O xadrez é um jogo realmente rentável onde as regras voltam-se à lealdade fictícia entre peças cujo valor, independente de sua relevância ditada pelas regras, torna-se nulo perante o rei, e a aversão entre os dois lados apresenta-se mútua em relação ao desejo por poder.
No final, são todos meros peões que caíram com a finalidade única de proteger o rei durante todo o percurso. No final, nenhuma das peças têm valor perante sua própria queda.
• Seu mordomo, à luz da lua. •
⊰ 7 a.m
Um pequeno filete dourado lutava para adentrar um espaçoso quarto escuro através do vidro e das cortinas, finalmente repousando seu fraco calor sobre a bochecha pálida da criança remanescente da terrível tragédia ocorrida há alguns anos atrás. Sua posição durante o sono não permitia que aquele pequeno raio de sol lhe atrapalhasse o sono, mas na verdade nada pareceria tirar o pequeno de seu aparente conforto exceto pela tonalidade suave da voz de Sebastian.
— Hora de se levantar, Bocchan. — O mordomo abria as cortinas sem aviso prévio, deixando que a claridade de uma fatídica e fria manhã adentrassem ao quarto, finalmente fazendo com que o pequeno conde se sentasse, ainda que de maneira preguiçosa, sobre a larga cama desarrumada com os olhos semiabertos por conta do sono. — Para o chá de hoje tomei a liberdade de preparar Royal Blend, de Fortnum e Mason, e para o café da manhã Cheese cake de baunilha de Cortswold e sopa de brócolis como acompanhamento para os scones recém preparados.—
— Brócolis? Hm. Dispenso a sopa de brócolis... Me traga o jornal dessa manhã. — Ciel, o jovem herdeiro do título dos Phantomhive, era uma criança acima de tudo o que fazia e tentava demonstrar apesar de sua personalidade fria e intolerante, era de seu feitio obviamente negar vegetais como uma boa criança sempre fazia.
— Como quiser... — O mordomo despia o menor calmamente durante toda a apresentação do cardápio matinal, passando calmamente a camisola branca deste por sua fina pele pálida e imediatamente vestindo-o com roupas casuais apropriadas. — Parece que sua agenda está cheia hoje... Começaremos a tarde com sua aula de violino, mas parece que houve um imprevisto e eu serei responsável por lhe passar as lições de hoje. Logo após terá sua aula de dança com a Madam--
— Adie essas aulas, não estou com vontade de assistir nenhuma delas por agora... — O pequeno conde disse ao interromper Sebastian, observando as reações de seu mordomo perante sua negligência a todo aquele momento ao negar tanto a sopa quanto suas aulas particulares.
— Ahh... — Em um suspiro o mordomo se viu encurralado pelas atitudes do menor, não tendo outra opção a não ser a de tentar fazer o mesmo com o conde. Levando a mão destra suavemente até o queixo de seu mestre, o mordomo se levantou em uma aproximação com este, encarando-o com firmeza. — Um jovem mestre que não é bom com instrumentos musicais e nem dança é ao menos aceitável... Mas um mestre não saudável começa a ser problemático... Não acha? — Feito aquilo, Sebastian teve o silêncio como resposta do garoto que imediatamente desviou seu olhar para o carrinho de café da manhã posicionado próximo à porta. — Foi o que eu pensei. — O demônio sorriu perante a reação do Phantomhive, ajeitando-lhe os cabelos antes de posicionar o tapa-olho negro sobre o olho direito do garoto, amarrando-o sem pressa com a ajuda do pequeno para manter a posição correta deste.
