O dia seguinte à chegada das Mills na cidade amanheceu rápido, era também o primeiro dia de aula, Cleópatra acordou antes mesmo de o despertador disparar, tomou um banho, colocou o novo uniforme e desceu para a cozinha. A tradução na família em dias como aquele era: a primeira pessoa a acordar prepara panquecas de mirtilo; mas ainda não tinham feito compras então ela improvisou esquentando a pizza da noite passada no micro-ondas.
Regina acordou pouco tempo depois, se arrumou para o trabalho e seguiu o cheiro de pizza requentada.
— Bom dia bonequinha — Beijou a cabeça da filha e sentou-se ao seu lado na mesa — como passou a primeira noite?
— Bem, menos a parte de acordar no meio da noite com três gatos miando na calçada, você ouviu? — Cleópatra empurrou o prato com duas fatias de pizza para a mãe.
— Não, mas podemos trocar de quarto se isso voltar a acontecer — Regina mordeu uma das fatias — Ansiosa para o primeiro dia?
— Recebi um e-mail ontem avisando que o monitor da minha sala vai esperar por mim na chegada, e fazer um tour antes de me levar para conhecer a diretora. Como era mesmo o nome dela?
— Rose Jones, eu acho.
— E você? Tem que prometer que não vai deixar nenhum paciente morrer.
— Não tenho controle sobre isso, sou apenas uma enfermeira e as vidas não são da minha alçada.
— Bom, você sabe fazer bons curativos, meus joelhos ralados nunca ficaram desamparados — Cleópatra riu.
— Certo, vamos lá. — Regina colocou as louças sujas na lava-louças pegou a bolsa
Do lado de fora fazia um clima agradável de primavera, os vizinhos saíam para o trabalho, as crianças mais novas se reuniam para iniciar um dia de brincadeiras que os fariam dormir tranquilos ao anoitecer e permitiria que suas mães se deliciassem com uma taça de vinho. E do outro lado do gramado David regava as plantas do jardim, usava calças sociais e sapatos do mesmo tipo, mas não tinha uma camisa e os cabelos estavam perfeitamente penteados para trás.
— Bom dia garotas — ele acenou por cima da cerca — como passaram a noite?
— Muito bem obrigada — Regina respondeu e Cleópatra confirmou com um menear de cabeça — cuidando do jardim logo cedo?
— É um favorzinho para a esposa antes de sair para o trabalho.
Uma mulher de cabelos escuros e compridos saiu pela porta da casa, usava um vestido justo na cor azul que realçava a pele branca e os lábios vermelhos.
— Tudo bem gostosão, não vamos querer que você se atrase para o trabalho e nem que fique se exibindo por aí sem camisa — ela segurava uma camisa de flanela e um blazer, que David vestiu logo após desligar a mangueira e deixá-la de lado.
— Querida, essas são Regina e Cleópatra, nossas novas vizinhas. Garotas, essa é minha esposa, Mary Margareth.
— Mas podem me chamar apenas de Mary — ela seguiu até a calçada onde Regina e a filha estavam paradas e cumprimentou às duas — É um prazer recebê-las na cidade, sentam-se em casa e me avisem caso precisem de qualquer coisa.
— Esse é o jeito dela de fazer vocês não se esquecerem dela, na próxima eleição, Mary é a prefeita da cidade.
— Nossa olha só, é um prazer conhecer a prefeita — Regina sorriu — o papo vai bem, mas acho melhor não me atrasar para o primeiro dia de trabalho, até mais tarde pessoal.
[...]
Green Lake recebia alunos a partir dos 6 anos, logo após saírem do jardim de infância, era a única escola da cidade e estava de pé há anos. A diretora atual fazia questão de manter o renomado nome em alta proporcionando a melhor qualidade de ensino possível e às vezes impossível também.
— Tem certeza de que não quer que eu entre com você? — Regina estacionou o carro ao lado da calçada.
