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História Inimigos de Primeiro Grau- Fillie - Calado Você é Um Poeta, Wolfhard


Escrita por: Anabellay1

Notas do Autor


Voltei com um capítulo grande!

Capítulo 2 - Calado Você é Um Poeta, Wolfhard


 

Coloco a cabeça para fora do carro e puxo uma lufada de ar, os meus cabelos voando e se embaraçando feito pêlos de cachorro, do outro lado do banco Wolfhard faz o mesmo, o ar gelado da noite circula dentro do ambiente, o cheiro estava bem melhor após a parada no posto de gasolina, onde eu e Sadie pudemos nos lavar, já que o jato de vômito dela foi direto do seu colo para as minhas pernas. Os outros três aproveitaram para tirar os tapetes e jogar uma mistura improvisada de água e do perfume de bolso do meu pai em tudo o que fosse possível.

Olho para o lado e mesmo no escuro consigo distinguir as feições pálidas da minha amiga, ela tem a cabeça apoiada e as mãos caídas de maneira inerte sobre as coxas.

- Está se sentindo melhor, Sads?- solta um muxoxo desanimado em resposta. Encosto as costas da mão em sua testa.- Ela está muito gelada.

- Devem ser os calafrios... você lembra de ter comido alguma coisa diferente ontem?- Winona pergunta, mas sem virar o rosto para nós, os vidros da frente também estão abertos.

- Na verdade não, também não sabia que enjoava assim em viagens de carro, me desculpa.- a pobrezinha geme em desgosto e fecha bem os olhos como se fosse afastar assim o enjôo.

- Não precisa pedir desculpas, Sadie, essas coisas sempre acontecem com alguém em uma viagem longa dessas, Finn também costumava passar mal quando era criança.- a mulher fala, olho para as luzes lá de fora, que saltam aos meu olhos.

- Até naquele dia em que nós fomos visitar o museu da Coca-Cola juntos, lembra? Nossa, o jato de vômito dele foi realmente inesquecível, acho que foi ali mesmo que nós nos tornamos uma família, Finnie.- o provoco, a sua mãe ri e o meu pai finge uma tosse para mascarar a gargalhada, Finn não me responde, o farol do carro que vem do sentido contrário ilumina o seu rosto brevemente e percebo que ele está encarando o encosto do banco da frente, seus olhos estão baixos e a boca entreaberta como se ele a tivesse esquecido escancarada.

- Eu não sabia dessa história do passeio à Coca-Cola.- a voz da garota sai fraquinha, mas distinguo o bom humor em seu tom.

- Ah, foi uma linda tarde de sábado, papai quis levar os dois para conhecer Atlanta e o primeiro lugar que escolheu foi a Coca-Cola, sim, eu sei, zero romantismo, mas a esse ponto Winona já deveria saber onde estava se metendo...

- Ei!- o velho reclama lá da frente, mas eu o ignoro e continuo a narrativa.

- Então os pombinhos sairam juntos para fazer alguma coisa estranha que gente velha faz enquanto namora...

- Millie...- Winona chama a minha atenção.

- Aí, eu e o meu futuro maninho fomos até o outro lado da rua comprar alguma coisa para comer e, bem, digamos que aquele não foi o melhor cachorro quente que Finnlard já provou.- finjo sussurrar a última parte somente para ela, a sua risada fraca preenche os meus ouvidos.

- Que covardia, mal sabia ele que estaria fazendo isso na frente da maior fofoqueira do lado leste de Atlanta.- Sadie grunhe quando nós passamos por uma lombada.

- Mas que absurdo, sou a pessoa mais discreta que eu conheço.- uma rodada de gargalhadas preenche o veículo, o meu pai chega a limpar os olhos quando vira o rosto na nossa direção.

- Você é a pessoa mais boca grande que eu já vi, Millie.- abro a boca em protesto, arregalando os olhos, ele apenas ri mais com o meu gesto, cerro os lábios quase imediatamente a isso.

