mesmo.”

 

Era idiotice. A claridade da resposta em sua mente era pura idiotice. 

 

Imitando o suposto ato de Doa, Pedro se levantou e foi até sua cama, deitando em um suspiro baixo. 

 

“Não.”

 

Ele não queria. Mas pouco sabia o que falar para dar continuidade à conversa naquele momento. Era nesses momentos que o lol se fazia uma peça tão requisitada. Não precisava ter assunto quando tudo o que faziam era rir e xingar aleatórios na partida. Suas madrugadas pertenciam a esses momentos onde não era necessário nem sequer um neurônio a mais ativo. 

 

“Sabe, queria te perguntar uma parada,” disse Pedro apesar de tudo. 

 

“Lá vem.”

 

“É sobre aquele negócio lá de você ter jogado um prato na cara de uma menina ano passado. Sério, que porra foi aquela?” Pedro arqueou as sobrancelhas e soprou um riso. Ele nunca entendeu de fato todo aquele bafafá, sempre chegando informação pela metade para ele até o momento que ele abriu mão, sentindo-se quase uma velha fofoqueira indo atrás do que não era da sua conta. Mas agora ele tinha o próprio malfeitor à sua disposição para perguntar. Era assunto antigo, mas nada custava. 

 

Doa grunhiu consternado. Ele não estava esperando logo aquilo. 

 

“Porra, Pedro, tanta coisa pra me perguntar e ce pergunta logo essa merda.”

 

Tanta coisa? 

 

“É que eu nunca entendi direito. E agora que a gente é parça tá ligado eu pensei ah sei lá que o cara podia me dar esse conhecimento-”

 

“A gente ficava,” interrompeu em tom baixo e direto. 

 

“Você e a mina lá?”

 

“É né, carai,” soou óbvio, talvez não muito contente em estar abordando o assunto. “rolou uns bagulho paia aí e deu no que deu.”

 

Pedro arqueou uma sobrancelha. Se antes ele não tinha respostas, agora muito menos. 

 

“E…? Conta a história direito, seu marginal.”

 

Doa suspirou alto. “Não tem necessidade, Pedro. Bagulho mó corta clima. Não vai adicionar nada na sua vida saber dessa fita.”

 

“Vai sim.”

 

“No que? Aprimorar seu currículo de fofoqueiro?”

 

“Sim, claro,” Pedro soprou pelo nariz. “ou só te conhecer melhor nessa porra,” completou em escárnio. 

 

O silêncio que se estendeu segundos a fio não foi catalogado da forma que deveria. Algo estranho queria transbordar pelo estômago de Pedro e inundar sua respiração, borbulhava. 

 

Estava começando a ultrapassar o ‘ele vai me chamar de intrometido do caralho e desligar na minha cara’ e beirando o desconforto que se espalhava espesso e disforme. 

 

Pedro sentia a lateral de seu rosto começando a pinicar e ok talvez ele realmente não precisasse daquela informação e ele realmente não se importaria em mudar de assunto pelo amor de deus. 

 

Num último momento de misericórdia, Doa tossiu baixo. Pedro se focou no som como um náufrago se agarra a uma boia.

 

Não foram mais do que míseros dez segundos. Talvez a ansiedade incurável de Pedro fosse um fator agravante na distorção do tempo. Não que fosse algo sob o poder de suas mãos; o tempo e sua maldita relatividade serpenteia desordenado por onde quer. 

 

Doa falou, “Uma vez ce me disse que conhecia mais sobre mim do que eu de você,” e o ponto final pairou em uma conclusão não muito clara. Pedro flexionou a boca rapidamente e então se sentou na cama, costas na parede. 

 

Se Pedro outrora se preocupou em mudar de assunto, Doa fora mais rápido. 

 

“É, falei,” o tom do ‘e dai?’ ficou nas entrelinhas. 

 

“Ah, mano, do mesmo jeito que ce tem o direito de me conhecer, eu também tenho,” só pela sua entoação fácil Pedro quase visualizou seus ombros magros se movendo para cima. 

 

“Beleza, Doa. E?”

 

“E que já tá bom de falar de mim. Já me expus muito hoje, filhão,” ele tinha um sorriso. Pequeno. Pedro sabia. Ele sorriu de volta. “agora eu que quero ser o fofoqueiro.”

