Oikawa estava nervoso – ou deveria dizer preocupado? Mais uma daquelas festas de faculdade estava se aproximando e ele realmente preferia virar a noite vendo séries enquanto devora um pote de sorvete. Mas não podia, afinal, Iwaizumi quem o chamou para irem juntos. Tooru estava se contorcendo no sofá de seu apartamento quatro dias antes da festa apenas pensando no que teria de enfrentar. A parte branca da unha de seu indicador esquerdo já não existia mais. Suas palmas suadas envolveram e agarraram o único travesseiro que não tinha sido derrubado pelo ataque de ansiedade recente. Virou-se para o estofado e encolheu seu corpo o máximo que pôde. Mal sabe Hajime que isso era tudo sua culpa.
Estava para começar a chorar quando escutou seu telefone vibrar sobre a mesa de vidro. Esticou seu braço, ainda de costas, e, com um pouco de esforço, conseguiu apanhar o aparelho.
Tudo começou há dois meses, quando, durante uma festa, segredos foram revelados.
...
O ex-levantador do Aoba Jhosai havia despertado com o barulho que seu celular fazia. Havia tentado ignorar o aparelho vibrando em sua cômoda, mas era simplesmente impossível. Sabia que não era algo importante, senão teriam ligado, era só alguém lhe enchendo de mensagens, fato que o estava irritando. Sem mais paciência e com sono, pegou o telefone e verificou o que estava acontecendo: o antigo capitão da Karasuno, Daichi, havia criado um grupo com os principais jogadores de diferentes times da época do colegial – o próprio Karasuno, Fukurodani, Nekoma, Shiratorizawa, Inarizaki, Itachiyama e, obviamente, Aoba Jhosai. O objetivo era organizar uma festa para uni-los novamente. Se Oikawa antes estava morrendo de sono, agora estava sentado em sua cama com seus olhos brilhando em animação. Começou a ler as mensagens e notou que não era o único empolgado com a proposta.
Era uma ideia ótima, ou melhor, genial! Seria a oportunidade perfeita para tentar algo e, quem sabe, até ficar com seu amor não correspondido, seu amigo de infância, Iwaizumi Hajime. Uma chance única.
O problema começou quando Tooru se dispôs a dar uma carona ao amigo. Como já fazia algum tempo que não se encontravam pessoalmente, nenhum dos dois sabia exatamente como puxar conversa. O clima no carro estava tão incômodo que chegava a ser tenso e, para quebrar aquela angústia, Iwazumi decidiu se pronunciar após dez minutos de silêncio absoluto.
- Eu ‘to ficando com uma garota que eu conheci na faculdade. – Se não estivessem parados no sinaleiro, com certeza Oikawa teria batido.
Por fora, o mais alto sorriu e cumprimentou o outro, tentando continuar a conversa. Por dentro, conseguiu ouvir seu coração falhar algumas batidas. Deveria ser um assunto normal entre amigos, não? Relacionamento amoroso é um tópico muito recorrente quando se atinge a adolescência. E esse era exatamente o problema. Foi nessa exata época que Oikawa notou que sua consideração por Hajime ia além da amizade. Demorou um tempo para que aceitasse seus sentimentos. O clímax foi quando se pegou batendo uma no vestiário do Aoba Jhosai pensando no spiker sem camisa, visão que havia tido há pouco e que, pela primeira vez, o deixou duro, coisa que nem pornografia hétero conseguia fazer. Foi assim que se descobriu homossexual.
Todas essas memórias e sentimentos voltaram de uma única vez, atingindo de forma certeira sua felicidade que perdurara até o momento. Nesses segundos, Oikawa transitou entre os extremos de suas emoções – deixou a felicidade de estar ao lado de Iwa mais uma vez ser totalmente esmagada pela realidade de que seu amigo era hétero, fazendo borbulhar em si mais do que decepção, frustação.
