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História Hey, Domme - Novos Ares


Escrita por: SraLaviolette

Notas do Autor


Hellooooo! Isn't me you were looking for? 🎼

Olá, bdsmer's! Tudo bem com vocês? EU TAVA NUMA SAUDADE TREMENDA AQUI...
E por fim, trago-vos o tão esperado spin-off de Hey, Professora. E a produção tá boa, garanto! XD

Sem muitas delongas, espero que curtam bastante!
Agradecer em especial aqui à três almas caridosas que estão me ajudando na betagem. (UHU CARAI DE BOTA, AGR EU TENHO BETASSS, SOU-ME CHIQUE!)

Agradecimento mais que especial à @BeaCorchiero , @TiaCatra e @Driz2004 (ovo sequestra vcs e por em potinhos pra ficar tudo cmg o tempo todo <3)

BOA LEITURA! n.n

Capítulo 1 - Novos Ares


 

Abrir os olhos todas as manhãs agora ganharam um significado diferente para a jovem advogada de 34 anos. Mara desfrutava de uma paz de espírito incomum para si própria em todos os anos após se formar em Direito em First Ones . E se para ela, a cidade natal era grandiosa, o que dizer da metrópole francesa? Bordeaux podia até não ser uma Paris da vida, com a qual ela sonhava conhecer algum dia e embora estivesse mais perto do que nunca disso já que estava na França, só o fato de estar ali com Scarlet, seu envolvimento amoroso de pouco mais de um mês; já lhe dava a sensação de um sonho em partes realizado.

Virou-se para o lado de bruços, morosa, parar mirar a namorada de pele branca e cabelo tingido em um acaju púrpura cobrindo metade da face esquerda enquanto dormia. Parecia uma deusa grega em transe de sono e até o fato do encher dos pulmões dela era para si, como um manjar dionisíaco que adorava degustar todas as manhãs. E às vezes à noite também...

Era um tanto quanto estranho, visto que mal costumava pensar em sexo, relações amorosas, nada além de infindáveis relatórios e contratos de empresas; se pegar pensando em coisas além de sua casta imaginação. Naquelas semanas se conhecendo devidamente e agora com toda a calma e tempo do mundo, Scarlet lhe mostrara um lado que tanto a assustava como fascinava. O respeito acima de tudo, por suas limitações, inexperiência e vontades, sobretudo, o charme inebriante, os olhos e lábios de vinho compunham a figura de Scarlet Laviolette na mulher por quem estava inegavelmente apaixonada.

A admirava em seus pequenos trejeitos adoráveis em seu sono: os lábios mexendo-se involuntariamente como um felino quando entra em estado de caça, o movimento de vai e vem dos olhos, um leve e sensual esfregar de pernas uma contra a outra, sua mão esquerda com o braço estendido sobre o abdômen, relaxado, e o direito totalmente jogado quase para fora da cama. Foi meio involuntário deixar escapar um suspiro apaixonado com tudo o que suas orbes azuis apreciavam. Já havia se tornado comum a vontade de jogar-se em seu colo, mas após a noite passada sabia que a dama precisava descansar um pouco a mais, afinal de contas, ninguém havia dito que a advogada era necessariamente uma puritana. E como Scarlet adorava isso.

Pega em seu devaneio matinal, após um pequeno susto ao perceber-se observada em sua sessão de devoção, repousava o punho direito no queixo sob os atentos olhos bordô, com um sorrisinho bobo e corado no rosto.

— Bonjour, fleur de matin. (Bom dia, flor da manhã). – A lady levemente sonolenta, em ato de espreguiçar, cumprimentou-a.

Mara sorriu um pouco desconcertada, ainda não entendia muito bem o francês, embora se encontrasse em um curso intenso de imersão naquelas semanas de férias, pois Scarlet parecia fazer questão de falar-lhe a maior parte do tempo no idioma nativo. Talvez fosse importante para ela, poder-se-ia dizer, nostálgico. A mais jovem também gostava de idiomas e era sobretudo inteligente, o conhecimento era sempre bem-vindo. Arriscou com a certeza de passar uma vergonha de proporções mitológicas em um sotaque mais ou menos forçado, acompanhado de um biquinho que Scarlet amou mais do que tudo.