 

Pedro fechou os olhos com força e riu, sua risada sendo cortada com seu fluxo rápido de fala. “Ah, beleza. A vontade, mano, mas eu não tenho nenhuma treta foda ou sei lá mais o que igual ce tem e-”

 

“Ce já namorou?”

 

Rápido. Tão rápido quanto começou, parou. Rápido. Seu rosto parado no meio da frase como um cd antigo. Rápido. Seu coração batia rápido ou seus ouvidos que começaram a tocar bateria? 

 

Ele respirou baixo. 

 

“E pra que ce quer saber.”

 

“Ué, carai. Já num disse?”

 

“Tá e por que logo isso?”

 

“E por que não isso?” simplista. 

 

Pedro franziu as sobrancelhas. “Porque sei lá,” deu de ombros e olhou para os lados, paredes escuras que não continham nenhuma luz de resposta. “tem coisa mais foda pra você perguntar do que isso.”

 

“Mas é isso que eu quero saber,” respondeu e mais uma vez, tão simples. Pedro sentiu vontade de xingá-lo, alto e de forma bem hipócrita. Era de propósito? Parecia de propósito. Bem, óbvio que era. Lá estava ele no lado oposto da moeda. 

 

A cara de Doa nem tremia. 

 

Por que, em todos os sete infernos, Doa queria saber aquilo? Era só uma forma de virar o jogo e no final falar ‘tá vendo, caralho, nem você quer falar disso’ quando Pedro continuasse negando uma resposta? 

 

Algo lá no fundo, algo desconhecido e negligenciado, não queria acreditar nisso. 

 

Ele roeu uma unha e sentiu aquilo novamente. Primeiramente se foda. Segundamente seu estômago estava doendo. 

 

“Tá, beleza, entendi,” suspirou e resolveu entregar o jogo. “ce virou a parada pra mim só pra falar que-”

 

“Eu acho que não,” Doa interrompeu e ele parecia mais divagando do que respondendo. 

 

“Que?” 

 

“Eu acho que ce nunca namorou.”

 

“Tá tirando informação do cu, parceiro.”

 

“Até posso. Mas tá ligado… Se eu perguntasse isso pra qualquer moleque que já namorou a reação automática ia ser dizer que sim e se gabar pra caralho.”

 

“E quem disse que eu quero me gabar?”

 

“Te foder, Pedro, ce é difícil, hein,” murmurou, um leve rastro de diversão na voz. “responde essa porra.”

 

“Já,” antes que pudesse pensar demais, respondeu. Mentiu e o sentimento foi meio sufocante. Não parecia certo. Não seria a primeira vez que ele dizia para seus amigos que já havia namorado e pegado uma penca de guria na escola. As histórias já eram criptografadas na parede de seu crânio, prontas para serem usadas nesses momentos onde parecia ser posto contra uma parede de olhos banhados em escrutínio. Ele sempre mentiu e a sensação não era essa. Onde estava o suspiro após um longo período embaixo d'água? 

 

O suspiro era amargo. 

 

Parecia que mentir para Doa seria diferente do resto de seus amigos. 

 

“Como foi?” Doa perguntou e Pedro levou um segundo, tentando captar qualquer sinal de descrença na voz do outro. 

 

Era apenas a voz de sempre. 

 

“Bom. Normal, sei lá, já faz um tempo e tal, mas aí não deu certo e fazer o que…” engoliu em seco. Idiota. 

 

“É lá da escola?”

 

Era um maldito questionário. E ele não deveria estar nervoso por responder cada uma das questões. Ele sabia as respostas, ele as tinha decoradas. 

 

“É, mas ela saiu ano passado porque se mudou pra outra cidade.”

 

“Ah, pode cre… Aí é foda. Foi por isso que ces terminaram? A distância?”

 

Não, Doa, a gente terminou porque ela sequer existe. Eu sequer cheguei perto o suficiente de uma garota para ser considerado um candidato válido. Eu para falar a verdade nunca tentei chegar em nenhuma. Eu nunca beijei nenhum boca na minha vida, Doa, estava ocupado demais sendo esquisito e no momento eu estou bastante ocupado tentando não me afogar em seja lá o que for esse mar que tanto ondula na porcaria do meu estômago, Pedro pensou frenético. 

