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História Loup Garou: Ascensão - Vincent, O Bastardo


Escrita por: InvisibleWriter

Notas do Autor


"Não fuja do que você fez
Eu sei o que você disse
Eu tenho vivido com a confusão que criamos"
3OH!3 - LOVE 2012

Capítulo 10 - Vincent, O Bastardo


Fanfic / Fanfiction Loup Garou: Ascensão - Vincent, O Bastardo

Vincent, O Bastardo

 

O mês seguinte a morte de Julie foi entediante, informativo e irritante ao extremo. Ok, eu admito, foi interessante. Entediante porque depois do ultimato de três dias os nossos protegidos resolveram pressionar Hamish por uma resposta, mas Hamish não tinha nenhuma. E como esperado eles tiveram a ideia de fugir para o Tavern ou qualquer outro lugar como aquele, mas Hamish conseguiu convence-los de que esperassem mais um tempo, com argumentos como a autopsia que ele próprio estava realizando em Raul. Não sei dizer como ele conseguiu dissuadi-los, mas ele os fez esperar duas semanas inteiras por uma resposta, que depois desse tempo os fez esperar ainda mais.

Não havia sinal de Devon em lugar algum, o desgraçado se escondia bem. Eu já tinha apertado o pescoço da metade dos garou que ia até o Tavern e nos outros bares conhecidos. Segui trilhas falsas e outras que eram verdadeiras, mas não levavam a lugar algum. Não sabíamos onde estava Devon e nem seus principais capangas. Igor e Ivan, nós os chamávamos de irmãos sombras, raramente descolavam de Devon. Era como se esses três tivessem deixado de existir.

Hamish conseguiu enrolar por um mês inteiro, uma façanha na verdade, eu não achava que aqueles três poderiam ser enrolados por muito tempo, mas eles tinham outras coisas pra se preocupar.

Quando saímos da casa caótica de Raul, algum vizinho abelhudo resolveu chamar a policia. Eles encontraram o braço mutilado e não demorou pra que soubessem quem era a dona. Os superintendentes ficaram furiosos e agora lideravam uma caçada por toda Chicago pra encontrar o assassino de Julie. Vizinhos disseram terem ouvido rosnados e talvez rugidos vindo da casa, depois um grupo de “três homens suspeitos” saíram de lá e nunca mais foram vistos, então descobriram que aconteceu o mesmo com mais duas casas do bairro na mesma noite. A policia ligou o incidente ao outro massacre da academia de alguns dias atrás e agora cogitava um grupo de serial killers que usava animais exóticos pra matar suas vitimas, qualquer pessoa com um animal diferente era um suspeito.

Então, eu, Hamish e Sam estávamos sendo caçados. O único conforto era que eles não tinham ideia de quem eram os “maníacos do silencio”, que era como a mídia nos chamava. Emily, Luiza e Andrew estavam desviando as atenções de nós. Tive que dar o braço a torcer para o loiro de farmácia, ele tinha corrompido as evidencias das três cenas do crime para que em nenhuma aparecesse o DNA de algum de nós, ele alterou todas elas adicionando pelo de tigre siberiano nas amostras. Foi um mês entediante sem duvida.

A parte interessante foi me ver cada vez mais dentro do mundinho secreto que criamos. Interessante porque nunca me interessei em proteger nosso segredo, em evitar que o véu se rompesse. Eu deixava os outros fazerem o trabalho, mas como dizem, a responsabilidade é como a desgraça, nunca fica longe por muito tempo. Me peguei vasculhando cada parte do bairro em busca de novos cheiros ou qualquer coisa que indicasse um intruso. Meu trabalho como guardião estava sendo tão bem feito que Hamish havia dispensado Matthew e Johnny do serviço de protetores, eu fazia tudo sozinho agora. Para um cara que evitava contato com outras pessoas e responsabilidade excessiva, eu até que estava me saindo bem.

Também era interessante ajudar Hamish no laboratório. Tínhamos encontrado algumas substâncias estranhas no corpo de Raul e boa parte eu identifiquei sozinho, mas o restante ficou difícil demais para os meus anos de medicina. Então eu o deixei brincar de legista e continuei com a minha patrulha-vigilância.

O fato mais interessante de todos e talvez o mais surpreendente era observar o comportamento dos três humanos prestativos. Pra ser sincero, o mais interessante era observar uma desses três humanos em questão. Emily.

Ela tinha recebido o aval médico e psicológico pra voltar ao trabalho, embora insistissem em mantê-la fora da ação, mas como eu já sabia, sua teimosia e sagacidade não tinham limites. Mesmo quando seu chefe dizia pra não se envolver, ela conseguia resolver os casos sem nem mesmo sair do prédio onde trabalhava. Ela era brilhante. Na maioria das noites ela lia até tarde, algumas vezes pegava no sono, como na vez em que dormiu na poltrona grande em seu quarto e esqueceu a janela aberta. Estava frio e ventava bastante fazendo com que as cortinas de seu quarto balançassem até chegar ao teto. Debati comigo mesmo por um tempo e resolvi fechar a janela. Pulei no telhado da casa delas, amortecendo o impacto pra não fazer barulho, me pendurei na calha e pulei, pousando suavemente na cobertura que ficava alguns centímetros abaixo da janela dela que era enorme. Quando eu estava prestes a fecha-la, vi que ela tremia um pouco em seu sono. Suspirei e passei pela janela.

Ficou louco McKinley?! E se te pegarem aí? Minha mente gritava alertas pra mim.

Olhei ao redor. O quarto era aconchegante, havia uma cama de casal toda trabalhada em uma madeira escura no estilo gótico, uma penteadeira no mesmo estilo e cor, vários livros espalhados e mais pastas de arquivos do que eu já vira na vida, tudo em cima de uma escrivaninha de mogno escuro. Havia um notebook com a logo do DPC. Ouvi passos pelo corredor e fiquei alerta, mas eles passaram direto e foram sumindo, depois uma TV foi ligada. Relaxei um pouco e peguei um cobertor que estava na cama, afinal eu não estava ali para um tour. Enquanto colocava o cobertor sobre Emily, reparei que ela usava um colar de prata com um pingente de uma pedra-da-lua pendurado, dos lados da pedra havia duas asas, uma de morcego e outra que deveria ser de anjo. O colar brilhava estranhamente. Dei de ombros e a cobri com cuidado. Depois, saí e fechei a janela do jeito mais silencioso que consegui.

Não tive nenhum contato com ela depois disso, mas eu ficava lá o tempo todo, observando de longe e me impressionava cada vez mais com sua inteligência, sua coragem, sua teimosia irritante e seu temperamento desafiador. Ela era boa, mas sabia como ser má. Um dia eu estava espionando...Quer dizer, fazendo a rotina de sempre, e vi Luiza e ela perseguirem um suspeito por toda Jane Addams Memorial Park. Aquelas duas sabem correr, até pensei em derrubar o cara pra elas, mas fiquei interessado em ver como isso sairia. No fim o cara era um merdinha qualquer que precisava praticar exercícios porque depois de algumas quadras ele simplesmente estava asmático. Emily o derrubou como um jogador profissional de futebol americano. Eu ri alto da expressão de pânico do cara quando ele caiu no chão, mas fiquei tenso quando o maldito teve tempo de puxar um canivete escondido no sapato. Com uma tremenda habilidade, Luiza o desarmou e Emily prendeu o braço dele nas costas, puxando mais cada vez que ele as xingava. Essas eram as partes interessantes e informativas. Eu aprendia mais sobre ela a medida que o tempo passava.

