- Jaehwan – falei com toda a segurança que tinha no coração – Você quer namorar comigo?
Por um longo tempo – muito mais longo do que eu esperava – Jaehwan ficou paralisado olhando para mim e para a flor estendida em sua frente, como se não acreditasse no que estava vendo. Ele estava tão surpreso que sua mente estava em branco.
Não era como se eu mesmo não estivesse surpreso também, a cada segundo entendia menos por que tinha sido tão impulsivo, por que tinha feito aquilo... E então a expressão dele foi ficando mais fechada a cada segundo e eu já sabia o que ele ia me dizer.
- Não posso fazer isso... Desculpe.
Antes que eu pudesse falar qualquer coisa, ele bateu a porta do quarto e fugiu pelo corredor. Eu ainda continuei ali, ajoelhado no chão por um bom tempo, tentando entender o que tinha acontecido e por que eu tinha feito o que fiz.
Eu tinha sido rejeitado, mas é claro que isso ia acontecer. Por que eu cheguei a cogitar que ele iria dizer sim? Eu tinha ficado maluco? Era óbvio que ele nunca ia querer namorar alguém como eu.
Fui levantando lentamente e recobrando minha consciência. Abri o lixo que ficava num canto do quarto e despejei a flor lá dentro, sentindo um horrível nó na garganta. Eu nunca mais teria coragem de encarar ele de novo, não depois do que eu tinha feito... Meu deus, como pude ser tão idiota?
Eu devia mesmo, mesmo, começar a pensar em voltar meu sistema para o padrão de fábrica e esquecer que algum dia na minha vida eu cogitei ser diferente do que eu realmente sou. Que um dia eu ousei ter esses sentimentos que não me pertencem. É o melhor que posso fazer...
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Naquela madrugada choveu, e foi uma chuva torrencial. Aquela era a primeira vez que eu presenciava um temporal desde que havia chegado naquela casa e, infelizmente, a sensação continuava não sendo nada boa. Achei que teria uma boa noite de sono depois de assistir ao filme com o Jinyoung, mas não foi bem assim...
Eu sempre morri de medo de tempestades, já que elas são muito violentas nessa região. Quando vivia no internato, costumava correr para a sala comum e ligar a televisão, para tentar me distrair. Diversas vezes corri sozinho pelos corredores daquele enorme e escuro prédio, apenas em busca de um pouco de conforto. A casa do Guanlin era definitivamente melhor e mais calorosa do que aquele local, mas a chuva ainda batia com força nas janelas e os raios caíam próximos demais para que eu conseguisse voltar a dormir.
Saí do quarto pé por pé – já que meus colegas de quarto eram do tipo que não acordavam nem com o mundo caindo do lado de fora – e carreguei uma lanterna comigo, enquanto caminhava pelo corredor. Tudo o que eu precisava fazer era chegar ao andar debaixo e ligar a televisão, já que assim eu conseguiria me acalmar. Contudo, o corredor estava escuro e o barulho dos fortes raios do lado de fora não ajudava em nada.
Foi então que minha lanterna iluminou uma coisa que pareciam pés e eu dei um berro e joguei ela para cima antes mesmo de ver quem era. Quem estava do outro lado também se assustou com o meu grito e levou um bom tempo para que eu conseguisse me acalmar.
- Está tudo bem?
Ao ouvir o som familiar daquela voz, me agachei depressa e juntei a lanterna, para iluminar o ser em minha frente. Foi quando vi quem eu jamais esperava encontrar: Meu doutor.
- Doutor – falei e um sorriso instantaneamente se formou no meu rosto – Foi Deus que mandou um anjo para me fazer companhia?
Vi que ele desviou os olhos dos meus e se balançou, como sempre fazia quando estava envergonhado – e eu achava aquilo um charme.
- Por que você está acordado? – perguntei curioso, já que eu sabia que os robôs recarregavam a noite inteira.
- Acordei com o som de um trovão alto – ele explicou – Meus ouvidos são sensíveis.
Nem me fale, doutor... Mais sensíveis que os meus ouvidos não existe...
- E então ouvi um barulho no corredor e vim verificar... – ele continuou explicando.
- Desculpa te assustar, eu já estou indo – falei e dei alguns passos para a frente – Pode voltar para sua recarga.