 

O que saiu de sua boca, por outro lado. “É.”

 

“Saquei.”

 

“Vou desligar agora.”

 

Doa suspirou e parecia agora resignado. “Por?”

 

“Tá tarde, né, paizão,” constatou de forma que sua resposta soasse óbvia, mão se enrolando nos cabelos de sua nuca num movimento pacificador. 

 

“E daí.”

 

“E daí que eu vou dormir.”

 

“Ce vai é bater uma.”

 

“É aí que você erra.”

 

“É?”

 

“É. Já bati enquanto a gente conversava. Ce é todo surdo e nem percebeu.” 

 

“Porra. E nem me chamou pra ir junto? Vacilo, Pedro.”

 

Ele riu apenas para se convencer de que seu cérebro havia associado as falas de Doa como uma piada. Ele engoliu em seco e desejou que a queimação descesse junto em sua garganta e morresse no fundo de seu estômago.

 

Puta que o pariu. Ele não era uma pessoa tão literal assim. Ele sequer tinha uma imaginação tão vívida.

 

Ele riu mais um pouco e desligou na cara de Doa.

 

Mais tarde ele diria que foi sua internet que caiu.

 

 //

 

Semanas se passavam como dias e os dias se passavam como minutos. Nenhum segundo perdido. 

 

Pedro estava acostumado a ver tudo passando por ele tão rapidamente enquanto apenas observava como um telespectador inativo. Quando que deixou de ser assim? Tudo agora parecia ter um peso sólido que o mantinha em foco, pés no chão e olhos ávidos para os lados. Firmes pelo o que? Ávidos pelo o que? 

 

A espera sempre do que. 

 

Caminhando pelo pátio da escola em direção a saída, os sons agitados de passos rápidos e gritos de animação eram sempre os mesmos. Ele adoraria fazer parte dessa celebração diária que era a libertação, mas seu peso maior agora se encontrava em outra coisa. 

 

Doa estava em semana de provas. Sua presença havia se tornado quase que fantasmagórica. Pouco se via pelos corredores ou matando aula, e quando era visto, seu semblante mais parecia que havia morrido alguém. De certa forma, foi meio que uma surpresa. Não que Pedro achasse que Doa fosse um irresponsável que sequer estuda para provas e não liga se tirar menos que quatro. Não era isso, mas ele esperava que fosse. Ver Doa tão empenhando em toda a maldita semana havia se tornado uma tortura velada que ele tampouco sabia ser possível. 

 

Quando que Pedro havia se tornado tão necessitado de atenção? Ele nunca se importou se estava ou não na presença contínua dos amigos. Era algo a se orgulhar. Agora, por outro lado, toda vez que Doa passava pelos corredores apressado para pegar revisão ou ir direto para o teste, o único cumprimento entre eles era um rápido aperto em seu ombro e um sorriso apressado. O calor residual parecia persistir por mais tempo do que o necessário. 

 

Uma semana sem Doa estando totalmente ativo em seus dias estava parecendo loucura e ele estava ficando tão louco quanto a mera hipótese de tudo isso. 

 

Era estúpido. 

 

Quando ultrapassou o portão, ele sentiu um braço rodear seus ombros e antes mesmo de se virar para ver, tranças roçaram em sua bochecha. 

 

Seu coração acelerou e ele quis esmagá-lo entre os dedos. 

 

“Adivinha,” foi tudo o que ele disse, seu sorriso parecia quase pintura a óleo. Se transpôs para Pedro como um imã. 

 

“O que?” Pedro levantou uma sobrancelha. 

 

“Fui liberado da prova de hoje.”

 

Se antes acelerou, agora simplesmente parou. 

 

“Caralho…?”

 

“Acredite se quiser mas não ameacei ninguém,” ele ergueu uma mão e Pedro a sentiu pousar em seu ombro novamente. “só tinha esquecido que eu já tinha ponto o suficiente naquela merda pra não precisar fazer mais nada. Ce é loco, Pedro… Quase que eu faço aquela prova de besta.”