- Mas que calúnia, pai! diga uma só fofoca que eu fiz e que você ficou sabendo.- cruzo os braços no peito, tentando lembrar de alguma coisa na mesma hora, tenho certeza de que ele vai usar a vez em que ouvi a Sra.Oona falar que estava com suspeita de epatite e eu,na imensa inocência de uma criança de seis anos de idade, saí contando para a vizinhança toda que a velhinha tinha contraído uma DST, mas, em minha defesa, eu havia escutado o termo em um filme na semana anterior, fora que eu também não sabia que nem todas as doenças eram DST's...

- E que tal quando a senhorita falou para a Winona que eu iria pedi-la em casamento?- a sua voz é pura provocação.

- Essa é uma calúnia ainda maior, primeiro porque eu não falei diretamente com ela, segundo que eu apenas contei ao Finn, não é minha culpa se ele não manteve a palavra e espalhou a conversa adiante.- defendo-me.

- Mas você admite que foi a culpada pela fofoca ter começado, então?- Sadie se mete, erguendo levemente a cabeça e franzindo o cenho para mim, recuo o rosto quase imediatamente e por puro reflexo, vai que ela vomita bem na minha boca frouxa.

- Eu não admito nada, pode perguntar ao Wolfhard, foi ele quem me pressionou a contar.- digo.

- Isso foi verdade, Finn?- Winona o repreende lá da frente.

Ele não responde.

- Finn, eu te fiz uma pergunta.- ela insiste.

- O gato comeu a sua língua, Finney?- provoco, Sadie cutuca o cotovelo dele, ele nos olha, consigo captar o seu ar desatento mesmo de onde estou.

- Ahm?- ele se desencosta do banco e ajeita as pernas longas, antes apoiadas na mochila preta, minha mochila preta, que acabou indo parar ali após a sessão de limpeza improvisada.

- Não foi verdade que você me obrigou a contar sobre o noivado deles?- o garoto me olha durante poucos segundos antes de voltar a olhar para a frente.

- Sim.- um silêncio estranho paira quando ouvimos a sirene de um carro de polícia passando apressado à esquerda, mais uma vez o seu rosto é banhado pelas luzes, desta vez sescarlates, posso ler suas expressões mais facilmente, mas por poucos milissegundos somente. Troco um olhar de desconfiança com Sadie, mas ninguém fala mais nada sobre o assunto, nem mesmo o xerife, olho para a frente novamente e vilumbro o olhar da minha madrasta sobre o meu através do retrovisor, desvio a atenção para a estrada em seguida.

Em menos de dez minutos, estamos estacionando em frente a uma pequena lanchonete de beira de estrada, foram seis horas de viagem até decidirmos dormir aquela noite no Kentucky, com Sadie botando as tripas para fora ficaria bem mais difícil de se viajar durante a noite, e era perigoso pernoitar nas estradas, mesmo que dentro de um carro em movimento, havíamos tido paradas para o banheiro e somente um lanche às seis da tarde, agora já são quase onze da noite. No geral o local é limpo, e não há ninguém ocupando as mesas polidas de tampo vermelho amarronzado quando chegamos, uma garçonete morena nos traz cinco cardápios e papai vai olhar as opções de pratos especiais que há em um pequeno letreiro iluminado, afixado na parede de papel gasto, mas limpo. Sadie vai ao banheiro e pede que nós peçamos uma sopa para ela, fico levemente tentada a segui-la para ver se estava passando mal pela segunda vez, mas decido dar-lhe alguma privacidade, por último, é Finn quem se afasta com o celular, o aparelho dá somente um toque e ele já está de pé no mesmo instante, segurando-o contra o ouvido e caminhando até o lado de fora, quando abre a porta de vidro o som dos carros na rodovia preenchem o ambiente e se misturam com o do sininho de boas-vindas, então volta a fecha-la com cuidado às suas costas e o barulho de pratos toma conta da atmosfera novamente, não consigo evitar de seguir-lhe com os olhos até perto do de uma antiga cabine telefônica, os vidros embaçados da grande janela ao nosso lado o transformam em um borrão escuro e alto, ao longe.

