No céu o Sol estava a pino, os raios calorosos desciam para o porto em uma luta sem fim contra o mar. As ondas curtas batiam furiosas contra a madeira velha do cais. O porto recebia apenas navios pequenos e pobres, juntos aos pescadores que vendiam a pesca fresca no pequeno mercado que ficava ao lado, onde comerciantes trabalhavam barulhentos e os interessados pela mercadoria vinham observando. Não era exatamente um lugar que chamaria a atenção de clientes, como todo o conjunto daquela parte da cidade — que era a mais pobre.
As construções ao lado do mercado subiam empobrecidas, feitas em tábuas de madeira que pareciam prestes a cair por culpa dos cupins. Uma em especial parecia bela e renovada, também era a maior construção dali e era onde se tinha o maior movimento. As paredes eram bem cuidadas e aparentavam serem novas, na madeira havia pinturas cuidadosas em volta das postas largas, flores rosadas e brancas que convidavam os Elfos de Luz a conhecerem o estabelecimento. O antigo dono e pai da família havia implicado um pouco com as flores, era “feminino demais” para um lugar onde os elfos que desistiram da vida dura desmaiariam de tanto beber.
Pelas portas pesadas de madeira escura saiam os elfos cambaleantes, estavam a horas bebendo na taberna e eram os melhores clientes dos Mahvir. A todo o momento chegavam novos clientes, mas não eram todos os dias que estavam tão movimentados.
— Solay, sirva o senhor Hocks. — ordenou Zelaia, uma elfa de olhos cansados e aparência jovem enquanto entregava o jarro cheio de cerveja para sua filha mais velha. A mulher usava um vestido preto demonstrando seu luto eterno pela morte do elfo que amava, seus cabelos estavam presos em um coque bonito e arrumado.
— Sim, mamãe. — a menina sorriu animada de mais para alguém que estava trabalhando desde cedo em uma taberna. Pegando a jarra, Solay saiu a passos apressados até a mesa onde o cliente velho esperava sua bebida.
Como sua mãe, a garota tinha olhos roxos de tom claro e cabelos dourados. Além disso, seu rosto fino também havia muito semelhança com a da mais velha, enquanto sua irmã mais nova parecia ser a cópia de seu pai; cabelos castanhos e olhos escuros.
A elfa loira usava um vestido fino de mangas curtas, era azul claro com a saia longa e corrida e acentuava sua cintura fina. O decote quadrado era singelo, na cintura tinha uma fita branca e se repetia nas mangas, parecia ter sido costurada apenas para não deixar o vestido tão simples. Nos cabelos tinha uma presilha com uma flor vermelha que prendia sua franja, por essa havia um carinho especial de Solay, havia sido presente de seu pai quando chegara à maioridade.
— Aqui está sua bebida, senhor Hocks. — a elfa sorriu gentil servindo a caneca de chifre sobre a mesa do senhor. O elfo sempre se sentava sozinho e ficava com a mente perdida em pensamentos conturbados, sua caneca de cerveja parecia ser sua única e fiel companheira. E como sempre o sorriso agradável era a única coisa que Solay recebia do cliente.
Virando-se, a loira passou seus olhos calorosos pelo lugar e ao ver novos clientes entrarem logo foi até a mesa onde se sentaram para pegar seus pedidos.
As paredes de tabuas escuras eram ainda mais enfeitadas por flores no lado de dentro da taberna. Mesas curtas, com lugar para quatro pessoas, se dividiam no interior longo do lugar, eram simples e construídas pelo falecido pai de Solay, junto a seu irmão que já viajava há muito tempo. Sobre elas haviam velas para iluminar o lugar, as poucas e pequenas janelas não eram suficientes.
— Solay. — a elfa de cabelos castanhos se aproximou saltitante com um sorriso alegre em seus lábios. Naquele dia, May parecia mais radiante do que nunca aos olhos da irmã mais velha.
— Boa tarde, minha irmã. — a loira sorriu em agradecimento aos clientes e saiu a passos apressados até sua mãe, acompanhada por sua irmã que passou a mão por seu braço os cruzando.
— Tenho algo para lhe contar. — comentou a menina baixo cheia de animação, Solay tinha certeza que se não fosse chamar à atenção de sua mãe, May estaria pulando pela taberna.
— Cerveja e duas coxas de galinha, mãe. — disse Solay passando os pedidos, quando a mãe saiu e em seguida, ela se virou para irmã com um pequeno sorriso nos lábios.
A cozinha ficava mais afastada, separada por uma tabua usada como bancada onde tinha algumas canecas, acima dela havia algumas cebolas e alhos pendurados e ao lado, em um tronco de madeira fino, ficava o brasão dos Elfos de Luz. Era azul, tinha lírios brancos e em seu meio ficava o sol cheio de esplendor, o brasão grande e de ferro tinha formato de um escudo. Por trás da bancada estava o forno de pedras, sempre aceso. Era com certeza a parte mais quente da taberna. Zelaia Mahvir costumava ficar maior parte do tempo ali, enquanto cozinhava para os clientes, apesar da comida não ser realmente o que mai vendia ali.
— Já posso até adivinhar do que se trata. — comentou Solay resgatando o jarro de cerveja para ir encher a caneca daqueles que a chamavam sedentos, insistente May a seguiu sorridente.