Alguns poucos momentos de calmaria naquele quarto foram causadores de um clima um tanto cômico para o mais alto visto que o pequeno lorde parecia um pouco constrangido, possivelmente pela inesperada ação anterior de seu mordomo que parecia estar se divertindo com isso agora. Não demorou a servir o menor visto que o pequeno conde era extremamente impaciente com relação a Sebastian, não admitindo que este demorasse na realização de qualquer tarefa pertinente a seus deveres como mordomo e ordens em geral. Após empurrar o carrinho até a beirada da cama, o maior pôde finalmente revelar a refeição matinal descrita por ele a Ciel, tendo uma resposta positiva àquilo apenas pelo olhar do Phantomhive. Não era uma mudança de expressão notável a olho algum, certamente o único capaz de desvendar os verdadeiros sentimentos e desejos que aqueles olhos quebrados ocultavam era Sebastian.
Por mais intrigante que fosse observar Ciel pouco a pouco deixando o mau humor de lado durante do café da manhã, o mais alto, como mordomo chefe da casa, dispunha de responsabilidades e deveres que precisavam ser cumpridos até o fim do dia a fim de manter a perfeita ordem na mansão, fora algumas tarefas a parte como consertar os erros cometidos por idiotices dos outros empregados. — O jornal dessa manhã está aqui, voltarei em breve para recolher tudo isso... — Sebastian dizia em sua reverência enquanto se preparava para sair do quarto. — Ah, Bocchan. A última página pode lhe interessar, tem algumas figuras para colorir. — Provocou o menor com um sorriso divertido nos lábios, aguardando a resposta de seu mestre, uma resposta que possivelmente seria revoltosa e infantil seguida de um olhar enfezado.
— Huh?! Você realmente não sabe a hora de se calar... Eu deveria amarra-lo numa coleira e larga-lo para passar a noite de hoje com Pluto. — O garoto respondeu àquilo cruzando os braços à medida em que mostrava uma carranca irritada pelo comentário do demônio, era realmente do feitio de Sebastian provocar Ciel com coisas pequenas que o fizessem lembrar do fato de ainda ser uma criança mesmo não agindo como uma. — Aliás, não estava de saída? — O conde balançou a mão no intuito de fazer Sebastian entender que já era hora de se retirar, praticamente expulsando-o com o gesto enquanto o observava sair do quarto, tendo mais uma vez visão daquele sorriso que estranhamente o fez sentir um arrepio quente a subir por toda a espinha, aquecendo-lhe o corpo momentaneamente até o momento em que despertou daquela sensação com o som da porta sendo fechada e finalmente da maçaneta voltando a sua posição inicial. Aquilo fora algo totalmente novo e certamente algo que não poderia ser descrito de maneira alguma pelo menor, não só por incapacidade mas por vontade, o pequeno preferiria ignorar o ocorrido e focar apenas no que interessava naquele exato momento, o café da manhã.
• • •
⊰ 5 p.m
Já passado há algumas horas o horário do almoço a mansão Phantomhive fora engolida em uma estranha maré de silêncio e paz, era realmente incomum algo assim em um ambiente onde aqueles três servos desastrados estivessem juntos. Bardo não havia incendiado a cozinha, nenhuma porcelana tinha sido quebrada naquela tarde por Mey Rin e ainda não houvera registros de destruição no jardim causados pelo cachorro demônio e Finny. Toda aquela situação era boa demais para ser verídica, na verdade, tudo naquele final de tarde parecia estar seguindo as conformidades de Sebastian até o inesperado momento aonde o mesmo, ao caminhar pelos longos corredores do segundo andar, presenciou a aproximação de uma carruagem já conhecida, fato que o preencheu com certo incômodo e preocupação.
Elizabeth e sua acompanhante aproximavam-se da grande porta principal da mansão, tendo-a rapidamente aberta antes que pudessem se preocupar em chamar a atenção de alguém batendo na mesma, tenho logo a elegante visão de Sebastian portando um sorriso sempre convidativo e atraente. — Lady Elizabeth... Perdoe minha imprudência, mas não esperava esta visita. Veio ver o jovem mestre? — O mais alto perguntara ao estender a entrada de ambas à mansão, virando as costas gentilmente para a parede na expectativa de que as duas damas entrassem, finalmente, guiando-as a um local apropriado para enfim aguardarem a chegada do pequeno conde.