- Finn está chateado com o pai.- tiro os olhos do vidro e olha para Winona, sentada bem à minha frente, havia esquecido da sua presença.

- Por que?- um segundo depois de perguntar me arrependo, eu sabia que aquilo não era da minha conta e também que não era segredo que o Sr. Wheeler, pai de Finn, era um tanto quanto omisso em relação ao único filho, prova disso era justamente ele ter ganhado somente o sobrenome da mãe ao nascer, pelo que eu sabia, Finn só foi oficialmente reconhecido como sendo dele aos cinco anos de idade.

- Fred ligou para ele enquanto estávamos abastecendo mais cedo, acontece que estava combinado de os dois viajarem juntos em agosto, iria buscá-lo em Hawkins, mas acabou não dando certo, como sempre.- ela vira o rosto, como que para se certificar de que o filho ainda está lá fora.

- Que pena para ele, tenho certeza de que Finn deveria estar bastante animado em sair com o pai.- lembro das suas feições alegres de hoje mais cedo. Ela abre a boca para me responder, mas fecha quase imediatamente quando o sino da porta soa mais uma vez, Finn chega levemente cabisbaixo e ainda guardando o telefone no bolso da calça, não havia reparado que ele estava usando uma touca antes, Winona limita-se a sorrir para mim, dando a conversa por encerrada, vejo Sadie lavando o rosto no fim do corredor que dá aos banheiros e me pego torcendo para que ela se apresse logo para que eu tenha com quem conversar, papai fala amigavelmente com um rapaz de avental branco, provavelmente pedindo para que adicionem mais bacon em seja lá o que for que ele pediu.

A garçonete volta com um aceno da mãe de Finn, que pede a sopa de Sads e depois começa a conversar com a moça sobre o que exatamente viria acompanhado ao queijo quente com presunto de peito de peru. Olho para o seu lado direito e o vejo brincando com um saleiro sem realmente prestar atenção no que fazia, seus dedos longos e brancos pareciam prestes a dar nó enquanto ele virava o objeto de um canto a outro, estava aparentemente fechado. Acho que sente-se ser encarado, pois devolve o meu olhar com uma máscara de desinteresse impressionante, eu sinto um arrepio subindo a espinha ao devolvê-lo com a mesma postura, o desprezo em seus olhos escuros é tão palpável que o meu primeiro impulso é levantar de onde estou sentada e ficar bem longe daquele lunático.

- E vocês dois, o que vão querer?- a voz da moça coincide com a sua desistência em tentar fritar viva a minha alma, ele a olha de maneira monótona e depois lança uma olhadela para o cardápio aberto e sibila algo a ver com o número quarenta e dois.

- E você?- ela gira o corpo em minha direção e eu viro o rosto quase na mesma hora em que ele volta a me olhar, sinto os seus olhos perfuraram a lateral do meu crânio enquanto a mulher me olha, esperando que eu me decida de uma vez.

- Pode ser o mesmo que o dele.- pego-me balbuciando, com voz baixa. Não torno a olha-lo nos olhos durante todo o jantar, e para minha felicidade, os outros dois ocupantes da mesa onze voltam a tempo de me salvar de mais alguns minutos constrangedores entre Finn e a sua aparente ira inadivertidamente dirigida a mim.

 

Apoio o interior do meu antebraço no travesseiro, afofado pela milésima vez pela minha pessoa. Coloco a cabeça para um lado, coloco a cabeça para o outro, nada, simplesmente não estou conseguindo adormecer com essa motosserra chamada Sadie Sink dormindo de cara colada com a minha. Finalmente, chuto as cobertas para o lado e puxo os chinelos roxos dela para os meus pés, abro a porta do quarto e sinto-me bruscamente desorientada enquanto refaço o caminho pelo corredor, preciso dar a volta no prédio e descer um lance de escadas até chegar à máquina de refeigerantes, ponho todas as moedas e aperto o botão, olho por sobre o ombro e avisto a área da piscina a menos de vinte metros, uma cerca pequena a rodeia e há uma sombra sentada à sua borda. Olho para a máquina novamente, nada da minha Coca, dou uma porrada de lado, e quando não dá jeito também uma pancada com a lateral da perna.

