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História Herdeiros da Guerra - Capítulo XII - Redenção


Escrita por: Joyblack

Capítulo 12 - Capítulo XII - Redenção


Capítulo XII - Redenção

Lor'themar apoiou as mãos na varanda e observou a mudança da guarda no início daquela manhã. O clima estava agradável e uma leve brisa agitava seus cabelos prateados. Se não fosse um patrulheiro experiente e líder já há algum tempo, diria que era um dia de perfeita paz e harmonia.

Só que paz era algo que seu povo não conhecia há anos.

Ouviu passos às suas costas e se voltou lentamente. Lady Liadrin chegara, vestida com sua armadura. O tabardo dos Cavaleiros Sangrentos destacava-se sobre a indumentária. A elfa parecia pouco a vontade.

- Então, você leu. - disse o patrulheiro.

- Sim. - respondeu com ar ainda incrédulo - E custo a acreditar.

O lorde regente balançou a cabeça, concordando.

- Não é algo que poderíamos esperar do rei Anasterian. - Lor'themar se aproximou dela - Mas é verdade. O diário prova isso. E temos um documento com o selo real que corrobora o relato. - e dando uma pausa, encarou a paladina e concluiu - A Linhagem Andassol não desapareceu.

Lady Liadrin franziu a testa. Sabia exatamente qual o motivo de ter sido chamada e da expressão séria de Lor'themar.

- O que você quer de mim, lorde regente? - perguntou na defensiva.

- Você renegou a Casa Andassol em Shattrath. Não a culpo. - acrescentou rapidamente - Era necessário. Mas agora é diferente. A Nascente do Sol voltou. Temos herdeiras para o trono. Herdeiras que não se macularam com os pecados de Kael'thas.

- E qual a sua posição em relação a isso? - devolveu.

- É direito delas assumirem seu lugar como princesas. Quando o rei reconheceu Dhomm como filho legítimo e herdeiro, ele deixou de ser um bastardo e passou a ser um príncipe. - seu olhar endureceu - Minha obrigação é garantir que o desejo do rei seja cumprido.

- E a minha é para com Luaprata. - retrucou Lady Liadrin - Preciso manter os Cavaleiros Sangrentos cumprindo seu papel. Nós cuidamos da Nascente do Sol e assim continuaremos fazendo. Não precisamos jurar fidelidade a ninguém para isso.

Lor'themar franziu as sobrancelhas.

- Uma delas estará no trono Liadrin. - ele omitiu o título dela de propósito - Pode ser que a futura rainha não seja tão condescendente quanto eu.

Lady Liadrin deu de ombros.

- Se a futura rainha não for inteligente o suficiente para entender a posição da minha Ordem, não merecerá o trono.

Apesar de irritado com a fala da matriarca dos Cavaleiros de Sangue, Lor'themar já esperava aquele posicionamento. Como Rommath, Liadrin foi enganada e usada por Kael'thas e renegou sua fidelidade a Casa Andassol em Shattrath. Com o retorno da Nascente do Sol, ela e seus cavaleiros voltaram à Luaprata e juraram manter a fonte protegida. Até aquele momento, apesar de se negar a se envolver na política dos sin'dorei, Liadrin tinha sido um apoio indispensável. Como conseguiria que ela não visse o reflexo de Kael'thas nas princesas?

- Lady Liadrin... - começou, mas a paladina ergueu a mão, pedindo a palavra. - Fale. - permitiu o lorde regente.

- Eu não vou me precipitar novamente lorde regente. Eu não vou seguir cegamente quem quer que seja apenas por possuir sangue real. Se as princesas fizerem por merecer a minha lealdade e a dos meus cavaleiros, elas terão. Essa é minha palavra final.

Sabia que não havia nada que pudesse dizer que fizesse Lady Liadrin mudar de ideia. Na verdade, a posição dela tinha sido bem mais razoável do que ele supunha.

- Posso me retirar? - perguntou a paladina.

Lor'themar afirmou com a cabeça, a elfa fez uma reverência e se retirou. O lorde regente suspirou e voltou-se para a varanda. Os guardas já tinham sido trocados e as novas sentinelas permaneciam paradas, a postos, com semblantes sérios e compenetrados. O patrulheiro invejou a serenidade deles.

- Poderia ter sido pior.

Halduron observara toda a cena do canto da varanda. Liadrin nem ao menos percebera sua presença, mas Lor'themar não se incomodara em partilhar a cena. Agora, o chefe dos patrulheiros se aproximara e ficou ao lado do lorde regente na varanda.

- Eu não esperava que ela aceitasse as princesas facilmente. - disse Lor'themar - Mas pelo menos não as rejeitou totalmente.

- Rommath aceitou melhor que Liadrin. - comentou Halduron.

Lor'themar o encarou.

- Você sabe por que Rommath não fez objeções.

- Sim sei. E temo por ele.

- Não tema. - o lorde regente tamborilou os dedos pela varanda - Ele já foi rejeitado uma vez e se tentar novamente, será rejeitado novamente.

- Como você pode ter tanta certeza? - questionou Halduron.

- Se você tivesse visto o que eu vi Halduron, saberia que chegar ao coração de Luxuriah é uma tarefa quase impossível. - Lor'themar olhou para o céu azul sobre Luaprata - É necessário muito mais que simples sentimentos da parte de Rommath. É necessário lutar contra um ódio e uma dor enraizada na alma daquela menina...

Halduron concordou com a cabeça, e perguntou:

- Você acha que isso influenciará na forma dela governar, caso ela venha ser rainha?

Lor'themar riu pesarosamente.

- E você ainda tem alguma dúvida?

O chefe dos patrulheiros não respondeu.

- Quero que você ponha sentinelas próximasa casa delas. – ordenou o lorde regente recuperando a compostura – Não quero correr nenhum risco, mesmo que poucos saibam da existência das princesas. – e dando as costas para a varanda, voltou para dentro da Torre Solfúria enquanto afirmava categoricamente – Não cometerei mais nenhum erro em relação à linhagem Andassol.

 

 

****************

- Senti falta disso aqui. - confessou Kassyeh.

A imensa casa se erguia imponente em uma das ruas principais de Luaprata. Roseiras e trepadeiras enfeitavam a frente da mansão, se emaranhando nas colunas de mármore que se postavam na entrada. Kassyeh respirou fundo e o cheiro das flores que plantara no jardim encheu o ar à sua volta. Não lembrava que sentia tanta falta daquilo até aspirar aquele perfume de novo.

- Sério que você sente falta? - ironizou Luxuriah ao lado da irmã - Pensei que você preferisse o deserto...

Kassyeh ignorou a ironia da irmã e se adiantou em direção a casa. Suas mascotes imediatamente começaram a atacar uma indefesa roseira, pulando em seu caule e tentando morder suas folhas. A maga abriu as portas da mansão, entrou e franziu a testa.

- Vocês não deixaram ninguém responsável por limpar? - reclamou vendo o estado da casa.

- Pra que? - Luxuriah também entrou e não parecia preocupada - Em poucos minutos você dá um jeito nisso.

Era verdade. Com um simples movimento, Kassyeh pôs as vassouras que estavam jogadas em um canto para trabalharem. Sozinhas, elas limpavam enquanto a maga continuando os suaves movimentos das mãos abria janelas e remexia em tudo. Em poucos minutos, a casa estava limpa e arejada.

- Nossa!Isso é muito legal! - exclamou Saba atrás de uma das pernas de Tewdric.

- Você ainda não viu nada! - avisou Karen atrás da outra perna - Espera só pra ver o que ela faz na cozinha!!

- Onde ponho as malas? - perguntou Tewdric que estava com bagagem nos braços, nas costas, na cabeça, enfim em todos os lugares onde Luxuriah conseguiu equilibrar algo.

- Tem certeza que não quer ajuda? - perguntou Huaru, que vinha carregando apenas uma mochila - Você parece meio sobrecarregado...

- Nãm, to bem! - disse o orc entrando na casa com a bagagem e duas meninas penduradas em sua perna - Isso aqui não é nada!

Saba e Karen desataram a rir e se agarraram ainda mais nas pernas do guerreiro. As mascotes de Kassyeh desistiram de comer a roseira e agora também sependuraram na roupa de Tewdric. Huaru se perguntou como ele ainda conseguia dar um passo depois do outro com aquele peso todo.

- Será que ele realmente não precisa de ajuda? - perguntou o tauren preocupado a Luxuriah, que agora dava atenção a Ashrial, que não parecia estar gostando nada daquilo.

- Não, deixa ele. - e olhando para Ash questionou - Está tudo bem mesmo?

Ash resmungou algo incompreensível. Ela estava tão agasalhada que parecia que ia enfrentar uma batalha em Nortúndria e não que fizera uma simples viagem de volta para casa.

- Responda direito ou lhe dou umas palmadas! - ameaçou a caçadora mais velha.

Huaru achou que era uma brincadeira da namorada, mas pela forma rápida que Ash respondeu, talvez não fosse.

- Eu to bem! - disse enfática - Só usei um portal Lux, não sai bebendo toda a magia de Azeroth!

- Mesmo assim, quero que você se deite e descanse a tarde toda.

A irmã mais jovem até pensou em protestar, mas achou melhor não contrariar. Luxuriah estava visivelmente cansada e muito, muito, muito, mas muito mesmo, mal-humorada que o usual.

No dia anterior, a visita surpresa de Vivithi no Penhasco do Trovão não passou despercebida por Ash, nem a conversa aos cochichos de Luxuriah e Kassyeh. Mas estava mais interessada em sobreviver às investidas de Karen, que teimava em mostrar cada pedacinho de sua armadura nova do que solucionar aquele mistério. Para sua surpresa, no dia seguinte logo cedo pela manhã, Luxuriah anunciou que deviam voltar a Luaprata. E rapidamente ajeitou tudo, enquanto Kassyeh fora em Orgrimmar buscar Saba e ver sua casa. Linore e Raziel ficaram muito tristes com a partida delas, mas Luxuriah garantiu que assim que resolvesse os problemas que surgiram na capital dos sin'dorei, voltaria. Todavia, só ficaram satisfeitos quando as visitas concordaram em ficar para o almoço.

Mas a surpresa mesmo foi Huaru surgir com sua mala feita, pronto para partir com elas após a refeição.A felicidade estampada no rosto de Luxuriah denunciou que ela não se oporia à iniciativa dele, muito pelo contrário. E então, estavam todos entrando na outrora mansão de Luelly Fendessol e que agora pertencia às suas netas.

- Bebê, onde ponho minhas coisas? - perguntou Huaru ao entrar na casa. Era muito maior que a sua na Aldeia Narache.

- No meu quarto, lógico. - respondeu Luxuriah se encaminhando para uma escada em formato de caracol - Venha comigo.

Enquanto Huaru subia a escada, Tewdric continuava se equilibrando com a bagagem excessiva. Mas Karen e Saba já haviam cansado da brincadeira de dificultar a vida do orc.

- Vamos conhecer meu quarto Saba? - chamou a pequena elfa - Você vai ficar lá comigo.

- Vamos! - gritou a pequena orquisa.

As duas soltaram Tewdric e saíram correndo escada acima com as mascotes de Kassyeh em seu encalço, quase derrubando Huaru e Luxuriah.

- Ei, vocês duas! - gritou Luxuriah - Cuidado para não caírem!

Saba e Karen estavam se dando muito bem. Bem até demais, o que era um perigo para a sanidade mental dos adultos. Tão logo se conheceram, a afinidade delas brotou como se ambas tivessem sido criadas juntas. Apesar de ser mais nova que Karen, Saba já era quase do tamanho dela, e bem mais pesada. A primeira coisa que a menina disse quando chegou a Luaprata, via portal, era que o lugar era frio. Por isso, ela agora estava vestida com a camisa de Tewdric por cima de sua roupa, enquanto Kassyeh iria providenciar vestimentas mais quentes para a menina.

- Estou quase arrependida de ter deixado Kassyeh trazer Saba. - confessou Luxuriah ao ouvir os gritos vindos do quarto de Karen e o barulho de dois corpos pulando sobre a cama - Karensky não precisa de incentivo para ser do jeito que é.

Huaru riu.

- Mas elas parecem bem felizes juntas. - observou o paladino.

- Por isso ainda não estou arrependida. –sentencioua caçadora.

Tewdric começou a subir as escadas vagarosamente, sendo seguido de perto por Ashrial. A jovem caçadora não queria admitir, mas agora que a dor e a sede do vício passaram totalmente, se sentia exausta. A ideia de deitar-se um pouco e dormir até a hora do jantar começou a ficar muito atraente. E se não fosse seu cunhado andando tão lentamente à sua frente, teria usado os últimos resquícios de força para correr paraseu quarto.

Kassyeh, que até entãoestivera na cozinha, apareceu na sala e franziu a testa ao ver a lenta subida de Tewdric. Se não conhecesse o orgulho do marido tão bem, ofereceria para ajudá-lo com as coisas usando sua magia. Mas isso só ofenderia o guerreiro.

- O que vocês vão querer para o jantar? - perguntou.

- Comida. - respondeu Luxuriah cansada chegando ao topo daescada - Qualquer coisa mastigável.

Kassyeh riu.

- Pode deixar. Farei um cozido com a carne que a mãe de Huaru nos deu.

- Acho que você também deve tirar um cochilo antes do jantar, bebê. - sugeriu Huaru carinhosamente.

- Ele tem razão. - concordou Kassyeh - É bom que você e Ash descansem bem.

Tanto Ash quando Luxuriah exibiam nítidos sinais de cansaço.

- E quem vai ficar de olho naquelas duas enquanto você faz o jantar? - perguntou Luxuriah antes de ouvir o barulho de alguma coisa quebrando no quarto de Karen. - Pela Nascente do Sol, elas vão destruir a casa...

- Eu fico! - se ofereceu prontamente Huaru.

- Não, quero você como travesseiro. - ela se apoiou nele - O Tewdric olha.

Tewdric concordou com a cabeça quase chegando ao topo da escada. Todavia, Karen e Saba seprecipitaram do quarto onde estavam e começaram a descer a escada correndo e gritando. As mascotes de Kassyeh vinham logo atrás, muito irritadas, no encalço das duas meninas. O orc perdeu o equilíbrio por um momento, cambaleou com as bagagens, mas se firmou no último minuto, sem deixar nada cair.

- Se vocês duas continuarem correndo, vou acorrentá-las na cama! - gritou Luxuriah enraivecida.

As meninas pararam de supetão e Hotch e Littleflame também. Os quatro pareciam envergonhados.

- Desculpa! - disseram Saba e Karen ao mesmo tempo.

Kassyeh suspirou. Se as meninas continuassem na agitação que estavam, nem Luxuriah nem Ashrial conseguiriam descansar. Mas também não podia cortar a animação das duas meninas, nem podar sua alegria. Então, uma ideia lhe ocorreu.

- Karen querida, o que acha de você ir mostrar Luaprata a Saba, hein? - perguntou afagando o cabelo da pequena orquisa - Ela vai gostar de ver a fonte, o bazar, a doceria...

Karen deu um gritinho de excitação.

- Tem razão Kass! - e começou a dar pulinhos - Vou mostrar a cidade toda! Vamos Saba!

- Esperem. - a maga enfiou a mão no bolso e tirou umas moedas de prata de lá - Aproveitem ecomam alguma coisa, ok? Talvez a janta demore. - Karen recebeu as moedas com os olhos brilhando. Ela e Saba se entreolharam e soltaram risinhos de cumplicidade.

Luxuriah suspirou aliviada. Um passeio pela cidade ia fazer com que elas gastassem bastante energia e ficassem mais calmas. Karen era acostumada a andar por Luaprata e todos a conheciam muito bem. E desde que ficassem dentro dos muros, não havia nenhum perigo em deixá-las brincarem sozinhas.

- Boa ideia Kass. - a caçadora estava com a voz exausta - Mas não saiam da cidade, certo meninas? Apenas dentro dos muros.

Elas assentiram com a cabeça e saíram correndo porta afora. As mascotes de Kassyeh a olharam, com um olhar pidão.

- Podem ir com elas. - autorizou sorrindo.

Hotch e Littleflame dispararam atrás das meninas, entusiasmados.

- Agora vou me deitar, antes que Vivithi apareça com mais alguma surpresa. - resmungou Luxuriah indo em direção ao seu quarto.

A sobrinha do Lorde Regente havia acompanhado-as até Luaprata, mas assim que atravessaram o portal, Luxuriah foi direta e concisa:

- Nós vamos descansar. Diga ao Lorde Regente que amanhã conversaremos sobre esses documentos.

Vivithi tentara argumentar:

- Mas Lux, é urgente...

- Eu sei, mas quero pôr Ash para descansar e temos coisas para arrumar. O que quer que seja dá para esperar até amanhã. - e observando a amiga,acrescentou - Mas você pode vir jantar com a gente, se quiser.

- Adoraria, mas não sei o que meu tio vai me designar agora. - respondeu tristemente - Se der, eu apareço.

Provavelmente Lor'themar Theron iria alugar a sobrinha por todo o resto do dia, pensou Luxuriah. Mas realmente não queria pensar naquilo. Na verdade, não queria pensar em nada. Aparentemente, assim que vira a casa, seu corpo ficara um milhão de vezes mais pesado e os olhos ardiam. Por isso, empurrou todas as preocupaçõespara o fundo da mente e se dirigiu ao quarto. Só esperou o tempo de ver Ash entrando no quarto dela, para então entrar no seu.

Huaru observou o quarto de Luxuriah admirado. Havia uma imensa cama de dossel, com cortinas vermelhas e uma infinidade de travesseiros. Uma penteadeira exibia vários frascos de perfume, uma caixa de música e um enorme espelho. Havia uma porta no canto, para onde Luxuriah apontou.

- Pode deixar suas coisas ali no closet.

O paladino foi até lá e deu uma olhada.

- Você tem um quarto só para roupa? - perguntou surpreso - Que estranho.

Luxuriah riu, sentou-se na cama e começou a tirar as botas.

- Isso já estava ai quando me apropriei do quarto. - disse ela.

Continuando a exploração, Huaru foi até a janela e afastou as cortinas. Não era realmente uma janela, mas uma porta de vidro, que dava para uma varanda e cuja vista dava para a parte mais bonita de Luaprata. Soltando uma exclamação de espanto, voltou sua vista até um quadro em cima da lareira. Uma elfa de beleza estonteante sorria. Os cabelos eram muito negros e os olhos azuis. Huaru achou que a conhecia.

- Ash? - indagou apontando o quadro.

- Essa é a Vovó Luelly. - Luxuriah agora tirava a roupa e vestia uma camisola - Esse quarto era dela. Eu precisei insistir muito para papai me deixar ficar com ele. Gosto de olhar para ela. - a elfa sentou-se na cama novamente - Sei lá, me acalma.

- Ash se parece muito com ela. - Huaru continuava observando, admirado - Se fosse morena como você, seria uma réplica da avó.

- E aquela menina ainda abre a boca e diz que é feia. - ela suspirou - Queria saber por que ela tem uma visão tão depreciativa de si mesma...

Era verdade. Até mesmo o paladino, que convivia há pouco tempo com elas, percebera que Ashrial tinha uma imagem muito distorcida de sua própria pessoa. Será que aquilo estava ligado à morte dos pais? Ou porque achava que jamais seria como as irmãs mais velhas? Todavia, essas respostas só poderiam ser dadas pela própria Ash, mas esta não parecia muito animada para falar.

- Vem cá. - chamou Luxuriah batendo a mão na cama - Quero me abraçar com você e dormir...

Huaru caiu na risada.

- Virei travesseiro? - perguntou se dirigindo à cama.

- Não só travesseiro, também virou um tauren de pelúcia gigante para eu agarrar! - brincou a elfa.

- Ah, sendo assim tudo bem. - e deitou-se na cama, que apesar de imensa, parecia pequena para ele. Contudo, ele conseguiu se ajeitar de uma forma confortável para ele e acomodou Luxuriah em seus braços - Agora durma. - pediu.