— Ahh! Sim! Estava com saudades... Onde está o Ciel? Trouxe uma coisa beeem fofa para ele! — A garota manteve-se falante durante todo o percurso até a sala de espera, erguendo, por agora, uma pequena caixa com embrulhos coloridos e um laço rosa. Era certamente a tal 'coisa' trazida pela menor ao noivo a julgar pela aparência, cuidado e afeição que ela tinha sobre o mesmo.
A loira não se aquietou até o mordomo retirar-se daquele quarto com a missão de trazer Ciel a seu encontro, sua voz de extremo ânimo e exaltação podia ser ouvida do lado de fora do cômodo, deixando o mordomo levemente ainda mais incomodado do que antes já prevendo a reação de seu mestre.
— Lizzy está aqui?! E por que está aqui? — O garoto indagou em bastante surpresa, assim como havia imaginado Sebastian. Nada naquele momento fora responsável por tirar o sorriso dos lábios do mordomo que parecia se divertir com a situação.
— Oh, Bocchan. Não é educado deixar uma dama esperando... — O mais alto, então, recusou-se a revelar as intenções da garota que aguardava ansiosamente a chegada de Ciel, não seria legal estragar a surpresa que a loirinha havia preparado, então nada mais justo do que apenas deixar que o menor descobrisse por si mesmo o motivo daquele repentina visita.
Em um suspiro de rendição, o Phantomhive levantou-se de sua cadeira no escritório, retirando-se do ambiente com Sebastian enquanto guiado pelo mesmo até o encontro da noiva, sendo recebido imediatamente por um grande abraço apertado e recheado do amor da mesma quando entrou no novo cômodo.
— CIEEEEEL! — Elizabeth gritou ao lançar-se carinhosamente contra o conde, tendo ele agora envolvendo sua cintura com firmeza para que ambos não caíssem pela negligência da mesma. — Eu senti tanto a sua falta! Você sentiu a minha também? Ahhh! Ciel, Ciel! Trouxe um presente para você! Eu sei que não é nenhuma data especial, mas mesmo assim eu quero te dar isso! — Cortando aquele abraço depois de uma aparente explosão de energia vinda da menina, teve agora os braços esticados na direção do menor, entregando-o a caixinha com um vasto sorriso animado estampado por entre os lábios, aguardando que o mesmo pegasse e abrisse.
— Hm? Ah... Obrigado. — Ciel tomou o pequeno pacote em mãos, abrindo-o logo em seguida ao ver o olhar curioso de Lizzy sobre sua reação, finalmente tendo a visão de um fino colar prateado, o material era puro e continha um pequeno pingente em formato de um coração de diamante. Não um coração inteiro, apenas a metade, foi aí então que a pequena interrompeu.
— A outra parte está comigo, olhe. — Foi rápida em sua ação ao mostrar o colar que usava, era idêntico ao do noivo a não ser pela divisão do diamante, representou também a união de ambas as pedras que logo formaram um coração inteiro. — Não é fofo? — Elizabeth perguntou ao tirar agora o colar das mãos de Ciel e, sem aguardar por qualquer reação dele, tratou de colocar o objeto gentilmente em seu pescoço para que os dois pudessem usar aquilo juntos. — Awww! Ciel ficou tão fofo! Devíamos comemorar, não acha, Paula? Vamos fazer um baile! Venha, Ciel. —
— Sebas...! — Em momento algum o Phantomhive tivera tempo de protestar ou reagir, a pequena parecia animada demais para não mostrar sua extrema felicidade ao outro, então, pegando-o pela mão com gentileza, Elizabeth levou o conde até o salão principal, local onde ocorriam os bailes.
Aquilo tudo incomodava Ciel. Toda aquela animação acabava por irrita-lo, especialmente pelo de não saber dançar e estar sendo praticamente obrigado a dançar, o demônio obviamente se divertiria com aquilo devido ao conde não ter o mínimo de coordenação para fazer o que sua noiva tanto queria naquele momento. Não levou muito tempo até que Sebastian, acompanhado por Paula, chegasse até o salão onde Elizabeth encontrava-se agarrada ao garoto que por sinal já demonstrava estar levemente irritado com aquilo.