Bonjour, mon amour...? – falou de sobrancelhas levantadas e lábios tremidos.

— Tanto pânico por um simples bom dia, Mara? – Scarlet riu com dois dedos na têmpora direita e o polegar na lateral do queixo. Achava-a linda mais do que tudo, ainda mais quando ficava com vergonha e suas bochechas tremelicavam. Sinais corporais que não deixava fugir aos olhos.

— Oras…essa língua é toda complicada, tem que mexer os lábios assim, “assado”.

Ela gesticulava e a lady brincava com o cenho, presa em tanta fofura. Vê-la daquela maneira tão despojada, completamente sua, enquanto aquele “para sempre” durasse, a trazia para um estado de consciência superior ao de qualquer trabalho bem realizado, ademais suas próprias lutas e receios pessoais. Um medo que pairava em seu subconsciente, enfim, começava a se esvair como fumaça, ainda que a preocupasse em momentos bastante específicos. Suspirou com a cena ligeiramente engraçada e recostou a cabeça no travesseiro amassado, com uma voz irritantemente doce e um pouco rouca graças ao despertar matutino.

— É porque você ainda está a aprender. Com o tempo e a fluência, mal perceberá os trejeitos nos lábios e a execução vocal deixará de ser um problema. Entretanto…não me importaria se continuasse a fazer estes biquinhos. – Imitou com os próprios lábios o gesto desajeitado da advogada. — É uma visão realmente preciosa, logo de manhã cedo, haha. – Riu abertamente.

Mara corou da cor dos olhos da amante com a provocação sutil travestida no elogio. Tudo bem, a intimidade conjugal é realmente intimidante. Mas ela dava tanto valor àquele momento e todos os outros que vivera recentemente com ela, decerto, aprenderia também, alguma hora a retira-la do pedestal de autossuficiência sem ser no sexo: situação onde por vezes a surpreendia com abertura a desejos até então desconhecidos para si mesma. E Scarlet era uma mulher de muitos dons, um deles era a capacidade de estar sobre si quase como que em passe de mágica. Era como se a hipnotizasse e roubasse sua consciência corporal em segundos. Tão assustador quanto excitante...

— C-como você faz isso? – perguntou com a lady sentada sobre suas coxas e mãos sobre seu torso, a acaricia-la ali.

Scarlet riu convencida e um sorriso maroto nos lábios, fitando-a, começara a lhe invadir a camiseta sob o pijama esverdeado. — Um bom mágico jamais revela seus segredos, Milady. – Provocou-a com a mão sorrateira em seus seios.

Sua namorada gemeu com o contato ligeiramente íntimo, entreabriu os lábios e semicerrou os olhos, sôfrega, desviou um pouco o olhar sendo pega de surpresa pelo ditame autoritário, mas gentil, da ex-domme francesa.

— Não tire os olhos de mim se eu estiver falando diretamente com você. – Scarlet pronunciou arduamente com autoridade.

— Scarlet? – Mara encolheu-se um pouco na cama, cenho fortemente franzido e a boca entreaberta, rendida pelo ar dominante e inconformada pela rispidez com que foi chamada a atenção.

A mulher pareceu oscilar no tom romântico por um segundo, umedeceu os lábios.

Pardon. Às vezes a minha Senhora interior dá o ar da graça. – comentou, tentando recobrar-se do acesso de dominatrix que acabara de ter.

Imediatamente, lançou o corpo com os lábios em trajeto direto à sua boca, olhava em suas orbes azuis, preocupada.

— Tudo bem? – mirava Mara com um olhar descrente sobre si, mas aquele típico arquear de cenho e um brilho único de curiosidade em seu olhar era suficiente para quebrar essa percepção ao meio, mesmo a despeito de lhe fazer questionar o nível de receio dela, com relação a seu comportamento opressor do momento. E ela tanto sabia como podia aproveitar daquela brecha para explorá-la da maneira que desejava.

A advogada levantou a sobrancelha e tocou-lhe os ombros gentilmente, ainda estremecida, mordiscou o lábio devassamente. 

— Sua Senhora, hum? – perguntou-lhe com certa temeridade e interesse.

