A chuva caía pela janela. Trazia em cada gota a lembrança viva de um passado nunca esquecido. Emma se lembrava, todo dia, da mesma história. Fazia seis anos agora, mas parecia que tudo havia acontecido ontem.
Ela tinha saído do Storybrooke com uma dor no peito e deixando uma história para trás. Seu casamento da adolescência tinha chegado ao fim. Oito anos casada com Killian Jones, o único homem de sua vida e, ainda assim, Emma nunca tinha sido realmente feliz. Seu maior desejo, ser mãe, ia cada dia morrendo naquele casamento, até que chegou a hora de terminar tudo.
Para esquecer e encontrar um novo caminho na vida, ela decidiu estudar em Nova York. Sua irmã e tia deram todo seu apoio e, contra os conselhos da mãe, Emma partiu para uma temporada longe de tudo.
Nova York foi a melhor escolha da sua vida. Além dos estudos, que iam super bem, Emma conheceu uma vida que nunca sonhou em ter. Tinha feito amigos novos e de todos os lugares do mundo. E por um desses novos amigos ela conheceu Regina. A tão badalada e famosa Regina. Seu nome não era tão conhecido na fotografia, mas nas mesas de bar, não tinha quem não suspirasse por aquela mulher.
A linda moça de cabelos negros, olhos amendoados e pele branca como a neve, logo a conquistou. Ela falava do mundo com a experiência de alguém com seus sessenta anos, mas Regina tinha a mesma idade de Emma. Sua liberdade e seu desejo de viver eram contagiantes, e Emma não se lembra ao certo quando aquela aventura, aquele tempo de descoberta, tinha se transformado em amor.
Amor que era recíproco. A conquistadora Regina tinha se acalmado, seus olhos e atenção eram todos para Emma. Com o fim dos estudos, Emma estendeu seu visto e ficou trabalhando como assistente de Regina. Compartilhavam seus sonhos e desejos para a vida. A loira ainda não lembra como teve coragem quando pediu para Regina ser a mãe dos filhos dela.
O olhar vivo de Regina, a alegria que tomou conta da mulher. Emma lembrava de tudo. Aquele perfume inesquecível, aquela pele macia. Tantas noites de amor que vieram depois daquele pedido. Tanto amor naquela tristeza que se abateu.
Por alguma razão, Emma não conseguia manter a gravidez. Já tinham tentando todas as formas de inseminação, trocado o doador, mas o terceiro mês chegava e a criança morria. A infelicidade, o sentimento de frustração, saber que todos aqueles anos em que ela secretamente havia culpado o ex-marido por não ter um filho era, na verdade, culpa dela. Então, Regina mais uma vez foi altruísta demais. Entregou seu óvulo e deixou que Emma tivesse a gravidez desejada.
Passou o terceiro mês e a cada mês sua barriga ia crescendo. Aquela vida ali dentro era calma, mas era o mais puro amor. Se seu sorriso tinha voltado, seu casamento com Regina tinha voltado aos tempos gloriosos. As noites eram cheias de amor e os dias uma espera infinita pelo nascimento daquele ser tão amado pelas suas mães.
Foi na trigésima sétima semana que o trabalho de parto se iniciou. Aquela dor, aquele momento que parecia eterno. Horas gritando, para no fim tudo se acalmar e ser celebrado com um choro. O primeiro choro, o primeiro contato. Emma se sentiu completa quando segurou sua linda bebezinha no colo pela primeira vez.
Regina seguia como a autêntica mãe de primeira viagem. Se a bebê respirasse diferente ela já sabia, e estava com o telefone na mão, pronta para ligar para o médico, caso se repetisse. Os choros da madrugada, as trocas de fraldas. Tudo era motivo de alegria. Tudo elas aprendiam juntas.
Tudo era amor, então Emma não soube o que aconteceu. Ela sentia o amor, mas ele não parecia ser suficiente. Nova York ficou sufocante. Aquela vida naquele apartamento ficou sufocante. Regina e a bebê ficaram sufocantes. E foi num dia de chuva que ela saiu, bateu aquela porta e nunca mais voltou.
Todos os dias desde aquele dia. Todo momento, em cada raio de sol ou cada gota de chuva, Emma sabia que devia ter voltado. E ela ainda não sabia porque não o tinha feito.
– Emma, vamos começar? – A médica chamou. A doutora Fiona fazia tratamento psicológico com Emma há cinco anos. Desde o mês passado, as sessões haviam diminuído de duas vezes na semana para uma. Era o segundo grande progresso dela em todos esses anos.
Emma acordou de seu devaneio e levantou, cumprimentou a tão conhecida médica e entrou em seu consultório.