- Mas que safadeza, ainda me roubou um dólar!- chuto a frente iluminada daquela porcaria.

- Estressada, Milliezinha?- a voz debochada soa alto e vem de perto da água, viro para responder, mas o som estridente do alumínio caindo perto dos meus pés me tira a atenção. Abaixo a cabeça e vejo duas latas vermelhas cintilando na abertura, apanho-as e afasto um passo, ainda olhando para a máquina de aparência antiga, acabou que fui eu quem a “roubou”.

Afasto-me e vou para perto da grade de ferro da piscina, Finn está com as pernas mergulhadas até o joelho, e ainda usa o mesmo moletom de mais cedo. Encosto os cotovelos na portinhola oxidada e ele tira os olhos do celular para olhar para mim mais uma vez, tenho a impressão de que acabou de desliga-lo, as luzes da piscina o iluminam e dão-lhe feições estranhas, assombradas e azuladas, as ondulações da água desenhando linhas escuras por sua figura. Eu ergo um dos refrigerantes em uma oferta silenciosa e ele assente uma vez com o queixo para cima.

A estreita passarela que dá acesso ao parque aquático do pequeno hotel é totalmente revestida por uma grossa camada de cimento e grama falsa, jogo os calçados para o lado e sento a alguns centímetros dele, no começo nós ficamos apenas em silêncio, não era raro termos de fazer companhia um ao outro, especialmente quando saíamos com os nossos pais, na verdade, na maioria das vezes em que conversávamos seriamente eu até conseguia suporta-lo por alguns minutos. Ele engole a bebida aos montes e ainda estou abrindo o lacre da minha, cruzo as pernas em posição de ioga e arranco alguns tufos do mato sintético enquanto tento puxar algum assunto.

- A sua mãe disse que você ia viajar com o seu pai no fim do verão.- ouço risadinhas e a luz de um dos quartos que ficam perto da saída para a garagem ascende, quando volto a olha-lo, Finn me observa de maneira curiosa, penso por um instante se ele vai me ignorar como de costume, ou se vai apenas me mandar cuidar da própria vida.

- Pois é, mas acontece que ele é um cretino ausente, então não, não vou mais a lugar nenhum no fim do verão.- abaixo os olhos para a Coca, eu não respondo de imediato, e acho que percebe a minha surpresa com tamanho desprezo e sinceridade, porque volta a me olhar com um sorrisinho humorado antes de continuar a falar.

- Não fique assim tão chocada, não é como se isso fosse algum segredo de estado.- trocamos olhares silenciosos, e ele continua a me observar com aquele semblante de gozação, mas sinto uma onda diferente de emoções convergindo quando analiso aquele sorriso trêmulo e aquelas sobrancelhas arqueadas em desafio, nenhuma delas, no entanto, tem a ver com a raiva ou irritação costumeiras, eu sei que esse é um tema delicado para ele e não pretendo ficar pisando no calo de ninguém.

- Bom, então sorte minha que o meu futuro irmãozinho não vai me deixar durante todo o verão.- ele solta uma risada nasalada e mexe nos fios cacheados e bagunçados, mais parecia que haviam acabado de sair do olho de um furacão.

- Três longos meses, doçura, você não vai ter para onde correr.- ele passa o braço por meus ombros e me dá uma sacodidela de brincadeira, surpreendo a mim mesma com uma risadinha esganiçada.

- Isso até eu te trancar no sótão a pão e água, Finnelman.- ele retira o braço de mim e me acompanha no riso.

- Não posso reclamar muito, Hawkins é tão chata que em algum ponto eu provavelmente irei implorar para que você comece uma discussão comigo, só para ter o que fazer.- sacode a sua latinha vazia e eu bebo um pouco da minha, ainda completamente cheia.

- Pensei que conhecesse muita gente lá, você sabe, cidade pequena e tal.- ele pondera o que eu disse, com uma careta.

- Mais ou menos, conheço muita gente lá, sim, mas Hawkins não tem quase nenhum lugar interessante para se ir, quero dizer, tem o shopping no centro da cidade, tem algumas lanchonetes legais até, tem o lago...