Ela não demorou a atender ao pedido dele.

 

 

*******************

Ash deu um passo para o lado e esperou Tewdric colocar suas coisas no chão. Normalmente faria questão de carregar sua própria bolsa, mas a cara que Luxuriah fez quando ela sugeriu isso foi o suficiente para voltar atrás no pedido.

- Obrigada Tewdric. - agradeceu com um sorriso.

Tewdric sorriu de volta.

- Você me agradece ficando bem, Ash. - e depositou uma mala no chão apenas para acariciar a cabeça da jovem - Qualquer coisa grite que eu venho correndo.

E pegando novamente a mala, saiu tropeçando porta afora.

Ash sorriu. Amava Tewdric sinceramente. Logo que o conhecera teve um pouco de medo da forma bruta com que ele falava e agia. Lembrava bem da cena. Entrara na cozinha para pegar água e o orc imenso estava comendo de forma bem rude na mesa delas. Ficou observando ele abocanhar a carne, tentando não gritar ou entrar em desespero. Quando Tewdric percebera que ela o olhava, ofereceu:

- Quer? – ele falara com a boca cheia.

Somente quando Kassyeh chegou e falou quem era o orc e que salvara a vida dela, foi que relaxara. Percebeu então que Tewdric era muito espirituoso e extremamente divertido. Com o tempo, notou que ele tinha as mesmas qualidades que seu pai e isso foi apenas mais um incentivo para gostar do guerreiro. A brutalidade e grosseria que na maioria das vezes ele demonstrava era apenas um traço comum na sua raça, mas a verdade era que aquele orc poderia ser tão gentil quanto qualquer elfo.

E ele amava verdadeiramente sua irmã. A devoção que ele demostrava por Kassyeh e que a maga retribuía era tão intensa que chegava a despertar-lhe um pouco de ciúmes. Afinal, antes de Tewdric, Kassyeh era somente delas, cozinha e cuidava de todas, como se quisesse suprir a falta que a mãe fazia. Após a vinda do guerreiro orc, Kassyeh saíra de casa, deixando todas um pouco perdidas, apesar de voltar com frequência trazendo Tewdric com ela. Foi com a proximidade dele que finalmente entendeu que não perdera a irmã, mas ganhara um irmão.

Caminhou até a mala, levantou-a e foi até a cama. Abriu-a, olhou o conteúdo e fechou-a novamente. Não estava com vontade de arrumar nada. Então, empurrou a mala de qualquer jeito para o canto do quarto e jogou-se pesadamente na cama, com a roupa que estava, e olhou para o teto. Sua cama também era de dossel, então ela encarou o tecido de seda que encobria sua cama. O quarto era todo decorado com seda rosa, havia uma lareira em frente à cama como no quarto de Luxuriah, mas em cima dela não havia um retrato, e sim vários aparadores cheios de bonecas. Qualquer um que entrasse ali pensaria que ali morava uma criança pequena e não uma elfa com quase duas décadas de vida. Ás vezes a própria Ash se incomodava com a infantilidade do quarto, mas jamais teria coragem de alterar qualquer coisa ali dentro.

Afinal, aquele fora o último presente de seus pais.

Quando estava em vias de se mudarem para Luaprata, antes da morte de Dhomm e Samanthah, o patrulheiro pintara o quarto, fizera os aparadores e sua mãe costurara as cortinas. Tudo fora feito por eles, do jeitinho que ela pedira quando era criança. Como então teria coragem de mexer no que quer que fosse ali?

Suspirou e levantou a mão em direção ao teto. As marcas haviam sumido. Seus cabelos voltaram à cor original. Não sentia mais dor nem sede. Então, porque havia aquela sensação estranha dentro dela? A sensação que algo estava diferente, que jamais voltaria a ser como era antes?

Lembrou-se das visões que tivera enquanto estava cheia da magia demoníaca. Kass lhe dissera que elas eram feitas por demônios que queriam arrastá-la para o ladodeles. Estremeceu ao lembrar-se de Luaprata em chamas e da sensação de desespero por estar sozinha em meio ao fogo. Perguntava-se como alguns de seu povo podiam ser bruxos e lidar com aquela energia todos os dias. Com certeza ela enlouqueceria. E pensar que Kass lidara sozinha com aquilo...

Franziu a testa. Com certeza sua irmã era bem mais forte do que dava a entender. Afinal, toda a aura de magia que vira ao seu redor não podia ser comum. Então, porque ela quase fora morta por uma orquisa? Luxuriah disse que Kassyeh não gostava de matar, e que sempre preferia fugir. Mas isso não era o certo, não mesmo. Jamais fugiria daqueles humanos que a atacaram. Na verdade, estava ansiosa por poder sair novamente de casa. A sensação de matar aquelas criaturas, aquela raça que mataram seus pais, fora arrebatadora. Redentora. Sentira o sangue ferver e o coração bater mais forte. Desejava que aqueles humanos tivessem filhos, que ficariam órfãos, como ela própria ficou. Desejava que elessofressem.

Porém, logo se arrependeu desses desejos. Sua mãe sempre dizia que não desejasse o mal para ninguém. Mas será que Samanthah continuaria com o mesmo pensamento se pudesse ver o que passaram suas filhas após sua morte? Será que sua mãe ouvira os gritos de Luxuriah durante o ataque? O que os humanos haviam feito com sua irmã após matarem seus pais? Com certeza algum tipo de tortura, talvez para ela revelar algo sobre Luaprata. Não sabia. Suspeitava que nem Kassyeh sabia. E com certeza não iria perguntar.

E se perguntasse, Luxuriah responderia?

Será que queria mesmo saber a resposta?

Sacudiu a cabeça, fechou os olhos fortemente e procurou afastar aqueles pensamentos. Melhor não pensar. Já pensara demais, vira demais, sentira mais ainda nesses últimos dias e não queria sua mente sendo assaltada por mais coisas dolorosas. Estava na hora de se render ao cansaço e esquecer-se de tudo.

Rapidamente caiu em sono profundo. Sonhos começaram a povoar sua mente. Eram sonhos felizes, em um mundo idílico, utópico. Lá, no lugar onde estava agora, seus pais ainda eram vivos. Mostravam o mesmo sorriso e alegria que sempre demonstraram quando ainda existiam. Suas irmãs também estavam lá. Kassyeh tinha as crianças que tanto queria, e que brincavam com Karen. Eles eram verdes e mais pareciam orcs que elfos. Mas mesmo assim, eram lindos. Tewdric ria de algo contado por Dhomm, que parecia estar se divertindo com o orc. Luxuriah estava ao lado deles e sorria. Aquela sombra de tristeza que pairava sempre sobrea cabeça da caçadora não estava mais lá e Huaru segurava carinhosamente sua mão. Estavam todos em paz.

Uma imensa casa se erguia nos sonhos de Ash, e ela reconheceu-a como sendo a casa de campo onde passara a maior parte de sua infância. Havia flores e pássaros. Nada de dor. Nada do flagelo. Apenas um dia calmo e tranquilo e todos estavam felizes. Ash observava a cena de longe, sentada em uma colina. Abraçada às suas pernas, ela velava sua família com um sorriso colado no rosto. Era assim que devia ser. Sempre. Era assim que deveria ser.

Estava absorta em sua observação quando alguém se sentou ao seu lado. Olhou, assustada, e viu aquele elfo. O mesmo que a tirara do sótão. O elfo de cabelos prateados e que usava um tapa-olho. Ash o olhava, boquiaberta. Ele não deveria existir. Naquele mundo, não havia sótão. Não havia perda. Ele não a tirara de lugar nenhum. Ele não era necessário. Então porque ele estava ali?

- Não chore menina... - ele disse alisando seus cabelos.

Queria dizer que não estava chorando, que estava feliz, que ele fosse embora, mas ao abrir a boca para falar, percebeu que lágrimas escorriam de sua face. Voltou rapidamente sua cabeça para a casa e então tudo havia sumido. Voltou-se com raiva para ele, para acusa-lo, mas então ele a abraçou, como fizera naquele dia dez anos atrás. Abraçou-a, colocou seu rosto em seu peito, e passou a acariciar seus cabelos. O cheiro dele era tão bom...

- Não chore. Eu estou aqui. Vou cuidar de você. – ele disse.

E ela acreditou.

Sem saber que sorria, Ash virou-se na cama durante seu sono e abraçou fortemente o travesseiro.

 

 

**********************

Karen e Saba corriam de braços abertos pelas ruas de Luaprata. Fazendo barulhos com a boca imitando o som dos zepelins, elas rodopiavam e pulavam como se estivessem em uma guerra aérea.

- Boom! Eu te acertei! - gritou Karen.

- Acertou não, eu desviei! - retrucou Saba.

- Acertei sim! - insistia a elfa.

- Acertou não! - negava a outra.

Elas discutiram algum tempo, mas logo mudaram a brincadeira e eram arqueiras perseguindo a Aliança pelas planícies de Durotar. Quem via as meninas naquele diálogo estranho e gestos estabanados não faziam ideia do mundo esplêndido que ambas criavam e recriavam em suas mentes a cada brincadeira.

Saba, que era filha única, estava adorando a sensação de ter alguém com quem compartilhar uma brincadeira que não envolvesse luta. Em Orgrimmar, tinha que ajudar os pais na estalagem e quando ia para a Academia as outras orquisas a desprezavam por ser a menorzinha da sala. Ter alguém que não a enxotasse a deixava muito feliz. Karen, que era a caçula de quatro irmãs, estava adorando ter outra menina de idade aproximada para brincar. Em Luaprata, a maioria das elfas ou eram da idade de Ash ou nasceram bem depois do Flagelo. Pouquíssimas eram as crianças de sua idade, e normalmente estas moravam mais afastadas do centro da cidade.

E naquele momento, ter as ruas vazias só para elas, era como ganhar um presente gigante de Véu de Inverno.

Sem perceber a distância que percorreram na brincadeira, as meninas se aproximaram da Torre Solfúria. Saba soltou uma exclamação de surpresa quando viu a imensa estrutura.

- Que enorme!!!– falou - Deve ser do tamanho do Castelo Grommash!

- Com certeza é mais bonito! - disse Karen.

- É mais brilhoso... -a pequena orquisa estava com os olhos brilhando - Deve ser lindo por dentro!

Karen deu de ombros.

- Deve ser, nunca entrei aí. - e apontando para a fonte, chamou - Tô com sede, vamos beber água?

- Dá pra beber essa água? - perguntou Saba se aproximando da fonte e olhando seu reflexo. Ela ainda usava a camisa de Tewdric, que estava firmemente amarrada em sua cintura e descia nas pernas como um vestido - A camisa de Ted fica engraçada em mim! - riu-se.

- Fica sim! - concordou Karen rindo também - Pode beber a água sem medo, é limpa. Todo mundo bebe.

Elas fizeram concha com as mãos e sorveram a água em grandes goles. As brincadeiras as deixaram sedentas.

- Quem mora ai? - perguntou a pequena orquisa, depois que sentaram em um banco perto da fonte e tomavam fôlego.

- Acho que o lorde regente. - disse Karen - Lux o conhece, eu nunca vi.

- Nossa, ele mora sozinho nisso tudo... - se surpreendeu.

- Acho que sozinho não... - Karen olhou para a torre e teve uma ideia - Acho que podemos nos aproximar... Talvez até entrar... - falou em expectativa - Topa?

Os olhos de Saba se acenderam.

- Topo!

Começaram a cochichar como deveriam fazer. Havia guardas e de repente elas se sentiram como poderosas guerreiras prestes a invadir Ventobravo. Passaram a se aproximar da torre agachadas, se escondendo na mureta da fonte. Quando estava se aproximando da entrada, Karen apontou para a cerca viva e elas rapidamente correram até lá. Dando uma olhada, viram que os guardas não deram atenção para elas epassaram a se aproximar cada vez mais.

- Só tem uma entrada... – sussurrou Saba apontando para a ponte que ligava a torre à praça – E agora?

Karen observou à sua volta e teve uma ideia.

- Vamos por ali. – e apontou a parede da torre.

O plano que Karen rapidamente contou a Saba e que a orquisa concordou era simples: continuar seguindo pela cerca viva até a parede da torre. De lá, elas poderiam se apoiar nas arestas da parede até chegarem perto da entrada. De lá, subiriam usando o estandarte de Luaprata como escada. Subiriam na varanda e, furtivamente, entraria na torre.

E assim fizeram. Andaram agachadas até a parede da torre e Karen decidiu ir primeiro. Apoiou-se numa aresta e começou a andar pela parede, usando as mãos e os pés como ganchos. Saba observou o que a elfa fizera e repetiu os gestos. Lentamente elas avançaram, até chegar bem embaixo da ponte. Com uma mão, Karen testou a firmeza do estandarte e então fez um sinal afirmativo para Saba. Subir pelo tecido foi um pouco mais complicado, todavia, logo estava um pouco acima da varanda, para onde a elfa pulou sem nenhum esforço e estendeu a mão para a orquisa. Saba aceitou a ajuda e logo estavam em segurança. Sorriram uma para a outra, vitoriosas.

- Ei vocês duas! - gritou um dos guardas - O que pensam que estão fazendo?

Elas se olharam, assustadas.

- Corre Saba! - ordenou Karen.

As meninas começaram uma corrida desenfreada pela ponte, e as sentinelas se adiantaram para detê-las. Entre gritos agudos e fugas por entre as pernas dos guardas, elas se estavam quase na entrada da torre quando foram pegas. Um dos elfos levantou Karen pelo cinto da calça e o outro pegou Saba pela gola da camisa de Tewdric. Mas elas não se renderiam tão facilmente. Karen chutou a barriga do seu captor e Saba mordeu o outro. Estavam tentando se libertar quando a confusão chamou a atenção de alguém dentro da torre.

- Que barulho é esse?

Lor'themar Theron estava muito irritado. Sua sobrinha acabara de lhe dar a resposta de Luxuriah e ele não gostara nenhum pouco. Queria resolver aquilo o mais rápido possível, mas não podia simplesmente mandar buscá-las em casa, pois já recebera uma resposta afirmativa, porém não imediata como previra. E depois de dispensar Vivithi e ficar andando de um lado para o outro se perguntando o que fazer, seus pensamentos foram interrompidos por uma confusão bem barulhenta do lado de fora da torre, próximo onde estava.

E agora, encontrara a cena mais inusitada dos últimos tempos. Uma menina elfa chutava com vontade a barriga do guarda que a segurava pelo cinto da calça e, para seu espanto, havia uma menina orquisa pendurada pelos dentes na mão de outro, que gritava e sacudia a mão presa, balançando perigosamente sua agressora.

- Mas... O que significa isso? - gritou o lorde regente.

Karen parou de chutar seu agressor, mas Saba continuou fincando os dentes na mão do que a segurava.

- Lorde regente! - exclamou o guarda que segurava Karen - Essas meninas estavam tentando entrar na torre!

- Isso é verdade? - perguntou ele a Karen.

- A gente só queria ver como era por dentro! - se justificou a menina.

Lor'themar levou as mãos às têmporas. Sério? Seus pensamentos foram interrompidos pela brincadeira de duas crianças?

- Soltem-nas. - disse displicentemente.

Karen e Saba foram postas no chão, mas a pequena orquisa não largava a mão do guarda.

- Solta menina! - gritou ele sacudindo-a novamente no ar.

- Pode soltar ele Saba. - disse Karen derrotada - Já pegaram a gente mesmo...

Saba soltou a mão do elfo e caiu pesadamente no chão, se firmando rapidamente. Karen colocou a mão no ombro da amiga e negou com a cabeça. Saba também parecia triste. Tinham sido capturadas. Seriam presas agora?

- Muito bem. - a voz potente do Lorde regente fez com que elas o olhassem, assustadas - Por que decidiram brincar justamente aqui meninas?

Karen tomou a frente, disposta a sofrer todos os castigos no lugar de Saba.

- Foi totalmente por acaso, a gente tava brincando e viemos parar em frente a torre. - e colocando a mão no peito, falou em um tom sério - E a culpa foi toda minha, eu convenci Saba a entrar aqui.

- Karen!- gritou Saba horrorizada - Não faça isso, eles vão te prender! - e olhando para Lor'themar, disse - Eu também tive culpa moça!

O lorde regente arqueou as sobrancelhas.

Moça?

- Saba, é um elfo. Um elfo macho. - corrigiu Karen.

Saba abriu a boca, espantada.

- Sério?! Bem que senti falta dos peitos... - e rapidamente corrigiu - Eu também tive culpa moço!

- Certo, certo... - ignorando que fora confundido com uma elfa, Lor'themar fez um gesto com as mãos, pedindo a atenção das garotas - Isso aqui não é lugar para brincar meninas. Por isso, vou mandar alguém deixar vocês em casa e avisar aos seus pais dessa confusão, assim eles podem lhes dar a punição adequada.

Saba deu de ombros.

- Meus pais não tão aqui mesmo... - disse despreocupada.

Já Karen, abriu a boca, horrorizada.

- Luxuriah vai me matar! - exclamou colocando as mãos no rosto. E olhando para Saba, acrescentou - E vai te mandar de volta!

Agora sim, Saba parecia assustada.

Enquanto as meninas surtavam com a perspectiva de encararem Luxuriah enfurecida, Lor'themar percebeu que estava diante de ninguém menos que uma das futuras princesas de Luaprata. Foi quando entendeu porque a menina lhe parecia tão familiar. Ela era muito parecida com Samanthah, sua mãe.

- Você é Karensky certo? - perguntou se aproximando interessado - Karensky Fendessol, filha de Dhomm e Samanthah, sobrinha de Aethas.

- Siiiiiiiimmmm.... - choramingou Karen ainda pensando no castigo.

Lor'themar sorriu. Era uma oportunidade boa demais para perder. Seria muito bom saber um pouco mais sobre as irmãs Fendessol de alguém que não estivesse pronto para lhe atirar uma flecha.

- Bem Karensky e Saba - começou encarando-as - se queriam tanto entrar na torre, porque não pediram para uma das suas irmãs lhe trazer?

- Não seria emocionante. - respondeu rapidamente Karen e Saba concordou.

O lorde regente não pode deixar de rir. Aquela seria uma resposta digna de Dhomm.

- Se vocês querem tanto ver como é aqui dentro, acho que posso lhes mostrar. -e mostrando a entrada, chamou - Querem ir?

Saba fez que sim e já se adiantava quando Karen lhe puxou pelo ombro. A pequena elfa assumira uma expressão desconfiada e agora olhava para o lorde regente com ar interrogativo.

- O que fez o senhor mudar deideia? - perguntou - Ia nos mandar para casa e agora quer nos mostrar a torre... Isso é estranho.

Perspicaz, pensou Lor'themar satisfeito.

- Fui amigo do seu pai Karensky. - respondeu - E sei que ele iria rir muito com sua tentativa e provavelmente não iria castigá-la, no máximo adverti-la. - e sorrindo completou - E não tivemos nenhum prejuízo aqui, não é mesmo?

Os guardas atacados pelas meninas franziram a testa, mas não discordaram do lorde regente.

- Ah, assim tá certo. - a desconfiança de Karen se evaporou - Queremos conhecer sim, o senhor pode mostrar?

- Venham. - convidou ele e as meninas o acompanharam alegremente.

Saba e Karen seguiram Lor'themar de perto e olhavam abobalhadas para o interior da torre. Os cristais arcanos pulsavam e pequenas faíscas luminosas escapavam deles. As cortinas que enfeitavam os salões balançavam levemente, mesmo na ausência de vento. Havia guardas espalhados pelos corredores onde passavam que olhavam interessados as acompanhantes do lorde regente. O elfo parecia muito orgulhoso do lugar e falava sobre cada detalhe dos lugares por onde passavam.

- Há quanto tempo existe essa torre? - perguntou Karen.

- Pelo menos três mil anos. - respondeu Lor'themar.

- Nossa, como ta bem conservada! - exclamou Saba.

Lor'themar riu.

