T. J. Potter – 1976
Mesmo àquela distância, Tiago conseguia ouvir as comemorações vindas do castelo. Venceu os dois duelos que havia disputado, como todos da Equipe de Duelos da Grifinória, mas naquele momento não pensava nisso, continuava sentado nas arquibancadas vazias do campo.
Ele beijara Lilly Evans.
E talvez ela o odiasse agora, justo quando finalmente começara a confiar nele.
Foi um impulso, ele diria, e pediria desculpas. Mas não se sentia culpado, não se arrependia. Foi bom e excitante e ela havia retribuído.
Mas ela também não havia reagido depois.
Nunca ouvira falar de Lilly namorando ninguém em Hogwarts, mas isso não era impossível.
Será que ela já havia beijado alguém? Algum trouxa, talvez? Alguém que estivesse esperando quando ela voltasse para casa? Ou talvez... talvez aquele ensebado, quando eles eram amigos?
Tiago sentiu um gosto ruim no fundo do estômago e as orelhas queimando. Ela era boa demais para Severo Snape. Só não queria acreditar que ela fosse boa demais para Tiago Potter.
-Tiago... –Tiago olhou em direção a Remo, que se aproximava. O rapaz acenou. –Parabéns pelo duelo!
-Obrigado, Remo.
-Aconteceu alguma coisa?
-Não. Como está a festa?
-Duvido muito que alguém vá conseguir acordar amanhã para as aulas. Aposto 5 guineus que a professora McGonagoll vai parecer no dormitório azarando todo mundo.
Tiago riu.
-Apostado. Você deveria estar lá.
-Você também, Potter, mas está aqui, sozinho. E ainda diz que não foi nada? O que há de errado?
Tiago empurrou Remo brincando e ambos riram, antes de voltarem à quietude da noite. O céu estava estrelado, apesar do outono. O vento frio balançava o gramado levemente. Era possível ouvir o salgueiro lutador dali. As vozes ao fundo. As pessoas estavam felizes e seguras. Hogwarts promovia essa sensação de pertencimento.
-Vou sentir falta daqui. –Suspirou Tiago.
-Eu também, mais do que qualquer um pode imaginar.
Tiago compreendia.
-Mas não precisa acabar aqui. –Remo sorriu da forma tranqüila como costumava fazer quando dizia algo de sentido muito mais amplo do que parecia. Com uma sabedoria peculiar para alguém tão jovem, talvez advinda das cicatrizes que carregava. Tiago sabia que ele não falava apenas de Hogwarts. E, naquele momento, se sentiu feliz por poder contar com alguém como Remo Lupim.
-Eu beijei Lilly Evans. –Falar aquilo tornava tudo mais real. Aquele lobisomem pilantra, fazendo Tiago se sentir confortável até começar a falar e nem perceber.
-E sobreviveu para contar a história?
-É o que parece. –Tiago riu. Um brilho de curiosidade iluminava o olhar de Remo.
-E agora?
-Como assim?
-Você sabe o que eu quero dizer, Potter...
-Eu não sei... mas estou vivo para contar a história, como você disse.
Remo estreitou os olhos.
-Você não parece arrependido.
Tiago empurrou o amigo novamente.
-Às vezes juro que você usa legilimentes. Claro que não estou. Pelas barbas de Merlin, estou me transformando no Sirius. –Ambos riram. –Acho que o ensebado viu.
-Severo Snape?
-Quem mais poderia ser?
-Isso é ruim, Tiago. Você sabe disso.
-Por que eu deveria me importar?
-Ele a ama, é uma pessoa vingativa e acha que nós somos os responsáveis por ele ter levado um pé na bunda.
-Ele a chamou de sangue-ruim na frente de toda a escola! Você fala como se eu tivesse medo dele, Aluado.
Remo não respondeu ao desafio. Sabia que não adiantaria. Tiago não era racional quando se tratava de Lilly. Pior ainda com Snape envolvido.
Ao invés disso, levantou.
-Vamos procurar Sirius.
-Ele também não está na comemoração?
-Não. Imagino que esteja com Pandora em alguma das estufas desativadas. –Remo respondeu, dando de ombros.
-Não imaginei que isso fosse durar tanto...
-E eu não me surpreenderia se terminasse amanhã... vamos...
Tiago e Remo seguiram para as estufas, o pequeno labirinto verde que existia sob os cuidados de Madame Sprout, a diretora da Lufa-Lufa. Eram sete estufas, ao todo, das quais pelo menos duas estavam desativadas. O lugar que ao longo do dia se mostrava belo e convidativo, à noite, sobretudo sem lua como aquela, era estranho, cheio de sombras.