Ok, não era como se eu quisesse que ele me deixasse sozinho, mas sabia que precisa recarregar, senão amanhã não estaria ativo e meu plano de chama-lo para um novo encontro iria ralo abaixo. Então era melhor que ele voltasse a dormir e eu iria assistir um pouco de televisão para me acalmar.
Deixei ele para trás e desci as escadas escuras até a sala. Quando cheguei lá, sentei no sofá e me agarrei em uma almofada, ligando a televisão. Passei de um canal para o outro sem saber ao certo o que escolher, até que cai num de desenhos animados. Parecia bom, né? Assistir algo que não fosse assustador.
Me encolhi e apertei a almofada contra o corpo, enquanto ainda ouvia o barulho do vento forte do lado de fora. Tentei prestar atenção no desenho animado para que o medo passasse logo, mas tudo parecia difícil hoje. Foi então que ouvi o barulho de passos na escada e peguei a lanterna rapidamente, nervoso. Quase caí para trás quando a luz iluminou o Jinyoung.
- Ei... – ele disse quando percebeu que eu o estava olhando com a lanterna – O que houve? Estava esperando você voltar para o seu quarto...
Esperando? Ele disse esperando?
Ele estava ESPERANDO eu voltar pro meu quarto? Ai meu jesusinho!
- Ah, desculpa... – falei tentando conter em vão a felicidade que tomou conta de mim – Eu tenho um pouco de medo de temporal, então decidi assistir televisão...
- Medo? – ele perguntou surpreso.
Sim, eu sabia que era vergonhoso que alguém tão velho quanto eu tivesse medo de chuva, mas não podia evitar. Jinyoung veio caminhando até mim e subitamente eu não queria mais que ele recarregasse, queria que ficasse ali comigo.
- Sim... Eu sou um bobo, né? – falei sem jeito.
- Todo mundo tem medo de alguma coisa – ele respondeu e olhou para a televisão, com um sorrisinho no rosto – Gosta desse desenho?
- Nunca assisti, honestamente – dei uma risadinha.
- É divertido, é sobre um robô e um garoto que vivem em Marte – ele explicou.
- Gosta de desenhos, doutor? – perguntei surpreso.
Ele deu um sorrisinho sem graça e desviou os olhos dos meus, mas estranhamente ele não parecia tão fechado hoje como das outras vezes, como se algo estivesse lentamente mudando dentro dele.
Será que eu podia ter esperança?
- Você não precisa recarregar? – perguntei preocupado.
Jinyoung se aconchegou no sofá e balançou a cabeça negativamente.
- Posso ficar até o final desse episódio – disse – Ou talvez de mais um.
Ele estava tentando dizer nas entrelinhas que ficaria ali até o meu medo ir embora? Que me faria companhia para que eu não tivesse que enfrentar aquilo sozinho?
Pela primeira vez na minha vida, alguém estava se oferecendo para enfrentar meus medos comigo e confesso que meu coração ficou ainda mais abalado.
Assim fica difícil eu não morrer de amores por você, né doutor?
Ele me fez companhia por mais de uma hora, até que a chuva começasse a bater fraca na janela e o vento fosse embora. Apesar de não termos falado muito, já que ele ficou a maior parte do tempo quieto olhando para a televisão, era tão bom tê-lo ao meu lado que nada mais me importava. Por ele estar comigo, me senti protegido pelo resto da noite.
Assim como um legítimo príncipe de contos de fadas, Jinyoung me levou até o meu quarto e esperou que eu entrasse para então ir para o seu, como se estivesse querendo se certificar de que eu ficaria bem. Mas, tinha como ficar bem quando meu coração batia que nem um louco no meu peito???
_
Como sempre, eu estava diante do meu notebook naquela manhã, lendo alguns artigos novos e bebendo uma grande xícara de café. Eu nem sei como foi que aconteceu, só sei que em um segundo eu estava sozinho no meu laboratório e, no segundo seguinte, Jihoon havia entrado e atirado o broche que dei a ele em cima da mesa.
- Eu te odeio! – ele gritou e então deu as costas, saindo e batendo a porta.
Fiquei paralisado olhando para o broche e tentando entender o que diabos tinha acontecido e o que eu tinha perdido, já que a última vez que o vi na noite passada nós estávamos bem um com o outro...