- Nosso povo vive muito, pequena. Gostamos de construir coisas que durem tanto quanto nós.

- Então você deve ser muito velho né? - quis saber a orquisa.

- Para os padrões da minha raça, nem tanto. - Lor'themar indicou um caminho - Venham por aqui.

Ele as levou a salão principal, onde acontecia a maioria das festas da corte élfica antes do flagelo. Agora ela estava sem uso, pois o lorde regente não era dado a comemorações. Porém, sem dúvida, somente dali era possível ter a vista mais bela de Luaprata. As meninas soltaram exclamações e correram para a varanda. Dava para ver até a Floresta do Canto Eterno.

- Que lindo! - Saba estava encantada - É muito mais bonito que Orgrimmar! - e franzindo a testa perguntou a Karen - Por que será que o Chefe Guerreiro não se inspirou aqui quando foi reconstruir a cidade?

- Provavelmente ele não sabe apreciar as coisas belas da vida. - filosofou Karen - Ou então nunca esteve aqui. - e se voltando para Lor'themar perguntou - O Chefe Guerreiro já esteve aqui?

- Garrosh Grito Infernal? Nunca.

- Se tivesse visto, iria fazer de Luaprata a capital da Horda. - falou a pequena elfa sonhadora - Seria legal né Saba?

- Aí eu ia morar aqui? - perguntou.

- Claro! Aí teríamos muitas aventuras juntas!

Elas começarama fazer planos e esqueceram-se completamente do lorde regente. Lor'themar não achou ruim, muito pelo contrário. Passou a observar o comportamento de Karen e percebeu que gostara muito da menina. Tinha audácia, coragem, prudência em certa medida, e um bom relacionamento com as diferenças, a julgar pela amizade com Saba. Era um diamante bruto, precisava apenas ser lapidado. Se tivesse sido criada dentro dos moldes reais, seria uma perfeita princesa.

Ou rainha.

- Tem mais lugares para ver? - perguntou Karen tirando-o de seus pensamentos.

- Claro. Venham.

O passeio durou boa parte da tarde. Lor'themar mostrou a sala do trono, a sala de música, a biblioteca, o jardim traseiro da torre e a parte cuja vista dava para a ilha de Quel'danas. Saba ficava impressionada com tudo, aceitando as coisas que o elfo dizia, enquanto Karen enchia-o de perguntas. Ela quis saber a quanto tempo ele morava ali, se já havia se perdido, se eraassombrado, quantos servos tinha e o mais importante, se ele morava sozinho.

- Não exatamente. - respondeu quando chegaram a uma sala menor. Ele havia pedido discretamente a um dos servos que preparassem um chá para ele e as meninas - Têm os servos, minha guarda pessoal e meus conselheiros também moram aqui.

- E sua esposa? - perguntou Saba - E seus filhos?

Lor'themar deu um sorriso triste.

- Não tenho esposa nem filhos.

- Por que não? - perguntou Karen.

Um dos servos se adiantou a eles, interrompendo a conversa.

- A mesa está posta meu lorde. - e apontou uma mesa farta com doces, chá e salgados.

- Obrigado. - e se voltando para as meninas, convidou - Vamos comer algo? Vocês devem estar famintas depois de tantas aventuras...

Elas assentiram e se sentaram à mesa com Lor'themar. O elfo fez questão de puxar as cadeiras para que as meninas se acomodassem e elas aceitaram entre risadinhas. Quando Lor'themar se sentou, Karen retomou a pergunta.

- Por que você não tem esposa nem filhos?

- Não tenho tempo para me dedicar a uma família. - respondeu ele o mais sincero que pode.

- Isso pra mim parece uma desculpa. - questionou a elfa.

Lor'themar riu.

- Talvez, quem sabe. - disse ele.

O servo passou a servir chá e doces para eles. Lor'themar percebeu que Saba era muito bemeducada para uma orquisa. Conhecia o suficiente daquele povo para saber que bem poucos conseguiam utilizar os talheres daquela forma.

- Onde aprendeu a etiqueta élfica Saba? - perguntou interessado.

- Kassyeh me ensinou. - respondeu feliz - Ela me ensina um monte de coisas e ainda me trouxe para o casamento dela.

- Casamento?

- É! - Karen confirmou - Kass vai casar com o Ted de novo. - e rindo, continuou - Lux acha que o casamento só vale se casar em Luaprata também. Aí vamos ter outra festa!

Após tomar um gole de chá e esperar as meninas fazerem o mesmo, o lorde regenteperguntou:

- O que você acha do companheiro de sua irmã, Karensky?

- Pode me chamar só de Karen. - disse a menina alegremente - E eu amo muito o Ted! Muito, muito mesmo! Ele é muito bom pra mim! Brinca comigo, me ajuda, me protege! - e suspirando, acrescentou - Acho que ter um pai é assim...

Aquelas palavras atingiram Lor'themar de uma forma mais brutal do que ele previra. Karen não era a única criança órfã de seu povo, mas ela era filha de alguém que o lorde regente prezara muito. Dhomm era um excelente patrulheiro e um elfo melhor ainda. Estava sempre alegre e bem humorado e não se importava nem mesmo com o mau humor habitual de Sylvana. Sempre que ele falava das filhas era com os olhos brilhando e a voz cheia de orgulho. Samanthah sempre fora mais reservada, mas mesmo assim sempre tinha um sorriso e uma palavra amiga para todos.

Pensar que a referência de pai que a futura princesa de Luaprata tinha era um orc o deixava um pouco incomodado.

- Seu pai foi um elfo extraordinário. - falou ele - E sua mãe também. Eles ficariam orgulhosos da menina bonita que você se tornou. - e rindo acrescentou - Apesar do atrevimento.

Karen e Saba riram.

- Como era o pai da Karen? - perguntou Saba - O senhor conhece histórias sobre ele?

- É mesmo Saba! Boa pergunta!

- Conheço algumas. - admitiu e as meninas o olharam com expectativa. – Suas irmãs não falam sobre eles?

Karen negou com a cabeça.

- Só a Kass. A Lux não gosta de falar e a Ash não lembra muito. – e dando uma pausa, pediu – Poderia falar um pouco, por favor?

O resto do lanche foi repleto de alguns casos envolvendo Dhomm e Samanthah que prendeu a atenção das meninas. Lor'themar se surpreendeu ao perceber que sabia bastante sobre eles, e como era irônico que fora tão próximo daquele que poderia ter sido rei de Luaprata. Obviamente omitiu coisas sobre a morte dos pais da garota e ficou feliz que ela não perguntou. Saba também fez perguntas, mas muito mais a respeito dos patrulheiros, que ela ouvira falar serem os melhores arqueiros do mundo. A pequena orquisa tinha interesse por arcos.

Quando percebeu que já estava perto de anoitecer, Lor'themar achou por bem encerrar a conversa.

- Está ficando tarde meninas,acredito que Luxuriah ficará preocupada se vocês demorarem.

- Ah, ela deve ta namorando o Huaru, nem vai notar! - disse Karen despreocupada. –Acho que podemos ficar mais um pouco!

Como?

- Quem é Huaru? - perguntou o lorde regente tentando não parecer interessado demais.

- O namorado da Lux! - respondeu Saba - Um tauren grandão assim! - e mostrou o suposto tamanho de Huaru com a mão.

Foi impossível esconder a surpresa com a informação. Luxuriah? Namorando? Um tauren? O que afinal se passava na cabeça daquelas elfas?

- Eu também fiquei surpresa. - disse Karen em tom consolador dando uma tapinha na mão de Lor’themar - A Lux não é de gostar muito de ninguém, mas o Huhu é especial.

Lidar com uma princesa elfa casada com um orc já seria difícil, mas agora lidar com uma princesa elfa casada com um orc E uma futura rainha casada com um tauren era demais. Lor'themar imaginou o que havia de errado com os elfos para não estarem despertando as atenções das elfas.

- Suas irmãs tem um gosto inusitado por companheiros. - comentou ele tentando parecer natural.

- Será que não é porque vocês machos se parecem demais com as fêmeas? - perguntou Saba - Tipo, parecem muito parecidos mesmo?

Karen, contudo, balançou a cabeça em negativa.

- Não é isso Saba. - e olhando para Lor'themar, falou seriamente - Acho que a gente não manda no coração, lorde regente. Quando a gente ama de verdade, coisas como raça não são importantes.

Lor'themar não pode evitar se sentir envergonhado diante da sinceridade e gentileza que a menina demonstrara.

- É, acho que você tem razão, Karen. Não dá para saber quem nosso coração irá escolher. - e dando um sorriso sincero, acrescentou - Espero que quando chegar sua hora, seu coração escolha alguém que mereça uma menina tão especial quanto você.

- Eu quero um guerreiro bem forte! - falou Saba - Meu coração que não me arrume outro!

- Pois eu estou aberta a todas as possibilidades! - disse Karen espojada - Quando meu coração escolher, vejo o que eu faço!

- Quando vocês tiverem idade, vocês começam a se preocupar com isso. - o lorde regente riu. Há quanto tempo não tinha uma tarde tão agradável? - Então meninas, vamos? Vou mandar alguém acompanhar as duas até em casa.

- Não precisa! - dispensou a pequena elfa - Não é perigoso!

- Faço questão. - e ele fazia mesmo. Não ia deixar a princesa andar por aí desacompanhada. Já pensava na possibilidade de lhe arrumar damas de companhia. - Não quero minhas convidadas correndo perigo.

As meninas riram.

- Obrigada lorde regente. - agradeceu Karen.

- É, obrigada lorde. - repetiu Saba.

Ele as acompanhou até a saída da Torre Solfúria e designou dois guerreiros de sua guarda pessoal para escoltá-las. Os instruiu discretamente que não fossem vistos pelas irmãs de Karen, mas que garantissem a segurança das meninas. Quando foi se despedir delas, ficou desconcertado ao receber dois abraços bem apertados das meninas.

- Gostei muito de você lorde regente. - disse Karen quando o abraçou - Você é legal.

- Obrigada por ter deixado a gente entrar. - disse Saba também o abraçando - E pelo lanche.

- De nada meninas. - ele retribuiu os abraços, um pouco envergonhado - Espero que possamos nos ver em breve.

- Claro! - responderam elas em uníssono.

E acenando, viu-as saírem acompanhadas pelos guardas, aos pulinhos, cochichando sobre tudo que viveram àquela tarde. E pela primeira vez em décadas, Lor'themar percebeu que verdadeiramente sentiu-se bem na companhia de alguém.

E desejou ardentemente estar de novo na companhia delas o mais breve possível.

 

 

*****************************

A carne já estava na panela e Kassyeh colocava os temperos e verduras enquanto cantarolava alegremente. A mãe de Huaru havia lhe dado um pinote quase inteiro, apesar delas disserem que não precisava. Mas a taurena insistira tanto que seria uma desfeita negar. Agora, estava feliz por ter aceitado, assim não precisava ir ao mercado para comprar nada e sua única preocupação era se fazia, para acompanhar a carne, lentilha refogada ou arroz com legumes.

Decidiu fazer os dois.

E frutas em calda para sobremesa.

Escolheu os legumes e as frutas na horta atrás da casa, levou-os para a cozinha, lavou bem todos eles e começou a cortá-los. Estava entretida nessa função quando alguém a agarrou por trás. Eram braços fortes, que apertaram sua cintura com gentileza, e levaram seu corpo ao encontro de outro.

- Tewdric! - exclamou sentindo o beijo em sua nuca - Eu estou ocupada!

Mas o orc não queria saber. Fazia dois dias que desejava ter sua elfa nos seus braços. Apesar da ansiedade de perdê-la ter passado após a conversa com Luxuriah, ele só se sentiria satisfeito quando a possuísse novamente e visse o brilho de prazer em seus olhos. Por isso, depois que distribuiu toda a bagagem e percebeu que quem estava em casa dormia e as meninas tinham saído, ele decidiu que não ia mais esperar.

- Estou com saudades... - murmurou ele passando os lábios pelo pescoço dela - Muitas saudades...

O corpo de Kassyeh respondeu com ânsia aos carinhos de Tewdric. Ela fechou os olhos, sentindo arrepios percorrerem sua espinha. Porém, havia trabalho a ser feito.

- Preciso terminar a janta... - murmurou - O arroz...

Mas Tewdric não queria saber. Começou a passar as mãos no corpo dela e apertou com vontade seus seios. Kassyeh gemeu. Tewdric então a virou e aplicou um beijo em seus lábios. Suas mãos então desceram para o traseiro da elfa, o apertou e a levantou.

Kassyeh tentou protestar, mas não conseguia. Seus lábios estavam firmemente colados nos de Tewdric. E se conseguisse, ela pediria para parar? Também estava com saudades, também ansiava por ele, e mal conseguia parar de pensar em voltar para seus braços. E agora que estava, a preparação da janta sumiu totalmente de sua cabeça.

Ele a encostou na parede e subiu seu vestido. Estava com as mãos em suas coxas quando um barulho muito forte veio da sala. A porta se escancarou violentamente e Kassyeh gritou de susto. Tewdric a soltou rapidamente e vasculhou a cozinha em busca de uma arma, mas logo perceberam que o estrondo fora causado por Hotch e Littleflame, que agora adentravam a cozinha correndo desesperados e se atiraram nas pernas de sua dona.

- Mas, o que? - Kassyeh estava confusa.

- Ah, esses diabinhos! - Tewdric abaixou-se e pegou cada um em uma mão - O que pensam que estão fazendo?- os bichinhos começaram a se debater nas mãos dele.

- Acho que a energia das meninas foi demais para eles. - riu-se Kassyeh - Devem ter fugido. Ponha-os no chão Tewdric, vou por algo para eles comerem.

Enquanto Tewdric colocava as mascotes com seu jeito delicado de orc no chão, Kassyeh foi rapidamente até a sala e fechou a porta. Torcia para que ninguém tivesse presenciado sua cena quente na cozinha. Mas como os cômodos eram separados por uma distancia razoável, achava que não. Quando voltou à cozinha, colocou generosos pedaços de queijo e carne numa tigela e água fresca em outra, pôs no quintal e colocou seus bichinhos lá. Assim, eles podiam comer e depois brincar sem destruir a casa.

Quando voltou à cozinha, Tewdric a esperava com um sorriso malicioso nos lábios. Porém, aproveitando um pouco do autocontrole que ainda tinha, pediu:

- Deixe só eu colocar a comida no fogo. - e dando um sorriso encantador, completou - Depois, serei sua.

Tewdric respirou fundo e deu de ombros.

- Certo, certo. Eu deixo. - e abrindo ainda mais o sorriso, colocou uma condição -Mas, eu quero sua calcinha.

Kassyeh arregalou os olhos, surpresa.

- Pra quê?

- Eu quero, só isso. - e rindo, continuou - Você faz a janta e eu fico com sua calcinha. É uma troca justa.

Pensando em que tipo de lógica ele utilizou para chegar àquela conclusão, Kassyeh achou melhor fazer o que ele pedia. Tirou a calcinha, sob o olhar ansioso do orc e entregou a ele, com o rosto em chamas. Depois, voltou sua atenção às panelas, tentando ignorar a presença dele às suas costas. Colocou o arroz e a lentilha para cozinhar com os legumes em fogo baixo. Depois, pôs as frutas com bastante açúcar em uma travessa e levou ao forno. Pelas suas contas, não precisaria se preocupar com as panelas por, pelo menos, uma hora.

Quando se voltou para dar a notícia a Tewdric, percebeu que ele brincava com sua calcinha, rodando-a no dedo, e de vem em quando, a cheirava com um sorriso de extrema felicidade. Ela sentiu o rosto corar.

- Tewdric! - exclamou - Por que você está cheirando minha calcinha?

Tewdric a olhou, com a calcinha ainda próxima ao seu rosto.

- Gosto de seu cheiro. Sinto falta dele. - respondeu com simplicidade e sem nenhum pingo de vergonha.

Kassyeh sorriu e balançou a cabeça.

- Você não tem jeito mesmo... - e suspirando, acrescentou - Temos uma hora.

Ela não precisou repetir. Tewdric se precipitou para cima dela com tal fúria que a maga deu um pequeno grito assustado, que foi logo abafado com um beijo. Ele a pegou no colo e rapidamente a tirou da cozinha. Kassyeh achou que o orc fosse levá-la ao quarto, mas se surpreendeu quando foi colocada no sofá e teve o vestido rapidamente removido.

-Aqui? - perguntou ofegante.

- Se eu tive levar para o quarto, não será apenas uma hora. - murmurou tirando a própria roupa. - Então vamos aqui mesmo.

Kassyeh quis protestar, dizer que não podiam simplesmente fazer sexo ali no sofá da sala, mas sabia que era inútil. Percebeu também, com surpresa, que gostava da ideia de fazer ali, naquele momento. Por isso, sorriu com malicia quando ele terminou de se despir e passou as mãos pelo corpo dele.

- Vamos, eu quero rápido e forte... - murmurou e passou a língua no peito dele.

Tewdric gemeu e a atirou no sofá, puxando-a para si sem nenhuma cerimônia. Kassyeh o enlaçou com as pernas e arqueou o quadril. Sem precisar de outro convite, Tewdric se lançou dentro dela, e passou a fazer os movimentos exatamente como ela havia pedido, com força e rapidamente. Logo, estavam gemendo de prazer, e o fato de estarem na casa dela com as irmãs dormindo no andar de cima não foi empecilho para se entregarem à paixão selvagem em plena sala de estar. Kassyeh não demorou a chegar ao ápice do prazer, acompanhada logo em seguida por Tewdric.

- De novo... - murmurou a maga ofegante. - Eu quero de novo...

Tewdric sorriu satisfeito.

- Quantas vezes você quiser...

E o tempo que eles dispunham antes de voltar ao jantar foi muito bem aproveitado.

 

***********************

Quando Luxuriah abriu a porta da sala e viu Vivithi, com um grande sorriso nos lábios e um enorme bolo de néctar doce nas mãos, ela esqueceu completamente de qualquer problema que pudesse ter com o lorde regente. Afinal, ali estava finalmente sua amiga, sem tabardo de Luaprata, sem estar a trabalho, apenas para um jantar informal.

- Você veio! - Luxuriah fez questão de lhe dar um apertado abraço.

- Meu tio me dispensou. - respondeu a patrulheira sendo conduzida para dentro da casa - Ele estava estranhamente bem humorado agora à noite.

- Bom para nós! Venha!

A janta, como Kassyeh previra, saiu mais tarde que o planejado. Não só pelas duas horas de sexo que ela partilhou com Tewdric, que acabou levando as frutas em calda a queimarem, mas também porque acabou querendo fazer mais acompanhamentos para a carne ensopada. E para conseguir terminar o resto da janta, deixou que Tewdric ficasse com sua calcinha. Assim, pode preparar outros pratos e refazer a sobremesa.

Ashrial e Luxuriah acordaram quando a noite já havia caído. A mais jovem ajudou a montar a mesa enquanto a outra olhava atentamente o sofá, para o desespero de Kassyeh.

- Você fez sexo aqui. - disse com ar reprovador para a irmã.

Kassyeh corou drasticamente.

- Mas eu limpei direitinho! - disse desesperada- Não tem uma manchinha!

Luxuriah desatou a rir.

- Não tem mesmo, eu sei porque o Hu ouviu tudo enquanto eu dormia. Vocês fizeram muito barulho e o deixaram constrangido.

A maga sentiu vontade de morrer.

- Desculpa... - murmurou.

- Tudo bem. - Luxuriah deu de ombros - Já fiz sexo na sua cama uma vez, então estamos quites.

E saiu em direção à sala de jantar ignorando o olhar perplexo da outra.

Karen e Saba chegaram logo em seguida. Normalmente Luxuriah lhe daria uma bronca por só chegar em casa após escurecer, mas o cochilo da tarde a deixara de extremo bom humor. Afinal, foram três dias sem conseguir dormir, e o descaso lhe fizera bem. Além do mais, ela estava com Saba e ambas pareciam tão felizes depois da tarde de brincadeiras, que a mais velha simplesmente deixou para lá. E para completar a noite, sua amiga estava ali.