 

Pedro não entraria muito no mérito do porquê, mas seu braço rodeou a mochila de Doa e o apertou em um abraço ladino. Seu sorriso era brilhante quase como se fosse uma conquista própria. Ficar feliz pelas pequenas vitórias do outro estava se tornando um hábito. 

 

“Caralho. Que bom, então! Foda-se essa merda.”

 

“Foda-se aquela merda de sociologia,” concordou com veemência e pouco se importou quando retribuiu o aperto de Pedro com seu braço. Eles ficaram parados tolamente na entrada da escola onde o porteiro os olhava de canto de olho. Doa não se dava particularmente muito bem com aquele porteiro desde que pulara o muro uns meses atrás. Soltando o ombro de Pedro, com certa hesitação, Doa se afastou e começou a andar, Pedro não perdendo segundos para lhe seguir rua abaixo. “Aliás aquela parada da conta. Consegui vender,” sorriu presunçoso e droga, com razão. 

 

Pedro não poderia se dar ao luxo de se sentir surpreso pois estava sendo atualizado quase que regularmente sobre a situação, talvez Doa sentisse o agora dever cívico para com Pedro em mostrar que ele não era um trambiqueiro que roubava da mãe em dias de sábado e batia no pai aos domingos. 

 

“Conseguiu que ele pagasse tudo? Tudo mermo?” perguntou, porque por mais que ele soubesse agora que a lábia de Doa era boa, o preço ainda era meio absurdo. 

 

“Todos os três mil. E não me olha assim, hein,” apontou um dedo. “minha conta era boa. Eu sei que se paaa não valeria isso tudo, mas o cara pagou e quem sou eu pra questionar.”

 

“Então isso significa que você voltou a ter amor parental?” sorriu irônico. 

 

“Como eu disse, eu ia pagar, e até mais do que peguei, só pra provar minha redenção. Falando nisso… Minha mãe quer te conhecer.”

 

Ele não sabe se escutou direito ou se alucinou. Ok, ele alucinou. Alucinações auditivas seriam mais cabíveis. 

 

Ele piscou forte e virou o rosto para Doa, torcido em uma enorme interrogação. “Sua mãe?”

 

“Ela.”

 

Muitas perguntas rodeavam a mente de Pedro naquele momento, inúmeras. Ele poderia desenrolar um pergaminho de sua mochila e listar todas elas com uma caneta de pena. Mas ali, quando seus olhos se juraram, tudo sumiu e um pequeno sorriso cínico brotou em sua boca. Ele não perderia uma oportunidade assim. Ele estava abrindo a boca para cuspir alguma piadinha totalmente sem graça sobre mães de amigos e sobre conquista-las, mas Doa pareceu prever seu raciocínio óbvio, emitindo um som de ‘tsk’ e revirando os olhos. Ele bateu no cotovelo de Pedro e aquilo era meio irritante. “Num viaja não, Zé.”

 

Pedro puxou o braço para fora dos rápidos tapinhas da mão de Doa e então franziu o cenho. “Mas por que ela quer me conhecer se não é pra desfrutar do meu corpo?”

 

“Ela só disse que queria saber quem era o infeliz que ficava conversando comigo todo dia até quatro da manhã,” deu de ombros. 

 

O corpo de Pedro esfriou. 

 

Talvez Doa tivesse notado, pois logo sorriu calmo. 

 

“Relaaaxa, fi. Ce pode ir hoje?”

 

“Hoje?”

 

“Agora.”

 

“Agora?”

 

“Caralho, Pedro. Virou papagaio nessa porra? Quer ir hoje ou não?” perguntou meio impaciente por mais que o olhasse em expectativa. “ela fez bolo de chocolate, por sinal,” soltou na inocência. Ah, suborno. 

 

Pedro não gostava muito de se apresentar para novas pessoas. O medo do imprevisível e o metodismo de agir de forma que não os afastasse sempre o deixava exausto. Por outro lado… Doa. Por que ele o olhava assim? Fazia parte do suborno? 

 

Como já dito antes, boa lábia. 

 

“Deixa eu só avisar pra minha mãe que vou chegar mais tarde hoje,” pegou o celular do bolso com certa dificuldade pois Doa agora chacoalhava seus ombros com empolgação.

 


Notas Finais


agradeco a todos os lindos e belos comentarios q essa fic bobeira recebeu


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