Foi então que ele voltou para dentro da sala e pegou o broche de cima da mesa. Ele já estava quase saindo de novo quando eu o impedi, já que não fazia ideia do que estava acontecendo ai.
- Parado – disse e ele congelou no lugar – Que diabos é isso?
- Nada – ele resmungou enquanto colocava o broche de volta no peito.
- Quer dizer que você só grita que odeia as pessoas por causa de nada?
- Sim, eu sou maluco – ele deu de ombros.
Suspirei e percebi que ele não ia me contar seja lá qual fosse a maluquice que estava passando por sua cabeça.
- Senta ai então, maluco – falei – Preciso dar uma olhada no seu sistema, pra ver se o seu coração artificial novo está funcionando bem.
Assim que falei aquilo, Jihoon arregalou os olhos e deu dois passos para trás, como se sei lá, eu tivesse dito que ia desmontar ele. O que estava acontecendo com esse garoto hoje???
- Não – ele disse sério – Você não vai olhar o meu sistema.
- Por quê? – perguntei confuso – É só uma verificação de rotina, Jihoon. Leva 1 minuto.
- Não! – ele gritou e saiu correndo para fora do laboratório.
Mas será possível?
Corri atrás dele, tentando entender o que diabos tinha de errado com ele hoje e tentei encurralá-lo dentro de seu quarto. Mas, para meu choque total, assim que pisei dentro da peça, ele estava apontando uma arma para mim, mais precisamente a arma de policial do Woojin.
- Não se aproxime – ele falou com segurança.
Levantei as mãos para cima e arregalei os olhos, confuso. Agora ele ia até mesmo atirar em mim por causa de uma simples checagem do sistema? Será mesmo que tinha alguma peça dando defeito e ele estava agindo tão esquisito por causa disso?
- Calma – falei pausadamente – Jihoon, eu não quero te machucar. Eu só preciso fazer a verificação costumeira do seu sistema, para ver como a peça nova está se comportando... É só isso.
Ele balançou a cabeça negativamente e eu percebi que não iria conseguir fazer aquilo hoje de jeito nenhum.
- Você não vai mexer no meu sistema – ele resmungou.
- Por quê? Tem algo que eu não posso ver?
Assim que perguntei aquilo, ele pareceu bastante desconfortável e desviou os olhos dos meus. Foi então que eu percebi... Algo deve ter mudado dentro dele. Jihoon provavelmente estava sentindo algo diferente e não queria que soubesse, o que era perfeitamente compreensível, já que os seres humanos também odiavam revelar aquele tipo de coisa para os outros. Além do que, Jihoon e eu nem podíamos nos considerar amigos, nós tínhamos uma relação meio de dono e empregado, então não fazia mesmo sentido que ele quisesse que eu visse algo tão particular...
Naquele momento, eu só lembrava de toda aquela história de robôs com alma e tudo o que conseguia pensar era que Jihoon estava sendo extremamente humano em minha frente.
- Você pode baixar sua arma? – pedi – Eu não vou olhar o seu sistema, eu prometo.
Ele balançou a cabeça negativamente e manteve a arma apontada na minha direção.
- Jihoon... – disse e dei alguns passos na direção dele – Você pode confiar em mim.
- Não – ele resmungou, convicto de que eu estava mentindo.
Jihoon tinha sido tão machucado, tão maltratado no passado que nem acreditava na verdade das minhas palavras naquele momento. Tudo o que eu mais queria era que ele pudesse confiar em mim.
- Eu te prometo – insisti – Prometo que nunca mais vou insistir em olhar o seu sistema se você não permitir. Você precisa acreditar em mim. Eu não sou como os outros.
A expressão dele amoleceu um pouco ao ouvir aquelas palavras, mas sua mão continuava agarrada à arma apontada em minha direção.
- Você precisa confiar em mim, Jihoon... Eu nunca vou te machucar – falei com sinceridade.
Parecia que pouco a pouco ele ia acreditando em mim, percebendo que minhas palavras eram verdadeiras. Eu não sabia por que eu queria tanto que ele confiasse em mim, mas não queria que ele sofresse mais, que duvidasse mais. Queria que ele pudesse deixar todas as suas mágoas do passado no passado e começar de novo, ao meu lado.