— Um tanto quanto inoportuna, por isso, lhe peço desculpas... não era a minha intenção parecer autoritária no momento. – comentou em autodefesa, a ex-domme.

— Não disse que era ruim...na verdade, é até... – Mara limpou a garganta, corando e tentando não desobedecer a ordem de evitar olha-la enquanto falava consigo. —…interessante... - completou com ar curioso.

A lady sempre a esperava. Digno de seu caráter, sobretudo, de sua estratégia de caça. Respirou tão quente perto de seus lábios que sentiu-a suspirar, e sorriu de lado, convencida e de sobrancelha levantada.

— Interessante, Grayskull? – em ato contínuo, quase sobrenatural, agora segurava em um de seus pulsos com força delimitada. — Sei que um pouco de agressividade a agrada, mas essa para mim é nova, senhora advogada. A malícia em seu sorriso e tom acendiam certos quereres questionáveis por parte da mais jovem.

— Há algumas coisas em você... que me assustam, é um fato. Não deixei de ser honesta quanto a isso, você sabe. Mesmo desde First Ones. – disse meio tensa, rebuscando a memória, olhando para a direita.

— E se a sua Senhora quisesse beijá-la exatamente agora, ousaria desobedecer a tal ordem e lidar com as consequências, senhora advogada? – Scarlet impôs sua presença arrasadoramente, inquirindo-a com a voz firme, dentro de seus olhos.

— Não desobedeceria... – Mara soltou tão deliberadamente que arrancou da face da lady um sorriso levemente sádico em satisfação e a dama deslizou a mão esquerda ávida por toque em seu queixo, pressionando-o com certa força, não deixando de notar alguma resistência dela à constrição imposta e, tomou-lhe os lábios com voracidade.

Separou-se por poucos centímetros da boca lasciva de desejo da namorada e assegurou-se do tom a usar com ela. Pareceria mentira admitir o quanto aquela mulher aparentemente casta, quase cândida, a despertasse em suas formas mais animalescas de tempos remotos. Concentrou-se no máximo cuidado que sempre reservava para com ela mesmo no âmbito da comunicação e libertou verbalmente seu maior desejo, agora em aberto, desde que deixara Albert La Conti em Etérnia.

— Amaria saber até onde está disposta a servir a sua Senhora, Mara Grayskull. – a mais velha disse em tom pérfido de provocação, devorando seus olhos oceânicos.

Em sua mente, desejos obscuros que beiravam o sádico se formavam, apenas sombras e formatos de itens os quais ela conhecia bem e que sabia que assustavam a parceira, passavam de relance em seu hipocampo na tentativa subconsciente de converter o ilusório em uma imagem mental clara e nítida, e seu ventre queimou; sua boca salivava. Não podia perder-se daquele jeito tão facilmente. Haviam acabado de se conhecer.

Mara não teve uma resposta imediata na ponta da língua, seus olhos apenas piscavam rapidamente e sua estatura tremia um pouco abaixo do corpo da mais velha. Queria responder com todo o ar de seus pulmões o que realmente lhe passava na cabeça naquela hora, mas algum bloqueio a impedia. Scarlet a excitava de vários modos e níveis, seu jeito naturalmente dominante, seu olhar perfurante, a cadência e delimitação de seu discurso que parecia ter sido feito sob medida para agrada-la e instiga-la; eram apenas detalhes disso. Engoliu em seco, lutando contra um moralismo auto impingido, que embora ela quebrasse com maestria nos momentos mais íntimos, ainda a cercava em sua ética pessoal. Respirou fundo com a resposta hesitante que não escapou à leitura corporal que a outra fazia de si o tempo todo.

— Muito... - odiou-se por ter falado de maneira tão seca e rude a ponto de parecer idiota, mas era o que dispunha no momento, tão nervosa que estava.

Scarlet a mirou em sua hesitação e tensão aparentes, suspirou um pouco sem perder a pose em cima de seu colo, beijou-a na testa e disse sussurrante na voz pacífica, carregada em um tom sutil de ameaça. Ou seria promessa?

— Eu irei faze-la querer, senhora advogada. – Lhe piscou enquanto movia as pernas para fora da cama, saindo de cima de seu corpo.