Mas, a parte irritante ao extremo desse mês, foi o cara que colocaram pra ocupar o lugar de Julie. Um novo Chefe da Divisão de investigação, Ryan Keller. Impressionante como um mortal qualquer podia me tirar do sério. O cara era metido a Don Juan e conseguia parar metade do CPD Building. O fato que verdadeiramente me irritou, embora eu não entenda porquê, era que depois que o babaca colocou os olhos em Emily, ele não conseguiu mais desgrudar. Toda vez que a via pelos corredores do prédio, prometia encontrar o assassino da tia dela e dizia que ele jamais iria realmente substitui-la e que sentia muito. O cara era o maior mala, sem falar que ele tinha idade pra ser pai dela, talvez avô. Fiquei realmente surpreso com o quanto aquilo me irritou. Não é como se ela fosse minha ou eu estivesse interessado nela ou algo assim.

Meu celular vibrou no meu bolso. Hamish.

- O que foi? – perguntei, mal-humorado.

- Tenho duas noticias pra te dar. Uma boa e uma ruim, qualquer quer ouvir primeiro? – disse ele, meio tenso e meio divertido.

- A boa, já estou irritado o suficiente.

- Certo. Identifiquei a estranha mistura no corpo de Raul. Era um tipo de neurotoxina concentrada e misturada com ácido gama-hidroxibutírico e uma dose quase letal de um veneno especifico que parece ter sido retirada da aconitum lycoctonum.

- Você deve estar brincando. – eu ri. Que ironia quase macabra.

- Não. Você sabia que o acônito da wolfsbane tem mais efeito nos impuros do que em nós?

- Como assim? Eu achava que era só lenda. A wolfsbane é usada em medicamentos homeopáticos no mundo inteiro, em doses controladas pode curar os humanos, fazendo com que seus glóbulos brancos trabalhem mais rápido do que o habitual, mas se usada em longo prazo pode ser letal.

- Exatamente. Em humanos ela pode fazer o fator de cura se acelerar um pouco, mas em nós e nos impuros, pode retardar o fator de cura.

- Então se eu levasse um tiro na cabeça com uma bala banhada em wolfsbane... – não precisei terminar a frase pra entender o que aconteceria.

- Você morreria.

- O que essa combinação faria no corpo de um impuro? Qual seria o efeito? – perguntei, me obrigando a pensar.

- Fiz uma série de testes em amostras dos tecidos musculares de um impuro voluntario. Você não vai acreditar. – ele parou de falar. Eu não estava com paciência pra isso.

- Diga de uma vez, Hamish!

- Tudo bem, a cobaia se transformou e depois ficou, sei lá, como um zumbi, foi então que entendi o porque do uso da neurotoxina. Pra fazê-lo seguir ordens. Licantropos não podem controlar a si mesmos, lembra? Mas uma hora depois dos testes ele acabou sucumbindo e a cobaia morreu com dilacerações no sistema nervoso e grave rompimento dos tecidos musculares. A wolfsbane serve pra forçar a uma transformação.

- Tá. A wolfsbane forçou a transformação, a neurotoxina permitia que ele recebesse ordens como um soldado zumbi mutante, mas e o GHB? Isso é um tipo de droga entorpecente.

- Ainda não tive nenhuma ideia, não sei onde o GHB se encaixa. Tem outras substâncias que ainda não consegui descobrir, só consegui identificar essas três. Talvez, a gente só saiba depois que conseguirmos identificar todas. A combinação é incrivelmente complexa, é um coquetel de venenos letais. Vou ter que tomar um chá de camomila depois de todo esse trabalho.

Foi então que tive o insight.

- Hamish, o GHB é uma droga entorpecente.

- É mesmo? Acho que você descobriu um novo elemento, Vincent – disse ele sarcasticamente.

- Você não entendeu? O GHB foi usado para acalmar e entorpecer o sentido deles e dar a brecha para que a neurotoxina pudesse agir no sistema nervoso central e consequentemente fazendo com que perdessem o controle sobre seus corpos. O GHB tem mais efeito em nós, é um alucinógeno poderoso, mesmo sendo usado em doses insanas. Nos humanos é capaz de matar. É pra isso que serve o GHB, para dar o empurrão na neurotoxina que também empurra a Wolfsbane.

- É claro! Uma droga projetada. Vincent, você é um gênio. – a voz dele estava alta agora. – Agora fica mais fácil saber quais são as outras substâncias, é só descobrir quem empurra quem.

- Certo. Agora a má noticia? – fiquei tenso e me preparei para o pior.

- Bem, Luiza me ligou no escritório. Pediu que eu fosse até a casa deles.

- Isso não é exatamente uma má noticia, Hamish. Já sabíamos que ia acontecer.

- O problema é que não tenho nada pra compartilhar e eles não vão querer saber de formulas, Vincent. Eles querem o culpado.

- Como assim não tem nada pra compartilhar? E a sua alcateia? Você não disse que tinha dado mais trabalho pra eles fazerem? – perguntei irritado. Agora a coisa ia ficar feia.

- E eu dei, mas não tenho nenhum sinal de Devon ou dos irmãos sombra. Nada, Vincent.

- Que ótimo. – eu disse, suspirei e passei a mão pelo cabelo. Eu já estava até imaginando a guerra na cozinha de Andrew outra vez. Só que agora eu não ia me meter, ouviria de longe. – O que vai dizer a eles?

- A verdade. Eles não podem fazer nada e nem nós na verdade, a não ser sentar e esperar por qualquer sinal de Devon ou alguma alma nessa terra que saiba da existência dele.

- Isso vai ser um problema.

- Tenho certeza que você pode resolver. – disse ele, como se fosse simples assim.

- O que? Por que eu? Eles são obrigação sua...

- Ah, Vincent? Vince? Não dá pra te ouvir...a ligação...ruim... – ele roncou no telefone, fingindo uma ligação ruim.

- Hamish! Qual é? – eu disse, mas ele já tinha desligado. – Mas, que droga!

Quase atirei o celular do prédio onde eu estava. Tentei me acalmar e continuei a observar o CPD Building até o sol se pôr. Agora com a noite me cobrindo ficava mais fácil me mover pelos prédios, tentei acompanhar o carro deles quando saíram do estacionamento. Ficava complicado conforme os edifícios mais altos entravam no meu caminho, os mais baixos facilitavam meu trabalho.

Depois de alguns minutos correndo como um louco, consegui chegar um pouco antes deles à casa. Fui para o meu lugar de sempre e esperei, o ar estava tão frio que parecia que iria nevar, queimava um pouco meu nariz. Hamish também chegou antes, estava vestido com seu “uniforme” habitual, um terno cinza de três peças. Ele saiu do Rolls Royce ao mesmo tempo em que a SUV branca chegava no fim da rua. Hamish respirou fundo e girou os ombros, parecia tenso.

- Saudade de quando matávamos as crias do inferno? – perguntei, achando graça.

- Nenhum pouco, mas acho que dá pra pensar no assunto. – ele disse, o tom de voz baixo enquanto o SUV branco parava em frente a casa. Os três saíram do carro, andei agachado pelo telhado quando todos entraram na casa. Dessa vez eu ia me manter o mais longe possível.

Da ultima vez minha intervenção não funcionou muito bem, acabei como o vilão da história e o cara que não se importava com ninguém, o que na verdade não era exatamente uma mentira, mas ainda sim a lembrança me irritou.

Depois de se reunirem na cozinha - leia-se sala de reuniões – um silêncio estranho se instalou sobre eles. Talvez já soubessem que Hamish não tinha novidades, isso explicaria suas expressões. Luiza parecia com raiva, Andrew frustrado, mas foi a expressão de Emily que me surpreendeu e me deixou desconfiado. Ela não demonstrava nada.

- E então? – perguntou Andrew.

- Descobrimos algumas coisas sobre como Devon poderia estar controlando os licantropos, mas ainda não há nenhum sinal dele.

- Eu já esperava por isso. Esse cara sabe se esconder, hein? – disse Luiza. Ela suspirou alto e sentou. – O que faremos?

- Esperamos. Não dá pra fazer mais nada. Procuramos em todos os lugares, perguntamos pra todos os licantropos que conhecemos e lobisomens também, falei com Diana hoje e ela também não sabe de nada.