— Nós fugimos para o celeiro essa noite. — a morena comentou baixo, enquanto sua irmã servia as canecas dos elfos bêbados. Solay sabia exatamente a que May se referia, sua irmã mais nova passava dias lhe contando sobre o secreto namorado, o elfo no qual May vivia se encontrando as escondidas durante noites.
— Detalhes não são o que quero saber. — rebateu a mais velha prontamente, enquanto sorria para o cliente mais jovem, porém o olhar que recebeu em troca não era agradável. Rapidamente ela saiu arrastando May.
— Está bem, eu sei! Mas acho que realmente devia experimentar. — May riu mordendo o lábio. Sabia exatamente como sua irmã ficava desconcertada com assuntos tão íntimos. — Dessa vez foi diferente. — comentou May e a olhando Solay podia ver o brilho de paixão nos olhos castanhos da irmã. A loira sorriu suspirando, ficava realmente feliz por ela.
O frescor do vento colidia-se contra a face do jovem Elfo Sangrento fazendo os longos fios de seus cabelos platinados voarem junto à brisa. Os olhos negros da figura alta e máscula coberto por vestimentas caras observavam desinteressadamente o horizonte à frente, fitando os rastros de terra que apesar da distancia equivalente, já ocupavam seu campo de visão.
As firmes ondas do oceano dançavam em movimentos ondulares acompanhando as vastas locomoções do vento. Os pássaros voavam em meio ao céu tomado pelo variante azul claro, pincelado com infindas nuvens brancas que se destacavam ainda mais com a luz do dia. A aragem penetrante das águas impregnavam os pulmões do elfo, suplementando seus sentidos com a aura salgada da resalga, fundindo-se com o frescor da areia queimada pelo volúvel Sol.
O vasto navio moldado à madeira locomovido com enormes velas brancas coordenou-se em direção ao porto que auferia apenas pequenos navios de pescadores. A potência das ondas impactava contra as bordas cobertas pela areia amarelada, levando e trazendo consigo pequenas e coloridas conchas, e manchando a velha madeira dos cais com o musgo esverdeado, cobrindo as desgastadas paredes por algas que transitavam para a terra firme juntamente com a potência das ondas.
Em poucos minutos, o elfo de olhos escuros já se encontrava com os pés colados em terra firme, acompanhado por sua parceira. Uma jovem elfa de olhos esverdeados, mais puxado para um tom cinzento, os fios castanhos dos lisos cabelos escorriam da raiz até a abaixo dos ombros, enquanto essa mantinha junto a si uma bolsa de couro que guardava suas incontáveis flechas, junto com seu arco de madeira escura.
O ambiente ao redor era completamente movimentado por vendas e mercadores, ambos que fitavam estranhamente os Elfos Sangrentos que chegara há minutos em um navio tão pouco visto por eles.
Niffar Rhaer era um elfo alto e másculo, seus olhos negros e seus cabelos platinados elevavam sua aparência séria, enquanto esse trajava roupas escuras no tom negro, pinceladas com detalhes dourados por toda a região de seus ombros, braços e peito, mesclando-se com o tom claro de seus cabelos e com as orbes escuras de seus olhos que lhe davam um ar impecável. A franja lateral voava por conta da brisa, enquanto os raios de luz inundavam todo o ambiente.
— Teryl está atrasado. — ele murmurou impaciente, enquanto mantinha seu olhar focado sobre a figura da mulher conhecida ao seu lado. O Sol acusava o horário entardecido, denunciando o irritante atraso de Teryl, o Elfo Sangrento de cabelos loiros que prometeu chegar adiantado.
— Ele realmente não muda, Niffar. — a morena distinta como Marth Rally respondeu entre um suspiro cansado, enquanto mantinha seus braços cruzados sobre o peito. — Mas dessa vez ele passou dos limites. — concluiu, sentindo os terríveis raios de Sol cobrir sua pele com fortes ondas de quentura.
O calor ali era realmente intenso.
Ainda intrigado com a ausência do parceiro, Niffar colocou-se a observar o ambiente. As pessoas iam e vinham, vendendo seus peixes e suas mercadorias baratas. No entanto, o que mais lhe chamara a atenção fora uma enorme taberna, essa que parecia ser a maior construção ao redor da cidade, tão bem moldada e enfeitada com flores coloridas.
Ainda relutante com o calor, o Elfo Sangrento destinou-se a caminhar dirigindo-se a porta de madeira que entravam e saiam pessoas ébrias por bebidas.
A estrada acima do cais se conectada a ele por escadas, essa estava enlamaçada e piorava a ainda mais com as chuvas inesperadas e as carroças que passavam por ali. Parecia que o Sol quente não era o suficiente para secar a terra.
Ao longe a figura alta chamava atenção. Um Elfo Sangrento de cabelos curtos e loiros andava despojado enquanto fazia questão de sorrir para os Elfos de Luz que lhe olhavam torto. Com certeza não era bem aceito ali, o ódio entre as raças não era nenhum mistério.
O cheiro forte de peixe e água salgada do mar tomava as narinas do loiro, o pior era a sensação oleosa que ficava em sua pele causada pelos raios de Sol que o esquentavam e também ao sal do mar.
— É um lugar bem agradável. — ele comentou com um sorriso debochado nos lábios rosados, nem mesmo as elfas parecia uma boa atração ali, além de que sua mente costumava estar ocupada com uma em especial.
A figura era alta e esguia, usava roupas que para muitos se diferenciava do habitual, em sua maioria de cores escuras. Por baixo do casaco longo de couro, apenas uma camisa branca. Nas pernas a calça preta, em sua cintura o cinto que abrigava a capa de sua espada. Seus pés carregavam a grande e pesada bota negra.