Quando se aproximaram estufa três, ouviram um ruído de vozes iradas.
Sirius e Pandora talvez não fossem os únicos ali, afinal, e poderiam estar em perigo. Havia muitas pessoas de fora em Hogwarts, devido ao torneio e, se as histórias estivessem certas, o próprio Dumbledore se opusera a realização dele naquele momento por motivos de segurança. Comensais da Morte foram vistos em Hogsmead no verão passado. O mundo não era mais o mesmo, o diretor era a única garantia de que Hogwarts não havia mudade.
Tiago sacou a varinha, conjurando um feitiço de camuflagem sobre si mesmo e Remo e silenciando seus passos. O rapaz se aproximou de uma das sebes, entre as quais poderia ter uma visão melhor.
-Onde está o pacote?
-Deve estar no lugar, como mandou.
-O que quer dizer com “deve”? –A agressividade fria na voz de Simon Lovelace era palpável apesar da aparente calma na voz, fazendo Tiago pensar que gelo queima.
-Está lá.
-A magia precisa ser alimentada, precisa ir substituí-lo logo, enquanto todos estiverem ocupados. Sabe que é importante. Sabe que precisamos de você.
Arthur estremeceu.
-Precisamos descobrir um meio de acesso. –Exigiu Simon Lovelace, a centímetros do filho. -Use o que ensinei, Arthur.
-Eu encontrei uma entrada para a doceria, Dedos de Mel, mas é protegida. Não sei como poderiam entrar por ela sem acordar Hogsmead inteira.
-Pense em alguma coisa!–O pai do rapaz estava nitidamente alterado. Completamente diferente do frio Sr. Lovelace que Tiago e Remo viram algumas vezes.
Remo tocou no braço de Tiago. A pergunta escrita em seus olhos: Por que Lovelace iria querer uma saída de Hogwarts?
-Espere! Dizem que existe um Mapa, criado por Black e os amigos dele. Esse Mapa mostra os esconderijos de Hogwarts, talvez...
-Como algo assim poderia existir sem conhecimento de Dumbledore?
-Eu não sei, mas já ouvi falar. Pai, porque...?
-Então pegue e traga para mim.
-Não posso, não tenho como entrar na torre da Grifinória. –O garoto empalideceu ligeiramente. –Voltar ao esconderijo já é perigoso o bastante. Eles descobririam e eu seria expulso.
Simon revirou os olhos.
-É sobre o futuro que estamos falando, Arthur. É muito mais importante do que tudo isso. Use a garota então. Você já fez isso antes.
-Tudo bem. –O sempre confiante Arthur Lovelace parecia exausto. –Mas eu queria entender o motivo.
Simon sorriu de forma encorajadora, de modo que o tremor de Arthur foi passando. Era novamente o homem frio e confiante.
–Sua mãe ficaria orgulhosa. Agora temos que ir. Já foi desagradável o bastante ter encontrado o jovem Black aqui, não preciso de mais transtornos e você tem um trabalho a fazer, filho.
Remo e Tiago iniciaram uma corrida desembalada para fora dos jardins. Não poderiam correr o risco de serem vistos.
A cabeça de Tiago a mil quando finalmente foi abraçado pelos companheiros de casa na Sala Comunal. Seus olhos encontraram os de Remo. O pavor estampado neles.
Lilly e Viollet estavam em perigo.
***
Os olhares de Sirius e Tiago se cruzaram assim que ele e Remo entraram na Sala Comunal da Grifinória. Em minutos, Remo e Tiago souberam que Atena Brow do 5º ano havia estuporado Ramon Smith do clube de duelos da Sonserina, assim como Liz Beneth e John Thomas também ganharam seus respectivos duelos. Tirando isso, todos os membros das equipes de duelos seguiam na disputa e agora comemoravam as vitórias.
Demorou um pouco até que os garotos conseguissem fugir dos cumprimentos e falar com Pedro e Sirius.
-Precisamos conversar... –Tiago puxou Sirius pelo braço, afastando-o dos colegas.
-Sim... aconteceu uma coisa...
-Você e Pandora encontraram Simon Lovelace nas estufas desativadas. –Remo completou.
-Como vocês sabem? –Pedro questionou.
-Fomos procurar Sirius e vimos Simon e Arthur Lovelace conversando, eles sabem sobre o Mapa e Simon o quer por algum motivo, temos de...
-Esperem... –Remo interveio. –Onde estão Lilly e Viollet?
Sirius praguejou.