O jantar começou bem animado. A comida estava ótima e todos estavam bem humorados. Huaru passou boa parte do tempo falando a Karen sobre o que fariam no dia seguinte, o treinamento que iriam começar e Saba pediu para Luxuriah ajudá-la a treinar com arco e flecha. Tewdric estava decidido a tirar o máximo de sorrisos possíveis de Ash, por isso fazia brincadeiras com a elfa durante todo o tempo. Vivithi contou as últimas fofocas de Luaprata e Kassyeh estava satisfeita que todos estavam comendo bastante o jantar que ela fizera.

- Então, Lady Liadrin gosta de elfos mais jovens... - Luxuriah estava adorando as fofocas -Eu já desconfiava que ela era chegada em um escudeiro...

- O mais novo amante dela deve ter quase a idade da Ash. - Vivithi soltou uma risada - Bem que ela tenta disfarçar, mas não se aguenta...

- Será que vocês podem deixar essa conversa para depois? - reclamou Kassyeh - Temos crianças na mesa.

- Não falamos nada demais, só que existem elfas que gostam de jovenzinhos, como tem elfas que gostam de orcs e sofás... - alfinetou Luxuriah.

- E taurens e cama de irmãs. - respondeu a maga.

- Mas não juntos. - provocou a outra.

- Do que vocês tão falando? - quis saber Karen.

- Nada querida, apenas coma. - Kassyeh baixou a cabeça para não encarar nem Vivithi nem Luxuriah que estavam às gargalhadas - Você e Saba estão comendo pouco.

- É que nos empanturramos de doces e chá. - revelou a pequena orquisa.

- Devem ter gastado todo seu dinheiro Kass. - disse Ash franzindo a testa - Gastado com um monte de besteiras.

- Não gastamos não! - protestou a elfa mais jovem - Tá tudo aqui, ó.

E colocando a mão no bolso da calça, tirou todas as moedas que Kassyeh tinha lhe dado mais cedo e colocou em cima da mesa.

Kassyeh estranhou e Luxuriah mais ainda. A maga contou rapidamente as moedas e viu que realmente nada foi gastado.

- Como vocês se empanturraram de comida se não gastaram nenhuma moeda? - perguntou Kassyeh preocupada.

- A gente comeu de graça com o lorde regente. - respondeu alegremente Karen. - Lá na Torre Solfúria.

- E passeamos na torre também! - completou Saba.

Luxuriah e Kassyeh pararam de comer imediatamente e se olharam. A preocupação, que abandonara Luxuriah até aquele momento, voltou com força total e agora era compartilhada por Kassyeh. Vendo o olhar da irmã endurecer, Kassyeh achou que as coisas não estavam claras suficientes, então perguntou:

- Meninas, vocês devem estar confundindo o lorde regente com alguém...

Karen pareceu ofendida.

- E eu também confundiria a Torre Solfúria? - replicou magoada e depois choramingou - Você acha que estou mentindo?

- Não estamos não! - defendeu Saba vigorosamente

- Claro que não estão minhas queridas! - apressou-se em dizer a maga e aplacar a mágoa das meninas - Só que... - ela olhou rapidamente para Luxuriah antes de continuar - Que tal explicarem melhor?

E foram o que elas fizeram. Animadamente, Karen e Saba passaram a contar a história daquela tarde. A reação despreocupada de Lor'themar Theron diante da suposta invasão da torre pelas meninas as fez pensar que as irmãs mais velhas também achariam tudo engraçado. Todavia, o que o relato despertou em Kassyeh, Luxuriah e também em Vivithi foi perplexidade. Luxuriah fechou as mãos com força e respirou fundo, na tentativa de se controlar. Quando o relato das meninas citaram os guardas pessoais do lorde regente vindo deixá-la, a caçadora cruzou as mãos em cima da mesa e presenteou as meninas com um sorriso imenso.

- Nossa, o lorde regente foi muito simpático com vocês! -o sorriso dela era gélido, mas apenas os mais velhos perceberam - Ele foi assim desde o princípio?

- Na verdade não. - quem falou foi Saba - Ele parecia irritado, mas aí falou com a Karen e ficou superlegal!

- E o que ele falou com você querida? - perguntou Luxuriah com o mesmo sorriso preso nos lábios.

- Se eu era filha de papai e mamãe e sobrinha do titio Tatá. - revelou a menina - Ele disse que gostava muito do papai e provavelmente ele iria rir muito do que a gente fez!

- E ele contou um monte de histórias sobre o pai da Karen também! - concluiu a pequena orquisa.

As meninas não perceberam que a tensão se instalou na mesa após suas palavras. Elas continuaram falando sobre a conversa que tiveram à tarde, enquanto Luxuriah mantinha o sorriso congelado em sua face. Vivithi estava perplexa. Era esse o motivo do bom humor de seu tio?

- O que mais vocês conversaram? - perguntou Kassyeh tentando parecer o mais relaxada possível.

Quando a atenção de Karen e Saba foi transferida para a maga, Vivithi rapidamente voltou sua atenção para a amiga.

- Lux... - sussurrou a patrulheira tensa - Eu juro que eu não sabia disso!

- Eu sei Vivithi. - o sorriso gélido ainda não havia abandonado-a - Você parece tão surpresa quanto eu.

- Por que toda essa tensão? - quis saber Huaru - Não foi apenas uma visita inocente?

- No dia em que Lor'themar Theron fizer alguma coisa inocentemente eu sou uma humana! - Luxuriah franziu a testa - Tem a ver com os documentos. Com meu pai. - e dando uma longa olhada em Vivithi, acrescentou - E com o rei.

Vivithi ficou petrificada.

- Lux...

- Você está inocente nisso, não se preocupe. Você não me disse absolutamente nada, nem eu forçaria. Mas sua cara não nega Vivithi, há alguém relação entre eles. - e afastando o prato falou em voz alta - Kass, cadê a sobremesa?

- Sirvo assim que as meninas comerem as verduras.

Karen e Saba protestaram, mas por fim comeram as verduras. Quando todos limparam os pratos, Ash e Huaru ajudaram Kassyeh a retirar a mesa e servir a sobremesa. Luxuriah, apesar do pedido, comeu pouco. Sua cabeça estava em outro lugar e seu estômago se apertara. Não iria aguentar aquela intromissão do lorde regente. Ele fora longe demais ao expor sua irmã caçula, uma criança, àquela situação. Não sabia o que ele pretendia ou quais suas intenções, mas iria logo saber.

Pois iria procura-lo naquela noite.

Assim que terminou a sobremesa, Luxuriah pediu licença e saiu para seu quarto. Chegando lá, mudou rapidamente de roupa, trocando as peças confortáveis de linho que usava em casa pelo seu uniforme de malha mais recente. Se ia enfrentar o Lor’themar Theron, queria se sentir preparada para um conflito. Uma batida na porta a avisou que sua intenção não passou despercebida.

- Entre. – respondeu.

Huaru, Kassyeh e Vivithi entraram. Luxuriah franziu as sobrancelhas.

- E a discrição? – perguntou aborrecida calçando as botas.

- As meninas estão entretidas com Tewdric. – disse sua irmã – O que vai fazer Lux?

- Tirar satisfações com Lor’themar Theron.

- Por que não espera para amanhã? – perguntou Vivithi preocupada – Ele estará te esperando.

- Por isso vou hoje. – Luxuriah se levantou e verificou sua aparência. Parecia alguém pronta para uma luta. Perfeito. – Quero pegá-lo desprevenido. Quero saber por que ousou meter Karen nessa história. Ele está tão desesperado para nos ver que usou uma menina? Então vai ter o que quer. Eu vou lá.

Huaru se aproximou, e pegou na mão dela.

- Quer que eu vá com você bebê? – se ofereceu. Com certeza ele devia estar temeroso com todo aquele brilho de raiva em seus olhos.

- Não Hu. Vou enfrenta-lo sozinha.

- Eu deveria ir. – disse Vivithi – Minha presença pode ajudar.

- Não, não quero que ele pense que você me contou alguma coisa. Fique aqui até eu voltar. Assim ele saberá que você não tem culpa nessa história.

Estava claro que Luxuriah não iria aceitar a interferência de ninguém e que queria resolver tudo sozinha.

- Leve uma capa. – Kassyeh aconselhou e já se adiantou no closet dairmã. Pegou uma capa e envolveu a caçadora – Pode ser que esfrie.

- Obrigada Kass. – e suspirando pegou o arco, a aljava e se dirigiu a porta.– Não deixe as meninas dormirem tarde.

- Certo. – e acompanhando a irmã para fora, perguntou já no corredor – Quer que eu faça mais alguma coisa?

Luxuriah assentiu.

- Sim. -e apertou os olhos antes de falar – Vista uma calcinha, sua depravada!

Os risos de Huaru e Vivithi acompanharam Luxuriah até a saída. Kassyeh olhava transtornada para baixo, tentando ver se dava para perceber através do vestido a falta da roupa de baixo. E deixando o ambiente mais leve, a caçadora saiu.

Antes de encontrar o lorde regente e encará-lo, Luxuriah pensou em fazer uma caminhada até a Torre Solfúria. Porém, mudou de ideia quando passou ao lado do estábulo. Seu falcoztruz, Debonzi, de penas negras e vermelhas não a carregava desde que viajara para Kalimdor. A caçadora percebeu que sentia falta da ave e quando tocou o bico dele viu que a saudade era recíproca.

- Oi Debonzi! – disse sorrindo – Vamos dar uma cavalgada noturna?

O falcoztruz soltou um pio de aprovação e se inclinou para que a dona pudesse subir. Em instantes estavam correndo velozmente pelas ruas de Luaprata e Luxuriah agradeceu mentalmente Kassyeh por tê-la envolto em um manto. A noite estava fria e uma leve névoa pairava sobreo ar. Enquanto sua montaria ganhava velocidade e vencia a distancia, a caçadora achou ter visto dois ou três patrulheiros de elite pelo caminho, aos arredores de sua casa. Ficou em alerta por um momento. Estariam elas sendo vigiadas? Contudo, sacudiu a cabeça e expulsou aquele pensamento. Achou que estava com complexo deperseguição e não deu atenção àquela sensação estranha de ser observada.

A vontade de Debonzi de cortar o ar da noite com sua dona logo os levaram à frente da Torre Solfúria. Luxuriah apeou, coçou o as penas da cabeça do falcoztruz e sussurrou:

- Me espere aqui, certo?

Debonzi deu um pio longo de afirmação e pôs-se a beber grandes goles de água da fonte em frente à torre. Luxuriah não precisava se preocupar em amarrar sua montaria; ele sabia muito bem que bastava aguardá-la ali mesmo.

Enquanto se encaminhava para a entrada da torre, a caçadora olhou bem para os guardas, como se os desafiasse a detê-la como fizeram com Karen e Saba. Contudo, ela não era uma criança brincando. Apesar de ser extremamente jovem para os padrões de sua raça, as circunstâncias a fizeram ingressar em um mundo que tradicionalmente só se abriria para ela em pelo menos cinco décadas. Contudo, antes mesmo de completar a terceira, já provocava medo e respeito por onde passava.

Logo que entrou na torre, viu Halduron conversando com um patrulheiro, justamenteum dos que vira pelo caminho até ali. E quando ele levantou a cabeça e a olhou, sem demostrar surpresa por vê-la ali, Luxuriah teve certeza que não fora afinal uma impressão. Aparentemente os patrulheiros estavam realmente seguindo-a e relataram sua chegada ao seu superior.

Incrivelmente o fato não a deixou com raiva, muito pelo contrário. Ficou feliz por seu instinto se provar mais uma vez correto e também por ter mais uma coisa para cobrar explicações a Lor’themar Theron. Quando ela se aproximou e tirou o manto que a envolvia, Halduron dispensou o patrulheiro com um aceno e fez uma reverência.

- Lady Luxuriah. – disse formalmente.

- Me poupe Halduron. – disse ríspida – Você sabe que eu detesto essas formalidades. – e sorrindo maliciosamente, acrescentou – E eu já te vi sem roupa, então acho que temos intimidade o suficiente para dispensar certas coisas.

A face de Halduron ficou muito rubra e Luxuriah gostou de tê-lo tirado de sua posição de conforto. O chefe dos patrulheiros foi um de seus primeiros amantes, e também um dos primeiros a serem cortados de sua vida, há alguns anos atrás.

- Bem... – ele pigarreou, procurando restaurar sua tranquilidade – Em que posso ajuda-la, Luxuriah?

Ela apertou os olhos.

- Não se faça de desentendido Halduron. – sua voz era rude, e ela não se importou – Ambos sabemos por que estou aqui. Vim falar com o lorde regente.

Halduron arqueou as sobrancelhas.

- Veio solicitar uma reunião? – indagou educadamente.

- Não. Vim falar com ele. Agora. – e levantando o queixo desafiadoramente, concluiu - Chame-o.

Ele bem que poderia simplesmente não atendê-la, afinal, Luxuriah ainda não era oficialmente uma princesa e em muitos aspectos era sua subordinada. Contudo, havia um brilho letal nos olhos dela que não passou despercebido pelo experiente patrulheiro. Luxuriah iria até Lor’themar naquele momento, mesmo que tivesse que passar por cima dele.

- Irei chamá-lo. – informou.

- Não é necessário.

Lor’themar apareceu no alto da escada do salão naquele momento. Já estava se preparando para recolher-se aos seus aposentos quando um dos patrulheiros o avisara que a elfa estava ali e não parecia muito satisfeita. Aquilo não o surpreendeu afinal. Karensky com certeza relatara sobre a tarde para a irmã mais velha, que fora até ali tomar as devidas satisfações. Não era, afinal, o que ele queria? Estar de frente à provável futura rainha de Quel’thalas?

- Luxuriah. – disse em tom ameno ao descer as escadas. Ele sabia que ela tinha tanta relutância em aceitar seu título nobre quanto seu pai tivera – Que surpresa. Eu só a esperava amanhã.

- Duvido muito de sua surpresa, lorde regente. – retrucou secamente - A julgar pelos patrulheiros cercando minha casa e sua atitude tão gentil com minha irmã, você deveria esperar que eu batesse à sua porta mais cedo.

Logo Lor’themar estava de frente à jovem. Os olhos dela estavam cintilantes de raiva.

- Creio que posso esclarecer todos os fatos, Luxuriah. – tentou parecer despreocupado – Acompanha-me até minha sala?

Luxuriah apertou os olhos, mas não disse nada. Halduron olhava de um para o outro, sem saber se oferecia-se para acompanha-los ou não. Tinha a leve impressão que talvez precisasse segurar a elfa e impedi-la de atentar contra a vida do lorde regente. As mãos dela apertando o cabo do arco deixavam claro que ela considerava seriamente realizar a atitude. O lorde regente percebeu a relutância de Halduron e então se dirigiu a ele.

- Seus serviços não são mais necessários hoje, Halduron. Pode retirar-se.

Halduron relutou um pouco, mas depois se curvou solenemente.

- Sim, meu lorde. - e mesmo diante do olhar gélido de Luxuriah, ele também se curvou diante dela – Milady. – e só então se retirou.

- Ele fez de propósito. – sibilou Luxuriah.

- Halduron não está errado, Luxuriah. – Lor’themar disse serenamente – Você é uma nobre, mesmo que não goste do título.

Luxuriah franziu a testa e estava pronta para argumentar quando Lor’themar acenou com a cabeça em direção às escadas. Achando melhor não adiar mais aquela conversa por causa das bobagens de Halduron, a caçadora seguiu o lorde regente. Eles caminharam por um corredor até chegarem à sala que ele usava como escritório. Lor’themar abriu a porta e fez um gesto educado para que ela entrasse primeiro. Luxuriahfingiu não ver, mas entrou mesmo assim.

A sala era muito luxuosa, como tudo que envolvia os elfos sangrentos. Havia uma belíssima mesa de carvalho vermelho no centro, onde dúzias de pergaminhos se acumulavam. A cadeira era de espaldar dourada e ao lado um pequeno suporte que levitava magicamente continha frascos de tinta. As estantes giravam displicentes nos cantos da sala e uma leve brisa entrava pela varanda, agitando as cortinas de seda. Luxuriah achou o lugar formal, mas aconchegante.

- Sente-se, por favor. – Lor’themar indicou uma cadeira em frente a sua mesa – Gostaria de beber algo?

- Não quero sentar nem beber. – respondeu secamente – Quero respostas.

Lor’themar se dirigiu à sua cadeiracalmamente, mas não se sentou.

- Eu preferiria que você sentasse. Temo que as explicações demorem um pouco.

Luxuriah continuou em pé, como se ele não tivesse dito nada.

- Pois bem. – disse o lorde regente colocando as mãos sobre a mesa – Achamos documentos referentes à sua família, entre os documentos reais. – começou.

- O que coisas da minha família estavam fazendo entre documentos reais? –questionou.

- Eu me perguntei a mesma coisa quando vi isso. – Lor’themar abriu a gaveta de sua mesa e tirou um livro. Luxuriah, porém, logo viu que não era um livro, mas sim um diário. Ele era vermelho, com detalhes dourados e tinha escrito na capa, com uma letra elegante, os dizeres “LuellyFendessol”.

O coração de Luxuriah começou a bater mais rápido e as pernas dela estremeceram quando Lor’themar lhe estendeu o diário. A caçadora sentou-se pesadamente na cadeira anteriormente oferecida e pegou o pequeno volume, com as mãos trêmulas.

- Devo me desculpar de antemão por ter invadido a intimidade de sua avó. Mas foi necessário.

Aquelas palavras tiraram Luxuriah de seu torpor.

- Você leu o diário?! – questionou ríspida – Com que direito?

- Com o direito de lorde regente, já que este diário estava entre documentos oficiais e podia conter respostas que eu procurava. – respondeu firme, mas educado.

- Como assim? – a voz dela se tornou mais alta e ela se levantou – Que tipo de questões tão importantes você teria para encontrar no diário pessoal de minha avó?!

Lor’themar parecia não se abalar com a fúria da jovem à sua frente.

- A paternidade de seu pai. – respondeu simplesmente – E de acordo com este documento, - ele exibiu o pergaminho com o selo real de Luaprata – Dhomm era filho do rei AnasterianAndassol.

Levou alguns segundos para que Luxuriah conseguisse digerir o que Lor’themar dizia. Quando finalmente compreendeu, sentou-se novamente na cadeira, agora perplexa. O lorde regente lhe entregou o pergaminho, e a caçadora o leu avidamente, uma, duas, várias vezes. Parecia não querer acreditar no que dizia aquelas linhas.

- Este documento estava dentro do diário. – explicou Lor’themar – Por isso nunca foi achado. – e vendo que Luxuriah não respondeu, sentiu-se tentado a continuar as explicações – Eu sinto muito por violar o diário de Lady Luelly, mas quando eu vi que um falcoztruz branco havia nascido...

- Um falcoztruz branco nasceu?! – Luxuriah sabia muito bem o significado daquilo. Ela mesma sonhara possuir um exemplar daquela magnífica criatura quando criança, mas seu pai lhe dissera que eles nasciam apenas para servir os herdeiros do trono.

- Sim, nasceu. – confirmou.

Ele caminhou até uma das estantes, sendo acompanhado pelo olhar de Luxuriah e pegou uma das garrafas. Depois, voltou a sua mesa e encheu duas taças, oferecendo uma delas à jovem. Dessa vez, ela não negou e tomou avidamente o líquido, como se quisesse empurrar as palavras do lorde regente pela sua garganta.

- Um falcoztruz branco nasceu. – repetiu Luxuriah - Esse tinha sido o motivo da visita aos documentos reais?

- Não só uma visita, uma busca minuciosa. Eu sabia que lá devia haver uma resposta. Afinal, todos nós julgávamos a linhagem Andassol extinta. Mas aparentemente, a Nascente do Sol sabia que isso não era verdade.

Eles se encararam um momento e Luxuriah desviou a vista para o diário.