— A-aonde você vai? – perguntou, à mínima percepção de uma mudança repentina de humor da companheira.

— Preparar-me para começar o dia de fato. Estes períodos de marasmo foram reconfortantes, contudo realmente tenho negócios a resolver. Preciso visitar um lugar. Foi a resposta meio fria demais que recebeu.

Mara recostou-se na cama ainda tensa, por pouco não suava frio. Tinha uma vaga ideia do que ela lhe propunha indiretamente, aquele relacionamento diário/semanal de servidão que sua irmã e cunhada, por vezes, lhe falavam de maneira superficial. Achava a ideia fora dos padrões tentadora, mas não sabia a fundo se era capaz de ceder-se tão incondicionalmente a alguém, mesmo que este alguém fosse Scarlet. Correu o olhar pelo quarto e mirou a nécessaire de couro sintético dela em cima da mesinha de centro, na suíte. Lembrou-se de na semana em que chegaram, tê-la visto remexer e retirar objetos, os quais olhou de relance e apavorou-se com a mais tenaz ideia do que aquelas coisas seriam capazes de fazer com sua mente e corpo. Perdeu-se na imaginação, suspirando boba e levemente excitada, sendo tomada de susto mais uma vez com a presença da mulher olhando-a, à porta e com frieza nas pupilas bordô.

— Pretende ficar na cama o dia todo, mon amour? – Scarlet falou-lhe já encostada à porta, com as mãos sobre a maçaneta, com certa impaciência.

— Como você se aprontou tão rápido? Digo... já estou indo. – Dispunha as pernas preguiçosas para fora dos lençóis.  

— Cinco minutos, Grayskull. Petit-déjeuner (café da manhã) é servido somente até as 08:00, são 07:45. Tempo de sobra para arrumar-se, não? - Seu tom estava meio irritadiço e ríspido.

Mara levantou-se em um salto, começou a vestir-se com a clara impressão de ela estava chateada, a mudança drástica em sua voz suscitava exatamente isso. Então seria mais ou menos assim viver em uma relação D/s com Scarlet Laviolette? Não poderia contraria-la ou já sofreria rudeza de sua parte? E passou, de fato, a se questionar se teria aptidão para adequar-se a seu modo de ser, o tanto que ela buscava adequar-se ao seu.

.....

Scarlet passava a geleia de cranberries na baguette e evitava direcionar o olhar para a namorada à sua frente, na mesa. Degustava o desjejum com uma classe invejável e, embora Mara compartilhasse certo nível de etiqueta, ainda conseguia ser ligeiramente desastrosa em seus trejeitos ao manejar o café da manhã francês.

A morena reclamou um pouco ao notar que em vez de café o restaurante do hotel mandara uma minúscula xícara de chá quando ela pediu à la carte, além da presença de tão pouca comida, diferente do banqueteio com que era acostumada. Parecia que aquele menu a queria matar de fome! Olhou a comida ali disposta sobre a toalha branca de seda, de cenho arqueado e correu o olhar pelas outras mesas, prestando uma vaga atenção aos demais hóspedes no ambiente.

— Não está de seu agrado? – A lady perguntou-lhe levando o pequeno pão aos lábios, quebrando as camadas duras, fazendo um ruído mínimo com o mastigar.

— Não é isso... é apenas...estranho. – Ela resolveu imitar o gesto e cobrir a baguette com a geleia. Mordeu-o olhando-a nos olhos e percebendo certa diferença no trato visual que a dama passara a lhe conceder naquela manhã depois do rápido diálogo na cama.

— Completamente aceitável, senhora advogada. Tudo o que é novo causa alguma resposta de medo, rejeição e estranheza. – disse cínica, capciosa e despreocupada com as interpretações que suscitaria. Talvez fosse exatamente a reação que queria evocar.

Mara levantou a sobrancelha, suspirou e continuou a comer com vagarosidade.

— Para onde pretende ir depois daqui?

— Um lugar importante aonde trabalhei... - Scarlet foi vaga em suas palavras.

Mara buscou o motivo daquela aparente chateação, a mudança de humor inesperada e não sabia se atribuía à sua hesitação de minutos atrás com ela, na cama, ou se o tal lugar assumiria a responsabilidade por aquela trágica mudança do vinho para a água. Scarlet passara a ficar de poucas palavras, e fria. Será que era culpa dela?