- Oikawa? Você ‘tá me escutando?
- Hã? Sim! você ‘tava falando como vocês se conheceram, né? – Hajime deu um leve sorriso e voltou a falar. Tooru se descuidou, não podia deixar nada transparecer, isso seria seu fim.
Mesmo antes de se descobrir homossexual já sabia como deveria se portar, tanto perante a sociedade, quanto perante seu melhor amigo. Sabia que, por mais carente que fosse, não podia desabafar com ninguém, afinal, Oikawa Tooru é um homem, não pode simplesmente falar de seus sentimentos, muito menos andar de mãos dadas com seu melhor amigo – até porque, ele seria quem mais o reprovaria. Enfim, exatamente por não se encaixar nas normas sociais, percebeu rapidamente que sua melhor opção era se esconder atrás de uma faixada condizente com o que a ideia de masculinidade lhe propunha. Isso porque, acima de tudo, Tooru tinha medo, medo das pessoas – nunca se sabe o que elas podem chegar a fazer.
Assim, após relembrar mentalmente sua “missão” de manter as aparências, tentou focar o máximo possível em qualquer outra coisa (principalmente no trânsito).
...
Já haviam se passado algumas horas de festa e Oikawa não conseguia fingir mais. Podia estar revendo ótimos amigos da época colegial, mas, mesmo assim, não conseguia manter nada mais que uma felicidade falsa – Iwaizumi não saia de sua cabeça. Estava cansado, tanto físico quanto mentalmente. Olhou em volta e viu Kageyama e Kenma sentados numa mesa, ambos com olhares perdidos, vagos. Algo estava estranho.
Se aproximou da mesa e puxou a cadeira ao lado de seu aprendiz, esse que permaneceu olhando para a frente até o outro tocar seu ombro.
- Tudo bem, Tobio? – O de cabelos pretos estremeceu sob sua mão. Realmente não estava prestando atenção em seu entorno.
- Ah, Oikawa. Desculpa, ‘tava distraído.
- Imagina. É só que... Você parecia sério demais para estar apenas distraído. – Kageyama engoliu em seco.
- ‘Tá tão na cara assim? – Um rápido momento de silêncio se fez presente.
- Tem alguma coisa que você precisa pôr para fora, não? – Kenma, duas cadeiras distante de Tooru, desligou a tela do celular e o colocou sobre mesa. Se ajeitou no acento e apoiou a cabeça na mão direita. Os três se entreolharam e não precisaram usar palavras para compreender a situação um do outro, sabiam que seus problemas tinham a mesma base.
O antigo levantador do Aoba Jhosai foi o primeiro a revelar sua história. Nunca imaginou que encontraria as pessoas certas para lhe escutar tão próximas de si. Logo, os outros levantadores começaram a concordar e comparar suas desventuras amorosas. Tooru não pôde evitar um sorriso – mesmo que o assunto fosse de conteúdo extremamente infeliz. Poder se abrir lhe trouxe uma tranquilidade inimaginável, a sensação de ser solto de uma forca.
Os três discutiam animadamente sobre suas paixões não correspondidas até chegarem numa questão interessante: quais outros presentes teriam paixões não correspondidas?
- Akaashi, com certeza. Olha o jeito que ele ‘tá secando o Bokuto. – Kozume apontou discretamente com a mão que segurava seu copo para a direção de Keiji, esse que, mesmo próximo de Koutarou, não desviava o olhar de seu rosto.
- Nossa, sim. Mas acho que se tratando de encarar, o Shirabu ‘tá fazendo bem pior. – Tooru inclinou levemente a cabeça na direção do antigo levantador do Shiratorizawa. Kageyama e Kenma seguiram com o olhar e comprovaram que Kenjirou não estava sendo nem um pouco discreto, seus olhos estavam cravados no corpo de Semi.