- Vocês também procuraram pelos amigos mais próximos de Raul? Talvez alguém soubesse de algo, afinal ele era um dos caras desse Devon. – perguntou Emily, seu tom espelhava sua expressão completamente vazia.

Nada bom, pensei.

- Sim. Como eu disse procuramos em todos os lugares e perguntamos a todas as pessoas. É como se Devon tivesse deixado de existir.

- E como ele controlava os licantropos? – perguntou Andrew.

- Ele usava uma formula projetada em uma mistura complexa de substâncias. Identificamos a maioria, mas algumas estão mais difíceis de saber o que são.

- Que tipo de substância? – O Loiro de farmácia parecia interessado demais.

- Uma neurotoxina poderosa com GHB e uma larga dose de veneno. - Hamish respondeu hesitante.

- Que tipo de veneno?

- Não sei, com toda aquela mistura é impossível separar as substâncias. – mentiu. Aparentemente Hamish não confiava tanto assim no rato de laboratório.

- Mas, como um coquetel de substancias ia funcionar em licantropos? Não, entendo. – disse Luiza, pensativa.

- Funciona assim. Eles usaram o entorpecente pra deixar o licantropo receptivo às outras substancias, isso deixaria seu sistema vulnerável para o ataque da neurotoxina que o obrigaria a obedecer quaisquer comandos inconscientemente e o veneno não identificado que força ele a se transformar, o que só ajuda a cair ainda mais na inconsciência. Licantropos não tem controle sobre si mesmos. – explicou Hamish, ainda cauteloso com a resposta.

- Ah. Que droga pra você não ter conseguido descobrir o que era. Talvez pudéssemos usar contra eles.

- Talvez eu consiga identificar, mas vou precisar de uma amostra. – disse Andrew.

- Não dá. Todas elas estão guardadas em refrigeradores de análise, impossível tirar de lá agora. – Hamish não daria o braço a torcer. Tudo bem trabalharmos com humanos, conviver com eles e outras coisas a mais, mas isso não significava que compartilharíamos nossas forças e fraquezas ou que iriamos chama-los para o jantar quando eles poderiam muito bem ser o prato principal.

- Ok. Então não fazemos nada e esperamos até o próximo ataque de Devon? Que será, o quê, daqui a cinco meses? – Agora Luiza estava com raiva.

- Não dá pra fazer mais nada, Luiza. Teremos de esperar até o baile de mascaras. Já coloquei todos vocês na lista de convidados e os lobos da minha alcateia vão disfarçados de seguranças. Vamos pegar Devon juntos, não tem como ele passar por todos nós sem ser visto.

- Não acho uma boa ideia, Hamish. Vamos esperar esse tempo inteiro pra tentar pegar um cara que nem sabemos se vai mesmo estar lá? – disse Andrew, Luiza balançou a cabeça concordando com o Loiro oxigenado.

- Ele não sabe que temos conhecimento do plano dele Luiza, nós é que temos o elemento surpresa. Devon vai aparecer e até lá só podemos esperar.

- Vai concordar com isso? – perguntou Luiza para Emily que permanecia calada e sem demonstrar nada. Ela suspirou e virou seus olhos de esmeralda pra Luiza.

- Não temos escolha, temos? Hamish disse que procurou em todos os lugares e falou com todos que pudessem saber de algo. Só podemos esperar, Lu.

- Emy... – disse Andrew dando um passo até ela e colocando a mão sobre seu ombro.

- Talvez seja um bom plano. Só o que temos é o elemento surpresa, é melhor do que nada, não acham?

Luiza claramente pensava o contrário, Andrew não parecia concordar muito mais e Emily permaneceu fria e distante. E eu desconfiado. Não era a reação que eu achava que ela teria e geralmente eu estava bem certo sobre isso.

- Tem certeza, Emy? – perguntou Luiza, o tom de voz baixo.

- É só no que posso apostar, Lu.

Ninguém discutiu mais nada naquela noite. O estranho é que pareciam evitar discutir a questão real. Conversaram sobre tudo, menos no que fazer agora que decidiram esperar. Falaram sobre o novo Chefe da Divisão de Investigação, falaram sobre o tempo, falaram sobre o cara morto por uma bala de canhão que havia chegado para analise no laboratório de Andrew. Falaram até de um assunto que deveria ser preocupante. O Superintendente de Policia estava furioso pelo caso que ainda não fora resolvido, ele era o melhor amigo de Julie, com praticamente um mês inteiro sem qualquer tipo de informação que ajudasse no encerramento do caso, o FBI ameaçava suspender a investigação por parte do DPC e começar eles próprios a investigar. Isso era ruim, mas nem tanto. Até onde todos sabem, existem três serial-killers lá fora que usam tigres siberianos em seus ataques que, aparentemente, são aleatórios.

Como eu disse, eles conversaram sobre tudo, menos o assunto que os interessava mais. Emily parecia estranhamente conformada com a situação. Talvez eu estivesse errado afinal. Talvez ela tenha aceitado isso.

Quando já era bem tarde, Hamish foi embora, Emily e Luiza também foram pra casa e eu continuei com a minha vigilância. Escutei todas as coisas ao meu redor como de costume, tudo estava calmo. As pessoas dormiam tranquilas em suas camas. Às vezes eu me perguntava se os problemas delas eram tão piores do que os meus. Provavelmente não, seus problemas humanos não envolviam Licantropos diurnos, Gurahls fora de controle, ameaças desconhecidas que assomavam no horizonte, nem bilionários prestes a serem assassinados. Nada disso existia pra eles e isso era meio que reconfortante, saber que a vida seguia um rumo comum em algum lugar. Mesmo que mascarada por uma realidade completamente inexistente.

Um vento forte de repente soprou do oeste, olhei para o céu. Não havia estrelas, só nuvens negras massivas, meu nariz queimou quando respirei fundo e os pelos da minha nuca se eriçaram. Então flocos macios e pequenos começaram a cair do céu. Neve. Algo esperado pra Junho. Eu amava a neve. Apesar de saber muito bem como ela se formava e todo seu processo puramente cientifico, não importava, ainda era como mágica pra mim. Caiam com tanta leveza ao meu redor, uma das poucas coisas que podiam chegar ao chão sem ser registrado pelos meus ouvidos sensíveis.

Quando escapamos pela primeira vez de Asrael, o sádico, caia os primeiros flocos da nevasca que se seguiria naquele inverno. Preso na cela, eu nunca havia visto a luz do sol ou montanhas, nem as vastas florestas. Eu só podia ouvir o som da chuva e imaginar como seria, mas a neve eu sentia no ar. Quando conseguimos fugir das masmorras foi a primeira coisa que reparei e desde então tinha sido um bom sinal pra mim. O sinal da minha libertação.

Fui pra casa quando o sol começava a nascer e vi Sam chegando ao fim da rua. Andei lentamente até a casa que guardava minha moto, assim que eu estava nela dei a partida e fui pra casa, sem deixar de notar o mundo que havia ficado de uma única cor. Puramente branco.

Em casa, depois de fazer todos os exercícios diários e tomar banho, fui direto pra cama. Eu não tinha dormido muito nesse ultimo mês, o mesmo pesadelo misterioso me atormentava. Eu ainda não tinha contado a Hamish e nem contaria, mas não conseguia me livrar da sensação de que não era apenas um pesadelo comum. Seja como for, o pesadelo era sempre o mesmo, havia um monstro descontrolado na floresta, ele corria por um longo tempo até que encontrava e atacava um homem, a sede de sangue da besta era o que o motivava, então eu acordava no ponto em que percebia que a fera era eu. Não tinha ideia do que aquilo significava, tentei vasculhar minha mente, se fosse uma lembrança eu saberia, eu ainda me lembrava dos rostos de cada vida que eu tirei e aquele rosto não parecia familiar em nada.

Eu estava inquieto, não dormia bem e os pesadelos continuavam. Cai na cama mesmo assim, incapaz de me controlar. Não demorei muito pra pegar no sono. Assim como também não levou muito tempo para o pesadelo se arrastar na minha mente.