— Eu devo ficar no hotel, então? Ou gostaria de companhia...? Isso é se... – lançou com certo receio o autoconvite.

— A seu critério, Mara. – disse-lhe friamente. — Possivelmente terei de me reunir com uma pessoa de meu passado, não sei o quanto isso a incomodaria. – Completou levando o chá quente aos lábios, com tranquilidade.

“Uma pessoa do passado” .... - Mara pensou e gelou.

Não sabia muito do passado da lady, apenas a parca história que ela lhe contara na mansão Grayskull e ainda por cima, em fragmentos. Sabia que não era da mãe de Scarlet que falavam, pois a mesma lhe comentara vagamente de sua morte. Quem poderia ser? E se a tal pessoa do passado de sua namorada fosse a responsável pela alteração de humor dela, precisaria desse alívio dentro de si. Precisava ir com ela. Não queria se sentir culpada.

— Se não se incomodar, eu gostaria de ir sim. Ficar sozinha aqui, já que não sei quanto tempo irá demorar, me mataria de tédio. – Arriscou, com espírito da advogada sagaz e assertiva que costumava ser.

— Como quiser, senhora advogada. – Scarlet terminou o café e fez menção de levantar-se, um pouco indiferente.

Mara a seguiu até a recepção para entregarem o check-in do dia, sua mente não parava de lhe perturbar. Por um breve momento, cogitou aceitar incondicionalmente qualquer condição que ela lhe impusesse caso isso trouxesse de volta a dama sorridente e carinhosa de hoje de manhã. Sequer percebera que estava antecipando fatos. Enfim, as incertezas de um relacionamento de primeira de viagem.

No carro devidamente alugado, lançava olhares para a lady silente a dirigir, compenetrada no trânsito da capital do vinho francês, até então, quase coagulante de tantos veículos. Mara não podia deixar de observar a grande paisagem urbana, ainda que pelos vidros abaixados e em movimento. Podia divisar um pouco ao longe os nomes de algumas placas de estabelecimentos comerciais e jardins por quase todas as ruas por que passavam, seus olhos se maravilhavam com a novidade da mudança de cenário. Scarlet manobrava com maestria por entre os carros, tomou o rumo até a Rue de la Fontaine e estacionou em frente à um restaurante com uma belíssima fachada branca com um logotipo peculiarmente único: o desenho de uma xícara de café e uma rosa vermelha acima da fumaça do vapor. A decoração externa seguia com tons de dourado e preto nas junções das paredes. À frente da estrutura havia um arco floreado por imagens de rosas vermelhas tão vívido que ela podia jurar que se tratavam de flores empalhadas ali no concreto. Sentiu o toque cálido, embora endurecido, em seus ombros.

 

Allez, allons à l’intérieur. (Venha, vamos entrar.). - Cedeu a mão direita polidamente.

Mara entreabriu os lábios meio surpresa com o lugar. 

— Você trabalhou nesse café? – leu na fachada chamativa “Red Rose Café”.

Escutou um risinho cínico e dissimulado dos lábios semicerrados da lady.

— Não se deixe enganar pelas aparências, ma chérie. O que procuramos encontra-se um nível abaixo, se é que me entende. – Arqueou o cenho cinicamente, trazendo-a para dentro do estabelecimento.

Red Rose Café, ao que parecia aos olhos da advogada, se tratava de um café comum desses de se encontrar em qualquer esquina, só que com certo luxo. As cores internas a lembravam um pouco de Etérnia e isso gerava alívio e incômodo em proporções quase iguais. Era meio inevitável não lembrar do pânico sofrido ao pôr os pés pela primeira vez no famigerado clube adulto. Por fim, o que seria tão assustador como entrar em um clube bdsm em plena First Ones e dar logo de cara com um chicote longo pendurado na parede do escritório da proprietária da casa noturna?