Ele finalmente baixou a mão depois de muita deliberação e jogou a arma em cima da cama. Dei um sorrisinho ao perceber que ele tinha confiado nas minhas palavras e então me aproximei e baguncei seu cabelo com a mão, como gostava de fazer. Ele ficou um pouco sem jeito e arrumou o cabelo rapidamente, o que era um tanto adorável. Não dava para não ficar admirando as coisas que ele fazia.
- Você vai parar de me odiar agora? – perguntei e dei um sorrisinho.
Jihoon assentiu com a cabeça, parecendo envergonhado.
- Bom, então vá trabalhar – dei um tapinha no traseiro dele e sai andando, voltando para o meu laboratório.
Enquanto caminhava pelo corredor, não conseguia parar de pensar... O que será que tinha mudado dentro dele que era tão sério a ponto de ameaçar me matar se eu insistisse em ver?
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Ann tinha saído da enfermaria naquela manhã, já que Jinyoung confirmou que ela já estava sadia o suficiente para dar uma volta pela casa. Ela estava sentada na escadaria dos fundos da casa, que dava para o jardim, e segurava o Daniel cachorro nas mãos quando me sentei ao lado dela, tomando uma xícara de café. No jardim, Ong, Sun e Minhyun trabalhavam com as flores.
- É bonito, não é? – perguntei a ela sobre o jardim, tentando puxar conversa, já que sabia que o Ong ia ficar feliz se eu me esforçasse.
Ela virou o rosto e me encarou, séria.
- Por que eles estão trabalhando com flores ao invés de matar pessoas? – disse parecendo genuinamente confusa.
Suspirei e bebi um gole do café. Bom, não era como se eu não tivesse o mesmo pensamento há pouco tempo...
- Você acha que todas as pessoas são boas, Ann? – respondi a ela com outra pergunta – Que todo mundo tem um bom coração?
Ela pareceu não saber me responder, mas acho que sabia a resposta.
- Sabe o garoto que levou um tiro? – perguntei me referindo ao Jaehwan e ela assentiu com a cabeça – Meu pai atirou nele, meu próprio pai, um ser humano.
Ela suspirou ao ouvir aquilo e acho que entendeu onde eu queria chegar, já que era esperta demais para sua idade.
- As pessoas podem ser boas e podem ser ruins, por que o mesmo não se aplicaria aos robôs? – perguntei – Antigamente eu também achava que os robôs eram malvados, mas não tem como você olhar para o Ong e achar que ele é ruim... Ele te salvou com as próprias mãos e ficou desesperado para que você não morresse. Existem poucos seres humanos que são bons como ele.
A garotinha desviou os olhos de mim e fixou-os no Ong, que estava sentado no meio do jardim com uma porção de flores ao seu redor, fazendo alguma coisa que eu estava curioso para saber o que era.
- Ele gosta de você e eu nem mesmo sei por que – continuei – Eu só te peço para que não machuque ele. Ong é importante demais para mim e eu não vou permitir que você faça mal a ele.
Embora ela não estivesse falando nada, sabia que estava ouvindo cada uma das minhas palavras e considerando tudo o que eu tinha dito. E, aquela ameaça era verdade, se ela fizesse mal a ele eu não iria perdoá-la.
Foi então que Ong correu até nós com um sorriso no rosto e se ajoelhou em frente à garotinha, segurando uma coisa florida em mãos.
- Fiz uma coroa de flores para você – ele falou e mostrou a ela – Posso colocar no seu cabelo?
Ann ficou olhando para ele por alguns segundos e então olhou para mim, como se esperasse uma aprovação. Assenti com a cabeça e então ela disse que ele podia colocar.
Ela estava fazendo aquilo, não magoando ele como eu tinha pedido. Talvez houvesse uma chance para nos entendermos.
Ong deu um enorme sorriso quando viu a coroa de flores no cabelo dele e ficou todo orgulhoso do resultado final. Não consegui conter o sorriso que se formou em meus lábios ao ver o quão feliz ele estava com um gesto tão simples. Ele me ensinava a ver a vida de um jeito diferente todos os dias.
- Ficou lindo – ele disse sorrindo.
- Cadê o meu? – perguntei e fiz biquinho, para brincar com ele.
- Você quer uma também? Uma coroa de princesa? – ele riu.