- Que brincadeira é essa de ficar apontando para os amiguinhos? – Sugawara parou, de braços cruzados, atrás do de fios negros, fazendo com que ele se assustasse pela segunda vez naquela noite.
- Só não apontamos ‘pra você porque não estava encarando o Daichi. – O loiro se pronunciou enquanto o mais velho se sentava na cadeira vazia ao seu lado. Por fora, Koushi juntou as sobrancelhas como querendo entender o que o amigo havia dito. Por dentro, prendeu a respiração involuntariamente e começou a se questionar o que havia deixado tão óbvio seu sentimento pelo antigo capitão da Karasuno.
- É verdade! Tinha esquecido do caso do Substituto.
- Sério, sobre o que vocês estão falando?
- Amor não correspondido. – Kageyama levantou seu copo e o levou até sua boca, bebendo todo seu líquido de uma única vez.
Koushi cogitou fingir desentendimento, entretanto, dois pontos o fizeram mudar de ideia: não fora ele quem trouxe o assunto à tona, então sabia que não adiantaria mentir, afinal, de algum modo, eles já sabiam. E também, o assunto parecia não envolver somente si, mas todos naquela mesa.
E assim, Sugawara entrou na conversa. O tema deprimente era encoberto pelas risadas dos levantadores que debochavam da própria desgraça. Com o tempo, conseguiram chamar a atenção de outros para a mesa e, dessa maneira, formaram um grupo (inclusive em uma rede social) que nomearam com o nome brega de “levantadores não correspondidos” – objetivo e conciso. Quanto mais tempo se passava de festa, mais próximos eles ficavam. Todos, pela primeira vez, colocando suas angústias e inseguranças para fora. Shirabu e Kenma se animaram ao conhecer o gosto em comum por brinquedos sexuais. Sugawara e Oikawa reclamavam sobre o quão desatentos e densos Daichi e Iwaizumi poderiam ser para nunca pegarem um único flerte deles. Akaashi e Kageyama discutiam sobre quem era o mais fofo, Bokuto ou Hinata. Yahaba permanecia em silêncio, comentando apenas quando era chamado. Enfim, criaram um verdadeiro auto – um teatro cômico-dramático.
Contudo, faltava um personagem – Atsumu Miya. Atsumu estava do lado de fora do salão, sentado na grama ao lado de Sakusa, ambos observando as estrelas. Com suas mãos apoiadas no solo, conseguia sentir som alto do buffet, mesmo esse estando um pouco longe. O loiro repassou seu plano pela milésima vez em sua mente, não conseguia acreditar que estaria fazendo aquilo. Olhou uma última vez para o companheiro, ele que estava sentado sobre sua própria jaqueta estendida na grama, com os joelhos dobrados e os braços envolvendo suas pernas. Seu olhar mirava as estrelas que, mesmo sendo poucas, brilhavam intensamente.
Céus, como alguém pode ser tão perfeito? – pensou Miya. Respirou fundo e abriu a boca, sabendo que, quando começasse, não teria mais volta.
- Omi-kun? – Questionou, fazendo o de fios pretos o encarar quase que imediatamente. – Tem uma coisa muito importante que eu preciso pôr ‘pra fora.
- ‘Tá tudo bem? – Sakusa percebeu o outro esticando involuntariamente suas pernas, estava nervoso.
- Sim, sim. É só que... Promete escutar até o final antes de dizer algo?
- Sem problemas.
- Omi-kun, - Ele mesmo se interrompeu. – não, Kyoomi, isso é algo que venho reprimindo a anos, algo que percebi a muito tempo e que nunca tive coragem de expor, nem mesmo para o meu irmão. – Atsumu tirou as mãos do chão e curvou as costas para se equilibrar. Estava suando frio. – Droga, por que é tão difícil?
- Você tem certeza de que quer contar isso para mim? – Os olhos castanhos do levantador deixaram clara sua desorientação pelas palavras do spiker. – Eu quero dizer, isso parece ser algo muito importante ‘pra você. Por isso, tem certeza de que sou eu a pessoa certa para você se abrir?