- E tem a casa da sua avó.

- E tem a casa da minha avó, verdade, talvez o lugar mais divertido de todos esses, mas pobre Noah, deve estar doido para se mandar de lá assim que terminar o ensino médio.- comenta por alto, como se estivesse falando aquilo somente para si mesmo.

- Noah é o seu primo mais novo, não é?- tento puxar do fundo da memória aquele nome, tenho a vaga lembrança de Winona nos mostrando fotos de quando Finn era pequeno, havia sempre um garotinho um pouco menor do que ele nas imagens.

- Um ano mais novo, ele mora com a nossa avó desde que se entende por gente.- diz, continuamos sem nos olhar, estamos os dois encarando o quarto oitenta e cinco, a luz ainda está acesa, mas os risinhos foram substituídos por ruídos estranhos e sons entrecortados.

- Eu lembro da sua mãe falando dele, é ele que tem pais arqueólogos, não é?- falo, mesmo sabendo que dificilmente ele teria outro primo que foi criado pela avó porque os pais vivem viajando.

- Esse mesmo, o filho da mãe poderia estar dando a volta ao mundo agora, mas preferiu ficar metido naquele buraco.- um grito alto e feminino nos faz parar a conversa repentinamente, logo depois, uma voz masculina profere palavras de incentivo em meio a uma patética tentativa de gemido. Nós nos entreolhamos e caímos na gargalhada, o homem, provavelmente já passado dos trinta, parecia estar tentando excitar a moça, mas o resultado estava mais para um bode sendo torturado.

Passamos ainda mais alguns minutos, ali, espiando o vergonhoso sexo alheio, os gritos fingidos dela são tão agudos que muito me admira que nenhum hóspede tenha reclamado. Quando a coisa realmente degringola para a patifaria, é que resolvemos nos recolher antes de adquirirmos algum trauma grave, não obstante, o fato de a gargalhada escandalosa de Finn ter feito o homem parar de imitar um porco no abate, também nos alarmou, saímos escondidos da área de lazer e nos camuflamos junto às folhas secas de uma grande samambaia de plástico que havia perto das grades laterais, espio sem sequer respirar e vejo que a luz do quarto se apagou depois do nosso alarme, os barulhos agora não podem mais ser ouvidos.

- Sacanagem, Finn, você acabou com a festa do tiozinho.- falo mais tarde, enquanto caminhamos calmamente rumo às nossas respectivas camas.

- Sacanagem é vir tirar o atraso em um motel de beira de estrada, Millie, não me culpe por ser uma pessoa consciente.- o seu riso preenche o corredor mal iluminado, paramos exatamente na porta da suíte que divido com Sadie, já posso imagina-la lá dentro, tomando todo o espaço do colchão de casal e fazendo mais barulho com a boca do que o casal sem noção do quarto lá de baixo.

- Ah, qual é, não me diga que nunca ouviu o xerife...

- Eca! não, que nojo! acho que eu me jogaria da ponte caso ouvisse o meu pai fazendo coisas... por que? a sua mãe já...

- Não, não, foi na casa de um amigo meu, Reuben, nós matamos aula no meio da tarde pra jogar videogame, acontece que os pais dele já estavam se divertindo e muito bem no meio da sala de estar.- tento imaginar a cena.

- Que trauma, e o que vocês fizeram?- dá de ombros antes de responder, sua mão vai até o bolso e ele tira a chave de lá.

- Eu saí de lá o mais rápido que pude, mas o pobre Reuben deve estar fazendo terapia até hoje.- ele ri enquanto gira a maçaneta, faço o mesmo e empurro a minha porta, espio o lado de dentro e vejo Sink ressonando tranquilamente. Finn ainda está encostado no umbral quando eu me viro para me despedir, avalio a sua boca em linha rígida e lembro do olhar intimidante na hora do jantar, sequer parecia a mesma pessoa ali diante de mim, pergunto-me rapidamente se ele sofre de algum tipo de transtorno dissociativo do qual ainda não tenho conhecimento.