- Quero – respondi com sinceridade.
- Tá bom, vou fazer uma para você também, princesa Niel – ele brincou e riu.
Naquele momento, até mesmo a Ann havia dado um pequeno sorriso, como se tivesse achado engraçada a nossa brincadeira. Ong ficou maravilhado ao ver o sorriso dela e então sorriu ainda mais, como se estivesse explodindo de felicidade. Eu me sentia contagiado pela felicidade dele e tudo o que eu mais queria era que ele pudesse sorrir assim para sempre.
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As coisas entre Minhyun e eu ficaram bem difíceis depois do que aconteceu na noite passada. Eu ainda estava me perguntando o que tinha acontecido e por que ele tinha me perguntado aquilo tão subitamente. Tinha me debatido de um lado para o outro da cama a noite inteira e simplesmente não chegava a uma conclusão... Ele queria mesmo ser meu namorado?
Mas, e quanto a mim? Eu queria um namorado? Logo eu que nunca pensei nesse tipo de coisa?
A verdade é que eu não sabia o que pensar ou o que sentir e nunca estive tão confuso em toda a minha vida. Era fato que eu gostava dele, não podia negar que ele balançava o meu coração. Mas, meus pensamentos nunca tinham ido além daquilo.
Nós nos encontramos no corredor pela manhã e ele passou reto por mim, sem nem olhar nos meus olhos. Nós voltamos a nos encontrar umas horas mais tarde e ele voltou a agir da mesma forma. Eu sabia que estava bravo comigo, magoado. Eu também estava magoado com toda aquela situação.
Pra variar, Jisung desapareceu e me deixou sozinho e sem comida no andar de cima. Eu não aguentava mais depender dos outros e queria que aquele maldito ferimento curasse logo. Me apoiei na beira da escada e chamei por ele, mas claro que não tive uma resposta... Ultimamente ele só ficava com o Sun pra lá e pra cá enquanto o Daniel estava sempre com o Ong. E eu, claro, sozinho.
Sozinho por que você deu um fora em quem te queria, né Jaehwan? Bem feito.
Agora desce esses degraus tudo ai sozinho.
Resmunguei para a minha própria consciência e me escorei no corrimão da escada, para começar a descer. Cada passo era doloroso, mas a fome na barriga também doía então eu tinha que conseguir. Fui me arrastando devagarinho e amaldiçoando o Guanlin por ter colocado uma escada tão grande naquela casa, quando senti meus pés soltarem o chão e meu corpo ser levantado. No segundo seguinte, me vi nos braços de quem eu menos esperava ver.
Minhyun não disse uma única palavra e nem mesmo olhou para mim, mas me carregou até o último degrau e me colocou de pé lá. Eu também não sabia o que dizer a ele, sentindo o coração doer no peito e as palavras me faltarem na garganta. Havia tanto que eu queria falar, mas não conseguia organizar meus pensamentos...
Ele me deu as costas e começou a subir novamente a escada e eu me arrastei até a cozinha. Pra variar não tinha ninguém ao redor, então teria que fazer tudo sozinho. Foi quando Minhyun voltou para perto de mim e, mais uma vez, me pegou no colo e me levou até a cozinha, me sentando no balcão como no outro dia. Parecia que ele estava tendo uma luta interna se devia ou não me ajudar, mas algo dentro de mim estava feliz por poder contar com ele, mesmo que eu não merecesse.
- O que você quer comer? – ele perguntou sem me olhar nos olhos.
- Qualquer coisa... – suspirei ao ouvir a voz dele.
Minhyun virou de costas para mim e pegou algumas coisas na geladeira e começou a colocar em uma panela no fogo. Por vários minutos, nós permanecemos em um estranho silêncio que eu não sabia como quebrar. Ele apenas mexia a comida no fogo e nunca foi tão difícil ficar ao lado dele como hoje.
- Me desculpa por ter te magoado... – deixei escapar, me sentindo miserável.
Ele continuou em silêncio por mais um tempo e eu até mesmo achei que não ia me responder, até que por fim disse:
- Não estou magoado – falou com firmeza – Aquilo de ontem foi um erro, não vai se repetir.
Suspirei... Droga, ele estava muito magoado comigo e eu nem sabia como prosseguir dali, o que dizer ou fazer, aquele gelo estava me matando, por mais que eu o merecesse.