A floresta e o arfar pesado.

As garras na terra.

O cheiro da presa e o sorriso monstruoso.

A carne se desfazendo sob as garras e o grito que nunca saiu dos lábios.

O pânico ao reconhecer que a fera era eu.

                                                                ***

- Ah! – gritei, pulando da cama e caindo agachado no chão. A escuridão que era apenas luz. Era de lei agora, todas as vezes que eu tinha um pesadelo, meus olhos mudavam do azul humano para o prateado lupino e quase sempre eu conseguia fazê-los voltar ao normal, outras vezes não. Meu corpo estava coberto de suor e meus pensamentos ainda no pesadelo. Fechei os olhos e tentei me concentrar em qualquer coisa, respirei fundo e tentei mudar de volta os meus olhos, mas como eu disse, tinha vezes que eu estava tão sobrecarregado que ficava difícil controlar as partes mais simples.

Meu celular tocou, me fazendo pular. Olhei a hora no despertador no criado mudo. Dez horas. Peguei meu celular e franzi as sobrancelhas ao ver o mostrador. Sam. Achei que tivéssemos trocado de turno.

- Hey, Sam. Desculpe eu...

- Cara você precisa sair daí agora! – ele me interrompeu aos berros. Tirei o celular de perto do ouvido.

- Desculpa, eu me atrasei...

- Vincent, Emily foi raptada, cara.

- O QUE?! – agora eu estava aos berros. Levantei e vesti o jeans preto que estava jogado no chão, coloquei os sapatos sem me preocupar em colocar meias, peguei a camiseta jogada no chão e corri escada baixo – Como assim ela foi raptada, Sam? O que aconteceu?

- Ela foi até o Tavern. Charlie me disse que ela entrou sem mais nem menos, fazendo perguntas. Discretamente na verdade, mas você sabe como essas coisas funcionam. Alguns caras ouviram e conseguiram atrair ela pra fora, dois tritões que estavam lá acharam estranho e os seguiram. Eles contaram ao Charlie que a ruivinha deu uma surra e tanto nos malucos do mal, mas eles são garous, cara.

- O que mais Charlie disse? Alguém conseguiu ver a placa do carro ou mencionou pra onde eles planejavam leva-la? Como era o carro, Sam? – procurei as chaves do fastback, mas não consegui encontrar. Tive de me lembrar de não esmagar o celular, eu estava furioso.

- Era um utilitário preto, tem um adesivo enorme de um lobo estilizado em tribal nas duas laterais do carro e Charlie não conseguiu entender direito, mas os tritões disseram que ouviram alguns caras mencionando em dar um banho nela em Fox River, parece familiar?

- E como. – Sorri, que irônico. Tão perto daqui. – Sei onde fica, falo com você depois. Ligue para o Hamish e explica pra ele, ok?

Não esperei ele responder, tirei a calça e a joguei no capô do carro, os tênis ficaram pelo caminho junto com a camiseta e num piscar de olhos eu estava sobre quatro patas poderosas. Hispo, o lobo monstruoso. A forma mais rápida de viajar pela floresta, nem tão forte quanto um Crinos, mas mais ágil.

Fox River ficava a leste da minha posição, correndo em linha reta eu chegaria lá a tempo. Pelo menos eu esperava que tivesse tempo. Se qualquer um deles tivesse feito algo para machuca-la ou pior eu iria aniquila-los, pedaço por pedaço. Eu os fatiaria até que ficassem em pedaços que não pudessem ser identificados. Reconheci o sorriso monstruoso no meu rosto. Uma nevoa vermelha começava a cobrir minha visão.

Não! Agora não! Não posso perder o controle, preciso tira-la dessa situação. É tudo culpa minha, pensei.

E era mesmo, se eu tivesse programado a droga do despertador eu teria acordado no horário certo e estaria lá naquela droga de telhado, fazendo a vigilância como sempre. Nada disso teria acontecido. Mas a ira ainda era a mesma. Estava furioso com ela por ser tão idiota. Quantas vezes tínhamos avisado que era perigoso para qualquer humano que pisasse naquele bar sem proteção? Quantas vezes enfatizamos que era mortal chamar atenção de uma forma completamente negativa? Afinal, tínhamos quebrado o véu para alguns humanos, mas isso não significava que outros aceitariam isso. Não quebrarás o véu era uma das leis, não que seguíssemos a regra, mas todos vivíamos do anonimato. Eu estava tão furioso que a nevoa vermelha ameaçava me dominar, tive que ficar me lembrando o tempo todo que eu precisava manter minha sanidade. Emily já estava correndo perigo, eu não precisava acrescentar mais peso a balança.

Não demorei muito pra encontrar a velha estrada de terra que serpenteava a floresta, corri um pouco mais devagar ao ver um estranho brilho na neve, parei um pouco e cheguei mais perto. Um cigarro. A ponta ainda estava em brasa que agora se apagava depressa por causa do frio, olhei para o chão e vi marcas recentes de pneu na neve. Eu estava no rumo certo.

Corri o mais rápido que me lembro de ter corrido, meu coração disparado em meu peito, eu não sabia se era do esforço da corrida ou do sentimento que estava brotando no meu peito. Um sentimento que eu não sentia há séculos, que era tão irreconhecível quanto qualquer outro. Medo.

E foi isso que me impulsionou, segui pelo lado direito da estrada, me mantendo na floresta enquanto seguia o rastro de pneus. Ouvi um som de motor a toda pela floresta e levou só alguns minutos pra ver o carro preto, apurei os ouvidos e tentei prestar atenção, afinal não dava pra atacar o carro errado.

- Qual é cara! Vamos só mata-la aqui mesmo e jogar o corpo dela no rio. – disse uma voz rouca e arrastada, ele parecia frustrado.

- Não. Eu quero deixar um recado para aquele bastardo filho de uma porca. Vincent me deve mais de uma vida e o irmão dele muito mais. Acha que a Ash Hollywood aí vale tudo isso? – reconheci aquela voz como se fosse a minha própria, mesmo que ele não tivesse aquele sotaque russo pesado. Ivan. Essa era a brecha que estávamos procurando. Um dos irmãos sombra estava aqui!

- Você não vai conseguir nada com isso seu assassino nojento! – gritou Emily, furiosa. Acalmei-me um pouco com o som de sua voz. Ela parecia bem, mas não dava pra saber até vê-la.

- Eu vou te mostrar sua vadia o quão nojento eu posso ser. Sua tia foi só o aperitivo, vou fazer de você o prato principal. – rosnou Ivan. Três vozes riram com ele.

- É mesmo? Então porque não para o carro e me mostra do que é capaz, hein vira-lata?

- Corajosa essa. Pare o carro Ivan, vamos brincar um pouco com ela. Tenho certeza que vai ser divertido. Adoro mulheres que se fazem de difícil. – disse outra voz. Essa era estranha e hesitante, talvez de muitos cigarros. Ouvi um inspirar profundo e a mesma voz soltou um murmúrio de apreciação. – Hum, O que você é? Já disseram que você tem um cheiro especial?

- Pena eu não poder dizer o mesmo de você. – respondeu ela, transbordando sarcasmo e desprezo.

Droga! Ela só vai morrer mais rápido se continuar assim.

Sem pensar dei uma distância de vários metros do carro pra não ser visto, até ele desaparecer da minha vista, mas ainda dava pra ouvi-lo. E como um touro enfurecido, corri em direção a lateral do carro, deixando minha forma Hispo mudar pra Crinos sem nem mesmo piscar, senti minha força aumentar e dei uma topada violenta com o ombro na lateral do carro preto, igual a uma bola de demolição, com a maior força que consegui. O carro virou e girou duas vezes pra fora da estrada antes de cair com as rodas viradas pra cima.