Teryl Avalon tinha a postura de um elfo cheio de autoconfiança, e não se diferenciava do que era. Além de ser tão cheio de si, parecia levar nada a sério e era garrido.
O loiro não demorou muito para encontrar os dois outros Elfos Sangrentos em meio aos Filhos da Luz, só de observá-los sabia que reclamavam sobre sua demora, mas realmente não se importava.
— A viagem de navio não me parece ter sido das mais agradáveis. — o loiro comentou, em pouco tempo todo o deboche parecia ter desaparecido de sua face. Estava apenas sendo sério, o que fazia pouco. Sem ao menos saber para onde Niffar e Marth seguiam, Teryl apenas ia com a confiança que tinha em ambos. — Uma cerveja não parece ser má ideia agora. — comentou ao ver a placa pequena encalhada em madeira, estava pendurada a frente da porta da taberna por correntes na madeira pregada a parede. Os enfeites de rosa pintados o faziam franzir o cenho. — Não tenho certeza se é apenas uma taberna. — comentou por fim escondendo o sorriso em seus lábios.
O trio de Elfos Sangrentos adentrou a localização tomada por repletos moradores ébrios por álcool. A parte interna da taberna era ainda mais enfeitada do que os muros externos. As paredes eram ocultas por tábuas de madeira, muito bem polidas, essas enfeitadas com incontáveis flores coloridas, deixando o ambiente com uma aparência agradável.
As mesas quadradas moldadas a madeira escura encontravam-se espalhadas em meio ao salão, enquanto os clientes sob elas bebericavam suas cervejas geladas, entretendo-se com goles, risos e conversas afiadas. Os estrangeiros de Sangue logo escolheram uma das mesas, a mais solitária dentre as muitas outras e logo adotaram seus lugares, sentando-se sobre os assentos de madeira no tom marrom.
O cheiro de bebida e carne inundava o ambiente, enquanto uma senhora que se mantinha atrás do balcão dirigia-se dentre um cômodo a outro, certamente buscando seus afazeres, organizando e preparando as proporções de pedidos.
— Acho que uma bebida cairia bem agora. — disse Marth. A elfa morena de arco-e-flecha dirigiu seu olhar sob o parceiro de cabelos loiros que mantinha consigo um sorriso sob os lábios rosados, enquanto seus olhos analisavam a decoração estruturada.
— Teryl, você não poderia ir até a bancada pedir algo? — indagou Niffar, dirigindo um olhar ordenado ao parceiro coberto por vestes escuras.
— Ah! Sempre sobra para mim ir ao balcão. — comentou Teryl estalando a língua enquanto fazia questão de se sentar ao lado de Marth. — Mas, veja bem, não conseguirei trazer todas as canecas sozinho. — sorriu ele passando seu braço sobre os ombros de Marth enquanto aproximava seu nariz da orelha pintura dela.
— Foi diferente! Eu sei! — a Elfa de Luz de cabelos amarronzados insistiu com sua irmã agarrando o braço dela enquanto acompanhava Solay que enchia algumas canecas de cerveja. Às vezes, Solay se questionava, estava fazendo o certo? Apenas incentivava os que haviam perdido tudo a perder o que já não tinham.
— É o que sempre diz, May. — suspirou a loira arrastando-a pela taberna. Não foi difícil perceber os novos clientes quando a luz do Sol invadiu o estabelecimento.
Os passos de Solay foram rápidos, mas no meio do caminho ela parou com os olhos um pouco assustados.
— São Elfos de Sangue. — comentou May apertando o braço de sua irmã.
— Elfos Sangrentos. — corrigiu Solay enquanto franzia o cenho. Tudo o que ouviam sobre aquela raça era sombrio, desde pequena seus pais lhe contavam histórias aterrorizantes sobre aqueles seres e isso fazia a pequena temê-los.
— Bem, clientes são clientes. — comentou May dando um passo para trás. — Você acha que vieram causar problemas? — perguntou baixo.
— Como se já não bastasse enterrar os Elfos de Luz na lama. — proclamou a loira suspirando rasamente. Seus pés pareciam presos ao chão, mas bravamente Solay os soltou do assoalho e com passadas pesadas, chegou à mesa daquelas figuras sombrias. May veio logo atrás e como sua irmã parecia lutar para enfrentar os desconhecidos.
— Podem-me dizer o que querem. — Solay forçou o melhor sorriso que tinha. Depois de dar tanto tempo o treinando com clientes desagradáveis, não era nada falso. May fez o mesmo, mas seu medo era visível.
— Ora, parece que não serei o escravo de vocês hoje. — comentou Teryl com um sorriso que conseguia ser ainda maior comparado ao de Solay, o loiro piscou para a loira. A Elfa de Luz se esforçou para sorrir agradavelmente depois daquilo, o que não precisou fazer por muito tempo. Por um momento seus olhos foram presos sobre a figura platinada, seus olhos negros eram tão obscuros que lhe causavam arrepios.
O olhar do Elfo Sangrento de roupas negras e cabelos prateados cobriram a pequena figura feminina da Elfa de Luz que havia se aproximado a poucos segundos. Essa ainda mantinha um sorriso gentil sobre a face serena, enquanto aguardava uma ínfima resposta.