-Elas não estavam com vocês? –O questionamento veio de Pedro. –Qual o problema?
-Pensei que elas estivessem aqui. –Tiago acompanhou o olhar de Sirius.
-Não vejo as garotas desde o fim dos duelos.
-Fiquem calmos. –Lupim segurou o braço de Tiago. –Elas podem estar em absolutamente qualquer lugar do castelo. Talvez tenham ido direto para o jantar ou estejam no banheiro feminino. Não vamos fazer nada precipitado. Elas estarão seguras dentro do Castelo.
-Vai mesmo confiar no grau de segurança de Hogwarts? Quantas pessoas já morreram ou se feriram aqui, Remo? –Tiago baixou o tom de voz. –O que me diz da garota do banheiro no primeiro andar? Temos de descobrir o que está acontecendo, Aluado.
-Podemos falar com o professor Dumbledore. –Pedro se aproximou de Tiago. Claramente assustado. –Ele vai saber o que fazer.
-Dumbledore não está em Hogwarts. –Todos os olhos se concentraram em Remo. –Ele não abriu os duelos como era previsto e nunca se afastaria de algo tão importante se estivesse aqui. Há algo errado...
O olhar de Tiago era sério e penetrante. Remo acenou com a cabeça, talvez o amigo tivesse razão afinal.
Bastou isso para que os garotos abrissem caminho entre os colegas e corressem. Potter foi até o dormitório pegar a capa de invisibilidade e conferir o Mapa do Maroto, enquanto os amigos se adiantavam para fora da Sala Comunal.
-Pegou o Mapa? –Sirius perguntou a Tiago, quando se encontraram em frente ao retrato da Mulher Gorda.
-É perigoso demais.
-Que droga, Potter! Precisamos saber onde elas estão, não dá para procurar no castelo inteiro.
-Precisa se acalmar, Sirius. Dei uma olhada antes, elas estão perto da Cabana de Hagrid, só não faço idéia do que estariam fazendo se o grandão não está por lá.
L. Evans - 1976
Lilly deveria estar na comemoração com os colegas e Vi se sentia péssima por isso, mas o Salão Comunal estava cheio demais, merecia um descanso dos olhares e julgamentos. Não que Lilly demonstrasse se importar, ali, suja de graxa, enquanto testava algumas poções na motocicleta.
Camuflagem e invisibilidade estavam ok. Aquela era uma ótima noite para um teste de velocidade, com a escola inteira ocupada com os duelos.
-Certeza que não quer voltar? –Perguntou Vi, pela terceira vez.
-E perder o primeiro vôo dessa belezinha? Não, obrigada. –Lilly deu um sorriso caloroso para a amiga.
-Você está estranha.
-Por quê?
-Lilly Evans nunca perde uma comemoração da Grifinória.
-Para tudo tem uma primeira vez. –Lilly disse, afastando-se do veículo para admirar o próprio trabalho. Agora bastaria arrastarem a motocicleta para os fundos do galpão e, se tudo desse certo, voar. Simples assim. Era incrível.
-Foi Severo?
-Não, sua tola! Não aconteceu nada, vamos, ande, me ajude aqui.
Vi estreitou os olhos como fazia quando demonstrava uma determinação fervorosa, enquanto Lilly começava a empurrar a moto, para desviar a atenção.
-Saia da frente, Evans.–Vi sacou a varinha e, com um movimento rápido, a moto flutuou em direção à porta do armazém. -Às vezes, você é tão trouxa...
-Vou repetir mil vezes o quanto acho o termo “trouxa” pejorativo.
Vi ignorou a amiga, aterrissando a moto na porta e conferindo se estavam sozinhas. Teria sido muito mais tranqüilo simplesmente roubar o Mapa, assim saberia de qualquer pessoa que se aproximasse, mas o dia fora tão cheio de eventos inesperados, que a garota não encontrara forças para invadir o dormitório masculino.
Lilly estava estranha desde cedo e fazia horas que não viam os Marotos. Tudo isso além do choque de encarar o pai diante de toda a Escola, enquanto ele discursava sobre a necessidade de força e sabedoria para se alcançar a vitória. As pessoas deliravam diante de suas palavras, como se elas enfeitiçassem quem quer que pudesse ouvi-las. Talvez ele tivesse feito isso com sua mãe e com ela.
Aquela vontade quase irresistível de confiar no pai. Quase...
-Foram excelentes duelos. –Lilly comentou, claramente tentando mudar de assunto.
-Eu deveria estar ofendida com seu tom de surpresa. –Vi resmungou, reprimindo um sorriso. O primeiro em horas, Lilly notou. –Sou boa em feitiços.