Descer para o porão do estabelecimento e, de fato, deparar-se agora com um pub em iluminação artificial vermelha, um grande sofá composto aonde residia uma fila de pessoas trajando algo que ela entendeu como couro, em cor preta, a presença de metal em seus vestuários e o menos esperado, mas igualmente e até mais, chocante: uma mulher de aproximadamente uns 25 anos de idade, com apenas algumas partes específicas do corpo também cobertas por couro a engatinhar, seminua, na frente daquele bando de humanos que pareciam deliciar-se com tal condição degradante. Choque infinitamente maior do que só ver alguns apetrechos eróticos distribuídos como decoração em um escritório, certo, Mara Grayskull?

Scarlet caminhava ao seu lado com um pesar nostálgico no olhar, notara sua reação e lançou-lhe um olhar benevolente.

— Continue andando, Mara. Foram as únicas palavras que lhe disse calmamente, despreocupada.

 

Andar por aquele antro de libertinagem humana a permitia ver coisas ligeiramente aterradoras como um homem de porte atlético, completamente restrito de todas as liberdades motoras, a boca salivante sob uma mordaça preta com um grânulo vermelho saindo para fora dos lábios e uma conhecida coleira em torno do pescoço, que parecia sufocá-lo. Ao seu lado, uma senhora de mais ou menos uns 50 anos. A mulher fumava e bebia e vez ou outra o puxava maldosamente pela guia da coleira, com um olhar tão sádico que ela lembrara de certa semelhança com um determinado olhar de Scarlet sobre si algumas vezes. Mara tocou a própria nuca, estremecida com a vaga ideia de estar naquela posição. A gota d´água foi escutar um gemido na tentativa de falar que, aquele escravo, sofregamente, lutou para pôr em palavras. “Sim, Senhora.” A advogada sentiu o calafrio lhe percorrer a espinha ao mesmo tempo em que a mensagem fisiológica foi entendida em seu baixo ventre como um pulsar rápido e forte.

O prosseguir de passos parecia não ter fim, e cada cena seguinte, uma mais estarrecedora que a outra, até enfim, chegarem ao final de um extenso corredor vermelho onde havia uma série de portas dispostas frente a frente em um ambiente ligeiramente mais escuro do que o do próprio pub em si. Uma parca luz artificial trazia alguma luminosidade aos olhos da morena totalmente surpresa e assustada com o que via. Por fim, o silêncio foi irrompido e ela pôde ouvir gritos. Em plena luz do dia. Começara a ter uma ideia horrível do lugar onde Scarlet dissera ter trabalhado.

Agarrou-se ao pescoço da lady fortemente, seus dedos tremiam. Scarlet segurou-a na mesma hora, virou seu rosto para si com a prontidão da sensação de segurança que Mara implorava no olhar.

 

— Calma, está tudo bem. – Tranquilizou-a, mas ela estava tão assustada. Muito mais do que quando conhecera Etérnia.

— E-este lugar é.... – Gaguejou, com a respiração acelerada.

— Um clube bdsm como Etérnia. – disse calma porém irônica, levando-a até o final do corredor que fazia Mara lutar contra o sentido da audição para não se estarrecer ainda mais com os brados alheios indistintos.

— V-você trabalhou aqui... – ela disse, apavorada, abraçada ao seu braço direito. O contato com ela sempre a tranquilizava, mesmo ciente das intenções subentendidas dela para consigo.

— Sim, ma chérie.

— Este lugar não tem fim?

— Mantenha-se calma, s'il te plaît? (Por favor?) – lhe beijou o topo da cabeça carinhosamente.

A última sala, muito mais afastada e de onde ela não ouvia nenhum ruído horripilante finalmente estava à sua frente. Scarlet soltou um suspiro antes de dar dois toques singelos e respeitosos com as costas dos dedos indicador e médio na porta marrom de madeira rústica.

Uma jovenzinha de etnia oriental, olhos puxados e aquela irritante coleira no pescoço abriu a porta, mirou Mara de cima a baixo e ao pôr os olhos em Scarlet, imediatamente baixou o olhar com uma expressão subserviente que trouxe questionamentos à advogada.

Com a devida licença, adentraram.

 

— Antoinette! – a ex-domme falou com certo ânimo na voz.

— Laviolette! – a outra mulher presente no recinto, sentada atrás de uma mesa preta ergueu o cenho e falou, também animada. Antes de mais nada, parecia surpresa.