Ela usava vestes simples bordadas com fios azuis, enquanto os cabelos louros caiam delicadamente sobre seus ombros cobertos pela manga curta do vestido. Os olhos no tom roxo claro o cobriam como ondas de um oceano, as orbes intensas transpareciam um brilho acompanhado por inocência, delicada como um jardim de orquídeas lilás. E o único pensamento que a mente de Niffar conseguiu produzir era; por que ela o olhava tanto? O Elfo Sanguento não disse uma palavra se quer. Sua mente estava em fervura, não sabia os reais motivos, mas sua a desconfiança de que esse provavelmente apontava para a figura maligna que a muitos anos habitava em si, ecoava em seu interior em oscilações de receio.
Em todos os seus anos de vida, passaram-se inúmeras elfas cruzaram o caminho Niffar, todas lançavam o mesmo olhar para si. No entanto, a sua voz consciente insistia em sussurrar que nenhum delas possuía o brilho sereno que tomavam os olhos da jovem da luz. E por um momento, achou entender exatamente o que ela queria.
Solay espremeu seus olhos levemente, ter seu olhar correspondido daquela forma a deixava completamente desconcertada e desconfortável.
— Três cervejas. — Marth pronunciou-se notando a inquietação de Niffar, esse que após as palavras da parceira ousou quebrar o fio de ligação que guiava seus olhos negros aos olhos roxos da Filha da Luz. — Acho que apenas isso, por enquanto. — a morena concluiu educada, enquanto fitava a elfa loira que se mantinha em pé.
— Tudo bem, cerveja. Caso queiram algo para comer, basta chamar. Solay. — disse sorrindo mais alegre do que era esperado, porém o desconforto da menina estava minimamente aparente. A Elfa de Luz deu um passo para trás e ao se virar empurrou sua irmã apressada enquanto segurava o jarro de bebida com cuidado. — Pegue as canecas e ponha na mesa. — a loira cochichou olhando-a.
— Eu? Mas... — May estava prestes a reclamar quando sua irmã a cutucou. — Está bem, como ia dizendo foi diferente. — a morena afirmou voltando a contar sua história, dessa vez ela que arrastava Solay pela taberna. — Ele disse que vai pedir minha mão. — novamente o sorriso apaixonado invadia os lábios da mais nova.
— Em noivado? — Solay parou estática com seus olhos roxeados presos sobre May.
— Claro, noivado, sua boba! — exclamou a morena saltitante. — Ah, minha bunda está pinicando até agora. — ela reclamou, menchendo seu quadril desconfortável.
— Oh, bem... — Solay voltou a caminhar até o balcão onde acabou por pegar as canecas por conta própria. — Que bom que ele finalmente tomou a iniciativa. — comentou por fim soltando um leve suspiro enquanto se esforçava ao máximo para conseguir segurar as canecas e o jarro.
A elfa loira seguiu de volta a mesa dos Elfos Sangrentos como se sua consciência estivesse em outro mundo. Sua mente trabalhava se perguntando se algum dia algum elfo a pediria em casamento. Solay suspirou pesadamente pousando as canecas sobre a mesa de madeira e depois as encheu sem qualquer pingo de pressa.
— Tenham uma boa estadia. — ela murmurou se agarrando ao jarro como se fosse consola-lo. Solay se virou voltando ao balcão para encher novamente o objeto de ferro. — Mamãe, acabou a cerveja.
Teryl mantinha seus olhos presos sobre a pequena Elfa de Luz que antes havia lhe atendido, e logo se voltou a Niffar enquanto lambia os lábios.
— Parece que alguém aqui terá uma estadia muito divertida e quente com algumas Elfas de Luz. — o sorriso que sustentava em seus lábios era brilhante. — Sempre soube que era um conquistador com todo esse ar sombrio. Até mesmo as tão inocentes Elfas de Luz não podem resistir ao Grande Niffar. — Teryl resgatou sua caneca cheia de cerveja e bebeu sorridente.
Por segundos Niffar absorveu aquelas palavras em sua mente, percebendo que não fora o único que notou o olhar direto da elfa loira sob si. Não era um olhar de medo que muitas vezes o lançavam, era algo diferente. Talvez, sua desconfiança e as palavras de Teryl estavam corretas, e eram raras as vezes que dava atenção às asneiras que muitas vezes, Teryl falava.
— Não fale besteiras, Teryl. — rebateu Niffar tentando ignorar os pontos que passavam em sua mente, focando apenas em seus objetivos; conquistar novos reinos. Seu tom de voz soara mais sério do que esperava, enquanto a expressão neutra tomava suas feições. O elfo apanhou a caneca de bebida, levando-a em direção aos lábios, sentindo o líquido levemente amargo confiscar seus sentidos enquanto o “doce” sabor do álcool inundava seu paladar. — Não temos tempo para pensar nisso. Lembrem-se, precisamos encontrar um lugar para passar a noite.
— Ora Niffar, meu grande amigo. — Teryl o cutucou com o pé por baixo da mesa. — Não finja ser inocente. — o loiro riu e alto demais, chamando certa atenção na taberna. Despojado como sempre, piscou para os telespectadores.
— Não há muitos aposentos decentes nessa cidade. — a arrogante Elfa Sangrenta proferiu e logo após bebericou um grande gole de cerveja. — É um local empobrecido, não podemos esquecer quem foram os principais culpados por isso... — lembrou Marth, depositando levemente a caneca sob a tábua de madeira da mesa escura. — Os olhares deles sob nós são visíveis. Quem aceitaria um trio de Elfos Sangrentos?