Me escondi nas sombras, acima deles. Eu queria o elemento surpresa, então corri morro acima e esperei agachado nos arbustos altos. Parecia até a cena no sonho em que eu atacava o humano estando acima dele.

Emily foi a primeira a sair do carro, cambaleando. Ela olhou ao redor e correu pela floresta, quase na minha direção, segurando o ombro direito, onde havia um rasgão na sua camiseta preta, dava pra ver o liquido escuro que já havia se espalhado por baixo da roupa, não era um ferimento recente. Respirei fundo e senti o cheiro de sangue. Se antes eu estava furioso, agora a ira tomava cada célula do meu corpo, ameaçando me dominar. Tentei me manter focado.

- Pegue ela, Pablo! Não deixe a vadia escapar. – disse Ivan, se desvencilhando do cinto de segurança, cada palavra pronunciada com seu pesado sotaque russo.

Pablo, um cara alto e magrelo, parecia ter sido esticado, saiu rapidamente do carro e alcançou facilmente Emily. Ela me surpreendeu dando um chute meia lua diretamente nas costelas de Pablo, ouvi o som dos ossos quebrarem e me encolhi. Com o chute ela perdeu o equilíbrio e caiu no chão de costas, gemeu de dor segurando o ombro ferido. Pablo gritou.

- Maldita! – os olhos dele mudaram de cor.

Hora de brincar, pensei.

Eu pulei e cai exatamente em cima dele, cravei minhas presas na jugular e mordi com tanta força que pude sentir sua cabeça facilmente sendo arrancada. Joguei para o lado e me posicionei em cima de Emily, protegendo-a com meu corpo, mas fazendo frente aos três que agora faziam a mesma coisa comigo. Dois licantropos e Ivan. Soltei um rugido alto quando vi um deles se aproximar de nós. Ivan ainda não tinha se transformado, olhei bem pra ele, que parecia desesperado, olhando para as próprias mãos como se nunca as tivesse visto. Os dois Licantropos, olharam para Ivan momentaneamente, como se também não entendessem. Foi o momento de distração que eu precisava, avancei no primeiro e enfiei minhas garras em seu focinho magrelo e doente, deixando minhas garras abrirem um corte profundo sob seus olhos. Ele rugiu e arrastou as garras afiadas ao longo do meu peito. Senti um corte profundo, enquanto o segundo montava nas minhas costas e enfiava os dentes com força.

Foi então que chamei pela fúria, que me respondeu como só ela pode fazer. Tingindo minha visão de vermelho, mas não deixei que me dominasse o bastante pra me fazer perder o controle.

Dei um soco no estomago do licantropo que perdeu o folego, depois acertei um gancho de direita vindo de baixo bem no focinho, o que empurrou sua cabeça pra cima deixando a garganta completamente exposta por tempo suficiente pra que eu enfiasse meus dentes, torci a mordida enquanto escutava o pescoço dele quebrando. O segundo Licantropo pulou das minhas costas e foi em direção a Emily que ainda estava no chão, olhando tudo com uma expressão de horror. Soltei um rugido involuntário de fúria e pulei em cima dele, derrubando-o no chão, afundando seu focinho na neve, enterrei minhas garras através de sua costa até senti-las perfurando seu coração que não batia. Ele parou de respirar segundos depois, me virei lentamente para Ivan, um rosnado bem audível se formando em meu peito.

Vamos ver agora o que você acha do meu jeito de brincar, pensei.

Ele tentou correr, mas eu o alcancei e o derrubei no chão. Ivan não era exatamente atlético, ele parecia aqueles lutadores de WWE que se entopem de carboidratos e gordura pra parecer que tem músculos.

- V-você não deveria se meter em assuntos que não são da sua conta, parceiro. A vadia pertence ao meu chefe que aposto que você não sabe quem é – disse Ivan se arrastando lentamente em direção ao carro. Ele claramente não sabia quem eu era. Devia estar cego.

Ou talvez só precise de uma dica, pensei.

Pisei na perna esquerda dele com força, ouvi o estalido alto quando ela quebrou. Ele gritou, segurando a perna e xingando a mãe de meio mundo em russo. Peguei-o pelo colarinho do paletó preto e o arrastei até os pés de Emily. Eu ia deixar que ela decidisse o que fazer com ele. Pisei no peito dele e enterrei minhas garras em sua pele colocando meu peso sobre elas. Ele gritou e agora deu pra entender o que ele dizia. Olhei para Emily sugestivamente. Ficava meio difícil pra mim fazer o interrogatório na forma Crinos, então esse papel era dela. Ela pareceu entender minha dificuldade. Levantou do chão e olhou para Ivan com todo o desprezo que pode.

- Onde está Devon?

- Não sei. Por que não pede para o seu cachorrinho de estimação tirar a pata nojenta de cima de mim antes que alguém mais morra hoje?

Ela olhou pra mim e tirei a pata de cima do peito dele. Só pra pisar com toda força na perna quebrada dele. Ele gritou, quase chorando agora. Não havia nem sinal de mudança de cor nos olhos dele. Emily chegou mais perto.

- Você não entendeu. Se alguém mais vai morrer hoje então esse alguém será você. Temos a noite toda ao contrario de você. Se não me disser qualquer coisa sobre o Devon, vamos quebrar cada osso do seu corpo e ver você se curar só pra depois fazer de novo, de novo e de novo. Acredite eu não poderia ter planejado melhor a minha noite

Olhei pra ela. Seu tom de voz era sinistro, eu nunca a tinha visto assim antes. Me dava até arrepios. Eu queria rir, mas precisava me concentrar. Como eu disse, ela era boa, mas sabia como ser má.

- Eu não sei nada...

Apertei mais a pata em cima da perna quebrada, cravando minhas garras no ferimento exposto.

- É sério eu não sei onde ele está! Ele liga de tempos em tempos pra saber como estão as coisas. Eu juro, não sei onde ele está se escondendo. Eu juro.

- Não acredito em você – disse ela, olhando pra mim sugestivamente.

Quebrei o antebraço dele e continuei pisando com força até sentir a fratura interna se tornar exposta. Ivan gritou tão alto que machucou meus ouvidos.

- O que sabe sobre os planos dele? Conte e nós paramos com tudo isso. – prometeu ela. O tom de voz de gelar os ossos deixava bem claro que não iria parar.

- E-eu só sei que ele queria pegar um cara. Um magnata. E-ele só fala em ser o Alfa supremo e em como deveria ser ele a comandar.

- Quem é esse magnata? – perguntou ela. Ele ficou em silêncio. Apertei as garras sobre seu bíceps e ouvi o estalo alto seguido pelo grito choroso de Ivan. Pisei até sentir o osso quebrado perfurar sua pele. O cheiro de sangue impregnava o ar. Eu na verdade estava surpreso, ele ainda não estava se transformando, na verdade nem tinha tentado.

- Eu só sei que é um cara importante para o Hamish. Se ele cair, Hamish também cai e vai ficar mais fácil derruba-lo de vez. Todo mundo sabe que ele só é respeitado porque tem aquela empresa chique lá no centro.

- Como ele planeja fazer isso?

- Tem um baile de mascaras que acontece todos os anos em Nova York, raramente esse cara está presente, mas Devon ficou sabendo que esse ano ele ia aparecer. Ele esperou por essa oportunidade durante anos. Está cansado de se esconder.

- Ele quer romper o véu. É pra isso que os licantropos servem. – disse Emily, pensativa. – Por que ele matou Juliette Givens?

- Ele precisava chamar a atenção do Hamish. É tudo o que eu sei. Por favor. Me deixa ir.

- Ainda não. Responda essa e Vincent pode parar com toda tortura.

- Vincent? – ele olhou bem pra mim, semicerrando os olhos na escuridão. Olhos humanos as vezes eram bem inconvenientes. Arreganhei os dentes pra ele. – Vincent, O bastardo?

Pisei com mais força e lágrimas de dor desceram pelos seus olhos que agora estavam furiosos.