- Você não pode gritar comigo, brigar? Eu sei lidar com isso – falei frustrado – Mas, não sei lidar com a sua indiferença... Eu sei que mereço, mas machuca.
Ele desligou o fogo e virou em minha direção. Por alguns segundos, nós apenas olhamos um para o outro e eu quase me parti ao meio ali na frente dele, tão machucado e dolorido estava. Sem me dizer uma única palavra, ele pegou um prato e serviu um pouco da comida que tinha esquentado e colocou em cima da mesa. Depois, ainda sem dizer nada, ajudou a me colocar sentado diante do prato e eu já nem tinha mais vontade de comer.
Eu estava tão, tão frustrado... Ele não falava comigo, nem sequer me olhava. Parecia que estava fazendo tudo roboticamente, como se fosse responsável por mim por eu ter levado um tiro por sua culpa – o que era mentira, mas ele acreditava ser verdade. Eu estava me sentindo muito, muito miserável com toda aquela situação.
Foi então que o vi pegar outro prato e outro copo, junto com um conjunto de talheres, e sentar ao meu lado. A princípio, não entendi o que estava acontecendo, achei que ele ia simplesmente me deixar sozinho na cozinha, mas não. O que diabos???
- O que você está fazendo? – perguntei confuso.
- Vou comer com você – ele respondeu.
- Mas... Você não come... – continuei sem entender.
Minhyun deu de ombros e pegou o garfo na mão.
- Podemos fingir que eu como – ele disse, como se aquilo fosse algo normal – Vá em frente, coma sua comida antes que esfrie.
Fiquei olhando para ele completamente pasmo. Ele estava fazendo aquilo por que não queria que eu me sentisse sozinho? Meu deus, eu realmente não o merecia.
Não consegui me aguentar mais e o puxei para um abraço apertado, que o surpreendeu. Demorou um pouco para que ele também colocasse suas mãos ao meu redor, mas quando o fez, me senti imensamente confortado.
- Eu sou uma grande bagunça, me desculpa – disse com sinceridade – Desculpa por ter te dito não.
- Não tem problema dizer não – ele respondeu e parecia sincero – Eu só...
Percebi que ele estava hesitando em dizer algo e então me afastei para olhá-lo nos olhos. Naquele momento, ele parecia bastante envergonhado e fiquei me perguntando o que iria me falar.
- Posso te pedir uma coisa? – ele perguntou e eu assenti com a cabeça – Não namora o Woojin não, tá?
- O QUÊ??? – gritei.
De onde tinha saído aquilo? De tudo o que eu esperava ouvir, aquilo era a última coisa.
- Eu sei que ele tá usando o uniforme bonito de policial e tudo o mais, mas veja... Ele é tão sujo, o quarto dele é uma lixeira – ele falou aquilo bem sério – Eu sou limpo, eu cozinho e eu até mesmo faço jardinagem agora.
Ele estava narrando suas qualidades e se comparando com o Woojin e eu não acreditava que ele tinha pensado que podia ter algo entre Woojin e eu... Como ele chegou a tal conclusão???
- Eu não tenho o menor interesse no Woojin, nós somos brothers – expliquei – Apenas isso. Nunca vai rolar nada.
Fiz sinal de negativo com as mãos e esperei que ele entendesse que aquilo era a coisa mais absurda do mundo.
- Tá certo então – ele não conseguiu conter um sorrisinho – Agora coma a sua comida antes que esfrie.
Assenti com a cabeça e dei uma garfada, apenas para me certificar de que, como sempre, a comida dele estava maravilhosa.
- De nada – ele deu um sorrisinho orgulhoso e eu resmunguei.
Maldito leitor de pensamentos.
Minhyun pegou o garfo e fingiu dar uma garfada em sua comida imaginária e começou a fazer elogios absurdos e desproporcionais sobre a própria comida – que ele nem tinha como provar – e eu fiquei pensando em como que ele podia ter um ego tão grande. E então, subitamente, o clima entre nós havia melhorado e eu já não me sentia mais tão ruim quanto antes.
Eu não sabia se eu queria namorar o Minhyun, mas, com certeza, sabia que amava passar o meu tempo ao lado dele.
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