— Um pouco mais de cerveja, senhor? — a Elfa da Luz questionou ao cliente. Quem a observasse diria que estava prestes a ter um ataque. Solay andava tão rápida pela taberna que sua mente parecia trabalhar mais rápida do que um raio, o que não era totalmente mentira. E com todos seus sentidos alertas, ela não pode deixar de ouvir um pouco da conversa dos seres sombrios misteriosos.
A loira aproximou-se novamente, com passos rápidos grudando um sorriso em sua face. Solay sorriu para os Elfos Sangrentos, antes de proferir.
— Nós também trabalhamos com hospedagem. Bom, com certeza é o melhor lugar que encontraram nessa parte da cidade e bem... — a moça limpou a garganta. — Nossa cerveja tem a fama de ser a melhor por aqui. — seu sorriso exagerado e agradável era sinal de todos os anos servindo na taberna. — Ah! Para a sorte dos senhores estamos com dois quartos vagos. Espero que tenham uma boa estadia. — e sem nem terminar de falar Solay já estava andando a passos rápidos pelo lugar.
— Ótimo, já conseguimos um lugar, sem precisar fazer nada. — Marth sorriu fraco e fitou os companheiros de Sangue, enquanto tomava um gole de sua bebida.
Os fracos raios de luz se espreitavam entre as janelas e adentravam ao cômodo, iluminando debilitadamente o ambiente pouco vazio. Aos poucos, os Elfos de Luz ébrios arrastavam seus passos lentos para fora da taberna desertando a localização. Os vestígios alaranjados pertencentes ao entardecer começavam a tomar conta do céu, denunciando que a noite chegaria em breve.
Apesar das longas horas bebericando, Niffar ainda se mantinha sóbrio. Seus olhos negros analisaram o recinto captando os detalhes ao redor, e então, concluiu que não sabia onde ficavam os aposentos que Solay comentou. A Elfa de Luz que lhe oferecerá um quarto não havia dito lhe mais nada. Marth e Teryl pareciam ocupados demais entretidos entre conversas, esses que aparentavam não estar nem um pouco preocupados com esse ponto. Então, com a intuição de procurar Solay em meio às mesas vazias, Niffar não demorou muito a avista-la.
O Elfo Sangrento levantou-se da cadeira onde estava e caminhou até a figura feminina que parecia distraída atrás do balcão enquanto limpava a sacada com um pano branco.
O lugar se esvaziava, o que para o horário era inesperado. A Senhora Zelaia havia saído assim como May, sua filha mais nova, que horas antes comentará estar indo varrer o feno. Solay apenas riu logo abaixando seus olhos com um soar tristonho. Contudo era claro que a elfa loira não permaneceria lamentando por demasiado tempo, um dos pontos fortes da jovem era ser tão positiva e alegre. A mantinha de pé e trabalhando até a exaustão por todos os dias, enquanto sua irmã parecia estar saltitando pelas ruas e sua mãe lamentando a morte do marido em silêncio.
— Os raios de Sol acariciam minha pele. — cantarolava a menina de face demasiada alegre enquanto deixava seu pequeno pano, agora amarelado de sujeira, sobre o balcão de madeira. Solay esfregou suas mãos pelo tecido de seu vestido e com elas finalmente secas ajeitou seus cabelos amarrando o lenço para prendê-los. Por fim, fez o laço delicado.
A cena que tomava os olhos de Niffar poderia parecer um pouco engraçada, típica de um livro romântico que para ele seria cômico. O Sol tardio se encontrava com o corpo delicado de Solay, parecia ilumina-la com ternura trazendo átona toda a áurea bondosa e bela que aquela pequena Elfa de Luz carregava.
— Com licença... Solay? — Niffar se aproximou duvidoso, chamando atenção da jovem e o sorriso amigável que Solay lhe lançou, anunciou ainda mais a sua beleza cheia de alegria. — Você poderia nos informar onde fica os quartos que nos informou? — indagou cobrindo-a com seus olhos, aguardando sua resposta.
— Olá, senhor. — cumprimentou a elfa prontamente enquanto parecia esconder o pano que pouco antes usava para limpar a madeira. Seus olhos vagaram silenciosos para os acompanhantes do Elfo Sangrento que agora se mantinham em sua frente, e logo voltou sua atenção a Niffar novamente com um sorriso convidativo em seus lábios. Com certeza nunca ganharia tanto dinheiro como eles lhe pagariam ao fim de sua estadia, era com certeza motivo de animação para a loira. — Lhe acompanharei até os quartos.
Seus dentes pareciam cintilar com a animação exagerada e seu sorriso enorme. Solay abaixou sua cabeça como se o reverencia-se sem saber se o deveria e saiu quase saltitando sobre seus pés doloridos. E sem esperar que o homem a seguisse, a loira desapareceu por uma porta pequena ao lado da dispensa.
Niffar apenas destinou-se a seguir a menina que transparecia felicidade, enquanto espalhava sua alegria em meio ao local vazio. E tudo o que ele conseguiu se perguntar foi; como alguém que vivia em condições tão necessitadas poderia sorrir tanto?
Apesar de grande, a taberna era pobre. Um corredor se estendia dirigindo-se em linha reta, onde havia várias portas de madeira, essas possuíam uma delicada flor enfeitando a fechadura. As superfícies das portas encontravam-se pouco descascadas, mostrando os focos desgastados da madeira velha.