– Como estamos essa semana, Emma? – Fiona iniciou a consulta.
– Melhor que semana passada. – Emma nunca sentava, ela gostava de andar pelo consultório. Detestava ficar parada, cada vez que parava, uma dor invadia seu peito.
Ficar parada significava não fazer nada, e não fazer nada foi o que ela fez em Nova York.
– Você está mais agitada hoje. Aconteceu alguma coisa?
– Duas coisas.
– E não vai me contar?
– Faz exatos cinco anos amanhã. Cinco anos que eu larguei minha vida.
– Nós já conversamos sobre isso, Emma. Você não largou sua vida. Você tentou salvá-la.
– Daqui a três meses Ivy vai fazer seis anos. E sabe onde ela vai estar?
– Onde ela vai estar, Emma?
– Aqui em Storybooke. – Ela olhou pela primeira vez para a doutora.
– E como você sabe disso?
– Eu li naquela revista internacional de fotografia que eu assino. Tinha uma nota da Regina, ela está vindo para o Maine. Para cá. – Emma sorriu.
– Emma, esse é um terreno muito perigoso, e não faz tanto tempo assim....
– Sabe o que é perigoso, Fiona? Você. Seus remédios. Seis anos que eu não vejo minha filha. Qual foi a vez que eu entrei aqui e não falei delas? Responde! – Ela alterou seu tom de voz.
– Nenhuma. – Fiona respondeu com calma.
– Exatamente. Faz cinco anos que eu morro a cada dia de arrependimento e você vem me dizer que minha filha é um terreno perigoso? Perigoso é eu continuar ouvindo você.
– Eu só quero te ajudar, Emma. Faz cinco anos que você não vê sua filha, não fala com a Regina. E se a menina não souber de você? E se a Regina tiver outra pessoa? Você acha que ela parou a vida por que você foi embora? Você já pensou no que ela passou, no que ela sentiu, no que ela sente?
– Eu quebrei o coração dela. Eu deixei a minha filha. – Emma respondeu séria. Respirou fundo e com toda a sua convicção disse. – E agora eu vou consertar isso, e ter a minha filha e minha mulher de volta.
(...)
Sempre nessa época do ano, Regina trabalhava dobrado. Ela se ocupava mais e mais, assim não tinha tempo livre para pensar no que aquela data trazia. Ela estava morta, Regina sempre dizia para si mesma, e ainda assim, nunca conseguiu pôr um ponto final. As palavras nunca foram ditas, o choro nunca veio. Ela não teve tempo. Tinha uma bebê para cuidar, para criar, tinha uma carreira para administrar e tinha que dar conta de tudo sozinha.
A única que conseguia sempre arrancar um sorriso de seus lábios era a pequena Ivy. A mini Regina, como Belle chamava, era realmente a cara dela. A mesma pele branquinha, os olhos amendoados e o cabelo negro. O sorriso e o humor matinal também tinha herdado de Regina. Mas aquele amor, aquele carinho que ela expressava sempre com um sorriso e um gesto, por mais que a biologia dissesse que não, a fotógrafa sabia que eram de Emma.
– Mommy! – Ivy correu e se jogou nos braços de Regina.
– Você está toda suada. – Regina disse enquanto cobria a filha de beijos. – Posso saber por onde a srta andou?
- Aunt Belle took me to...
– Em português, só português agora. – Regina cortou a filha, que parou um pouco e recomeçou a frase.
– Tia Belle me levou para comprar a mala para viagem, e daí na volta paramos no parque, e eu corri um pouco. – Ivy falou com o sotaque ainda carregado.
– Mas que mala?
– Uma da Minnie que eu vi, pequena para ir no meu colo.
– Você viu né? Como você é espertinha, já não tinha mala o suficiente para levar?
– Ai, Regina, ela queria para levar as coisas de mão dela. – Belle interrompeu a resposta de Ivy.
– As coisas de mão dela, vão na minha mala né, Isabelle.
– Mas agora eu tenho a minha, mommy.
– E o que a srta vai levar nessa mala, posso saber? – Regina perguntou olhando séria para Ivy.
– A Tinker Bell... – Ivy começou a usar os dedos para contar. – O meu cheiro e chocolate? – Vendo a pouca quantidade de coisas listadas, ela ficou insegura.
– E? – Regina insistiu e em socorro Ivy olhou para a tia.
– E quando ela for fazer a mala, ela vê o que mais vai levar. É muita coisa para saber de cabeça, Regina.
– Mas que bela dupla vocês são. – A fotógrafa respondeu e Belle deu uma piscadinha para a pequena que sorriu enquanto abraçava a fotógrafa. – Anda, vamos tomar um banho e se arrumar pro jantar.