- Mamãe disse que havia escondido o diário da vovó para que o papai não o queimasse. – revelou a jovem – Ele não queria saber quem era seu pai.

- Eu sei. – Lor’themar encheu a taça dela de novo – Ele me contou.

A caçadora estava numa situação delicada agora. Fora até ali pronta para questionar muitas coisas, até mesmo a lembrança que o rei Anasterian bloqueara de sua mente. Não negava que chegara a suspeitar que o rei poderia ser seu avô, mas aquela ideia lhe pareceu tão absurda, que a deixou para lá. Mas no final, era verdade. O amante que abandonara Lady Luelly e seu filho, séculos atrás, era mesmo o bondoso e amado rei de Quel’thalas.

Luxuriah se arrependeu das lágrimas que derramou no dia de sua morte, e desejou que ele estivesse sofrendo no inferno naquele momento.

Aparentemente Lor’themar esperava que ela dissesse alguma coisa, mas Luxuriah realmente não sabia o que dizer. Por isso, tomou novamente o vinho da sua taça, recostou-se na cadeira e abriu o diário. Precisava ver com seus próprios olhos o que o lorde regente afirmara. Lor’themar não se opôs à atitude dela, sentou-se em sua cadeira, cruzou os braços e esperou.

As horas passaram enquanto Luxuriah passava as folhas do diário.
Sua expressão era impassível e Lor’themar se perguntava o que poderia estar passando na cabeça da jovem. Não dava para saber. Lamentava ter que jogá-la naquele turbilhão, pois a menina já tinha traumas e problemas demais. Mas era necessário.

Enquanto virava as páginas, um envelope lacrado caiu em seu colo. Luxuriah o pegou e o olhou. Era uma carta selada e o envelope trazia os seguintes dizeres: “de Luelly para meus netos e netas.” Carinhosamente, repôs o envelope entre as páginas, respirou fundo e retomou a leitura.

Luxuriah não leu o diário todo. Em determinado momento, ela simplesmente o fechou. Levantou-se sem dizer nada e caminhou para a saída. Lor’themar a observou, confuso.

- Luxuriah! – chamou se levantando – Precisamos...

Mas ele não terminou a frase. Luxuriah levantou um dedo em riste, um sinal para que ele parasse.

- Não Lor’themar. – disse friamente – Hoje não.

- Mas Luxuriah...

- Eu disse não! – gritou. E depois, baixando o tom de sua voz, completou acidamente – E de acordo com isso aqui – apontou o diário – você tem que me obedecer.

E sem mais uma palavra, saiu.

Lor’themar suspirou e voltou para sua cadeira. Estava preocupado, mas ostentava um sorriso no rosto.

Luxuriah poderia não ter consciência, mas já assumira o papel de princesa.

 

 

*************************

- Deixe-me ver se vocês realmente escovaram os dentes. – ordenou Kassyeh seriamente.

Saba e Karen abriram as bocas, mas não conseguiram conter as risadas enquanto eram examinadas atentamente por Kassyeh. Quando viu que elas realmente tinham escovado os dentes, ficou satisfeita e apontou para a cama.

- Cama, agora, as duas.

As meninas reclamaram, mas foram para a cama. Depois do jantar, elas tinham brincado com Tewdric até a exaustão e agora se preparavam para dormir. Saba iria ficar no quarto de Karen, apesar da afirmativa que a menina poderia ficar sozinha em um dos quartos de hóspedes. Mas a pequena orquisa preferia partilhar a companhia de Karen naqueles dias e agora se acomodava com a elfa na cama grande de dossel.

O quarto de Karen era parecido com o de Ash, com tons de lilás e diversas bonecas em aparadores pelas paredes. Anteriormente havia um berço no lugar da cama, mas logo que Karen estava grande o suficiente para não precisar mais dele, suas irmãs lhe deram uma cama bem grande, como ela pedira. E era nela onde agora as duas meninas se acomodavam, uma do lado da outra.

Saba vestia uma das camisolas de Karen, enquanto a pequena elfa preferira dormir usando uma camisa de Tewdric que praticamente arrastava no chão. Kassyeh fizera tranças nas meninas e agora as cobria com uma pesada manta.

- Querem que eu acenda a lareira? – perguntou depois de colocar mais uma manta sobre Saba.

- Não precisa,ta quentinho! – disse a pequena orquisa se aconchegando.

- Se ficar frio demais, eu te chamo! – garantiu Karen.

- Certo, chame mesmo. – e olhando as meninas deitadas, perguntou – Querem uma história antes de dormir?

Elas negaram com a cabeça.

- Música! – exclamaram em uníssono.

Kassyeh riu, sentou-se na beira da cama e cantou para elas. Não demorou muito e logo as meninas caíram num sono profundo, exaustas com as diversões daquele dia. Mesmo assim, Kassyeh cantou a música até o final, e depois depositou um beijo na testa de cada uma. Levantou-se, verificou se as janelas estavam bem fechadas, puxou as cortinas, apagou a luz as janelas e por fim, saiu do quarto.

De lá, foi o quarto de Ash, que também já estava deitada, mas ainda estava acordada.

- Pensei que já tinha dormido. – disse Kassyeh se aproximando da cama da irmã e sentando.

- Com aquelas duas gritando aí do lado não dava para dormir.

A maga riu.

- Elas se acalmaram agora, então você logo vai adormecer. – e passando a mão nos cabelos da irmã, perguntou – Quer que eu cante para você?

- Não sou mais criança, Kass. – reclamou Ash, mas sem muita convicção. Queria sim uma cantiga de ninar, mas não queria que a irmã pensasse que ela era uma criançona.

Percebendo a relutância da irmã em aceitar a canção, mesmo que quisesse, Kassyeh mudou de tática.

- Então, você deixa que eu cante para você? – pediu singelamente – Estou com vontade de ninar um pouco minhas irmãs...

- Claro! – respondeu Ash um pouco rápido demais.

Kassyeh não riu, apesar da vontade de soltar uma risada diante da reação da irmã. Apenas começou a cantar a mesma música que cantara para Karen e Saba. Ash deixou-se levar pela voz melodiosa da irmã e logo dormiu também. A maga então fez o mesmo procedimento de verificar as janelas e cobrir a irmã e lhe aplicar um beijo na testa. Depois, saiu do quarto.

No corredor, sozinha, Kassyeh se encostou à parede e levou a mão ao ventre. Será que já estaria grávida? Quando saberia? E se nunca pudesse ter filhos, sua sina seria apenas cuidar daqueles a quem não dera a luz? Bem, não era hora de pensar naquilo. Havia problemas a serem resolvidos e tinha que manter sua mente focada neles, em ajudar Luxuriah e não apenas em seus desejos pessoais.

Desceu então as escadas e foi para sala. Lá estavam Vivithi, Huaru e Tewdric, tomando o chá que ela deixara pronto antes de subir para colocar as crianças na cama. Huaru e Tewdric discutiam sobre a ida de Luxuriah à Torre Solfúria, enquanto Vivithi mantinha-se em silêncio, visivelmente em conflito consigo mesma.

- Entendo você. – disse o orc para a patrulheira – Ficar entre a lealdade a um amigo e a lealdade a uma causa.

- Não se culpe moça. – aconselhou o tauren – Lux com certeza entendeu seu lado.

- Eu realmente gostaria de esclarecer a vocês o que está acontecendo. – reclamava Vivithi – Acho que me arrependo de ser eu a lidar com isso.

- Discordo. – Kassyeh se dirigiu ao sofá, sentou-se ao lado de Tewdric e se serviu de chá – Se Lux fosse escolher alguém para guardar um segredo nosso, seria você.

Vivithi deu um pequeno sorriso.

- Espero que ela continue pensando assim quando voltar da conversa com meu tio. – e suspirando, se levantou – Tenho que ir, está ficando tarde.

- Por que não fica? – perguntou Kassyeh – Você pode ficar em um dos quartos de hóspedes.

- Gostaria muito, mas acredito que quando Luxuriah chegar vai querer privacidade. Obrigada pela janta Kass. – e olhando para os machos, disse – Até mais rapazes.

A maga acompanhou a amiga até a porta, onde trocaram mais algumaspalavras. Quando ela retornou, Tewdric se levantou e se espreguiçou.

- Acho que a Lulu vai demorar. – disse – É melhor a gente ir deitar Kass.

- Não sei se vou conseguir dormir. Estou angustiada.

- Fique tranquila. – falou Huaru sem se levantar – Eu espero o bebê voltar. E se ela não estiver bem, chamo vocês dois.

Kassyeh ainda hesitou um pouco, mas o olhar calmo e tranquilo de Huaru a fez assentir. E antes que ela percebesse o que estava acontecendo, Tewdric a levantou rapidamente e a pôs no ombro. Ela deu um gritinho de surpresa e depois caiu na risada, sendo acompanhada por Huaru. O orc deu uma tapinha no traseiro da sua elfa, e disse animadamente:

- Não se preocupe Kass, farei você não pensar em nada essa noite.

A maga enrubesceu e olhou para o chão atentamente. Huaru apenas ria e não fez nenhum comentário. Tewdric então subiu as escadas rapidamente, pulando dois degraus de uma vez e logo se ouviu uma porta sendo trancada e risadas abafadas escapando por entre as frestas.

Huaru se levantou e foi até uma grande janela que ficava ao lado da escada. Lá fora, um mundo bem diferente do dele, muito mais pomposo e suntuoso. Apesar da mansão e do amor ao povo, ele não achava que Luxuriah combinasse com aquilo tudo. Ela sem dúvida parecera bem mais feliz no meio da floresta. Talvez os elfos sangrentos, diferente dos elfos noturno, pudesse se sentir a vontade nos dois ambientes: nas florestas e em sua esplêndida cidade. Mas não negava que preferia vê-la entre as árvores de Mulgore que ali, entre os pilares de Luaprata.

Bem, o que ele pensava sobre isso não importava. Ele era um Andarilho do Sol, iria onde fosse necessário. E naquele momento, era ao lado de Luxuriah que era deveria ficar.

Voltou para o sofá e se serviu de um pouco mais de chá. Kassyeh havia providenciado uma xícara grande o suficiente para não parecer um brinquedo em suas mãos e era grato por isso. A maga tinha uma sensibilidade muito grande. Tomou um gole da bebida fumegante e pensou no dia em que vira Luxuriah pela primeira vez. Os olhos tristes que ela ostentava mexeram com sua alma de uma forma como nunca ocorrera antes. Sentiu uma necessidade tremenda de protegê-la, cuidá-la... O sentimento fora tão estranho e devastador que procurara seu mestre, Taruu, e falara sobre aquilo. A resposta que ouviu foi:

- Faça o que seu coração mandar.

E ele ouvira. E estava ali, do outro lado do mundo, no meio da capital sin’dorei, com uma xícara nas mãos, enquanto esperava a volta de seu bebê.

Sim, ela era dele. Como ele se sentia dela.

O tempo passou, o chá esfriou, mas Huaru continuou sentado à espera de Luxuriah. Já estava para ir em busca dela quando a porta da frente abriu-se repentinamente. Luxuriah entrou e Huaru rapidamente se levantou. Ao vê-lo ali parado à sua espera, a caçadora arregalou os olhos, surpresa, e se dirigiu até onde ele estava.

- Pensei que já estivesse dormindo. – disse com a voz rouca. – Não devia ter me esperado.

Huaru arqueou as sobrancelhas.

- O que aconteceu? – e vendo que ela estava sem capa e tremia, passou as mãos pelos braços dela – Onde está sua capa? Você está gelada!

- Acho que perdi no caminho. – ela não lembrava. Não lhe ocorreu nenhuma ideia que não fosse chegar em casa o mais rápido possível, e sequer havia notado o frio – Isso não é importante.

- Claro que é! – ele a abraçou, passando as mãos por suas costas, na tentativa de passar seu calor para ela. Deve ter funcionado, pois Luxuriah parou de tremer e se agarrou a ele.

- Onde está Kassyeh? – perguntou ainda abraçada ao jovem tauren.

- Dormindo. Ou não. Ela e Tewdric foram para o quarto há algum tempo.

Luxuriah se desvencilhou do abraço dele.

- Preciso falar com ela. – disse com tom de urgência e se dirigindo às escadas – Isso não pode esperar para amanhã.

- O que aconteceu bebê? – quis saber ele, preocupado, subindo logo atrás dela.

- Descobriram a paternidade de meu pai Huaru. – revelou com a voz amarga.

- E?

Luxuriah parou no alto da escada e se virou para ele.

- Parece que meu pai pertencia à realeza que tanto desprezava. – e se virando, continuou o caminho até o quarto da irmã.

O paladino ficou sem entender, mas sabia que Luxuriah explicaria melhor quando trouxesse a irmã. Só não sabia se Tewdric ficaria feliz por isso.

A caçadora não perdeu tempo e foi logo girando a maçaneta daporta. Huaru ficou feliz pelo casal ter se trancado, pois assim não seriam surpreendidos em nenhum momento constrangedor. Luxuriah, todavia, pensava o contrário, pois ficou furiosa e socou com força a porta.

- Tewdric! Saia de cima da minha irmã, eu preciso falar com ela!

Houve um burburinho do outro lado e poucos instantes depois a porta foi entreaberta. Kassyeh vestia um robe de seda, visivelmente constrangida, com os cabelos bagunçados e o rosto muito vermelho.

- Lux! Que bom que você...

Mas a maga não terminou a frase, pois a irmã empurrou a porta e entrou como furacão no quarto. Huaru, confuso, a acompanhou. Tewdric, que estava completamente nu na cama, teve a decência de colocar um travesseiro sobre sua nudez, e pela primeira vez, estava constrangido. Com certeza isso se devia pela presença de outro macho no ambiente.

- Pô Lulu! – reclamou o orc – Estamos tentando fazer um bebê aqui!

Kassyeh colocou as mãos no rosto, tomada pela vergonha. Em outra ocasião a caçadora teria rido e soltado uma piada sobre a situação, mas não naquele momento. Tirou de dentro do colete o diário de Lady Luelly e a carta do rei Anasterian. Sem dizer uma palavra, passou os documentos para a irmã, que os observou, sem entender.

- Leia a carta real. – disse Luxuriah.

Foi o que Kassyeh fez. E ao ler, sentiu suas pernas fraquejarem e rapidamente procurou a cama, onde sentou pesadamente. Como Luxuriah fizera na sala de Lor’themar, leu várias vezes para ter certeza e depois encarou a irmã, perplexa.

- Papai era filho do rei Anasterian? – falou sem acreditar no que dizia.

- Pelo visto, era sim.

A maga continuava boquiaberta.

- Então... Isso faz de nós...

- Isso mesmo. Princesas. – respondeu friamente Luxuriah.

Huaru arregalou os olhos, tomado pelo espanto. Olhou para Tewdric e o orc ostentava a mesma expressão perplexa.

Princesas?

- Kass... – Tewdric engatinhou para onde estava a esposa, segurando o travesseiro entre as pernas – Como assim princesa? Tipo, princesa que vira rainha?

- Acredito que sim... – murmurou ela ainda segurando a carta – O lorde regente está certo disso Lux?

- Está. – a caçadora se pôs a andar de um lado para o outro – O diário da vovó comprova também. - e respirando fundo, parou e passou as mãos pelos cabelos, angustiada – Por isso Vivithi foi nos buscar! Por isso todo o carinho com Karen! Por isso os patrulheiros vigiando a casa!

- Como assim? – Kassyeh levantou-se rapidamente e foi até a janela. Olhou para baixo e depois puxou as cortinas – Tem patrulheiros nos vigiando?

Luxuriah fez que sim.

- Como eles descobriram isso? – Huaru não estava gostando do rumo da conversa. Não sabia como funcionava a forma de governo dos elfos sangrentos, mas se fosse parecida com a dos taurens, elas tinham o direito de governar Luaprata, logo, fazia sentido as ações de Lor’themar Theron – Você disse que nunca souberam quem foi seu avô e de repente isso surge...

- Um falcoztruz branco nasceu. – revelou finalmente.

Para o guerreiro orc e o paladino tauren, aquela informação parecia totalmente sem sentido. Uma montaria nasceu da cor branca. Que importância haveria o fato naquela conversa? Kassyeh, ao contrário, sabia exatamente o significado do acontecimento. Voltou para a cama, sentou-se novamente e fitou o chão. Parecia em choque.

- Pela Nascente do sol... – murmurou – Um falcoztruz branco... - seus pensamentos giraram e encontraram a única lógica plausível naquele momento - O lorde regente quer que sejamos princesas?

- Aparentemente, esse é o plano. – e fitando a irmã completou – Ele quer princesas... E talvez uma rainha.

As irmãs se encararam um tempo e Kassyeh compreendeu o motivo da falta de expressão no rosto de sua irmã.

- Ele quer que você seja rainha?! – indagou perplexa levantando-se e se dirigindo à irmã – Ele te pediu isso?

Luxuriah deu de ombros e cruzou os braços.

- Não diretamente, mas acredito que é essa a intenção. - falou com a voz gélida.

- Onde entra o falcoztruz branco nessa história afinal? – perguntou Tewdric exasperado.

Com paciência, Kassyeh se voltou para seu marido e explicou tanto a Tewdric quanto a Huaru sobre o nascimento daquela criatura. Falou resumidamente sobre a história do príncipe Kael’thas, que ambos já conheciam, mas que ajudou a ligar os pontos da história. Enquanto isso, Luxuriah apenas andava de um lado para o outro semfalar nada. A maga também resumiu a história de seu pai e de sua desconhecida paternidade. Conseguiu tirar um pouco das dúvidas dos machos, mas Tewdric continuava angustiado. Algo naquela história não o agradava. Mas foi Huaru quem colocou o desconforto em palavras.

- Então... Se vocês são princesas... E talvez virem rainhas... Vão ter que casar com elfos, certo?

Houve um momento de silêncio. Tewdric estava sentado, mas de repente o mundo pareceu ter fugido de seus pés. Sua Kass... Com outro? Ser princesa a obrigaria a casar com um elfo? Por um instante, imaginou-se sem sua pequena elfa e percebeu que simplesmente não poderia existir sem ela. Nuncativera família ou lar. Kassyeh era tudo que tinha naquele mundo de dor e ódio. A única coisa boa que acontecera em sua vida. Ela se tornara sua razão de viver e um motivo realmente justo pelo qual morrer. Pensar em ficar sem seu abraço, seus lábios vermelhos como sangue, seu cheiro adocicado e sua voz melodiosa doía mais que qualquer ferimento de batalha.

Não. Ninguém iria roubar seu mundo.

Com esse pensamento, Tewdric soltou um rugido e pulou da cama. Ele agarrou Kassyeh, que estava de costas para ele encarando a irmã,pela cintura de modo possessivo como se um dragão imenso tentasse tirá-la dele. O orc nem reparou que o travesseiro caiu e expos sua nudez para todos.

- Ninguém tira minha Kass de mim! – gritou enfurecido – Ninguém! Nem que eu tenha que matar o mundo todo, ninguém tira minha elfa de mim!

- Tewdric! Calma! – pediu Kassyeh e se virando para ele colocou as mãos em seu peito, procurando acalmá-lo – Eu nunca vou deixar você! Por nada nesse mundo! – e segurando rosto dele entre as mãos, sussurrou – Eu prometo... Princesa ou não, eu sou sua... Não fique assim, tá?

Tewdric relaxou com aquelas palavras e a abraçou. Colocou a cabeça no ombro dela e deixou que Kassyeh o acalmasse.

Huaru e Luxuriah se encararam diante da cena. O jovem paladino podia não ter gritado, mas sentia a mesma dor exposta por Tewdric. Podia estar ali ao lado dela há pouco tempo, mas já não conseguia se imaginar distante. Luxuriah lhe despertava um sentimento forte de ternura, carinho, paixão e desejo.Pensar em voltar para Mulgore com a perspectiva de não voltar a vê-la mais a possibilidade de ela casar-se com qualquer outro que não fosse ele, fazia seu coração doer tanto que pensou que ele se rasgaria. Talvez, já estivesse se dilacerando com a mera presença da dúvida.