A jovem Elfa de Luz indicou dois quartos aos convidados de Sangue que a seguiam enquanto ela explicava os principais pontos da taberna. Solay deixou ambos assim que chegaram ao local esperado, os estrangeiros permaneceram parados lado a lado em frente às duas portas, concluindo que havia apenas uma cama de casal nos dois cômodos.
Os olhos de Niffar apenas observaram Solay se afastar assim que essa concluiu a tarefa de apresentar a localização, e então após segundos analisando o cômodo ele pronunciou-se.
— Eu ficarei aqui. — o elfo de cabelos platinados concluiu parado em frente à porta do aposento, com a mão sobre a fechadura. — Acho que você e Teryl podem dividir o outro, Marth.
— O quê?! — a morena antes distraída, agora arregalava os olhos sentindo suas bochechas corarem instantaneamente. — Eu me recuso a dividir a cama com... isso... — ela fitou o companheiro de cabelos loiros com um olhar de desprezo e tomou novamente a sua postura rija, enquanto cruzava os braços sobre o peito. Marth revirou os olhos no momento em que Teryl lhe lançou um sorriso brilhante.
Apesar do sorriso, o loiro teve seu olhar elevado e por um curto momento, sua mente se perdeu pelo corredor construído em madeira escura envernizada. Teryl limpou a garganta encostando-se contra a parede, não transparecia e nem faria isso, mas ser tratado apenas como uma “coisa” pela elfa que tanto admirava e planejava construir uma família em alguns séculos realmente era um pouco doloroso.
— Posso ser um “isso” — sorriu piscando para a morena. — Mas sabe que não sou um canalha, Marth. — ele comentou com a face límpida forçada. — Boa noite, meu amigo. — o loiro se despediu de Niffar abrindo a porta, assim se deparando com o quarto que não era grande coisa. — Ao menos a cama parece confortável, querida. — o elfo voltou a pronunciar com um sorriso debochado em seus lábios.
Marth suspirou brevemente, dando-se por vencida.
— Que fique claro que apenas aceitarei isso por falta de escolhas. — a morena concluiu, adentrando ao cômodo. Despediu-se de Niffar com um olhar rápido e fechou a porta em seguida.
O elfo platinado apenas adentrou ao quarto, onde havia apenas uma cama e uma velha cômoda de madeira escura. As cortinas brancas pregavam-se nas janelas, enquanto a baixa luz instalava-se aos poucos. Sem pressa alguma, Niffar se aprontou e com passos lentos caminhou até a cama, deitando sobre o colchão coberto por um fino lençol no tom das cortinas.
Não demorou muito para a lua ampla se instalar sobre o céu variável e volumoso, tomado pelo tom azul escuro. As estrelas brilhavam ainda intensamente naquela noite, acompanhando a cintilante lua cheia. No entanto, Niffar não conseguira pregar os olhos um segundo se quer. As recordações acompanhadas pelas palavras do Teryl insistiam em apontar que sua intuição sobre Solay estava certa. O olhar que ela lhe lançou no bar denunciava ainda mais.
O Elfo Sangrento suspirou pesadamente quando uma ideia passou por sua mente. Ele logo se colocou em pé, caminhando até a porta e retirando-se do pequeno quarto. Sabia perfeitamente o local onde a Elfa de Luz mostrou ser seu quarto e de suas doces palavras dizendo que se os estrangeiros precisassem de qualquer coisa, era só consulta-la.
Antes de ter sua mente arrancada da fantasia para a realidade cansativa, Solay estava agarrada ao parapeito da janela de seu quarto, enquanto observava a lua com seus olhos grandes e sonhadores. Por vezes procurava a maior das estrelas, a que sua mãe dizia ser alguém em especial.
— Ah, dormir. — comentou a loira consigo mesma enquanto fechava seus olhos preguiçosos, era com certeza a melhor parte de seus dias monótonos e ela seria capaz de dormir debruçada sobre a janela, o que provavelmente não aconteceu por culpa da visita inesperada.
Em o que parecia um salto, a elfa se ergueu e seguiu rapidamente até a porta. Seus olhos dispersos embaçados e sonolentos se depararam com a imagem sombria, até o homem se pronunciar.
— Desculpe incomoda-la novamente, Solay. — pediu Niffar educado assim que a pequena figura loura surgiu na porta, e então ousou continuar. — Mas você... — ele engoliu a saliva, prosseguindo com o plano. Queria tirar tudo a limpo, para afastar essa intuição que lhe perseguira desde o instante que a viu e faria isso naquela noite. — Poderia me dar um pouco d’água?
Os ouvidos de Solay encontravam-se dispersos pelo sono, ela demorou segundos até sua mente cansada assimilar o que o Niffar dizia. Chegava a parecer um pouco assustada, mas logo sua face se limpou e novamente o sorriso agradável veio aos seus lábios, sempre com o pensamento insistente preso ao ouro que receberiam no fim da estadia. Os Elfos Sangrentos eram extremamente ricos, ao contrário dos Elfos de Luz.