-Você subestima a minha inteligência. –A garota de cabelos vermelhos se aproximou. Os olhos brilhando intensamente. –Um duelo não é só sobre feitiços. Vocês têm me mostrado isso desde o começo dos treinos. Precisa de algo mais... mas mesmo que fosse só sobre feitiços, você é muito acima da média.
-Falou a favorita do Clube do Slugh. Você também e nem por isso encontrou na competição.
-Eu gosto de curar, Viollet! Enfim... Estamos falando de uma sextoanista que consegue fazer uma transfiguração perfeita. Alguns bruxos passam anos tentando.
-Acha que minha transfiguração humana é boa, porque a sua é péssima.
-Você é a melhor aluna em feitiços e não fica devendo em nada a Sirius, Tiago e Remo em transfiguração e DCAT. Ao contrário, ganhou deles e de Frank nos treinos. Várias vezes.
-E perdi algumas... Sorte de principiante.
-Sabe o que eu acho, Vi?
-Vamos lá... qual a sua teoria, Evans? –Vi afastou-se da moto para encarar a amiga. Parte dela temia aquele momento, quando Lilly começasse a fazer as perguntas certas. Viollet morria de medo das respostas ou da ausência delas. Mas outra parte, escondida por detrás daquele medalhão que usava há 10 anos daria qualquer coisa para que a amiga tivesse descoberto, seria o fim dos segredos. Talvez, assim, Vi descobrisse quem ela era afinal, por debaixo todos eles.
-Que você esconde a sua capacidade. E acho que as outras pessoas também sentem isso em algum nível. Não só pela sua família, que claramente não é a mais maravilhosa do mundo, ou porque tem todas as características de uma corvínea e foi para a Grifinória...
-Está lendo romances trouxas demais, garota.
-Não se trata disso. O ponto é que você é o prodígio, não Arthur e não apenas em feitiços, mas esconde isso por algum motivo.
-Por que eu faria isso?
-É essa a questão.
O vento frio fez com que Lilly estremecesse.
-O que acontece quando eu descobrir?
Vi sentiu a aproximação antes de ouvi-la ou vê-la propriamente. Uma pequena premonição que lhe salvara a vida algumas vezes.
Não ouvia mais o que Lilly dizia. Em segundos, Vi sacou a varinha e ocultou as duas, prendendo a amiga contra a parede. A mão sobre a boca.
O som dos passos finalmente se fez ouvir, quando uma sombra alta atravessou a parte mais escura dos jardins em direção à Floresta Proibida. Bem escondida. Para ser vista, alguém teria de olhar no momento certo, aproveitando a pouca luz da noite por entre as árvores. Próxima demais para não apresentar risco. Próxima o bastante para que, ao passar pela copa das árvores, Vi e Lilly vislumbrassem alguns fios de cabelo louro, quase dourado.
Vi esperou um minuto após o sumiço da sombra na Floresta Proibida antes de desfazer o feitiço.
-Vi, por quê?
-Não sei, mas vou descobrir. –Viollet fez a moto levitar de volta para o lugar e trancou o armazém com um movimento da varinha. –Volte para o castelo, encontro você mais tarde.
-De jeito nenhum!
-Eu preciso ir, Lilly, depois discutimos.
-Só pode estar louca! –Mas Viollet já se afastava em direção á Floresta Proibida. -NÃO VOU DEIXAR VOCÊ ENTRAR SOZINHA A NOITE NA FLORESTA PROIBIDA!
-Quieta, Lilly. Volte para o castelo.
Foi a calma com que Viollet disse aquelas palavras que definiu a atitude seguinte de Lilly. A garota correu até a amiga, jogando-se sobre ela. As duas rolaram sobre a terra úmida, engalfinhando-se, sem sacar as varinhas.
-Me solte, Lilly, vai acabar se machucando. –Lilly era quase um palmo mais alta que Vi, o que lhe garantia vantagem. Além de usar as unhas para impedir que a amiga se afastasse com empurrões. Vi não a machucaria, Lilly sabia disso.
-VOU TIRAR PONTOS DA GRIFINÓRIA!
-Fique quieta! Era o meu pai! –Lilly hesitou por um instante. Tempo o bastante para Vi notar a aproximação de 4 vultos. A noite estava mais animada do que o esperado. Não havia tempo para feitiço de invisibilidade.
Não havia tempo para nada.
Vi agarrou Lilly pelo braço, obrigando-a a levantar.
-Corra... –Vi sussurrou.
Lilly a acompanhou passo a passo, adentrando na Floresta Proibida.
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