— Lizzy... Eu já disse que não gosto de dançar. Não há qualquer outra coisa que queira fazer? — O conde perguntara a medida em que tentava educadamente escapar dos braços da loira.
— Ciel não quer dançar comigo...? Sou uma péssima noiva! Ahh... — A Middleford houvera feito uma cara de choro ao criar hipóteses como a de não ser uma boa noiva para o Phantomhive, sentindo-se verdadeiramente mal por aquilo ao imaginar que Ciel preferisse ficar entediado a dançar com ela.
— N-Não diga besteiras... — Em um suspiro de derrota, o conde, em uma súbita atitude inesperada até mesmo para ele, envolveu delicadamente a cintura da garota com a mão esquerda, entrelaçando em seguida os dedos da destra com os da mesma, puxando-a para mais perto de si ao começar suaves movimentos em uma dança. A menina obviamente se mostrou extremamente feliz enquanto observando o forte azul de seu olho esquerdo, o único que podia ser apreciado por conta não apenas das mexas que lhe caíam por cima do mesmo mas pelo tapa-olho que lhe escondia a visão.
Convenientemente Sebastian havia entrado no salão com um violino em mãos, iniciando uma suave e doce melodia para que o mestre se guiasse por meio desta naquela dança. Sua preocupação não podia ser mascarada por sorriso algum visto que o conde era um péssimo dançarino e ainda assim tentava naquele momento sincronizar seus passos em algo terno e aprazível apenas para deixar a noiva feliz.
As coisas infelizmente não estavam de acordo com o que houvera imaginado Ciel. Seus passos, assim como seu desconcertante ritmo, quebravam toda a harmonia esperada em uma dança sutil. A garota parecia apreciar aquilo apesar da inexistente simultaneidade de movimentos, muito contrária ao conde que não continha seu nervosismo e frustração perante a dama. Passos em falso ainda não haviam transbordado a paciência do menor até o momento em que a última gota fora despejada sobre ele. Um erro maior do que todos os outros que ele já tinha cometido naquela dança fora finalmente inadmissível. O garoto, descoordenado e de humor instável, pisou o pé de Elizabeth em um de seus últimos movimento antes da súbita parada. Sua testa fora de encontro com o peito da garota que o segurou firmemente para que este não caísse e nem a derrubasse . Não era como se ambos já não fossem o foco daqueles que estavam no salão, e isso agora incluía os três outros servos juntamente a Tanaka, mas aquele momento havia atraído mais da atenção dos presentes justamente pelo erro do conde.
Os primeiros olhos procurados por Ciel haviam sido as orbes rubras de Sebastian, o mordomo obviamente já não tocava mais a doce melodia de segundos atrás visto que o olhar reprovador de seu mestre o ordenava a parar, suas mãos apenas repousavam sobre o instrumento musical que tocara anteriormente, de seus lábios fora inevitável a fuga de um suspiro surpreso pela reação do garoto que, rapidamente, separou-se da loira e em passos apressados dirigiu-se ao segundo andar, especificamente a seu escritório.
— Perdoe-me pela rudez de meu jovem mestre... Ele está um pouco cansado pela realização de atividades anteriores. — Sebastian desceu as escadas em direção à lady Elizabeth, explicando-a um possível motivo para a reação do garoto por mais que já estivesse óbvio, ao menos para si, o real motivo do pequeno lorde ter se irritado daquela maneira. Alguns bons minutos haviam sido tomados do demônio para que explicasse às duas – Paula e Elizabeth – que o Phantomhive precisava de um tempo para si longe daquele tipo inesperado de pressão recém realizada sobre ele.
•
A maçaneta havia se virado, o baixo ranger da porta anunciava a chegada de alguém. Ciel já sabia que seria Sebastian, era bastante óbvio, por isso não fez questão de levantar a cabeça que repousava sobre a mesa do escritório. O garoto apoiava os braços sobre o móvel de maneira que pudesse improvisar um travesseiro com os membros aonde enterraria o rosto e aguardaria o sono, ou ao menos aguardaria a vontade de se levantar.