— Água? Ah, claro! — a menina exclamou um pouco perdida no que acontecia, em maior parte por culpa da sonolência. — Claro, todos precisam de água para sobreviver. Imagino que até mesmo um Elfo Sangrento precise... Bem. — ela ergueu os olhos para o elfo novamente, piscando seus olhos demasiadas vezes, Solay voltou a forçar o sorriso enquanto parecia se esconder por trás da porta. — Me desculpe... Bem, espere um pouco. — pediu com as palavras delicadas e doces enquanto fechava a porta por um breve momento para vestir seu singelo roby de tecido branco e leve. Não poderia estar andando por ai com suas roupas de dormir, já não era adequado daquela forma. — Deveria ter colocado uma jarra de água em seu quarto, peço perdão. — se desculpou prontamente. Na verdade, Solay se questionava se não havia colocado. Já havia se tornado automático. — Com a taberna cheia e tendo que servir a todos sozinha... Bem. — ela mordeu o lábio xingando a si mesma, estava esperando um bônus e talvez aquele mínimo detalhe esquecido estragaria tudo.
— Tudo bem. — respondeu Niffar mediante as desculpas da garota que parecia apreensiva com as palavras, prestando atenção em cada frase que saia de seus próprios lábios, e tudo aquilo o deixava mais desconfiado. Alguém não iria querer agradar tanto o outro se não houvesse algo por trás, algo que descobriria naquela noite. — Eu compreendo. — concluiu com a voz tão calma que até mesmo ele a estranhou.
Niffar observou a Elfa de Luz passar por si, lhe lançando um segundo sorriso tão doce quanto mel escorrendo de uma colher. O elfo apenas seguiu a jovem em meio aos corredores compridos que se encontravam iluminados apenas por tochas, essas presas sobre as paredes.
Ambos passaram em meio às mesas da taberna vazia, chegando à distinta localização. A cozinha era pequena e estreita, os balcões eram de madeira simples e a pequena pia era moldada a pedra. O homem alto observava a loira profundamente, analisando os movimentos da figura feminina com seus profundos olhos negros enquanto Solay caminhava até o armário e retirava de lá uma pequena caneca de ferro.
Aquela seria a chance, se a garota realmente quisesse algo, ela demonstraria com qualquer ato desconhecido.
Já com a caneca em mãos, Solay se esgueirou cuidadosa pelo pouco espaço que tinha na cozinha, ainda menor com a ocupação do Elfo Sangrento. O espaço pequeno era abafado pelas cinzas ainda quentes no fogão de pedra, mas a loira nem percebia o desconforto do calor, o sono pesava seus olhos e ela só conseguia pensar na sua cama confortável.
Pegando a jarra de água, Solay preencheu a caneca até quase transbordá-la, enquanto seus olhos nublados se prendiam sobre a parede construída em madeira escura, lhe trazia uma sensação monótona. A elfa pousou a caneca com cuidado, para não causar barulho e irritar seus ouvidos que praticamente hibernavam. Virando-se para o elfo se esforçou para esconder sua sonolência e sorriu brevemente, um ato gentil.
— Deveria levar a jarra até seu quarto, senhor? — perguntou a menina, um pouco baixo demais, mas era apenas por causa do sono. Solay esticou seus braços entregando a caneca para o ser sombrio, os olhos do elfo voltavam a lhe causar arrepios, principalmente pela menina senti-los a todo momento sobre si.
— Sim. — ele respondeu simplesmente, antes de pegar a caneca de água e bebericar um grande gole do líquido gelado. — Obrigado. — agradeceu momentaneamente, e após aquele ato “gentil” acompanhado por um sorriso da parte da garota, Niffar concluiu que suas suspeitas estavam corretas.
Ele não estava com tanta sede, mas ainda sim, tomou toda a água do recipiente para que a menina não desconfiasse de nada relacionado à suas ações.
O homem ingeriu o último gole, deixando apenas a caneca vazia sobre a pia de pedra, para logo após agradecê-la por uma segunda vez. Seus olhos acompanharam a figura feminina que se dirigiu novamente rumando em direção ao armário e retirando de lá uma jarra branca, e em seguida voltar-se novamente a pia, enchendo-a.
A Elfa de Luz respirou profundamente mergulhando a jarra na grande bacia construída em madeira sobre a pia, onde mantinham a água para não precisar ir todo momento até o poço. Em momentos como aquele, era uma ótima ideia na concepção de Solay.
— Bem, irei levar a jarra. — anunciou a loira com o sorriso agradável voltado aos seus lábios.
Passando pelo Elfo Sangrento, Solay desapareceu pelo salão seguindo para o corredor onde ficavam os quartos.
Niffar apenas a seguiu em meio ao local pouco iluminado. Não demorou muito para ambos se encontrarem em frente à porta de madeira do quarto. A menina parou e o homem abriu a porta e fora apenas então que ele se lembrou do pequeno jarro de água que já tinha naquele quarto, e por um momento havia se esquecido dele.
Niffar engoliu em seco, concluindo que não conseguira pensar em uma desculpa por não ter visto o objeto sobre a mesa que era um tanto visível. Ele não poderia deixar que a garota o visse, se não seu plano iria por água abaixo.
Antes mesmo que Solay pudesse adentrar ao quarto e bater os olhos no jarro, o Elfo Sangrento fora mais rápido adentrando e tomando o recipiente em suas mãos, atirando-o para fora da pequena janela de madeira que se encontrava aberta. E em seguida, Niffar a fitou com um sorriso aliviado, observando a pequena figurar adentrar ao quarto. Não poderia afirmar certeiramente se a loira havia ou não percebido algo, mas ele esperava que não.