Pouco menos branca e alta do que Scarlet, um pouco mais corpulenta, grisalha de seus quarenta e poucos anos também, ela não trajava roupas características do cenário bdsm, o que tranquilizou um pouco Mara, apesar da serviçal ao lado parecer-lhe mais uma escrava e, mal notou a presença dela ter parecido desaparecer dali.

Quels bons vents vous ramènent en France?! (Que bons ventos a trazem de volta à França?!) – a senhora de cabelos grisalhos, colete branco-creme e uma choker em formato singelo de gargantilha em torno do pescoço incomodou os ouvidos de Mara com o estalar de pesadas botas no chão, surpresa com a visita da amiga que não via há tantos anos.

Les vents de la nécessité d'un changement d'air! (Os ventos da necessidade de uma mudança de ares.) – Scarlet comentou em francês polidamente, sem ignorar a presença da namorada.

Ao passo que a outra senhora se aproximava de si, e surpreendentemente levantou-lhe os pulsos olhando-a nos olhos e um sorriso se formou em seu rosto, a mesma olhou de soslaio para Mara meio estática, ali ao lado, ainda de pé.

Antoinette, c'est un grand plaisir de vous revoir. (Antoinette, é um grande prazer vê-la novamente.).

A mulher mirou a advogada ali parada, observando a interação entre elas e pôs a mão no queixo rapidamente, repetindo o mesmo olhar de análise da garota nipônica, com um ar que fez Mara se arrepiar e disse com a voz grave, austera, tanto a responder o cumprimento da velha amiga quanto a perguntar algo inusitado.

Je peux dire la même chose, Scarlet. Est-ce votre esclave? (Posso dizer o mesmo, Scarlet. Esta é sua escrava?).

Quelle? Non! Voici Mara Grayskull, ma ... petite amie ... (O que? Não! Esta é Mara Grayskull, minha...namorada...) – disse meio inconformada, puxando a mão de Mara para apresenta-las devidamente. — Chérie, Mara ne parle pas complètement le français, on communique mieux en anglais ici... (Querida, a Mara não fala francês completamente, é melhor nos comunicarmos em Inglês aqui.). – Direcionou-se à amiga de quase mesma idade da sua.

Oh, oui! (Oh, sim!) – Pigarreou. - Delighted to meet you, Miss Grrrayskull. (Encantada em conhece-la, Srta. Grayskull.). – disse com tanto sotaque naquele Inglês quase perfeito.

My pleasure. (O prazer é meu.). – Mara agradeceu o cumprimento cortês e observou aquele mesmo aperto de mão dominante que a fizera ter o primeiro gay panic intenso da vida, com Scarlet há meses atrás. Retirou a mão um pouco trêmula.

Would like have a seat, Miss Grrrayskull? (Gostaria de se sentar, Srta. Grayskull?) – Antoinette ofereceu o assento em uma poltrona preta, ali em seu escritório.

I appreciate it. (Agradecida.). – A mais jovem entre as três se sentou, de pernas cruzadas e analisava o ambiente.

Scarlet afastou-se um pouco para conversar com a ex-colega de profissão. Em poucos minutos de conversa, descobrira que a amiga havia convertido o antigo cabarét francês em um pub liberal anos após sua partida de Bordeaux. Ela olhava com nostalgia por todo o escritório, parecia sofrer uma dor deliciosa com lembranças que passavam em sua mente continuamente durante aqueles minutos de reencontro.

Où l'as-tu trouvée? – (Aonde você a encontrou?) - a de cabelos cinza perguntou com o olhar cravado em Mara, ali a quatro passos de distância.

— First Ones, la ville dans laquelle j'ai déménagé. Mara y est avocate. Le meilleur de la ville. (First Ones, a cidade para a qual me mudei. Mara é advogada lá. A melhor da cidade.). – Manifestou com certo orgulho, correndo o olhar de esguelha à morena, ao responder à pergunta da amiga.

Maintenu la norme de qualité. Ne me surprends pas, Laviolette. (Manteve o padrão de qualidade. Não me surpreende, Laviolette.). – A grisalha comentou sem tirar o olhar insidioso sobre Mara, que até então olhava para o lado, observando a criada em pé. Na verdade, esse tempo todo ela havia se mantido em silêncio e assustadoramente estática como se fizesse parte da decoração, que Mara mal pôde perceber sua presença.