Luxuriah percebeu a dor nos olhos deles, bem como a mesma dúvida que explodira em Tewdric. Ela não disse nada, apenas caminhou até onde ele estava e segurou suas mãos. Depois, depositou um beijo singelo em seus lábios e encarou os olhos escuros. Huaru não precisou de palavras. Sabia que Luxuriah, como Kassyeh, não tinha pretensões de deixar aquele pergaminho se interpor entre os seus sentimentos.

Depois disso, a caçadora se voltou para sua irmã e seu cunhado, que ainda estavam abraçados. Ainda havia algo a ser dito.

- Temos que tomar uma decisão Kass. – falou com a voz controlada.

Kassyeh soltou-se do marido e virou-se para a irmã.

- Que escolha temos Lux? Se somos herdeiras do rei Anasterian,o trono é nosso direito.

- Pode ser nosso direito, mas não deixarei que se torne nossa prisão. – falou incisiva – Não fomos criadas para isso. Não temos culpa do erro do rei, que não assumiu seu filho, nem do príncipe Kael’thas, que se corrompeu. Não deixarei que nos imponham algo sem nos ouvir antes!

A outra elfa não precisou responder. Concordava com o ouvira e seguiria qualquer determinação que Luxuriah tomasse.

- Eu acho que vocês só devem tomar qualquer decisão quando conversarem com Ash e Karen. – falou Huaru de repente – É o destino delas também. Precisam ser avisadas e ouvidas.

- Ele tem razão. – Tewdric falou já mais calmo – Vocês devem decidir o que fazer juntas. – e com a voz mais ameaçadora, continuou – E se a decisão for partir aquele elfo caolho no meio, podem deixar que eu faço!

As risadas que seguiram a fala de Tewdric espantaram a tensão.

- É, vocês tem razão. Não dá pra decidir nada sem as meninas. – e suspirando, massageou o pescoço – Mas não hoje. Quero me deitar, esquecer isso. E também não quero continuar olhando para o passarinho verde de Tewdric.

Foi quando o orc percebeu que estava completamente nu na frente de todos há algum tempo. Pegou rapidamente o travesseiro e pôs na frente do seu membro. Kassyeh corou de vergonha pelo marido.

- Vamos Huaru. – chamou Luxuriah – Deixe esses dois fazerem o bebê deles. – e soltando uma risada, acrescentou – Imagine só, um meio-orc príncipe ou princesa!

- Será a realeza mais linda que esse povo já viu! – disse Kassyeh convicta, cruzando os braços e piscando para a irmã. Luxuriah piscou de volta antes de sair e fechar a porta.

- Bem, onde estávamos? – perguntou Kassyeh tirando o robe e jogando no chão, fazendo Tewdric sorrir e esquecer completamente os acontecimentos dos últimos minutos.

Lá fora, Luxuriah e Huaru se dirigiram para o quarto dela. Assim que entraram, ela começou a tirar a roupa e jogar pelo chão. Huaru a observou, ainda preocupado.

- Bebê – começou – o que posso fazer por você?

Luxuriah o encarou longamente, usando apenas a roupa de baixo.

- Me mostre os conselhos que seu irmão lhe deu. – disse simplesmente.

Huaru a olhou, um pouco surpreso com o pedido. Achou que depois de todo aquele estresse ela iria querer simplesmente se deitar e dormir agarrada a ele. Mas ela não parecia interessada em dormir. Ainda havia adrenalina correndo em suas veias e tudo que a caçadora desejava naquele momento era descarrega-la no corpo de Huaru. Caminhou até ele, tirando o resto das roupas e o beijou longamente. Logo o tinha despedido e o puxado até a cama. Precisava dele. Precisava dele naquele momento ou afundaria em desespero.

Beijaram-se longamente enquanto as mãos dele percorriam o corpo nu da elfa. Luxuriah gostava do toque macio dele. Apesar das mãos grandes e fortes, capazes de erguer um pesado martelo e lutar com fúria, a forma como a tocava era carinhosa e tenra.

- Beije-me... – suplicou Luxuriah – Beije todo meu corpo...

Huaru atendeu ao pedido. Deslizou a boca para o pescoço, e passou os lábios da orelha até o colo, fazendo Luxuriah arrepiar-se e se agarrar mais ainda nele. Logo estava sugando avidamente os fartos seios enquanto apertava sua cintura. Ela gemeu alto e passou os dedos entre os cabelos dele. Entendendo aquilo como um sinal que estava fazendo tudo certo, continuou com os beijos pela barriga, lambendo seu umbigo até chegar entre suas pernas. Luxuriah já esperava ansiosamente para senti-lo bem ali e ficou surpresa quando ele repentinamente se ergueu e sentou na cama.

- Vire. – disse com a voz rouca.

Luxuriah sorriu maliciosamente, já prevendo o que viria a seguir. Virou-se languidamente e ergueu o quadril na direção de Huaru. Apesar de nervoso, ele sabia exatamente o que devia fazer. Pelo menos na teoria. Abaixou-se, afastou um pouco as pernas dela, e passou a língua em sua intimidade. O prazer preencheu completamente o corpo de Luxuriah como o sol preenchia o céu após a madrugada. Se agarrando firmemente nos travesseiros, ela mordeu os lábios e deixou-se levar por aquela sensação. Huaru estava fortemente agarrado em seus quadris enquanto explorava seu sexo com a língua. Mesmo que estivesse apenas proporcionando prazer a ela, o paladino sentiu-se preenchido por um êxtase que não imaginava que existia. Sentia-se realmente um macho pela primeira vez, e aquela sensação só se agravava a cada novo gemido de Luxuriah. Quando não aguentou mais o latejar entre suas pernas, parou de fazer aquilo, ajeitou-se e a penetrou.

A sensação de tê-lo dentro de si era ainda maior naquela posição. Luxuriah mordeu os travesseiros para não gritar todo seu prazer e acabar acordando a casa toda. Enquanto isso, Huaru se sentia mais pleno do que nunca estivera antes. Ele arremetia para dentro dela, sentindo-a se fechar ao redor de seu membro e se contorcer de prazer, enquanto ele apertava seu quadril possessivamente, deixando as marcas de seus dedos na pele macia e nua dela. E quando ele menos esperava, ela deu um grito abafado, e começou a tremer compulsivamente. Contudo, ele continuou segurando-a com força e seus movimentos se tornaram mais rápido e atingiu o clímax com um gemido rouco enquanto ela ainda se afogava no prazer.

Ficaram ainda alguns segundo naquela posição, e então, relutantemente, Huaru saiu de dentro dela, deitando-se pesadamente ao seu lado. Luxuriah rolou, o abraçou e aplicou o mais profundo beijo que jamais aplicara em alguém antes.

- Vou presentear Mhuu, com certeza. – murmurou com um sorriso nos lábios – Você foi incrível!

- Fui mesmo bebê? – perguntou ofegante, mas alegre.

- Como ninguém foi antes! – confessou.

Aquilo o deixou com um orgulho inflado, e logo estava ansioso por fazê-la esquecer de qualquer um que passara antes dele.

- Podemos ir de novo? – perguntou já sentindo outra ereção.

Luxuriah olhou para o desejo dele, surpresa, e depois riu. Huaru era jovem e era um tauren. Com certeza tinha energia para o resto da noite e até mesmo para uma parte da manhã. Estava ansiosa para ver o quanto conseguiria dele.

- Claro que podemos. – garantiu – Você tem muito o quê me mostrar e eu mais ainda para te ensinar. – e passou as pernas pelo corpo dele – Vamos, me beije.

 

 

****************

A luz da manhã entrou discretamente pelas cortinas do quarto de Ashrial, e tocaram no rosto da jovem elfa como um singelo beijo matinal. Ela remexeu-se um pouco na cama e entreabriu os olhos verdes. Por um momento ficou confusa e então lembrou que estava em casa. Uma onda de alívio e tranquilidade espalhou-se por seu corpo e ela sorriu.

Sentia-se anormalmente bem naquele dia.

Sentou na cama e espreguiçou-se. Esperava que Kassyeh fizesse panquecas no café da manhã. Adorava panquecas com mel silvestre e sempre tinha que disputar a última com Karen. Claro que no final das contas Luxuriah comia a panqueca, para ensinar as irmãs a não brigarem por comida, mas o mesmo ritual se passava no dia seguinte. Sentia falta das panquecas, pois quando não as tinha, significava que sua irmã estava longe.

Jogou as cobertas para longe, pôs as pernas para fora da cama e olhou longamente para o quadro de sua família que ficava na parede ao lado de sua cama. Quando seus pais morreram, Luxuriah não aguentava olhar a pintura que mostrava todos juntos, com Karen ainda bebê nos braços da mãe. Então, ela pedira que Aethas colocasse o quadro em seu quarto, para que, quando Luxuriah tivesse pronta, a pintura pudesse voltar para sala. Só que Luxuriah nunca pedira a pintura de volta e Ash ficava feliz com isso. Assim podia olhar para os pais todos os dias quando acordava.

Levantou-se, espreguiçou-se novamente e foi até o banheiro. Cuidou de sua higiene pessoal e depois voltou para o quarto. Sentou-se em frente à penteadeira, desfez a trança que prendia seus cabelos e pôs a escová-los sistematicamente. Era um hábito que a mãe incutira nas filhas e que Luxuriah não deixou cair no esquecimento. Samanthah costumava dizer que nenhuma elfa que se prezasse acordava sem cuidar dos cabelos. E apesar de achar que suas irmãs eram infinitamente mais belas que ela, amava seu cabelo. Era bem dourado e liso. Quando os escovava, eles caiam como uma cascata de luz sobre suas costas. Enquanto Kassyeh mantinha o cabelo curto e Luxuriah o deixava um pouco abaixo dos ombros, Ash preferia ver suas madeixas bem longas, quase chegando ao seu quadril. Quando precisava sair em missão, o prendia numa trança ou um rabo de cavalo. Mas ali, na segurança de sua casa, deixava-os soltos, ao sabor dos movimentos de seu corpo.

Quando terminou o ritual diário e viu o resultado satisfatório dele, levantou-se e foi até a janela. Abriu as cortinas e a porta de vidro da varanda, deixando o ar fresco da manhã invadir seu quarto. Como sua camisola branca era longa e possuía mangas que chegava aos pulsos, não se importou de alguns passos a frente e se debruçar na varanda. As ruas ainda estavam tranquilas e os poucos elfos que passavam não olhavam para cima. E mesmo que olhassem, dificilmente poderiam vê-la por entre os galhos das roseiras de Kassyeh que se espalhavam por todo o jardim. Ao contrário de quem se encontrava na rua, Ash podia ver claramente quem passava. E foi com surpresa que viu um falcoztruz parar bem em frente de sua casa e uma figura imensa descer e se dirigir para a porta. Curiosa com a estranha visita debruçou-se na varanda e conseguiu ter uma visão perfeita do visitante.

Seu coração disparou com tanta força que Ash achou que ele fosse saltar de seu peito.

Era o elfo de seus sonhos.

Ainda estaria dormindo?

O elfo segurou a argola daporta e bateu com força. Aquilo soou como um despertador na cabeça de Ash. Ela saiu da varanda, cruzou seu quarto como uma flecha e se atirou porta afora. Enquanto percorria o corredor, com sua camisola de seda esvoaçando ao seu redor, se perguntou o que estava acontecendo com ela. Sonhara com aquele elfo durante a maior parte de sua vida. Foram tantas as vezes que ele apareceu em seu sono que já o tinha por uma ilusão. Uma miragem. Como então ele poderia estar batendo a porta de sua casa naquela manhã? Havia três explicações: poderia estar sonhando. Poderia ser real. Ou ela estava ficando louca.

Em sua corrida desenfreada escada abaixo, seu pé bateu dolorosamente num pilar ao final do corrimão e um vaso foi ao chão. A dor deixou claro que não era um sonho. Restavam duas opções.

Suas mãos alcançaram a maçaneta no momento em que um novo som de batida foi ouvido. Ash sequer conseguia respirar. Abriu a porta e esperou para ver qual de suas opções estava correta.

O elfo era exatamente igual a sua visão. Os cabelos prateados presos no alto da cabeça, um rosto forte e decidido, um tapa-olho no lado esquerdo do rosto. Era o mesmo que a tirara do sótão quase uma década atrás. O que a confortara no pior momento de sua vida. Sim, definitivamente era ele.

Ou seria uma ilusão?

- Bom dia. – a voz dele era forte, mas macia, e preencheu todo o silêncio da casa – Eu gostaria de falar com Lady Luxuriah. – e diante do silêncio inicial dela, perguntou – Você é uma serva da casa?

A respiração de Ash estava acelerada e seu coração parecia que ia parar de bater a qualquer instante. As palavras dele foram claras, mas ela não conseguiu extrair nenhuma informação delas, ouvindo apenas o tom forte e harmônico que chegava aos seus ouvidos. Precisava saber. Precisava ter certeza. Mas como?

Ergueu a mão em direção ao rosto dele. Seus dedos tremiam. Parou o movimento bem perto do rosto dele, que a olhava visivelmente confuso. Depois desse instante de hesitação, seus dedos tocaram a pele do rosto dele. Foi como se um raio a atingisse. O calor que sentiu nas pontas de seus dedos não poderia pertencer a uma ilusão. Deixou que toda sua mão tocasse aquele rosto tão conhecido, mas tão estranho ao mesmo tempo e sentiu que o elfo estremeceu ao seu toque. Estaria reconhecendo-a também?

- Você é real... – murmurou com os olhos brilhando de lágrimas de alegria.

E antes que pudesse receber uma resposta, suas pernas perderam a força e o mundo se apagou.

Lor’themar havia se dirigido à casa das princesas tão logo achou que era conveniente. Não sossegaria até obter alguma resposta das irmãs. Decidiu que conversar com Luxuriah em sua própria casa era a melhor forma de abordá-la. Aproveitaria e conheceria o orc e o tauren.

A casa estava exatamente da mesma forma que quando era habitada por Lady Luelly e o filho. A única diferença era a quantidade de flores no jardim da frente, bem superior ao que havia antes. Como havia ido sozinho, desceu damontaria e a amarrou em um dos pilares da casa, da mesma forma que fizera tantas vezes ao visitar o amigo. Encaminhou-se para a porta, bateu e esperou.

Esperava por muita coisa quando a porta se abriu, mas nunca o que realmente aconteceu. Estava diante da criatura mais linda que jamais vira. Ela tinha os cabelos dourados, como os raios de sol, que caiam lisos por seus ombros. Os olhos eram verdes, como o de todos de sua raça, mas Lor’themar podia jurar que vira um brilho azulado no fundo deles. Os traços do rosto eram delicados, mais até que o comum para as elfas, a boca pequena e o nariz afilado. A elfa com certeza era muito jovem, mas o lembrava alguém. Só que ele não conseguia se lembrar de nunca ter estado diante de uma criatura tão adorável.

No momento em que ela o tocou, estremeceu. Não sabia se por causa da surpresa do gesto, ou se foi a delicadeza dos dedos que percorreram seu rosto. O certo é que ficara totalmente paralisado diante daquela sensação. Só voltou a si quando ela balbuciou palavras que soaram totalmente sem sentido para ele e depois desmaiou. Seus reflexos de patrulheiro fez com que segurasse a moça antes que ela despencasse no chão. Ignorou o que sentiu ao segurar aquele corpo maravilhoso contra o seu, e ergueu a jovem nos braços. Procurou algum lugar onde pudesse coloca-la e viu um luxuoso sofá na sala. Dirigiu-se para lá e a deitou.

- Jovem? – chamou ele segurando em seu queixo – Pode me ouvir?

Ela murmurou algo incompreensível, mas não acordou. Lor’themar olhou para os lados, em busca de ajuda, mas não havia ninguém a vista.

- Pequena, acorde. – chamou sacudindo-a um pouco.

O movimento aparentemente surtiu efeito, pois ela começou a voltar a si. Piscou um pouco os olhos, para que a vista entrasse em foco e então o olhou. O rosto dela corou absurdamente e ela sorriu.

Era o sorriso mais bonito que já vira.

Eles se olharam durante alguns instantes e quando ele abriu a boca para perguntar quem ela era, uma voz irritada invadiu a sala.

- O que você pensa que está fazendo?!

Luxuriah descia as escadas com pisadas fortes, como se quisesse destruir o caminho embaixo de seus pés. Ela ouvira as batidas na porta, o vaso quebrando e o silêncio que se seguiu. A elfa usava um robe por cima da camisola e apesar de ainda não ter dormido estava relaxada e feliz. Isso até descer as escadas e encontrar Lor’themar Theron em sua sala, debruçado sobre Ash, que ainda estava de camisola.

- Luxuriah. – disse ele ficando em pé – Eu vim...

Ele não terminou a frase. O soco de Luxuriah atingiu seu queixo com tanta força que ele deu dois passos para trás e sua vista escureceu com a dor.

- Não!

A criatura adorável se levantou de um pulo, como se o mundo finalmente estivesse claro para ela e segurou a caçadora pelo braço.

- Lux, não! – gritou desesperada.

- O que você estava fazendo com minha irmã?! – Luxuriah estava com os olhos ardendo de fúria.

Irmã? Lor’themar a olhou atentamente. Aquela era Ashrial? Só podia ser. Tinha visto Karensky no dia anterior e lembrava que Kassyeh era morena, como Luxuriah. Então, aquela era a outra princesa, mais jovem que Kassyeh e mais velha que Karensky. Naquele momento lembrou-se do dia da morte de Dhomm e Samanthah, quando resgatara uma menina chorosa e triste do sótão. Só podia ser ela. Todavia, não havia em Ashrial nenhum resquício daquela criança assustada. A pequena elfa havia crescido... E se tornado bela.

Bela e estonteante, como Lady Luelly fora no passado.

Ash estava agora desperta e nervosa. Sim, ele era real. Mas deixaria de ser no momento em que Luxuriah colocasse as mãos nele. A caçadora mais velha com certeza não tivera uma boa impressão da cena que se desenrolara ali.

- Eu abri a porta! – Ash começou a explicar-se desesperadamente – E acho que desmaiei... Ele... – ela o olhou e prendeu a respiração. Como o elfo era lindo! – Ele me amparou e me trouxe até o sofá...

A explicação surtiu efeito, pois Luxuriah parou de avançar sobre o lorde regente. Endireitou-se e o encarou como se esperasse mais.

- Foi exatamente o que aconteceu. – falou ele tranquilamente, como se não tivesse acabado de levar um forte soco no rosto bonito – Acredito que a jovem possa estar se sentindo mal...

- Eu estou ótima! – apressou-se em dizer – Deve ter sido apenas uma tontura...

Luxuriah olhou para Ash e depois para Lor’themar. Parecia estar procurando alguma mentira, mas como não achou nenhuma, relaxou.

- Então, lorde regente, - começou a falar -o que veio fazer na minha casa a essa hora da manhã, além de salvar minha irmã de se estatelar no chão?

Lorde regente?! Ash o encarou com os olhos arregalados. Aquele era Lor’themar Theron? O elfo que povoara seus sonhos desde a infância era ninguém menos que o regente dos sin’dorei?

- Eu gostaria de conversar... Sobre ontem. – e acrescentou, para acalmá-la – Se for de sua vontade, obviamente.

- Claro que é! – Ash respondeu rapidamente, para a surpresa de Luxuriah – Ela vai falar com voc... Com o lorde. – e fez uma reverência – Gostaria de tomar café da manhã conosco?

A simpatia extrema da irmã fez Luxuriah levantar as sobrancelhas, espantada. Ash não era dada a tanta hospitalidade, principalmente com pessoas que não eram íntimas.

- Será um prazer aceitar o convite. – respondeu o patrulheiro fazendo uma reverência às irmãs.

