Prólogo.
A casa estava silenciosa do jeito que por muito tempo amou, porém seu amor mudou de foco. E o objeto de sua atenção era completamente o contrário de si mesmo. Ela gostava de barulho, de música alta e de risadas escandalosas.
Desde que a conheceu, o barulho passou a ser mais do que som desnecessário. Passou a ser a certeza de que estava vivo e a razão para a qual voltava para casa todas as noites.
- Onde está, querida?! – exclamou tirando a parte de cima do terno.
- Shii – a mulher de sorriso brilhante entrou no cômodo, pedindo silencio com o indicador nos lábios – Acabei de coloca-la para dormir.
Ele desviou dela para olhar a escada que levava aos quartos no segundo piso. Praguejou mentalmente por não ter colocado sua menina na cama também. A decepção o fez sorrir. Há anos não sentia nada e agora o fato de ter trabalhado até mais tarde, o que antes era sua vida, agora era motivo de lamentação. Voltando os olhos para loira a sua frente deixou-se relaxar e sentir aquela quentura doce que o invadia todas as vezes que estava ao lado dela.
- Do que está sorrindo? – Ela perguntou arqueando a sobrancelha – Se soubesse o trabalho que ela deu, não estaria. Akemi tem gênio forte.
- Ela puxou a quem, hum? – riu divertido.
- Você é claro! – Mebuki cutucou o peito dele – Espere ela crescer e verá o trabalho que ela dará.
- Não venha com essa, ela puxou você – disse ainda se divertindo – Ela puxou seus olhos e seu gênio raivoso. Terei trabalho quando chegar a adolescência.
Aproximou-se da mulher de cabelos loiros prateados, ela mantinha um bico consternado nos lábios mais deliciosos que já provou. O cheiro de maçã madura o envolveu e ele não esperou mais para inspirar profundamente. Mebuki tinha os olhos verdes mais sinceros e misteriosos que já tinha visto, e que agora sua filha também carregava no rosto.
- Eu te amo – confessou antes de beija-la ternamente.
- Dia difícil, Kizashi? – a loira murmurou ainda nos lábios do homem – Eu também o amo, com todo o meu coração.
Kizashi continuou a beijá-la deixando que as palavras dela aplacassem a parte mais obscura que o dividiu por toda sua vida. Seu trabalho cobrava o homem/monstro que foi criado para ser e sempre o foi. E a única pessoa que conhecia sua parte de homem digno e feliz era sua mulher, que agora beijava, e sua pequena filha de oito meses.
- Vamos dormir? – ciciou ele sentindo as mãos dela desfazendo a maldita gravata que tanto odiava.
- Ainda não – Mebuki negou com a cabeça e lhe deu um sorriso nervoso – Temos visitas.
Kizashi olhou por cima da cabeça de Mebuki, o que não era nada difícil, já que ela era pequena. As luzes do corredor que levava à cozinha brilhavam acesas. Sua testa franziu contrariada e sua pele arrepiou-se sem motivo aparente.
- Quem é?
- Fugaku – ela deixou escapar um suspiro – Ele está aí já faz um tempo. Quer falar com você. Ele parece nervoso.
Kizashi baixou seus lábios e beijou a testa de Mebuki, seus olhos ainda presos no portal que daria para a cozinha. Como se sentisse seu olhar, a sombra de Fugaku apareceu segundos depois.
Os olhos negros de seu melhor amigo estavam sérios e gélidos. Problemas graves eles gritavam.
- Suba Mebuki, logo a seguirei – baixou seus olhos para a mulher em seus braços.
- O que está acontecendo? – o medo na voz dela era palpável – Me diga.
- Eu não sei, apenas suba – Kizashi se desvencilhou dela tomando a cozinha como direção.
Mebuki hesitou ainda o encarando, o sorriso doce já não mais abrilhantando na face serena dela. Kizashi movimentou a cabeça indicando as escadas, ela seguiu seu comando com a mandíbula travada. Ela estava com raiva e ele sabia que pagaria por isso mais tarde.
Quando a porta bateu com força no andar de cima, Kizashi virou para encontrar o sorriso solidário de Fugaku.
- Mikoto também está assim – a voz do Uchiha era como trovão num ambiente tão silencioso – Minha vantagem é que ela é da família.
- Ela pode quebrar todas as portas dessa casa. Ela não vai se envolver, meu amigo – Kizashi passou por Fugaku indo diretamente para o balcão – O que o traz essa hora até aqui?
- Madara matou Orochimaru – Fugaku disse observando seu amigo retesar no meio do cômodo – Ele matou durante a entrega de hoje.
Kizashi virou-se para o Uchiha seus olhos brilhando com raiva clara.
- Não podemos comprar uma guerra agora! – levantou a voz – Já estamos lidando com os russos!
- Não havia saída! Foi para me defender! – Fugaku rebateu aproximando-se do outro – Vamos dar um jeito. Essa cidade vai ser nossa!
Kizashi negou com a cabeça afastando-se do moreno. Eles já estavam afundados em mortes suficientes para poder comprar briga com mais pessoas. Já estavam perdendo muitos homens. A cidade estava um caos completo. Não havia paz.
- Vai dar tudo certo, meu amigo – Fugaku caminhou até o amigo e apertou seu ombro – Quando conquistarmos tudo, vai poder viajar com sua Mebuki e filha. Toda essa cidade vai ser nossa. Nossos filhos poderão brincar sem correr algum risco!