A conversa continuava em um francês rápido e fluente demais para Mara acompanhar, ela suspirou um pouco impaciente ao lembrar das coisas aterrorizantes que havia presenciado desde que pusera os pés no pub. Acompanhou com o olhar as duas senhoras virem até onde estava, ali cismada, à espera de sua namorada.

De repente Scarlet a olhava de cima, Antoinette também e Mara pôde observar melhor seus traços, que apesar da idade, a faziam parecer atraente aos seus olhos. Suas orbes castanho-mel, as madeixas grisalhas, comportadas em um coque com fios escorridos próximos das têmporas, nariz bem delineado e longilíneo e os lábios carnudos em batom vermelho-vivo. Perdeu-se um pouco admirando-a e voltou o olhar à sua própria dama, que estava séria, mas com uma linha semicerrada nos lábios entreabertos, indicando um frágil sorriso.

— Mara, semprrre-bem vindo a Red Rose Café. – Antoinette arriscou fora de seu idioma nativo e Scarlet riu sutil, com um dedo nos lábios.

Better in English, ma amie. (Melhor em Inglês, minha amiga.) – Provocou a amiga domme.

Très bien, Laviolette. (Muito bem, Laviolette.) – Olhou-a com certo ar de ralha e pigarreou, consertando a pequena gafe. — Always welcome to Red Rose Café, Mara. (És sempre bem-vinda em Red Rose Café, Mara.)

Thank you so much, Mrs....? (Muito obrigada, Sra....?) – suscitou-lhe saber o sobrenome.

— Leblanc. – A grisalha confirmou, olhando-a diretamente.

Thank you so much, Mrs. Leblanc. (Muito obrigada, Sra. Leblanc.) – olhou para baixo enquanto lhe fornecia a mão novamente e mais uma vez se sentiu capturada pelo olhar imponente da mais velha, piscou rapidamente e voltou a si, dando as mãos à Scarlet.

We’ll be back here soon, Antoinette. (Estaremos de volta aqui em breve, Antoinette). – Scarlet falou por último, despedindo-se da ex-companheira de profissão.

.....

 

— Temos mesmo que voltar aqui? – a morena respirava aliviada entrando no carro para a viagem de volta.

­— A incomodou tanto, senhora advogada? - Scarlet parecia ter voltado ao tom ríspido matutino.

— Um…pouco. É mais... intenso do que Etérnia. – Engoliu em seco, com ênfase vocal e um arquear de cenho naquele “intenso”.

A dama suspirou profundo, com descontentamento no timbre.

— Você tem sorte. A Antoinette gostou de você. – Riu cínica enquanto ligava o carro.

A advogada franziu o cenho fortemente e inclinou a cabeça com as sobrancelhas levantadas em certa indignação, virando o rosto totalmente para questiona-la enquanto Scarlet dirigia.

— Eu precisava ser avaliada e aprovada, é isto? – esbravejou, emburrada.

— Apenas por mim, Mara Grayskull. Ela é apenas uma antiga colega de profissão e uma boa amiga, deveras importante para mim. De qualquer modo, me agrada que tenha gostado de você. – completou, voltando a atenção total ao volante.

Mara fechou a expressão por um momento e se manteve calada o resto do trajeto de volta ao hotel.

Tantas coisas lhe visitavam a mente, e sim, aqueles homens e mulheres amarrados e com coleira, além dos gritos que ouviu, a incomodaram bastante. Embora, para Scarlet parecesse normal a ponto de não lhe fazer sequer pestanejar, para Mara, era estarrecedor. Quem sabe sua irmã e cunhada no outro lado do continente não poderiam lhe dar algum norte sobre este mundo tão novo para si e que cruzava o limite entre o belo e o assustador?

 


Notas Finais


Cheguemo até aqui, né?

Aproveito pra panfletar que tem uma collab monstrenga saindo com uma escritora FODAPACARAI que é a BeaCorchiero... e adivinhem, é de She-Ra tbm n.n (vão lá dar uma conferidas nas obras dela, é uma ordem. u.u)

Intéhh


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