O loiro não conseguiu conter uma risada. Não era óbvio?
- Como eu poderia me declarar para outra pessoa se você é quem eu amo?
Quando percebeu o que havia dito, já era tarde demais. Se encaravam, um mais surpreso que o outro. O primeiro a ter alguma reação foi Atsumu que, ao sentir suas bochechas enrubescerem, virou a cabeça para o lado oposto. Não conseguia mais sentir as vibrações do chão nem mesmo ver as luzes coloridas que iluminavam o jardim – sua mente estava em branco. Foi trazido de volta à realidade pelo seu tato. Não querendo tirar conclusões precipitadas (não acreditava estar plenamente são), moveu seus olhos lentamente até que pudesse ver o que estava tocando sua mão. Outra mão envolvia a sua: a mão de Sakusa.
- Se você não tiver problemas em seguir devagar por conta da misofobia... – O olhar de Kyoomi mirava o céu, esse que iluminava fracamente seu rosto, mas o suficiente para expor um leve rubor nas maçãs de seu rosto.
- Tudo por você, Omi-kun! – Os lábios de Miya se curvaram formado um grande sorriso, o que fez o de fios escuros sorrir timidamente.
Voltaram a observar as estrelas ainda com os dedos enroscados. Agora, mais do que antes, aquele momento era somente deles – sozinhos sob o luar.
Bom, nem tanto. Kageyama e Sugawara saíram para respirar ar fresco a pouco. A conversa tinha tornado todos os levantadores mais próximos de certa maneira – mesmo que por uma melancolia em comum, o que fez Tobio pensar. Koushi percebeu a inquietação do mais novo e saiu consigo daquela algazarra.
- Então? – O mais velho perguntou logo que encostou seu corpo na parede.
- Minhas expressões são tão óbvias assim? – As mãos de Kageyama foram parar em seu rosto, o apertando e repuxando, o que fez o outro rir.
- Não muito. É que estou acostumado a observar as pessoas.
O de olhos azuis também apoiou suas costas na parede, deixando escapar um pesado suspiro antes de começar.
- É só... Não importa quanto esforço eu faça, sempre acabo agindo de forma grosseira com ele, é involuntário!
- Bem, devo concordar que, se não te conhecesse, com certeza negaria com todas as minhas forças que você gosta do Hinata.
- Isso era ‘pra me animar?
- Deixa eu terminar! – Suga limpou a garganta, estavam falando em um tom mais alto por causa do alto som da festa, mesmo estando do lado de fora. – Realmente não acho que ele odeia isso. Vocês estão sempre brigando e competindo, mas não sei se percebeu que isso, na verdade, é a maneira que vocês encontraram de demonstrar sua admiração e apreço um pelo outro. Olha, o Hinata não é tão frágil quanto você pensa que ele é. Não apenas tem uma grande e forte personalidade, mas também um coração com as mesmas características.
O breve momento de silêncio que surgiu entre os levantadores foi quebrado pelo leve som de passos se aproximando, era Shoyo.
- Daichi-san me pediu para chamar quem estivesse aqui fora para comer.
Kageyama engoliu em seco, Hinata era a pessoa que menos queria encontrar no momento. Um clima tenso pairou no ar e, antes que a situação pudesse se tornar mais constrangedora, Koushi se pronunciou.
- Ah, obrigado, Hinata, já estamos indo. – O mais velho passou pelo ruivo com o de fios negros atrás, em passos apressados.
Shoyo expirou involuntariamente quando escutou o som da festa aumentando e diminuindo pelo movimento da porta. Limpou o suor gelado das mãos nas próprias calças, respirou fundo e se aproximou de Sakusa e Atsumu para chamá-los. Mal sabiam os dois ex-levantadores da Karasuno que Hinata havia escutado sua conversa.
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