Apesar de não ter gostado nenhum pouco da atitude deAsh, Luxuriah acho que no final ascontas aquilo seria bom. Lor’themar estaria sozinho, no meio delas. Tewdric e Huaru estavam ali. Poderia resolver tudo naquela manhã.

- Fique a vontade lorde regente. – disse Luxuriah com uma pontada de ironia e sem se curvar – Acredito que Kassyeh descerá em seguida para preparar a refeição.

- Posso fazer sala para o lorde. – ofereceu-se Ash, sentindo o rosto corar quando ele a encarou.

- De camisola? – perguntou Luxuriah – Acredito que não é apropriado.

Foi quando a jovem percebeu os trajes que usava. Corou absurdamente, murmurou um pedido de desculpas e subiu as escadas correndo tão rápido que chegou a tropeçar duas vezes. Quando a irmã saiu de vista, Luxuriah encarou Lor’themar.

- Vamos deixar uma coisa clara, Lor’themar. Não seremos obrigadas a nada.

- Jamais pensaria em fazer tal coisa. – respondeu serenamente – Dhomm e Samanthah jamais se curvaram a nada que não fosse de sua vontade. Por que suas filhas o fariam?

Luxuriah apertou os olhos, mas não retrucou, apenas disse:

- Fique a vontade, vou me trocar. - e saiu da sala.

Lá em cima, Ash entrou como um furacão no quarto. A única coisa que pensava era que ele era real, muito real. O elfo que povoara seus sonhos sempre existira! Se o tivesse visto antes, teria o reconhecido, mas ela jamais fora chamada em sua sala ou precisou ir lá. Mas agora, ele estava ali, bem perto dela, e seu coração batia descompassadamente. Sequer parou para pensar o que ele estaria fazendo ali.

- Ash!

Luxuriah entrou no quarto sem bater, como era seu costume.

- Por que você fez aquilo? – perguntou a mais velha.

Os olhos de Luxuriah eram inquisidores. Só o fato de ela ter entrado ali e perguntado pelo que fizera e não se estava bem depois do desmaio, só deixava claro que ela estava muito incomodada com a presença de Lor’themar Theron na casa.

Ash sentiu os pensamentos trabalhando rapidamente para dar uma resposta satisfatória a irmã, sem revelar sobre seus sonhos.

- É o lorde regente Lux! – disse tentando conter a animação – Ele tem algo para falar conosco não é? Melhor que seja aqui em casa. E além do mais, ele tem foi educado com Karen ontem, devemos ser educadas também.

Calou-se então e esperou uma resposta.

- Certo, vou aceitar esse seu argumento. – disse Luxuriah – Vista-se e desça. Vou acordar Kassyeh e as meninas.

Feliz por ter conseguido convencer Luxuriah, ainda que parcialmente, percebeu que precisava se vestir rápido, mas achou que deveria tomar um banho antes. Prendeu o cabelo cuidadosamente e se banhou. Depois, começou a procurar avidamente uma roupa. Não podia caprichar demais no visual, ou isso atrairia novamente os questionamentos de sua irmã mais velha, mas também não podia se apresentar com suas roupas diárias na presença do lorde regente. Corou ao lembrar que ele a vira de camisola, mas rapidamente mudou sua atenção de volta as roupas. Achou um vestido lilás simples, mas muito bonito, com o qual costumava passear e optou por usá-lo. Por baixo, colocou uma calça de linho branca, já que detestava a sensação de estar só de calcinha embaixo do vestido. Calçou sapatilhas vermelhas, deu uma última escovada no cabelo e desceu.

Quando chegou à escada e olhou para baixo, viu que ele estava lá, sentado no sofá, de braços cruzados olhando para o vazio. Permitiu-se olhar um pouco a beleza austera do elfo, antes de respirar fundo e começar a descer as escadas. Começou a pensar que tipo de assunto poderia conversar com ele enquanto esperava as irmãs, mas sua mente só conseguia pensar no quanto ele mexia com sua cabeça.

Ash estava nos últimos degraus quando ele a olhou. Ela parou um pouco de andar e conseguiu esboçar um sorriso. Lor’themar sorriu de volta. Encararam-se brevemente até que um barulho ensurdecedor de gritos se precipitou sobre a escada, e dois vultos se chocaram violentamente com Ash, fazendo-a se desiquilibrar e cair de cara no chão da sala.

- Karen! – o nome da irmã caçula foi o grito de dor de Ash.

Karen e Saba já estavam acordadas há algum tempo e já estavam prontas para o café da manhã. Porém, antes de sair do quarto, as meninas apostaram quem chegaria primeiro a cozinha e uma corrida desenfreada foi iniciada. Como estavam entretidas demais empurrando uma a outra, não viram Ash e esbarraram na elfa, lançando-a ao chão. Agora, Karen sabia que estava em apuros.

- Ash! Desculpa! – disse a menina com a voz pesarosa.

O som de passos se aproximou de Ash, que ainda estava estendida no chão.

- Quando eu por as mãos em você... – sibilou a jovem levantando a cabeça.

Esperava encontrar a irmã em sua frente, mas quem estava lá era Lor’themar. Ele se abaixou e estendeu a mão.

- Deixe-me ajuda-la. – pediu educadamente.

Ash nunca amou tanto Karen quanto naquela hora. Mesmo envergonhada, estendeu a mão e aceitou a ajuda do lorde regente. Quando suas mãos se tocaram, aquela descarga elétrica já sentida mais cedo se manifestou novamente. Ash estremeceu e viu que ele também. Ficou triste quando Lor’themar soltou rapidamente sua mão, assim que a pôs em pé.

- Você está bem? – quis saber analisando-a à procura de algum ferimento.

- Estou. – e querendo quebrar um pouco aquela tensão que surgira entre os dois depois do toque, brincou – Acho que hoje não é meu dia...

Deu certo, pois ele sorriu.

- Não diga isso, o dia mal começou.

- Olha Saba é o Lolô!

Demorou alguns instantes para que eles percebessem que a menina se referia a Lor’themar.

- Karen! Não ponha apelidos no lorde regente! – reclamou Ash.

- Mas Lor’themar é tão comprido... – reclamou a menina.

- Chame-o de lorde regente então!

- É mais comprido ainda! – exasperou-se Karen.

Ela e Saba se olharam e balançaram negativamente a cabeça, como se Ash fosse a criança incompreensível e não Karen. A jovem caçadora teve vontade de pegar a irmã e lhe dar boas palmadas. Mas o motivo da discussão não parecia irritado com o apelido, pois ria com os argumentos da menina.

- Seu pai também gostava de diminuir os nomes de todos. – disse o lorde regente carinhosamente – Mas não me chamava de Lolô, preferia me chamar por Temma.

- Posso te chamar de Temma então? – perguntou Karen com os olhos brilhando de expectativa.

- Claro.

Karen deu um sorriso triunfante para Ash, que voltou a odiar a irmãzinha espevitada. Se não fosse a presença de Lor’themar, já teria dado uns bons beliscões em Karen e também em Saba, que acompanhava a amiga nas risadinhas.

Um barulho na escada fez todos olharem para cima. Kassyeh vinha descendo na companhia de Tewdric, tendo suas mascotes correndo à sua frente. Ash estranhou que o orc viesse com o machado nas costas; ele não costumava andar armado dentro de casa. Mas bastou ver que Tewdric encarava Lor’themar para entender o motivo da arma. Começou a se preocupar então. Tinha que se lembrar de que o lorde regente fora até lá resolver algum problema, e pelo olhar assassino de Tewdric, Kassyeh estava bem envolvida.

- Bom dia lorde regente. – Kassyeh cumprimentou-o e fez uma reverência assim que desceu as escadas – É um prazer vê-lo.

- Igualmente, Lady Kassyeh. – e retribuiu a reverência.

Era tão difícil alguém usar os títulos que as irmãs tinham que todos, com a exceção de Lor’themar, franziram a testa.

- Soube que vai tomar café conosco. – continuou a maga, com sua simpatia costumeira – Vou para a cozinha e não demorarei a servi-lo.

- Não há pressa milady. – garantiu despreocupadamente.

- Fique a vontade. – e fazendo outra breve reverência, se retirou para a cozinha.

Ash convidou Lor’themar a se sentar com um gesto e todos se acomodaram na sala, inclusive Tewdric, que ao sentar-se, colocou o machado ao lado e não desgrudou a vista do elfo. Hotch e Littleflame pularam no colo de Karen e Saba, que passaram a acariciar os bichinhos animadamente.

- Então Temma vai comer com a gente? – perguntou Karen muito animada – Que legal!

- Ele pode contar histórias como ontem! – vibrou Saba.

- Será um prazer se me for permitido. – garantiu o elfo.

- Que tipo de histórias? – perguntou Ash.

Ela corou quando a atenção de Lor’themar se voltou para ela.

- Sobre seus pais. – respondeu singelamente – Conheço muitas histórias envolvendo Dhomm e Samanthah.

- Você vai ficar de bico calado elfo! – falou Tewdric rudemente – Lulu não gosta que toquem nesse assunto!

- Tewdric! - exclamou Ash em represália.

Mas Lor’themar continuava com o semblante calmo.

- O orc tem razão. – concordou para a surpresa de todos – Luxuriah não gosta que toquem nesse assunto. Mas quando quiserem conversar sobre seus pais, basta me procurarem. – e sorrindo acrescentou – Espero que possamos nos ver com mais frequência agora.

Era tudo que Ash mais queria.

Tewdric continuava olhando para o lorde regente como se analisasse em qual parte do corpo dele seu machado entraria com mais facilidade.

- Só não esqueça elfo, que essas meninas são minha família e qualquer coisa feita contra eles eu vingarei, de preferencia com meu machado. - passou a mão no cabo da arma.

Assustada, Ash se questionava o que exatamente estava acontecendo. Conhecia aquela postura de Tewdric e ela não era um bom indício.

- O que está acontecendo? – perguntou por fim.

Não era nenhuma surpresa para Lor’themar descobrir que as irmãs mais jovens ainda não haviam sido informadas da descoberta. Tewdric, no entanto, parecia estar bem ciente e preocupado. Sim, Lor’themar sabia que a agressividade contra a sua pessoa não era nada mais que a proteção exagerada que os orcs reservavam às suas fêmeas. Enquanto Kassyeh e Luxuriah escondiam sua preocupação sob uma fachada de tranquilidade, Tewdric não conseguiria fazer o mesmo. Bem, aquilo no final das contas era bom. Ter alguém tão disposto a defender as herdeiras de Luaprata era excelente.

- Não se preocupe Lady Ashrial. – tranquilizou-a Lor’themar – Logo você será informada.

- Pode me chamar de Ash... – pediu ela sorrindo encabulada e colocando o cabelo atrás da orelha.

- Como preferir, Ash. – respondeu.

Karen, que estava ficando de fora da conversa, tratou logo de se inteirar. Caminhou até Tewdric e sentou em um de seus joelhos. Saba a imitou e sentou no outro e as mascotes de Kassyeh também pularam em cima do orc.

- Ted, você tem raiva do Temma? – perguntou preocupada.

A expressão do orc mudou totalmente. De raivoso, ele se desmanchou em um sorriso bobo quando olhou para a menina. Lor’themar podia jurar que vira os olhos dele brilhando. E com um tigrinho e um cãozinho lambendo o rosto dele, a cena ficava ainda mais branda.

- Claro que não Karenzinha! – disse com a voz mais carinhosa que já se ouvira de um orc – Só protejo vocês de qualquer um!

- Mas Temma é legal! – garantiu a menina – Queria que vocês fossem amigos...

Depois dessa fala, Ash voltou a amar a irmã com força total.

- Karen tem razão Tewdric. – disse ela para reforçar a ideia – O lorde regente foi amigo de nosso pai, não acredito que nos faça mal...

- Não fazer mal não significa fazer bem. – disse Luxuriah em alto e bom tom da escada.

Finalmente a irmã mais velha aparecera já vestida com suas roupas tradicionais de couro e acompanhada de Huaru. Lor’themar se surpreendeu ao ver que o tauren, novo amante de Luxuriah, era um paladino.

Grey não ia gostar nem um pouco daquilo e essa ideia o fez sorrir.

- Vejo que está bem acomodado, lorde regente. – comentou Luxuriah num tom casual – E bem acompanhado também. – acrescentou olhando Tewdric e seu machado.

- Há tempos não desfrutava de companhias tão agradáveis. – respondeu no mesmo tom.

Lor’themar podia ser muitas coisas, mas burro com certeza ele não era. Luxuriah sabia que ele faria de tudo para cair nas graças das irmãs, e como estava em desvantagem ali na casa delas, aceitaria de bom grado qualquer coisa dita. A caçadora teve a impressão que se pedisse para ele imitar uma galinha, ele o faria.

Contudo, Luxuriah não teve oportunidade de provar se sua teoria era verdadeira, pois Kassyeh chegou naquele momento e sorriu para todos.

- O café está na mesa. – anunciou. E voltando-se para o lorde regente, convidou – Por favor, me acompanhe.

Em pouco tempo todos estavam acomodados na mesa da sala de jantar. Normalmente comiam na cozinha mesmo, pois Luxuriah se sentia incomodada com a imensa mesa e suas muitas cadeiras. Mas Kassyeh aprontou o lugar com tanto esmero que ela achou melhor não dizer nada. A maga também havia caprichado na comida. Havia pães, panquecas, bolos e três chaleiras fumegantes com chás diversos. Também havia suco, queijo, mel, manteiga e frutas. Luxuriah sempre se perguntava como a irmã podia preparar tanta coisa em tão pouco tempo.

Luxuriah sentou-se à cabeceira da mesa, com Huaru do seu lado direito. Kassyeh fez um gesto para Lor’themar sentar do lado esquerdo. Depois, a maga acomodou-se ao lado do lorde regente tendo Tewdric à sua frente. Ash preferiu sentar ao lado do orc e Saba e Karen sentaram lado a lado, com as cadeiras bem próximas, como se dividissem o mesmo espaço. As mascotes de Kassyeh ganiram pedindo comida também, no que foram atendidas pela maga.

- Oba, panquecas! – comemorou Karen olhando para as diversas tigelas com panquecas de vários formatos – Tem mel com favo?

- Claro que tem. – disse carinhosamente Kassyeh – Aqui. – e passou o mel que continha ainda os favos inteiros para a menina, que adorava mastiga-los.

Todos começaram a se servir, e Luxuriah percebeu que Lor’themar parecia um pouco surpreso com o fato de elas mesmas colocarem a comida em seus pratos e nos dos convidados.

- Não temos servos desde o flagelo. – esclareceu Luxuriah para ele – Papai optou por não tê-los mais e eu também.

- Tínhamos servos antes? – perguntou Karen colocando mel com bastantes favos por cima das panquecas.

- Sim. – respondeu Kassyeh saudosa – Três. Eu os adorava. Eram pessoas maravilhosas.

- O Flagelo levou muito do nosso povo. Não apenas pessoas, mas também a esperança da muitos. – disse Lor’themar seriamente.

Houve um momento de silêncio.

- Não vamos falar sobre isso. – Kassyeh pegou um bule e encheu a xícara de Lor’themar – Prove desse chá, lorde regente. São ervas de Mulgore.

No início, apenas comeram. Ash tentava manter-se concentrada apenas na comida, mas era difícil. Lor’themar estava sentado tão próximo dela que suas mãos tremiam um pouco ao pegar nos talheres. E mesmo que mais cedo estivesse faminta e loucapor panquecas, agora sua boca estava seca e não sentia fome nenhuma.

- Ash, o mel sem favos está aqui. – Kassyeh passou o recipiente de cristal repleto de mel puro de uma bela cor âmbar para a irmã – Por que não está comendo?

- Eu to sem fome. – balbuciou sem levantar a cabeça.

- Com fome ou sem fome, coma. – mandou Luxuriah – Para não estar desmaiando por aí.

- Ash desmaiou? – perguntou Huaru preocupado.

- Não foi nada. – ela odiava quando todas as atenções estavam voltadas para ela, como naquele momento – Apenas uma tontura.

- Não é aquilo de novo não né? – Karen parara de comer e olhou assustada para Ash – Você não vai ficar doente daquele jeito de novo não né?

- Não Karen, não vou. Foi só uma tontura.

- Lady Ashrial esteve doente? – perguntou Lor’themar e Ash ficou muito feliz ao perceber uma ponta de preocupação na voz dele.

- Ela tava com magia ruim dentro dela. – revelou Karen para o desespero da irmã – Foi muito feio.

- Karen! – ralhou Ash, sentindo o rosto ficar rubro e lágrimas começarem a encher seus olhos. A última coisa que queria era que Lor’themar soubesse de sua fraqueza.

- Certo, vamos deixar esse tipo de assunto de fora de nossas conversas! – Kassyeh reparou no desconforto da irmã e saiu em seu auxílio – Vamos falar de coisas amenas.

- Luxuriah vai me treinar hoje? – perguntou Saba com a certeza que aquilo era um assunto ameno.

- Com certeza Saba. – garantiu a caçadora – Vou lhe mostrar porque os elfos são os melhores arqueiros do mundo. – e piscou o olho para a menina, que riu.

- E eu vou treinar com o Huhu! – disse Karen aparentemente já recuperada do susto – Ele disse que preciso começar logo a treinar se quero ser uma paladina logo.

Lor’themar, que estava cortando uma panqueca com bastante mel, parou e olhou para a irmã mais jovem, com uma leve surpresa.

- Vai ser paladina Karen? – perguntou com uma simpatia que surpreendeu Luxuriah. E o que era mais surpreendente era o fato que aquela simpatia era totalmente sincera. Lor’themar realmente gostava de Karen.

Bem, era um ponto a favor dele.

- Sim, sim! O Huhu vai me treinar! Já tenho armadura e tudo! Serei uma Andarilha do Sol.

O lorde regente riu.

- Lady Liadrin vai ficar muito desapontada em perder uma aprendiz tão disposta. – comentou voltando a atenção para as panquecas.

- Lady Liadrin é a que gosta de namorar elfos novinhos? – perguntou Saba em voz alta.

Kassyeh e Ash abaixaram a cabeça, envergonhadas, desejando de todo coração enfiar a cara embaixo da mesa e sumir. Luxuriah,Huaru e Lor’themar, no entanto, caíram na risada, sendo seguidos por Karen e Saba.

- Bem, acredito que todo servo da Luz deva ter direito a suas preferências não é mesmo? – perguntou olhando diretamente para Huaru.

Luxuriah teve vontade de enfiar o garfo que segurava no olho bom do elfo, e só não o fez porque Huaru não se mostrou nenhum pouco ofendido, muito pelo contrário. Ele abriu um sorriso para Lor’themar e falou com sua voz tranquila:

- Nós, servos da Luz, preferimos sempre aquilo que nosso coração escolhe. – e olhando para Luxuriah, acrescentou – O meu a escolheu, poderia eu lutar contra isso?

Aquelas palavras foram ditas de forma tão inocente e tão sincera, que qualquer sentimento negativo que poderia existir em Luxuriah naquele momento, evaporou-se. Retribuiu o olhar carinho de Huaru e colocou a mão sobre a dele, sorrindo. Lor’themar mal podia acreditar no que via. Havia amor ali. Simples, puro e sincero amor. A Nascente do Sol pelo visto realizara um milagre através do Andarilho do Sol: permitiu que este alcançasse o coração daquela sofrida menina. O elfo então sorriu satisfeito. Se alguém merecia aquela felicidade, esse alguém era Luxuriah.

Rommath não ficaria feliz com aquilo. Nem Grey.

- Fico muito feliz que você tenha encontrado alguém com tão fortes sentimentos por você, Luxuriah. – falou com sinceridade – Que ele possa curar os males que o mundo lhe fez.

- Farei isso com certeza. – garantiu Huaru.

Tewdric estava calado desde que chegaram à mesa. Comia, ouvia a conversa, mas não tirava os olhos do elfo. O medo que a notícia da origem de sua elfa lhe incutiu ainda estava lá, latejando como uma ferida inflamada. Kassyeh dissera que não o deixaria, e ele acreditava. Mas a simples possibilidade de alguém ao menos cogitar separá-los era o suficiente epara deixa-lo naquele estado de espírito.