Regina levou Ivy para o banheiro, ligou o chuveiro e enquanto a menina entrou foi pegar as roupas e a toalha.
– Mommy, quem vai ser minha teacher? – Ivy perguntou na volta de Regina.
– Professora, filha. E eu tenho que falar com a escola primeiro, ver quem eles vão indicar.
– É que eu esqueço como se fala em português.
– Eu sei, mas você sempre falou bem direitinho, não vai ter problema. Quando a gente estiver lá, fica mais fácil porque todo mundo vai falar igual. – Regina disse lavando os cabelos da filha.
– A minha outra mama era de lá, né? – Ivy perguntou, o tom triste que ela trazia sempre que fazia essa pergunta, cortava o coração de Regina.
– Era, por que?
– Será que eu não tenho um vô lá também? Como eu tenho o vô Henry.
– Eu não sei, filha. A mamãe já te explicou, eu conheci sua mãe aqui em Nova York e nós não chegamos a ir ao Maine visitar a família dela. Nem o vovô Henry chegou a conhecê-la.
– A tia Belle chegou a conhecer e ela não me conta nada.
– Mas o que você quer saber? Você pode perguntar pra mim. – Regina desligou o chuveiro e passou a secar a pequena.
– Você fica triste, não gosto de ver você triste.
– Não é tristeza amor, é só saudades. – Respondeu e virou a filha para que ela não visse as lágrimas em seus olhos. Terminou de secar a pequena e antes que ela fugisse a segurou.
– Não mommy, não seca o cabelo.
– Claro que sim. Fica aqui, Ivy. – Regina segurou a filha com mais força. E com muito custo secou os cabelos da pequena. Essa era sempre a pior parte dos banhos da menina, e não havia outra pessoa que conseguisse esse feito além de Regina.
Enquanto a fotógrafa foi para o seu banho, Ivy ficou esperando a mãe na cama dela, vendo um livro de fotos que Regina sempre levava para todos os lugares.
– Você está com fome? – Belle pulou na cama ao lado de Ivy, sorrindo.
– Tou sim. A gente podia comer pizza, né?
– Vamos dar essa ideia pra sua mãe. Nossa última noite em Nova York, fechar com chave de ouro.
– Isso! - Ivy respondeu
– E por que essa carinha? Já está com saudades daqui?
– Perguntei da minha outra mama pra mommy, mas ela ficou triste. – Ivy abaixou a cabeça. – Ela diz que não fica, mas eu sei que fica.
– E por que você perguntou, meu amorzinho? Essa mama não faz parte da sua vida. Pra que saber dela?
– Curiosidade, Isabelle. – Ivy respondeu, mas se não fosse o tom de voz, poderiam facilmente dizer que era a Regina falando.
– Mas ó se não baixou a Regina na pessoa. – Belle começou a fazer cócegas na menina, e enquanto as gargalhadas da pequena enchiam o quarto quase vazio, a fotógrafa saiu do banheiro.
– Olha a bagunça das duas. – Regina sorriu ao ver a diversão das duas. De todas as pessoas que ficaram contra ela durante o período que Emma sumiu, Belle seguiu firme ao seu lado. A mesma Belle que tinha pavor de criança, foi quem permaneceu e aprendeu a trocar fralda, fazer mamadeira, e cuidar de bebê. Até cantando para Ivy dormir Regina já tinha pego a amiga fazendo.
– Mommy, vamos comer pizza? Para vibrar nossa última noite em Nova York. – Ivy disse com toda empolgação quando viu Regina entrar no quarto.
– Vibrar? – A tia gargalhou. – Pequena, é outra coisa que vibra por aqui.
– Isabelle! – Regina repreendeu a assistente.
– Não é vibrar? – Ivy olhava da mãe para a tia sem entender o porquê das suas reações.
– Não, amor, é celebrar, comemorar. – Regina respondeu para a filha, ainda fazendo cara feia para a amiga. – Vamos comer sim. E você pode escolher os sabores sozinha.
– Ai, Regina, pô, você sabe que ela vai escolher só doce, né?
As três saíram rindo do apartamento da fotógrafa. Pegaram um táxi e foram em direção à pizzaria preferida delas. A imagem perfeita de uma família imperfeita.
Belle não tinha o amor que queria da fotógrafa, mesmo depois de todos esses anos. Regina sofria calada por nunca ter esquecido Emma. E a pequena Ivy só queria conhecer a mulher misteriosa que preenchia seus sonhos desde o dia em ela havia visto aquele rosto nas fotos escondidas da mãe.
Regina deu um beijo na cabeça da filha e internamente pediu para que essa volta a Storybrooke tivesse sido a decisão correta.
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