- Boa noite, doçura.- sorri de um jeito anormalmente sincero que quase mascara o seu tom de zombaria, dou um passo de costas para dentro do quarto enquanto ainda me pego atenta ao seu rosto branco, em contraste com o breu do cômodo escuro atrás dele.

- Boa noite, cabeção.- fecho a porta antes de poder ouvir a sua risada de marreco rouco, rio em silêncio e sozinha, em seguida.


Nós nos olhamos abismados à mesa do café, à nossa frente, uma Sadie voraz e decidida acaba de comer sozinha a sua terceira montanha de panquecas cobertas de manteiga e xarope de bordo, especialidade da casa.

- Ô, ruiva, você não acha que está pegando um pouco pesado, não?- Wolfhard é quem pergunta, olho para o seu prato, ele mal tocou na própria torrada.

- Uhm?- ela nos olha de boca cheia, eu mastigo os ovos ainda quentes e rio da sua carranca.

- É melhor você pegar leve na massa, Sadie, estava colocando as entranhas para passeio ainda ontem.- falo, Winona apenas continua a observar a menina, parece chocada, talvez porque a outra estava em pleno leito de morte na noite anterior.

- Deixem a Sadie, ela é das minhas.- papai volta do rodízio com um prato/montanha de tudo a que tinha direito, ressalva à montanha de calda sobre tudo aquilo, senta-se do meu lado direito e ataca o prato ainda mais avidamente do que Sink.

- Você bem que poderia aproveitar a viagem para tentar hábitos mais saudáveis, querido, não iria fazer mal comer uma maçã vez ou outra.- Finn e eu nos empertigamos simultaneamente, está na hora do assunto mais maravilhoso de todos.

A alimentação de David H. Brown.

O meu pai engole a comida em seco e os dois começam a travar uma discussão super cansativa sobre a probabilidade de ele ter um infarto se continuasse daquele jeito.

Wolfhard ergue as sobrancelhas para mim, segurando a risada e enchendo a boca de comida para ter com o que ocupa-la, é Sadie quem nos chama a atenção desta vez.

- Olha, Mills, aqui eles têm aquelas super bolas de sorvete que nós tomamos uma vez.- aponta com a cabeça o balcão às minhas costas, olho rapidamente e vejo uma garotinha se lambuzando com o que parece ser uma bacia de sundae.

- Parece que sim.- continuo a comer, sem prestar muita atenção ao que ela fala.

- Pensei que as bolas de sorvete gigantes da Geórgia só fossem feitas em Savannah, quando foi que vocês foram para lá sem mim?- Finn reclama, com feição indignada, todos sabiam que ele era o maníaco dos doces.

- Ah, relaxa aí, você sequer andava conosco naquela época, foi antes de vocês se mudarem de Indiana, nós fomos junto com os pais do Jacob.- Sadie arregala os próprios olhos depois de soltar a matraca.

- Sadie! depois eu que sou a fofoqueira.

- Foi sem querer, Mills.- ela se lamenta, eu a havia feito prometer que jamais falaria aquele nome na frente do futuro enteado do meu pai, não daria a Finn mais aquele trunfo para debochar de mim.

Agora já era tarde, um sorrisinho maligno surge em seus lábios. Ninguém fala mais nada durante o resto da refeição, o casal vinte vai pagar e fechar a conta dos quartos, os dois ainda estão se estranhando por causa da briguinha de antes. 

Eu estou sentada na pequena mureta que faz fronteira com o estacionamento, uma dorzinha de cabeça fina começa a me perturbar e mesmo sendo cedo o sol já está fazendo bem o seu serviço, tenho dificuldade para conseguir um modo de amarrar os cabelos sem nenhum tipo de prendedor, desde que os cortei na altura dos ombros há pouco mais de um mês, mas acabo dando um jeito de deixá-los parados.

Ouço passos vindo e amaldiçoo baixinho quando enxergo pela visão periférica aquela maldita cabeleira escura, já estou para mandá-lo embora quando o maldito começa a falar.