— Tenho, você já conversou tudo o que tinha para conversar por telefone. Posso seguir daqui, eu juro.
Às duas se abraçaram e se despediram. Regina seguiu para o trabalho e a filha iniciou a jornada na escola nova. Enquanto seguia para dentro os outros alunos seguiam-na com o olhar, a maioria se perguntando quem era aquela garota e de onde tinha vindo. Com uma cidade pequena como aquela todos se conheciam desde sempre e era raro ver um novo morador o que deixava as Mills em evidência.
— Você deve ser a Cleópatra Hood-Mills — uma garota loira saltou de trás da porta, o sorriso era largo e branco demais, carregava com ela uma prancheta rosa, e antes que Cleópatra pudesse confirmar a garota voltou a falar — É um prazer recebê-la em Green Lake, meu nome é Dakota Jones sou a monitora da sua nova turma e vou te mostrar tudo. Podemos ir?
— Podemos — foi tudo que ela teve tempo para dizer.
— Muito bem! A primeira parada é o seu armário por enquanto está sem uma combinação, mas pode escolher agora — Dakota se virou de costas dando privacidade a nova colega de classe — O armário a sua direita é do meu namorado Nicholas, você ainda vai poder conhecê-lo e tenho certeza de que vai gostar. Vamos nessa? — Dakota estendeu o braço para que Cleópatra pudesse enlaçar o seu, mas a garota se recusou e seguiu assim.
Dakota mostrou cada pedaço da escola, as salas de aula, salas de aula extracurriculares, ginásio, piscina para as aulas de natação, cantina, salão de festas e auditórios. Mostrou também todos os lugares secretos, debaixo da arquibancada no campo de futebol, o banheiro abandonado do segundo andar e o porão. Ao terminar o tour Dakota se despediu e deixou Cleópatra com a diretora, que por acaso era sua mãe.
Às duas conversaram sobre as expectativas de Cleópatra para o fim do ano letivo, e o que ela esperava encontrar em Green Lake, repassaram as aulas extracurriculares escolhidas pela garota e se despediram.
Cleópatra chegou atrasada para a primeira aula, mas mesmo assim teve que fazer uma pequena apresentação sobre si mesma para toda a sala.
— Meu nome é Cleópatra, mas se formos próximos o suficiente podem me chamar de Cleo, tenho 17 anos e me mudei ontem para a cidade. Somos apenas eu e a minha mãe, pelo menos até meu irmão ou irmã nascer.
— E o que você gosta de fazer Cleópatra? — Bella a professora de inglês perguntou para incentivá-la a continuar — No seu tempo livre quero dizer.
— Eu toco guitarra, e passava a maior parte do tempo lendo ou praticando algum esporte com minhas velhas amigas. Posso me sentar agora?
— Claro, não vamos mais tomar tanto tempo da aula.
O dia continuou indo bem, até o fim da aula, quando as coisas desandaram. Cleópatra estava em seu armário guardando alguns livros no armário quando ele chegou, um garoto alto e loiro, de olhos verdes, usava um uniforme que Cleópatra julgou ser do time da escola. Ele abriu o armário ao lado de Cleópatra e ela se lembrou instantaneamente do que a garota loira — que ela já havia esquecido o nome — tinha dito para ela. Aquele devia ser o tal Nicholas.
— Já ouvi muito sobre você — ele disse e ela percebeu ser com ela que ele falava — Cleópatra né?
— Não somos da mesma turma.
— Sim, mas isso não impede que eu tenha ouvido falar de você. Seria mais fácil dizer em quais momentos seu nome não foi mencionado, minha mãe fala de você, meu tio fala de você, minha prima fala de você e até minha namorada fala de você.
— Sua família inteira me conhece? — Cleópatra pegou a mochila com seu avental para a aula extracurricular de artes plásticas.