- Concentre-se Ivan. Como Devon conseguiu as formulas pra dominar o Gurahl e os licantropos? Como ele aprendeu a dominar os licantropos durante o dia? – perguntou Emily, o tom de voz enganosamente macio.

- Ele aprendeu com um cara. – pisei no outro braço dele até quebra-lo. Queríamos informações completas – Um alquimista. O cara é um alquimista. Ele foi até uma Moira a procura de poder. Ela disse que seu destino estaria nas mãos de um alquimista. Ele o encontrou enquanto vagava pelo norte há uns cinco anos. O cara é louco e excêntrico.

- Qual é o nome dele?

- Não sei. Eu passo a maior parte do tempo por fora, só recebo ordens dele por telefonemas, nunca conheci o cara. – ele estava ofegante agora.

Dessa vez pisei na virilha dele e Ivan gritou mais alto, soltando um jorro de blasfêmias em russo. Ele segurou minha pata e enterrou as unhas nela, ofegante respondeu.

- Eu. Não. Sei.

- Ok. Agora só mais uma pergunta. Onde Devon conseguiu o Gurahl? Pelo que sei eles são tão raros que estão quase extintos. – disse Emily, enquanto andava até o carro virado e mexia em alguma coisa atrás do banco.

- O tal alquimista tem vários deles. Ele os usa como guarda-costas e outras tarefas a mais.

- Como matar policias inocentes. – disse ela, voltando com um taco de beisebol na mão. Agora eu estava com medo dela e ao mesmo tempo queria rir.

- Também – disse ele rindo. Apertei com toda força e senti o liquido quente do sangue sob a minha pata. Ivan gritou. – Pare. Me deixe ir. Já respondi suas perguntas. Um russo nunca quebra sua promessa.

- É você respondeu, mas acontece um pequeno conflito de interesses. Não sou russa. – disse ela, a expressão fria e os olhos brilhando de fúria, o taco de beisebol sob o ombro. – Eu disse que Vincent pararia. Não eu.

- Sua puta maldita! Vou te fazer em pedaços, nessa vida ou na próxima! – gritou ele. Tirei minha pata de sua virilha e arranquei um de seus braços com os dentes. Rosnei de satisfação quando ele gritou tão alto que achei que a cidade vizinha pudesse ouvir. – Você nem tem ideia do que ele preparou pra você Bastardo.

Dei um passo pra trás e olhei para Emily.

Ele é todo seu, pensei.

Ela deu um sorriso sinistro, os olhos de esmeralda brilhando. Levantou o taco acima da cabeça e com rapidez e eficiência bateu nas costelas de Ivan. Franzi o focinho ao ouvir o som dos ossos quebrarem. Ela continuou batendo, sem demonstrar dó e nem piedade.

Andei até o carro, tentando ignorar os urros de Ivan. Farejando o ar senti o cheiro de alguma coisa familiar. Arranquei a porta do carro e continuei farejando até encontrar a origem do cheiro, no teto embaixo da bagunça de vidro quebrado e outras coisas encontrei uma seringa. Estava cheia de um liquido roxo, parecia espesso. Peguei-o com cuidado, nem precisei aproxima-lo do meu nariz pra sentir que era isso o que eu estava procurando. O mesmo cheiro de doença que havia no corpo de Raul naquela noite.

Então senti uma coisa na minha mente, uma voz se desenrolando lentamente. Uma onda forte de preocupação me atingiu como um tsunami, mas não era minha.

- Vincent? Emily está bem?

Hamish. Se ele estava transformado, significava que não estava muito longe.

- Está. Consegui chegar a tempo. Sam me avisou.

- É, ele também ligou pra mim. Onde vocês estão exatamente?

- Na estrada a leste da minha casa. Na direção de Fox River.

- Leve-a pra sua casa.

 Soou mais como uma ameaça. Rosnei com isso, eu não gostava do tom dele de alfa. Repassei na minha mente tudo o que tinha acontecido. Ivan, os capangas, a seringa, a tortura. Senti um pouco de satisfação no fundo de sua mente e decepção. Ele queria ter acabado com Ivan.

- Chegaremos aí em meia hora.

Senti que ele havia sumido. Peguei a seringa que parecia minúscula entre minhas garras enormes e olhei em volta em busca de algo importante, mas não havia nada. Saí de dentro do carro virado e andei até Emily e tive um sobressalto. Ivan claramente estava morto, o crânio dele estava aberto, a neve estava tingida de vermelho vivo, mas Emily continuava batendo, quase como se estivesse em transe, lagrimas manchavam seu rosto. Cheguei mais perto e segurei o taco de beisebol, olhei dentro dos seus olhos, em um pedido sincero pra que ela parasse. Ela começou a chorar ruidosamente, seus joelhos fraquejaram, mas eu a segurei, com cuidado pra não machuca-la. Seu ombro ainda sangrava e ela tinha um corte no supercilio, o sangue caia pela lateral de seu lindo rosto de anjo. Um anjo profundamente ferido por dentro. Eu precisava leva-la pra casa.

Dei a seringa a ela e fechei os olhos, ficando nas quatro patas, deixando o Crinos se tornar um Hispo. O lobo gigante. Aquilo não seria legal e nem um motivo de orgulho pra um Lobisomem. Eu não era um cavalo, mas não sabia outra forma de carrega-la. Eu podia pega-la nos braços, mas isso diminuiria nossa velocidade. Abri os olhos e fiquei perto dela que mais uma vez pareceu entender, me abaixei um pouco pra ela poder subir.

Emily ainda era peso pena pra mim, só teria que se segurar bem. Virei a cabeça pra olhar pra ela, achatando minhas orelhas. Ela ficou me encarando por um tempo, sem entender, até que deitou em cima de mim, as mãos segurando meus pelos com força, que poderiam muito bem ser rédeas. Seu corpo tremia, mas eu não sabia se era de frio.

Comecei a correr devagar pra ela se acostumar com o ritmo e depois mais rápido, mais rápido e mais rápido sempre seguindo a trilha que eu deixara. A lua saiu de repente das nuvens e iluminou a floresta escura, embora eu não precisasse de iluminação nenhuma. Ficou difícil me manter nessa forma. Depois que sua fúria desaparece você precisa de algo pra se manter transformado, comigo costumava ser mais fácil do que para os outros. Eu não tinha que pensar, era quase como respirar ou piscar, é tão natural e instintivo que as vezes eu nem percebia que estava transformado, tinha vezes que eu sonhava com a floresta e acabava acordando na forma Lupina.

Mas, agora era diferente e eu não sabia bem por que. Talvez porque eu sentia a aura de serenidade que vinha de Emily, vindo em ondas pra mim, me acalmando e ameaçando minha forma monstruosa. Éramos regidos pela fúria, eu mais do que outros, sem isso não tem transformação. Precisei me concentrar. Seu corpo colado ao meu dificultava isso. Era quase como se fossemos um só, quase como se pudéssemos ver pelos olhos um do outro. Seu aperto se afrouxou um pouco e ela olhou para uma das mãos. Ouvi seu ofegar e olhei pra ela.

- Você ainda está sangrando.

Estranho, era pra ter cicatrizado, mal dava pra sentir. Ignorei e continuei correndo em linha reta, seguindo o meu cheiro.

- Obrigado.

Ela deve ter sentido minha confusão.

- Por salvar minha vida.

Rosnei pra ela, de repente furioso.

Gostaria de dizer que você foi uma idiota, mas você não entenderia.

- Eu sei. Foi estupido, mas eu precisava tentar. Estava esperando há um mês, Vincent.

 Eu sei. Eu faria a mesma coisa se estivesse no seu lugar. Só que você foi corajosamente inconsequente.

Olhei de relance pra ela e sua expressão me desarmou. Uma gratidão profunda se revelava nos seus olhos de esmeralda, ela segurou meus pelos com mais força e olhou pra frente, meio que sorrindo. Virei minha cabeça para o caminho e atravessei os últimos quilômetros de floresta, avistei o topo da igreja e corri mais depressa. Meus músculos queimavam, eu não estava acostumado a correr com peso, mas até que era revigorante.