— Jovem mestre? Sabia que negaria o jantar mas não posso deixa-lo dormir com o estômago vazio, então tomei a liberdade de lhe trazer uma fatia de bolo amanteigado de baunilha para substituir a refeição. — O mordomo, sempre cuidadoso quando o assunto era o pequeno conde, aproximou-se da escrivaninha em que o menor estava, deixando lá a pequena bandeja que trazia consigo contendo um prato com a fatia de bolo enfeitado com alguns doces e uma xícara de chá vermelho. Tudo que houvera trazido era do agrado do jovem pois seria o método mais viável encontrado por Sebastian para melhorar o humor do garoto. Um sorriso não pôde ser evitado nos lábios do maior ao ver o quanto os olhos de Ciel brilharam ao finalmente encontrarem o prato. Orgulhoso, o menor virou o rosto em negação no primeiro momento, mas logo tratou de pegar uma das pequenas jujubas que decoravam o bolo e começou a comer.
— Suas atitudes hoje não foram dignas, jovem mestre... — O demônio disse à medida que recolhia alguns dos papéis e livros sobre a mesa do conde, guardando-os em seus respectivos lugares dentro daquele cômodo.
— Isso não importa mais... Coisas que estão no passado vão continuar no passado. — O Phantomhive cuspiu as palavras antes de finalmente iniciar a degustação de verdade, sempre mantendo o olhar fixo sobre o mordomo. O garoto parecia sério apesar de razoavelmente menos irritado por estar se deliciando com coisas doces, sua resposta havia sido seca no entanto, era inevitável se sentir mal após lembrar-se dos terríveis erros cometidos ao dançar com sua noiva. Aquilo fora, para si, algo próximo ao imperdoável.
— Creio que tanto para você quanto para mim é importante mantê-lo sempre apresentável e respeitável perante outros olhos... Eu recomendo fortemente que o jovem mestre passe a ter aulas de dança agora. — Sebastian respondeu de maneira que acabou fazendo o garoto enrugar a testa. Não gostava de dançar e apesar de encontrar grande necessidade de tal habilidade optava por não aprender. Preferiu continuar comendo e ignorou o mordomo que imediatamente pôs-se a seu lado com um sorriso incomodado, o pequeno conde não havia entendido no começo até finalmente ver a mão destra do demônio estendida para si. Seu rápido raciocínio logo o levou a entender mas ainda assim a questionar. Sebastian realmente o estaria chamando para dançar? Sua negação fora óbvia, virou o rosto mais uma vez em relutância por não querer repetir os mesmo erros de algumas horas atrás embora o parceiro desta vez fosse alguém de maior proximidade.
O demônio persistiu. Não queria que Ciel guardasse as lamentações de uma pequena falha, talvez ter uma rápida aula de dança o fizesse esquecer parte do problema. Até porque o garoto já havia deixado claro há tempos atrás que era bastante esquisito dançar com alguém tão mais alto. — Não tomarei muito de seu tempo, é importante dormir cedo ou acabará acordando sem disposição. — Um sorriso confortável e de certa forma acolhedor se formou nos lábios daquele ser, sorriso este que provavelmente fora o causador da aceitação do conde.
Ambos estavam agora de pé banhados pela luz da lua, Sebastian trouxera o garoto para o centro da sala onde gentilmente enlaçou ambos os dedos e de maneira semelhantemente carinhosa lhe envolveu a cintura com firmeza. Tendo finalmente o corpo do pequeno próximo ao seu iniciou suaves movimentos ritmados apesar da ausência de qualquer trilha sonora. — Tente repetir os meus passos, assim pode tirar uma base para continuar. — O maior dissera em tom baixo enquanto observava Ciel a encarar seus pés. Aceitou aquela situação apenas pelo fato do jovem ainda não ter total domínio sobre a cena, permitindo então que ele encarasse os próprios membros.