- Nada dará certo se seu irmão continuar sem nenhum controle! – Kizashi exclamou puxando o maço de cigarros do bolso. Tragando o cigarro profundamente, suspirou – Por que ele o matou?
- Sai para comprar um presente para Itachi e Sasuke. Quando saí da loja, um carro apareceu e começou a atirar. Saquei a arma, mas Madara já estava atirando enquanto o carro arrancava para a outra esquina. O motorista perdeu o controle e bateu no poste.
- Orochimaru dirigia? – perguntou duvidoso.
- Não, um capanga dele dirigia. Também tive essa reação quando abri a porta do carro e vi Orochimaru. Ele deve ter visto uma oportunidade, eu estava apenas com Madara, nenhum outro homem – Fugaku coçou a sobrancelha nervoso – Saímos antes que os policiais chegassem.
Kizashi nada falou e concentrou-se em seu cigarro. Não se envolveria nesse caso. Um carro crivado de balas não parecia com trabalhos feitos por eles, não haveria porque suspeitar deles então. Encarou seu amigo de infância e sorriu de canto.
- Se livrou de uma, não é bastardo?
Fugaku bufou soltando uma risada alta. O Uchiha estava pronto para devolver a fala com outro palavrão, quando um estrondo soou vindo da frente da casa. Entreolhando-se os dois homens sacaram as armas de seus ternos e a passos lentos caminharam até o portal da cozinha.
- Russos? – Fugaku murmurou quando o que pareceu uma explosão soou – Espero que não tenha sido meu maldito carro.
- Você foi seguido? – Kizashi perguntou sentido suor frio brotar em sua pele.
- Não!
- Tem certeza?
- Claro que sim porra!
- Então como eles descobriram onde moro?! – Kizashi encarou seu amigo furioso.
- Eu não sei!
- Kizashi?! – a voz de Mebuki atraiu a atenção dos dois.
Kizashi logo correu em direção a escada, mas antes mesmo que conseguisse ver Mebuki, a porta foi arrombada e homens encapuzados entraram atirando. Jogando-se rapidamente no chão, Kizashi escapou dos primeiros tiros e apontando a arma em direção dos invasores, começou efetuar disparos consecutivos.
O barulho dentro da casa tornou-se intenso, alto demais. Enquanto seu dedo apertava o gatilho sem parar, homens caiam e sangue espirrava por toda parte, e tudo em que Kizashi conseguia pensar era em Mebuki e sua pequena Akemi.
Conseguia ouvir Fugaku gritando obscenidades enquanto mais balas voavam para todas as direções. Quando pôde ficar de pé, procurou rapidamente por Mebuki subindo pelas escadas o mais rápido que conseguiu.
No andar de cima havia apenas o som abafado do barulho do andar de baixo. Respirando fortemente e com o corpo tremendo pela adrenalina, Kizashi apertou a arma em mãos, seu dedo pronto no gatilho.
- Mebuki? Sou eu... – murmurou cuidadoso. Algo estava errado, podia sentir em sua pele tanto quanto sentia a arma em suas mãos.
Sua esposa não respondeu, mas o ruído de algo batendo contra carne o fez correr para a última porta do corredor. Chutando a porta aberta, o choque com a cena o fez aturdido por alguns segundos.
Mebuki estava montada encima de um dos invasores. Ela batia contra o rosto dele repetidamente com um atiçador de lareira. O sangue espirrava a cada baque da haste de ferro contra o rosto do homem. Lágrimas escorriam dos orbes verdes dela.
- Mebuki! – gritou avançando na direção dela e tomando o ferro de suas mãos.
Ela gritou roucamente e tentou soltar-se de seu aperto. Kizashi usou mais força para fazê-la encará-lo. O rosto bonito dela estava coberto de sangue, que escorria e pingava de seu queixo. Assim que ela o identificou, Mebuki paralisou por alguns segundos. Contudo, logo voltou a olhar pelo quarto transtornada.
- Onde está Akemi, Mebuki? – perguntou a vendo arrastar-se por cima do corpo até ficar de pé.
- Akemi, Akemi, Akemi, Akemi – ela repetia sem parar enquanto tateava o chão e balançava seu corpo na procura pela filha.
- Mebuki?! – gritou Kizashi a fazendo parar e olhá-lo.
Mais lágrimas caíram enquanto ela ofegava.
Mebuki caiu de joelhos e um grito angustiante a deixou.
Kizashi a encarou sentindo seu coração pulsar dolorosamente vendo sua mulher abraçar-se enquanto gritava em meio as lágrimas. A arma escorregou de suas mãos, batendo no chão com um som seco.
Kizashi observou a janela aberta com a cortina esvoaçante, uma corda pendia no beiral. Num bater de coração, ele estava correndo escada a baixo, não importando-se se iria levar um tiro. Kizashi cruzou a porta de sua casa e correu em direção ao portão de entrada que estava no chão e tomou a estrada forçando suas pernas o mais rápido que podia.
- Akemi! – rugiu para a noite estrelada – Akemi! Akemi!
Mas nada o respondeu. Não havia mais carros. Não havia mais homens encapuzados. Não havia mais sons do tiroteio.
Kizashi se viu no meio da estrada asfaltada sozinho, coberto de sangue e sem sua pequena filha.
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