Irrompi pelos portões que no meu desespero havia deixado aberto, direto pela nave central. Parei e me abaixei um pouco pra que ela descesse. Alex latiu acima do altar e veio correndo pra mim, abanando o rabo, mas não se aproximou muito. Ela virou a cabeça de lado, as orelhas de pé.

- Você mora numa igreja? – não consegui interpretar o seu tom de voz. Mesmo assim fiquei ofendido.

Com a boca peguei minha calça que estava jogada no capô do carro e me escondi atrás de uma pilastra larga, fiquei sobre as patas traseiras e mudei para a forma humana, vesti a calça rapidamente e saí de trás da pilastra.

- Não há nada de errado em se morar numa igreja. Pode ser muito libertador.

Seus olhos se arregalaram quando me viram na forma humana, ela desviou o olhar para os vitrais. A luz da lua os atravessava, formando desenhos coloridos no chão e sob nós.

Andei até a caixa de luz e acendi cada interruptor. As luzes se acenderam lentamente uma por uma, depois peguei a caixa de primeiros socorros que guardava embaixo do altar de pedra.

- Venha. Preciso olhar isso aí. – eu disse, apontando para o ombro que ela ainda segurava.

- Não, tudo bem, eu...

- Emily, se isso for um arranhão de Licantropo então pode dar Adeus a suas saídas noturnas ou pior.

Ela engoliu em seco e se sentou no altar de pedra, suspirando em resignação. Examinei o corte aberto, que felizmente não era um arranhão e sim um ferimento de uma bala que pegou de raspão, mas ela precisaria levar alguns pontos.

- Você levou um tiro?

- Aparentemente sim. Um deles tinha uma arma, mas consegui desarma-lo no caminho. – disse ela, olhando para o ferimento sob a camiseta rasgada.

Andei até onde eu havia jogado meus sapatos e a camisa.

- Segure – dei a ela a camisa. Ela me olhou confusa. – Desculpe por isso. – Antes que ela pudesse dizer alguma coisa, peguei os dois lados rasgados de sua camisa e rasguei o restante sem dificuldade nenhuma. Ela ofegou e senti no ar o seu rubor. Eu quase sorri, mas me segurei. Retirei com cuidado a alça de seu sutiã de perto do ferimento e de repente não havia mais graça nenhuma na situação. Olhei pra ela de relance e ela olhava pra todo lado, menos pra mim.

Peguei o vidro com soro fisiológico e limpei a ferida, ficava mais fácil quando se levava em conta que meu sentido tátil era mais desenvolvido que o de um humano normal. Depois de limpar a ferida, sequei com um pedaço de gaze e molhei outra com peróxido de hidrogênio, agora isso ia doer.

- Preciso que relaxe agora. Isso vai arder.

Ela assentiu e eu coloquei a gaze molhada em cima da ferida. Emily fechou os olhos bem apertados e soltou a respiração com um ruído, franzindo o nariz de dor. Tentei ser rápido e eficiente. Deixei a gaze sob seu ferimento no ombro pra estancar o sangramento e me concentrei naquele que era menos grave.

- Olhe pra mim.

Quase engoli em seco quando ela me fitou nos olhos. Essa garota tinha um poder e tanto. Tirei seu cabelo de cima do ferimento no supercilio, meus dedos roçaram levemente em seu rosto. Escutei seu coração mudar os batimentos. Posso dizer que o meu não estava batendo exatamente devagar. Limpei o corte deixando minhas mãos leves, primeiro o soro depois o peróxido de hidrogênio, se doeu ela não reclamou. Não ia precisar levar pontos então fiz um curativo oclusivo.

Tratei do ferimento mais sério. Esse ia ser mais complicado, eu não tinha nenhum anestésico comigo, então teria que suturar sem.

- Esse aqui vai ser mais complicado.

- Por quê? – a voz dela estava rouca.

- Porque não tenho anestésico aqui. Vou ter que suturar sem isso. Acha que aguenta? – eu a desafiei.

- Tenho certeza.

- Que não aguenta? – brinquei, tentando distrai-la.

- Tenho certeza de que você é o idiota perfeito para não fazer doer tanto. – disse ela, revirando os olhos.

Eu ri. É eu era o idiota perfeito pra isso. Peguei um isqueiro que eu guardava no fastback e me preparei pra fazer a sutura, esterilizei a agulha e peguei o fio absorvível.

- Você quer ficar com essa ferida pelas próximas semanas ou quer que ela suma em 48 horas? – perguntei, passando o fio absorvível pela agulha.

- Como assim?

- Não pergunte. Só responda sim ou não. – ela não ia gostar disso e nem Hamish, diga-se de passagem.

- Sim?

Passei o fio absorvível pela língua observando-a, sua expressão ficou cômica de horror. Sorri pra ela.

- Agora entendi porque nunca exerceu profissão. – disse ela, enojada.

- Sabia que a saliva dos lobos ajuda a reduzir a infecção bacteriana em feridas e acelerar a regeneração dos tecidos? Eu sei que é estranho, mas você vai estar curada em tempo recorde. Agora, não se mexa e confie em mim.

Me aproximei dela, que se enrijeceu. Senti seu cheiro puro de brisa da manhã, parecia com o aroma que o paraíso teria e sinceramente, não era um cheiro humano. Deixei meus olhos mudarem de cor e lambi a ferida bem devagar, o gosto metálico do sangue banhou minha boca, ela estremeceu e sua respiração ficou ofegante. Parei e olhei em seus olhos verdes enquanto passava a agulha, os lábios rosados estavam levemente abertos. Senti o frenesi monstruoso, mas me controlei bem. Tentei conversar com ela pra distraí-la. Ou me distrair.

- Então, você questionou sobre eu morar numa igreja, certo?

- Sim.

- Eu acho mais tranquilo do que morar na cidade. Gosto da liberdade que esse lugar me oferece.

- Você poderia ter isso em qualquer lugar. Por que aqui?

- Não sei bem. Talvez eu esteja procurando por redenção. – brinquei. Ela franziu um pouco as sobrancelhas ruivas, pensativa de repente. Alex se aproximou dela.

- É sua? – perguntou ela, acariciando atrás das orelhas de Alex.

- Sim. Estava quase morta quando a encontrei aqui. Tinha uns seis meses e era pele e ossos, agora é essa obesa de quarenta quilos.

Alex ganiu pra mim e arranhou minha perna em um gesto indignado.

- Tudo bem. Quarenta quilos bem distribuídos.

Emily riu e Alex latiu pra porta. Apurei os ouvidos e pude escutar um carro ao longe. Estava virando para a estrada de terra que dava direto pra cá. Hamish havia chegado afinal. Terminei a sutura colocando uma gaze com esparadrapo por cima pra proteger os pontos.

- Coloque minha camiseta. Hamish já está chegando. Tome cuidado com os pontos.

- O que significa? – perguntou ela apontando para a tatuagem tribal que cobria todo o lado esquerdo do meu tronco até o pulso do meu braço esquerdo, ao mesmo tempo tentava colocar a camiseta sem mexer muito o ombro. Tentei não olhar pra ela de sutiã bem na minha frente.

- É a marca do meu rito de iniciação e outras coisas.

- Hamish disse que você nunca pertenceu a uma alcateia. – ela puxou a camiseta. Ficou parecendo um vestido pra ela, mas a cor aderiu a sua pele de um jeito atraente.

- Já fiz parte de uma alcateia. Há muito tempo.

- O que aconteceu?

- Todos morreram. Fui o único que sobreviveu.

- Sinto muito. Também quero me desculpar pelo que eu disse naquele dia. Não fui justa com você. Na verdade com ninguém. – Emily baixou os olhos até o chão.

- Eu entendo porque disse aquilo. Não devia se desculpar, ninguém culpa você.