Passados alguns breves minutos o próprio conde já havia resolvido erguer a cabeça, não estava completamente norteado mas havia pego um pouco da manha para dançar. Vendo aquilo, Sebastian tratou de intensificar um pouco mais as coisas em alguns giros e movimentos mais espaçosos. Ciel não pareceu se intimidar por aquilo, já estava bem mais relaxado se assim poderia ser dito e aparentava também estar disposto a continuar. Sendo assim, entre mais alguns passos suavemente coordenados Sebastian resolvera tentar algo diferente. — Feche os olhos... — Sussurrou à medida que se inclinava sobre o conde, eventualmente também o curvando um pouco para trás. Sentiu com facilidade a insegurança do Phantomhive que não demorou muito a logo entregar o peso de seu corpo cansado às mãos de Sebastian. O azul de seu olho direito viu o carmesim do demônio pela última vez naquele período de tempo antes de finalmente ser fechar vagarosamente, apreciando de maneira inconsciente aquela aproximação até o último segundo. O mordomo segurou com ainda mais firmeza a cintura de seu mestre já que todo o peso da criança havia sido depositado em sua mão da maneira como havia desejado.
Ter o pequeno e frágil conde em seus braços daquela forma era mais interessante do que lhe parecia ser em mente há segundos atrás. Seria insensato se aproveitar de uma situação daquelas ao mesmo tempo em que era totalmente intrigante para o demônio ter acesso àquela intimidade por um meio falsamente inocente. Inclinou ambos os corpos mais um pouco às proximidades do chão, vendo a mão destra do menor tocar agora o tapete vinho. Sem perder tempo levou a mão que agora estava livre a tocar a fina pele do pescoço alheio, sentindo, mesmo que através das luvas, os vestígios de calor daquele corpo. Um demônio com as condições dele não deveria ser julgado por suas ações caso decidisse por um mero impulso tomar-lhe a vida tão indefesa e bem guardada, e de fato não seria. Ninguém os veria ali, ninguém saberia o que de fato aconteceu além daqueles olhos avermelhados. Ainda não parecia ser o suficiente. Nunca parecia ser, na verdade.
Sebastian aproximou os lábios do pescoço de Ciel, tocando-lhe a pele de maneira cálida e suave até disferir lá um beijo inesperado, ação tal que finalmente aniquilou todas as forças do conde naquela noite, fazendo com que o mesmo perdesse toda a capacidade de se equilibrar sobre as pernas, entregando, enfim, o aos domínios do demônio. O peão tivera se apoderado do rei pela primeira vez no jogo, marcando a alma do tal como sua mais importante missão sobre aquele tabuleiro de xadrez.
⊰ Caminhou pelos corredores vazios e atualmente iluminados pelo intenso brilho da lua da mansão em direção ao quarto de seu jovem mestre, deitando-o já adormecido sobre a espaçosa cama entre alguns travesseiros. De sua pele branca a maior pureza resplandecia, sua respiração nunca havia aparentado ser tão calma quando era agora, a melhor expressão de ternura se mesclava a indescritível sensação de paz emitida pelo simples fato de ainda preservar sua humanidade, tornando-o ainda são em meio ao ódio guardado por si mesmo em seu próprio coração. Aquilo era perfeito. Uma incrível sintonia de normalidades que pareciam eventos ainda não estudados pelo homem, tão raros quanto eclipses ou a constante felicidade na Terra. Tão inacreditável a ponto de criar comoção em uma criatura fria e amaldiçoada quanto um demônio. A perfeição aos olhos de Sebastian se encontrava na criança finalmente adormecida e mais uma vez à mercê da acolhedora luz da lua.
Um sussurro frio e entorpecente fluiu por entre os lábios do mais alto até o ouvido do menor, aparentando ecoar por eternidades dentro do garoto até o breve momento em que se retirou daquele quarto, mesclando-se, enfim, à impenetrável caligem da noite.
— Boa noite, jovem mestre. —
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