A postura e o olhar do orc não passaram despercebidos para Lor’themar. Ele, contudo, ignorava a ameaça lançada como se nada estivesse acontecendo. Queria aproveitar aquele momento para estabelecer laços. Karen já gostava dele. Luxuriah o respeitava, apesar da postura defensiva. Kassyeh era uma diplomata, faria o que quer que fosse melhor para todas. Mas Ash... Lor’themar a olhou. Ela estava de cabeça baixa, com os olhos fixos no prato. Parecia incomodada com algo. Não conseguia saber exatamente o que esperar dela. O que vira até aquele momento o deixou confuso. Ora Ash era sensível; ora havia fúria em seus olhos. Perguntou-se se ela lembrava-se do dia em que a resgatara do sótão. Era provável que não.

Sentindo-se observada, Ash levantou a cabeça. Seus olhos caíram sobre Lor’themar e se encararam mais uma vez. Aquele sentimento se instalou novamente em seu peito e por um momento temeu que todos pudessem ouvir seu coração.

- Deveria comer milady. – falou em um tom brando e suave – O café da manhã é a refeição mais importante para nosso povo, e sua irmã fez uma comida simplesmente excepcional.

- Obrigada lorde regente. – agradeceu Kassyeh.

- Eu só estou meio sem fome. – se justificou a jovem com o rosto em brasa – Só isso... Ninguém precisa se preocupar.

- Isso é preocupante sim. – falou Karen seriamente – Normalmente ela briga comigo pelas panquecas e hoje nem tentou roubar nenhuma do meu prato!

- Karen me disse que elas até trocam beliscões! – emendou Saba.

- Uma vez ela me deu um chute e saiu correndo com a panqueca! –Karen com certeza estava exagerando, mas arrancou risos da mesa.

Sério, um dia Ash iria fincar uma flecha no olho de sua irmã caçula, com certeza!

- Deve ser minha presença. – brincou Lor’themar piscando para Karen, que riu – Talvez Lady Ashrial não esteja satisfeita comigo aqui.

- Não, de jeito nenhum! – o tom de Ash foi tão desesperado que Luxuriah arqueou as sobrancelhas, curiosa – Não é sua presença lorde regente, não mesmo! Por favor, não pense mal de mim!

- Calma milady. – o lorde regente achou que fora longe demais – Peço desculpas se fui inconveniente com minha brincadeira.

- Sua presença aqui é inconveniente! – rugiu Tewdric de repente – Por que não fala logo o que quer elfo?!

- Tewdric! – exclamou Kassyeh.

Lor’themar não se abalou com a explosão do guerreiro.

- Espere milady. – o patrulheiro estava tranquilo – Deixe que seu companheiro se expresse.

Com a mão fechada, Tewdric bateu em cima da mesa. O barulho assustou Hotch e Littleflame, que aparentemente estiveram comendo embaixo da mesa o que era jogado por Karen e Saba no chão. Várias xícaras viraram inclusive a de Lor’themar. Um silêncio pesado se seguiu e Ash temeu o que viria a seguir.

- Eu sei o que você quer elfo! – Tewdric praticamente cuspiu as palavras – Quer trazer mais problemas pra vida das minhas meninas! Mas eu não vou deixar! – e se levantando, apontou o dedo para Lor’themar – Princesas ou não, elas não vão serobrigadas a nada!

- Princesas? – perguntaram Ash, Karen e Saba ao mesmo tempo.

As meninas se entreolharam confusas e depois se fixaram em Luxuriah e Kassyeh, aguardando uma resposta. A primogênita suspirou. Não queria começar aquela conversa daquela forma, mas Tewdric estava nervoso demais para se conter. Achava uma evolução ele não ter tentado partir Lor’themar em dois desde o começo, mas não podia esperar muita paciência de um orc. Por isso, ela afastou a cadeira, levantou, foi até Tewdric, pôs a mão no ombro dele e falou calmamente:

- Tewdric, sente-se. Você estáassustando as meninas.

A tática surtiu efeito, pois ele olhou para os rostos atônitos das meninas e pareceu desconfortável. Murmurou algo incompreensível, e sentou-se, sem desviar a vista de Lor’themar. Luxuriah voltou para seu lugar à cabeceira da mesa, mas não sentou. Respirou fundo e começou as explicações.

Enquanto ela falava de tudo que estava acontecendo, o queixo de Karen e Ash caia cada vez mais. A história parecia tão absurda, que a caçadora mais jovem tinha certeza que só podia ser uma piada.O pai delas era filho do rei? Elas eram princesas? Mas bastou um olhar para Lor’themar e ver a seriedade no rosto dele para entender que era verdade.

Por isso ele estava ali?

- O lorde regente me entregou documentos que provam que o que eu disse é verdade. – concluiu Luxuriah sentando-se – E é isso.

Ninguém falou nadapor um momento, até que Karen questionou:

- O rei era nosso avô então?

- Sim. – respondeu Luxuriah.

- Mas ele morreu né? O papai morreu também. Então o que isso tem haver com a gente?

- O trono de Luaprata é hereditário. – quem falou foi Kassyeh – A Linhagem Andassol estava extinta, por isso o lorde regente passou a nos governar. Mas com essa descoberta muda tudo Karen. – e olhando para a irmã, acrescentou – Uma de nós tem o direito de ser rainha, se assim quiser.

- Ser rainha é tipo um Chefe Guerreiro dos elfos né? – perguntou Saba com os olhos brilhando em expectativa.

- Sim. – respondeu Lor’themar.

- Puxa que legal! – a pequena orquisa estava radiante – Imagina só Karen! Uma de suas irmãs vai mandar em tudo!

- Não é tão simples Saba. – Luxuriah retrucou carinhosamente e depois olhou para Lor’themar – Tenho objeções com relação a isso.

- Sou todo ouvidos, milady. – falou o patrulheiro com suavidade.

Ash estava surpresa com o sangue frio e a calma dele. Se fosse ela, só com a explosão de Tewdric já teria caído no choro e saído correndo. Ele, ao contrário, parecia tão sereno quanto antes.

Luxuriah se levantou novamente. Virou-se e caminhou até a janela. Lá fora, Luaprata se erguia monumental. Parecia calma e tranquila. Será que continuaria assim se soubesse o que acontecia naquela sala?

- Não vamos pagar pelos pecados dos Andassol. – disse finalmente se voltando para a mesa –Eu não quero essa responsabilidade Lor’themar.

Ele já esperava por aquela resposta e tinha um contra-argumento preparado.

- Se me permite, eu gostaria de expor os motivos pelo qual vocês deveria aceitar a incumbência.

- Fale. – quem permitiu foi Kassyeh.

- Como eu disse anteriormente, nosso povo ficou praticamente sem esperanças após o Flagelo. – começou – Fomos traídos por nosso príncipe e ficamos sem aliados.Eu tenho governado desde então e tomei a decisão de nos aliar à Horda. E se não fosse por ela – aqui ele encarou Tewdric e Huaru antes de fazer uma mensura com a cabeça – não existiríamos mais. Todavia, esse cargo não é meu por direito. A Nascente do Sol sabe disso. Se não, o nascimento do falcoztruz branco não teria acontecido.

- Um falcoztruz branco nasceu?! – perguntou Ash perplexa.

- Sim, milady.

- Uau que legal! – exclamou Karen. Depois, olhou para Saba e explicou – É uma ave grande que nem a Lola e o Debonzi só que toda branca! Só a realeza pode montar! – e olhando para Lor’themar pediu – Eu posso vê-lo?

- Eu também quero! – exclamou Saba – É tipo um Lo’gosh só que uma ave né? – e ao ver que Karen não havia entendido, explicou - Também existe uma lenda de um bicho branco para os orcs, mas é um lobo. Lo’gosh, o lobo fantasma!

- Uau que legal!

As meninas pareciam imunes ao clima de seriedade da história. Ash, contudo, estava angustiada. Queria falar algo, mas não conseguia. O que podia falar? Aquilo era tão novo, tão improvável, que parecia uma história contada por um bardo bêbado.

- Eu sei que é algo novo e assustador para vocês. – continuou ele encarando Luxuriah, depois Kassyeh, Karen e, por último Ash. E foi sobre ela que deteve seu olhar por mais tempo – Mas gostaria que vocês considerassem essas coisas como um sinal. Nosso mundo quase foi destruído recentemente. Enfrentamos ameaças, não somente da Aliança. Nosso povo anda aflito, e muitos ainda me olham com desconfiança. – ele gesticulou com as mãos como se quisesse reunir todas elas entre seus braços – Vocês podem mudar isso. Ter alguém com o sangue real traria nova fé ao nosso povo. Não seríamos mais desgarrados. Seríamos uma nação sob o comando dos Andassol novamente.

As irmãs se entreolharam, mas nada disseram. A resposta à fala do lorde regente veio de outra pessoa.

- Então, você ta querendo abandonar o barco, elfo, e quer jogar a responsabilidade em cima das meninas? –rugiu Tewdric ameaçadoramente.

O lorde franziu as sobrancelhas.

- Jamais fugi às minhas responsabilidades orc. – a voz de Lor’themar agora adquiriu um tom gélido e os olhos dele faiscaram na direção de Tewdric – Tenho exercido o poder a uma década e tenho feito de tudo pelo meu povo. Mas o poder não me cegou ao ponto de eu ignorar a verdade. Eu não tenho direito a esse cargo. O rei reconheceu Dhomm Fendessol como seu filho. Delegou legitimidade a ele e suas filhas. O trono é por direito delas

- Certo, acalmem-se. – pediu Huaru conciliador – O lorde regente expôs a opinião dele. Agora, acho que devemos ouvir o que as meninas têm a dizer sobre isso.

O orc cuspiu no chão, mas não falou mais nada.

As atenções se voltaram imediatamente para Luxuriah. Afinal, ela era a mais velha e se alguém fosse subir ao trono, seria ela. Sentando-se novamente, ela encarou cada um dos presentes. Tinha que admitir que o que Lor’themar falara tinha fundamento. Como sin’dorei, ela amava seu povo e estava disposta a tudo para protegê-los. Porém, sabia que se fosse rainha, estaria condenando seu povo mais que o ajudando.

- Eu sinto muito Lor’themar, mas eu não posso ser rainha. – falou finalmente. Antes que ele retrucasse, ela levantou o dedo, pedindo para continuar – Não é por não amar nosso povo, mas justamente por amá-lo demais. – e diante de todos, admitiu – Sou uma pessoa beligerante. Tenho um ódio mortal pela Aliança, principalmente pelos humanos. É uma carga muito negativa para uma rainha. Se eu tivesse seu poder - ela olhou diretamente para o elfo – Eu já teria nos levado à extinção há muito tempo, pois eu não permitia que nenhum humano vivesse enquanto eu estivesse com a coroa sobre minha cabeça. – e suspirando, encostou-se à cadeira – Nesse sentido, me identifico com Grito Infernal. Acho aquele orc uma péssima escolha para a Horda, mas entendo o ódio dele aos nossos inimigos. Por isso, não posso ser rainha. – concluiu.

Apesar de decepcionado, Lor’themar sabia que ela tinha razão. Luxuriah fora honesta e sincera ao recusar o trono. Seu olhar se voltou para Kassyeh.

- Eu também não quero ser rainha. – disse sem rodeios – Mas meus motivos são mais egoístas que os da minha irmã. Eu quero cuidar da minha família e me dedicar a ela. Ser rainha não me permitiria isso. Então não, não quero a coroa para mim. Quero continuar cuidando de minhas irmãs e... – ela enrubesceu e encarou Tewdric – Ter meus filhos. Quero liberdade para continuar fazendo isso. Desculpe-me lorde regente.

O coração de Ash acelerou. Era isso? O trono ficaria para ela? Quando Lor’themar a olhou, soube que não teria coragem de dizer não para ele. Mas o motivo estava ligado aos sentimentos que surgiram em seu coração no momento em que o vira novamente e percebera que ele não era apenas um sonho seu e não pelo fato de querer governar seu povo. Ash sabia que disso não era capaz. Não conseguia falar em público. Detestava ser o centro das atenções. Seu estômago revirou só de se imaginar com a coroa e o cetro em frente a toda população de Quel’thalas. Não! Não queria! Mas com Lor’themar com aquele olhar esperançoso em sua direção, poderia dizer não? Suas mãos começaram a tremer e ela fazia esforço para dizer algo.

- Eu quero ser a rainha.

A frase não saiu da boca de Ash, mas de Karen. Todos olharam a menina, espantados, principalmente pela voz dela ter saído segura e séria e não brincalhona.

- Com todo respeito Karen – começou o lorde regente carinhosamente – Acho que devemos esperar a resposta de sua irmã.

- Ela não quer. – disse Karen convicta – Eu conheço a Ash. Ela ta morrendo de medo de ser rainha, porque não gosta de chamar a atenção. Só que ela não tem coragem de dizer não. – e sorrindo carinhosamente para a irmã, acrescentou – A Ash é boazinha, ela não sabe dizer não para ninguém.

As lágrimas começaram a rolar do rosto de Ash, que o cobriu com as mãos. Apesar de todas as traquinagens, amava a irmã incondicionalmente. Afinal, fora com ela que passara a maior parte de sua vida, enquanto Luxuriah e Kassyeh seguiam seus caminhos. Todavia, jamais imaginava que Karen a conhecesse tão bem, a ponto de interpretar até mesmo o seu silêncio.

- V-vocên-não deve fazer isso por m-mim... – gaguejou em meio ao choro.

- Não é só por você. – disse Karen – É pela Lux, pela Kass, pelo Temma e por todo mundo. Se nosso povo precisa de uma rainha, eu posso ser né? – e dando de ombros, continuou - Eu sou criança, posso aprender a ser uma boa rainha. Não tenho a raiva da Lux, nem o cuidado da Kass, nem a timidez da Ash. Acho que daria certo.

Todos estavam espantados com a fala da garota, e Lor’themar mais ainda. Quando conhecera Karen no dia anterior sabia que estava lidando com alguém muito especial, mas aquilo superava todas suas expectativas. Ela se oferecera, sem medo, pensando não somente nas irmãs e no povo, mas nele também.

Contudo, Luxuriah não estava gostando nada daquilo.

- Karensky... – a voz da primogênita estava trêmula – Você não faz ideia da responsabilidade que é um reinado...

- Não sei mesmo. – confessou – Mas posso aprender.

- Uau! Você vai ser a chefe guerreira dos elfos!!! – exclamou Saba – Que legal!!

Luxuriah não podia acredita no que estava acontecendo. Seu bebê queria o trono?!

- Acho uma ideia brilhante. – falou Kassyeh animada.

A caçadora mais velha a encarou com fúria.

- O quê? – exclamou.

- Karen será uma boa governante. – continuou a maga ignorando o olhar zangado de Luxuriah –Ela é inteligente, carismática e passa confiança. Claro que ela teria que aprender muito, e não poderia governar sozinha.

- Vocês poderiam formar um conselho. – Lor’themar não podia perder a oportunidade que Kassyeh lhe oferecia –Vocês seriam princesas-conselheiras e ajudariam Karen. Assim, nenhuma ficaria com toda responsabilidade, nem deixariam sua irmã sozinha com o fardo.

Ash respirou fundo, mais controlada, e decidiu opinar também.

- O lorde regente também teria que ser do conselho. – disse sem o encarar – Afinal, governa há algum tempo e Karen precisaria de uma pessoa com experiência.

- E o treinamento de paladina? – perguntou Huaru.

- Ela pode continuar treinando sem problemas. – esclareceu Lor’themar – E isso seria muito bom, nosso povo nunca teve um regente paladino.

- Esperem! – gritou Luxuriah atraindo as atenções – Não falem como se isso tivesse decidido!

- Mas está. – Saba quem falou – A Karen já disse que quer!

- E ela tem apoio. – completou Lor’themar.

Luxuriah olhou para Kassyeh e Ashrial como se elas fossem suas inimigas. E talvez naquele momento realmente fosse.

- Huaru? – perguntou ela olhando para seu companheiro.

Apesar de querer ajudar a sua elfa, Huaru era um paladino, e precisava ser sensato.

- Bebê, a decisão é dela. – disse simplesmente, como se pedisse desculpa.

Luxuriah respirou fundo.

- Tewdric? – chamou.

Depois da última explosão, o orc estava quieto. Luxuriah sabia que se o orc discordasse, faria de tudo para demover Karen da decisão.

- Me diga uma coisa elfo – começou o orc – Se Karenzinha for rainha e as meninas princesas, elas vão ser obrigadas a casar com elfos?

Então aquele era o medo do orc afinal, pensou o lorde regente mais aliviado. Aquilo era muito fácil de resolver.

- Claro que não. Elas teriam a liberdade de escolha. Não queremos que o erro do rei Anasterian se repita. Então, não precisa se preocupar.

Diante daquilo, Luxuriah sabia que tinha perdido seu aliado.

- O que Karenzinha decidir, pra mim tá bom. – disse o orc seriamente.

Enquanto pensava no que dizer para demover a irmã daquela decisão, Luxuriah viu Karen se levantando e caminhando até ela. A menina parou em frente à irmã e segurou suas mãos com delicadeza.

- Lux, não se preocupe. Com vocês perto de mim não haverá problema. – e sorrindo, acrescentou – E quando eu for paladina, poderei jogar o escudo em quem quiser me fazer mal!

O coração da elfa se encheu de alegria e tristeza. Alegria por ver que Karen estava fazendo exatamente a mesma coisa que os pais fariam naquela situação. Dhomm, apesar de tudo, não fugiria à responsabilidade. E Samanthah encararia tudo com a tranquilidade que a menina demostrava naquele momento.

Sim, Karensky Fendessol seria uma excelente rainha.

- Se você quer, se você realmente quer... – falou com a voz embargada – Eu não me oporei.

Karen deu um imenso sorriso e abraçou a irmã. Todos estavam comovidos com a cena. Quando o abraço findou, a menina respirou fundo, olhou para Saba e gritou:

- Vou ser rainha Saba! Uhullll!!!

A outra se levantou da cadeira e correu até ela.

- Chefa Guerreira dos elfos!! – gritou também.

E começaram a correr ao redor da mesa, sendo acompanhadas pelas mascotes de Kassyeh. Luxuriah olhou para Lor’themar, triunfante, e murmurou:

- Boa sorte na educação da rainha, lorde regente.

O elfo, contudo, sorriu.

- E boa sorte com Huaru, Luxuriah. – murmurou de volta – Uma escolha bem mais acertada que Grey.

Luxuriah piscou surpresa com a referência ao ex-amante. E enquanto Karen corria, gritava e começava a puxar as irmãs, Tewdric e Huaru para uma dança desajeitada de comemoração, ela perguntou:

- O que quer dizer com isso?

- Ele me procurou dias atrás, me ameaçando por permitir... Bem, permitir que você se livrasse do seu problema. – ele colocou a xícara, que ainda estava tombada, em pé e colocou mais chá – Tive que retirá-lo da minha sala a pontapés. Não gostei da arrogância dele. – e dando um sorriso imenso, completou - Devo confessar que estou ansioso para ver a cara dele quando vir toda a paixão que você tem pelo tauren. Um sentimento que ele nunca foi capaz de despertar.

Antes que pudesse dizer algo, Luxuriah foi puxada para a dança por Karen. E enquanto era obrigada a dançar com a irmã caçula, pensou no que Lor’themar dissera. Grey fora até lá tirar satisfações. Isso significava que ele poderia voltar atrás dela? Estranhamente não sentiu nada diante da possibilidade. Olhou para Huaru, que dançava com Saba e soube que o que sentira por Grey jamais fora amor. Amor era o que sentia por Huaru. Então, decidiu deixar o elfo paladino para lá. Havia agora uma rainha e duas princesas para preparar.

Sim, porque da parte dela, sabia o que a aguardava e mais ainda o que aguardava o povo de Luaprata. 



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