- A sensação ainda é a mesma. – de repente seu olhar mudou, como se ela tivesse se lembrado de alguma coisa. – Por que Ivan chamou você de bastardo?

Eu ri, apesar de não ter graça nenhuma. Fiz uma pausa na esperança de que ela deixasse o assunto de lado. Só que ela continuava me encarando com aqueles olhos verdes desconcertantes.

- Porque sou o único num raio de mil quilômetros que não faz parte de uma tribo. Nem mesmo tenho uma alcateia.

- Isso importa muito? – eu podia ouvir apenas curiosidade em sua voz baixa.

- Pra nós sim. Quando nascemos, a primeira coisa a se observar é a lua. Somos regidos por ela, a fase que ela estava quando nascemos moldará nossa personalidade. Chamamos de Augúrio.

- E qual é o seu?

- Não sei. É daí que vem o apelido. Não sei meu augúrio, não tenho tribo e nem alcateia. Não sei nada sobre mim.

Comecei a me sentir como uma aberração. Examinei os meus próprios cortes pra me distrair. Havia um corte enorme que cobria boa parte do meu peito, mas já estava cicatrizando. Olhei para a mordida no meu ombro, também estava cicatrizando. Quando terminasse não sobraria nem cicatriz, mas nesse ritmo só iria curar amanhã, pelo menos tinha parado de sangrar.

Então dois carros entraram pela nave central e Hamish pulou pra fora assim que viu Emily sentada no altar, correu de encontro a ela. Sua alcateia saiu dos carros e vieram andando em nossa direção. Muitos rostos que eu não conhecia e um familiar. Sam.

- Emy! Você está bem? Foi mordida?

- Não, eu estou bem. Vincent chegou bem a tempo. – garantiu ela. Ele se virou pra mim.

- Você está bem?

- Estou. – respondi confuso.

- Ótimo. – sem mais nem menos, ele me deu um soco. Foi como levar um coice direto no meio da cara. Caí pra trás, meus olhos mudando automaticamente de cor e um rosnado se formando no meu peito. Dei um mortal antes que minhas costas atingissem o chão e fiquei agachado em uma posição de ataque e desafio.

- Hamish! – disse Emily, olhando pra ele confusa. Eu estava confuso e furioso.

- POR QUE VOCÊ FEZ ISSO?! – meio gritei, meio rosnei.

- Eu disse a você pra ficar de olhos abertos. Disse pra protegê-los. Como é que ela escapou sob sua supervisão?! – rosnou ele. Seus olhos azuis indo para o dourado.

- Hamish, a culpa não foi dele. Eu é que estava de turno. – disse Sam, andando lentamente em nossa direção. Nenhum de nós dois olhou pra ele.

- Como assim? Seus turnos são durante o dia e não a noite. – perguntou Hamish.

- Aconteceu um problema no Tavern à alguns dias e pedi para o Vince assumir meu lugar. Ele fez turnos dobrados três dias seguidos. Resolvi ficar hoje pra que ele pudesse descansar, mas eu vi uma moto chegando no final da rua e achei que fosse ele. Então fui pra casa. A culpa é minha.

Hamish relaxou os ombros tensos e seus olhos dourados voltaram ao azul habitual.  Ele olhou pra Sam.

- Isso foi muito irresponsável, Sam. Você deveria ter esperado pra ter certeza de que era ele. Quase custou a vida de Emily.

- Não acho que seja pra tanto. – disse ela, o tom irritado. Ela não gostava de proteção. – Vincent chegou a tempo e salvou o dia. Fim da história. Agora, quer saber o que descobrimos ou quer continuar a gritar com os outros por coisas que estão fora de seu controle?

Eu quase ri. Ela sabia como se impor e não era uma pessoa que qualquer um de nós gostaria de mexer. Lembrei dela abrindo o crânio de Ivan. Corajosamente estupida.

- Conversamos sobre sua aventura depois. – Hamish estava decidido a não deixar essa história de lado. Ele estendeu a mão pra mim, mas eu a tirei do caminho com um tapa. – Onde deixaram os corpos?

- Eu já disse. Ao leste da estrada, siga meu rastro e vai encontrar o que procura. – dei as costas a ele e fui subindo as escadas de pedra.

- Ô maluco, pra onde você vai? – perguntou Sam.

- Se ainda não reparou, estou seminu e acho que preciso de mais do que uma calça pra levar Emily pra casa. Ainda tenho uma vigilância pra fazer.

Ninguém discutiu, subi para o meu quarto, puxei uma camiseta nova e tênis. Fui até o banheiro e lavei o rosto coberto de sangue e minhas mãos. De um lado essa era a parte inconveniente, seria bom se nossas roupas simplesmente entrassem e saíssem da existência quando nos transformávamos. Seria bem mais fácil do que carregar uma muda de roupa por aí ou perder aquele tênis favorito no meio de uma transformação explosiva. Peguei meu celular no caminho e desci de novo. Emily já tinha contado toda a história. Não havia sinal de ninguém da alcateia e nem do outro carro. Hamish ouvia cada palavra e Sam em sua forma Crinos amarronzado repassava tudo a alcateia, ele parecia completamente desinteressado. Fui até o armário e peguei a caixinha com dois comprimidos de analgésicos e uma garrafa d’água.

Passei por eles entrando no fastback, abri a porta pra Emily, que entrou sem dizer nada. Abaixei o vidro da minha janela e Hamish se debruçou olhando pra nós dois.

- Agora, leve-a pra casa. Sem paradas no caminho.

Eu não respondi, simplesmente liguei o motor do carro e dei a partida. Saí a toda pela estrada, como eu sempre dirigia. Depois de um tempo, olhei pra Emily pelo canto do olho e quase caí na gargalhada. Ela estava tensa. Segurando o banco com as duas mãos. Não resisti, comecei a rir.

- Desculpe. Melhor por o cinto. – eu disse, enquanto diminuía um pouco a velocidade.

- Você sempre dirige assim? - perguntou ela, colocando o cinto. O pânico tingia sua voz.

- Sim.

- Você não tem medo de levar uma multa ou de morrer num acidente?

- Não. Dificilmente um acidente de carro me mataria, Emily. – abri o porta luvas e dei a ela a caixa com os comprimidos e a água. – Vai precisar tomar outro amanhã quando acordar, vão te dar sono, mas vai ajudar a diminuir a dor. Na hora do banho tome cuidado com a água quente demais.

- Por que nunca exerceu a profissão? Você é bom nisso. – perguntou ela tomando os comprimidos.

- Motivos pessoais. – eu disse. Vi que ela ficou curiosa, mas permaneceu calada. Suspirei e revirei os olhos pra mim mesmo. – Ok. Fiz faculdade de medicina pra tentar achar a cura pra uma amiga minha. Ela era uma licantropo. Cuidei dela por três meses, pensei ter descoberto a cura pra isso, mas acabei matando-a. Descobri que isso não era uma doença e sim uma maldição.

- Então, você desistiu?

- Que propósito havia em continuar? Assim como vocês da policia, também fazemos juramentos em manter a vida e não destruí-la. Quebrei esse juramento, não podia exercer a profissão sabendo disso.

Seguimos calados por um tempo. Pude sentir sua mente trabalhando ou talvez fosse só efeito dos analgésicos. A estrada estava meio escorregadia por causa do gelo, então tive que tomar mais cuidado do que o habitual. Numa batida de carro dificilmente eu morreria, mas Emily não teria essa sorte. A respiração dela estava uniforme e tranquila, achei que estivesse dormindo, mas quando olhei ela estava observando a estrada.

 

 


Notas Finais


Gostaram? Não? Deixem comentários, sim? ^^
Tenho uma notícia meio chata pra dar. Não vou poder postar os capítulos por algum tempo, pois estou de mudança e vou ficar sem rede ¬¬", mas vou tentar dar um jeitinho.
Obrigado por ler e até a próxima!

THAT'S ALL FOLKS!


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