— Minha mãe é a Emma Swan, e o meu tio é David e a minha prima Melina, então sim! Todos aparentemente se encantaram por você — Nicholas pegou a mochila e pendurou nas costas fechando a porta do armário e finalmente olhando para Cleópatra — e vendo agora, não entendo porque todo esse estardalhaço, me parece uma garota normal.
— Talvez você só não tenha bom gosto, já pensou nisso? — Cleópatra fechou o armário.
— Calma aí rainha do Egito, não quis ofender — ele riu.
— Finalmente se conheceram, e então? — Dakota chegou beijando a bochecha do namorado.
— Para ser sincera, não achei grande coisa. O tal Nicholas, parece com uma água de arroz e você parece uma garotinha fútil que se importa demais com sua bolsa cara da Chanel — Cleópatra deu as costas para os dois e seguiu para a aula
— Qual o problema dessa garota? — Dakota perguntou ofendida.
[...]
Mais tarde naquele mesmo dia depois do término das aulas, Regina buscou Cleópatra na escola e voltaram juntas para casa.
— E então querida, como foi o dia? — Regina parou o carro no sinal vermelho.
— Eu tive uma pequena desavença com um casal qualquer da escola — Cleópatra estava concentrada no celular, conversando com sua prima Elizabeth.
— Como assim?
— Ele me chamou de desinteressante, é filho daquela mulher que levou os cupcakes de padaria. Como era mesmo o nome dela?
— Emma — Regina acelerou — Bonequinha, eu sei que as coisas não são fáceis em uma cidade nova e fazer amizades é mais complicado, mas se você se desentender com todos vai ser ainda mais difícil. Por isso, da próxima vez que vir o garoto vai pedir desculpas, e para a namorada dele também. Combinado?
— Está bien mamá, lo siento.
— Honrando suas raízes latinas ahn? — Regina riu e virou para a esquerda.
— Esse não é o caminho para casa.
— Sim, vamos ao supermercado. Não sei se vou aguentar comer mais pizza — finge vomitar.
Enquanto Regina se concentrava em comprar o necessário, Cleópatra balanceava a situação comprando doces e aperitivos. A mãe estava no corredor de hortifrúti, tinha acabado de pegar alguns aspargos quando a viu, Emma vinha do outro lado riscando coisas em um pedaço de papel quando viu Regina.
— Olá vizinha — Emma cumprimentou.
— Oi! Emma, que coincidência encontrar você — Regina colocou dois pimentões vermelhos no carrinho.
— É mesmo? Porquê? — Emma pegou uma melancia pela metade.
— Eu queria te pedir desculpas, pelo mal-entendido entre nossos filhos — Emma franziu as sobrancelhas confusas — Você não sabe? Oh! Você não sabe. Eles tiveram um desentendimento na escola hoje, parece que o seu filho disse uma coisa que a minha filha não gostou muito.
— Meu Deus! Regina, me perdoe, eu não sabia disso, mas vou tratar de resolver agora mesmo.
Nicholas chegou de repente, no mesmo instante que Cleópatra, os dois se olharam rapidamente e reviraram os olhos.
— Nich, quando pretendia me contar sobre o que aconteceu entre você e a Cleópatra? — Emma cruzou os braços — Quero que peça desculpas para ela, agora — o garoto revirou os olhos, mas obedeceu.
— Me desculpe Cleópatra.
Regina olhou para a filha e ela soube dever fazer o mesmo.
— Me desculpe Nicholas.
— Me deixe fazer algo para compensar — Emma pediu.
— Não mesmo, é a minha vez. Você já foi simpática o suficiente levando aqueles cupcakes — Regina sorriu — venha almoçar com a gente no sábado. Eu insisto.
— E eu não nego, estaremos lá. Não é mesmo filho? — Nicholas concordou — Vejo vocês no sábado.
Às duas se afastaram e terminaram suas compras separadamente. E pela segunda vez Regina deixou passar uma borboleta-amarela, e não notou quando ela pousou no retrovisor do carro pouco após sair do estacionamento do supermercado.
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