- Eu acho que esse nome Jacob não me é estranho, mas pensei que haviam sido somente boatos aqueles sobre o garoto que você namorava, quero dizer, não que eu não admire a coragem do infeliz, pelo contrário.- não olho para ele, tão pouco respondo a provocação de imediato.

- Mas olhando assim até que faz sentido, sabe? Ele claramente viu no que estava se metendo e fugiu enquanto pôde, rapaz esperto.- suspiro pesadamente e rezo com todas as minhas forças para que um meteoro caia bem no meio da cabeça de Finn agora mesmo.

- Hilário.- cubro os olhos dos raios de sol que os atingem repentinamente quando uma enorme caminhonete que estava ali por perto sai arrancando com tudo e para de fazer-me sombra.

- A minha teoria inicial seria de que um dia ele simplesmente se deu conta do que estava fazendo e terminou tudo com você.

- Genial, Finn.

- Ou então, a melhor de todas até agora, você o pegou no ato, te traindo com uma amiga sua.- fecho os olhos, cansada, não o respondo novamente, tenho a sensação de ter engulido uma lâmina junto com o café com leite, pois sinto algo descer rasgando a minha garganta até chegar ao peito, o antigo buraco que ali havia, antes dando indícios de cicatrização, agora estava sendo cutucado, entretanto, ele continua o seu joguinho cruel, não sei se já percebeu a minha expressão, não temos contato visual direto, continuo a olhar para a frente e a proteger o rosto da claridade.

- Aposto que achou uma garota mais interessante, tenho certeza de que a substituição foi acertiva.- o seu tom é extremamente maldoso, mas não é nada com que eu já não tenha lidado antes, por isso, estranho o desconforto com as suas palavras, muito provavelmente porque é a primeira vez que concordo com ele, internamente. Os três já estão indo em direção ao carro, e eu não perco tempo em pular da mureta em um salto e me apressar para me juntar a eles, quando o faço os meus cabelos se soltam de maneira selvagem, Sadie conversa algo com eles mais lá na frente, nenhum deles se dá conta de que estamos nos aproximando, mas, mais uma vez eu posso sentir a sua presença praticamente colada ao meu corpo, aperto o passo com mais força, a minha garganta a esta altura já está completamente fechada e basta só um pio para que eu não consiga mais me segurar.

A risada genuinamente divertida dele me faz querer arrancar os seus olhos com as unhas, mas ao mesmo tempo parece atingir mais fundo o oco no meu corpo.

- Ah, vai, Millie, você sabe que foi engraçado!- quando ele me agarra pelos ombros com extrema facilidade e me faz parar de andar, eu me desespero a esconder os meus olhos cheios d’água, um movimento e um deles poderia transbordar, prendo a respiração quando Finn vem para a minha frente e me força a abaixar a mão que me protege do sol, mesmo que não o faça com violência, para ele ainda era tudo um jogo, uma brincadeira, não faz muita diferença mesmo assim, até porque, a sua figura com mais de vinte centímetros a mais do que eu já estava me privando de qualquer vislumbre adiante. Quando levanto a cabeça para encara-lo sou totalmente pega de surpresa pela sua expressão facial, ele tem a testa franzida em confusão, mas os seus olhos congelados e a sua boca entreaberta o denunciam ainda mais, seria mesmo culpa o que lhe enchia o semblante agora mesmo?

- Mills, eu...

- Esquece, Finn, você venceu por hoje, meus parabéns.- até a minha voz sai estrangulada, mas que ódio, solto-me dele e vou com mais pressa ainda para perto de Sadie, limpo os resquícios do aborrecimento o tanto que posso, sou a primeira a bater a porta do carro, e com força, ignoro os outros terminantemente e finjo estar em outro planeta quando arrancamos para longe dali, agora mais do que nunca eu estou completamente ciente da presença de Finn do outro lado, não o olho mais pelo resto do trajeto. Uma faísca se acende por todo o meu corpo, e eu sinto raiva de mim mesma por ter de alguma maneira poupado os seus sentimentos na noite passada.


Notas Finais


Opiniões?!


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