Solay apenas desviou seu olhar rapidamente, mais para que não tivesse que corresponder ao sorriso do elfo, por vergonha de estar sozinha em um quarto com alguém que não devia. Além disso, não queria parecer estar observando o que ele fazia e ainda mais estar o julgando um ser estranho.
A loira se aproximou para por o jarro sobre o criado-mudo, mas com Niffar ali não tinha espaço para fazê-lo sem ter que esbarrar nele, então a elfa esperou paciente para poder terminar seu trabalho. Seus olhos se pousaram sobre a janela, inquietos.
— Irei fechar a janela para o senhor. — pronunciou a loira engolindo em seco, ainda com o jarro em mãos.
A única coisa que a mantinha de pé era a porta que — propositalmente — havia mantido aberta, não era tola a ponto de se enfiar em um quarto trancado com um Elfo Sangrento. Os boatos sobre aquela raça obscura não eram nada encorajadores. Mais uma vez a menina repetia a si mesma, em pensamentos, que apenas era prestativa para o Elfo Sangrento por conta da bela gorjeta que receberia ao fim da estadia.
— Tudo bem. — ele respondeu incerto, sem retirar os olhos da garota. Niffar se afastou percebendo o espaço que Solay pedia silenciosamente. Constatou que por um momento, a loira parecia evitá-lo e aquilo fez a dúvida reaparecer novamente em seu interior. Ela parecia temê-lo e ao mesmo tempo, parecia reunir um outro interesse. Mesmo com toda a inteligência e anos de experiência, era impossível desvenda-la.
Por alguns segundos, seus olhos negros desviaram em direção à porta que se encontrava aberta e em seguida, o ruído baixo da madeira da janela se fechando chamou novamente sua atenção que agora cobria a garota. Mesmo evitando ao máximo demonstrar, a preocupação de Niffar gritava em sua mente observando a Elfa de Luz tão próxima da janela. Sabia que se Solay encontrasse o jarro atirado ao lado externo do cômodo, sua mentira desceria por água abaixo.
Niffar sentia-se como se estivesse agindo como uma criança, e aquele comportamento era inaceitável para um príncipe de origem rica como ele. Mesmo relutante, o Elfo Sangrento deixou suas dúvidas e incertezas de lado, ignorando o ponto que lhe atormentava. Mas ainda sim, não ousou dizer nada, apenas aguardou pela próxima ação da Elfa de Luz que por algum motivo, lhe chamava tanto a atenção.
Solay concluiu de fechar a janela colocando a pequena tábua, para que ninguém a abrisse por fora ou até mesmo o vento. Por fim, pousou a jarra de madeira sobre o criado-mudo e ao se abaixar para fazê-lo sentiu o arrepio caminhar por suas costas. Por um curto momento parecia que seu corpo não funcionava mais, estava travada em frente ao inimigo e com certeza era causado pelo medo que sentia. Sua vida, por mais conturbada e difícil que poderia ser, lhe era importante.
— Peço perdão por ter esquecido o jarro, senhor. — Solay ergueu-se rapidamente e ao se virar para o Elfo Sangrento, abaixou sua cabeça desculpando-se com o hospede. — Espero que não entenda mal, não é algo que costuma acontecer. Apenas... Estive com a mente cheia hoje, a taberna estava lotada. — a loira não parecia ser capaz de olhá-lo. Poderia ser um erro grave frente ao elfo obscuro, não pareciam ser os mais agradáveis. — De qualquer forma, eu cometi o erro então considere que a culpa foi toda minha.
Solay respirou fundo. O cliente sempre estaria certo, não importava o quão injusto fosse, teria que aceitar suas palavras grosseiras.
Niffar franziu as sobrancelhas após as palavras dela que soavam um tanto desajeitadas. Claramente, ela parecia querer agradá-lo. Ele não suportava tantas desculpas, mas não seria rude, isso era algo que não se encaixava com seu perfil.
— Eu entendo. — o elfo respondeu curtamente chamando a atenção de Solay para si, após ela ajeitar o jarro sobre a mesa. Apesar da apreensão, sua voz ainda se mantinha calma. — Não é nada importante, mas de qualquer forma, tome mais cuidado da próxima vez. — concluiu simplesmente, cortando a ligação do seu olhar que insistia em dirigir-se a frágil figura próxima.
Com um pequeno sorriso em seus lábios, Solay finalmente se permitiu observar o Elfo Sangrento e após abaixar-se frente a ele mais uma vez movimentou seus pés suavemente em direção a porta. Evitava ao máximo qualquer contato com ele, o máximo que se permitia era olhá-lo.
— Espero que tenham uma boa estadia. Qualquer coisa basta me chamar. — disse ela parada na porta prestes a fechá-la. — Costumo cuidar de todos os problemas aqui, senhor. — pronunciou suspirando baixo, logo o bocejo voltava junto com o alivio de estar enfim voltando ao seu quarto e se afastando dele. — Tenha uma boa noite.
Sem poder esperar suas palavras, Solay fechou a porta e apressou seus passos pelo corredor, seguindo assim para seu quarto.
Niffar apenas observou a Elfa de Luz se afastar, com uma visível pressa ao querer sair dali. Ele apenas suspirou, voltando-se em seguida para a pequena cama de casal que ocupava boa parte do pequeno quarto, enquanto os passos apressados ecoaram-se em meio aos corredores e em segundos, tudo ficou em silêncio, tomado apenas pela escuridão acompanhada por distantes ruídos noturnos, esses causados pelo canto da coruja e o entoar do grilo.
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