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História Loup Garou: Herege - Cyberpunk


Escrita por: InvisibleWriter

Notas do Autor


Desculpa, pessoal. Agora estou trabalhando de madrugada e estudando durante a tarde, então tá foda escrever :/

Capítulo 56 - Cyberpunk


Fanfic / Fanfiction Loup Garou: Herege - Cyberpunk

 

- Certo. O que temos? – eu disse enquanto me debruçava por cima do mapa para vê-lo melhor.

Deixei você achar que num piscar de olhos eu começaria minha narrativa já na jaula dos leões, não é? Tsc. Eles passaram centenas de anos se escondendo até da porra das bolas de cristal dos angelicais mais poderosos, por que você acha que eu conseguiria localiza-los com tanta facilidade? Às vezes eu acho que você pensa que sou o deus do impossível. Caralho, eu até que gosto dessa sua ideia, mas a verdade é bem diferente, caro mortal.

Muito diferente.

O mapa se estendia por todo o tronco cortado de um cedro ou sequoia devido ao seu tamanho enorme. Acho que o mapa dos Cervos era o mais completo da Umbra e olha que faltavam muitos reinos ainda. A Umbra era simplesmente impossível de mapear, pois seu terreno muda sempre. Quer dizer, olhe para nós. Estamos numa floresta de clima subtropical que lembrava a vida selvagem da Tailândia e a poucos quilômetros ao norte de nós havia um puta deserto muito parecido com o Saara africano. Tudo é meio louco por aqui, talvez porque a maior parte das almas que vivem aqui também são meio loucas.

- Aqui foi onde encontramos o primeiro forte demoníaco. A cinco horas e meia de distância da Babilônia. – eu disse, apontando para um lugar no canto superior direito do mapa.

- Eu e Johnny vimos nos mapas eletrônicos do trem que a linha seguia para ainda mais ao sul do que onde ela terminava na cidade das pirâmides onde soltamos os Zigurates. Então, se estivermos certos, a próxima cidade demoníaca deve ficar mais ou menos nessa linha. – Asynjor traçou uma linha com o dedo por cima do mapa.

- Eles podem tê-la mudado de lugar, afinal eu entrei na mente de uma de suas crianças e vi o que havia lá dentro. Eles não tem apenas duas cidades, eles tem três. Uma perto da Babilônia, essa que estamos procurando e ainda uma terceira cidade misteriosa que ninguém estava autorizado a saber. Apenas aqueles que seriam enviados para ela. – eu disse.

- E como vamos saber qual das duas encontrar em menos de sete horas? – perguntou Bianc, franzindo a testa.

- Encontramos aquela que estiver mais perto. Não temos ideia de onde fica a terceira cidade, mas sabemos algo sobre a segunda e que ela fica nesta linha. Estamos sem tempo. Acha que pode usar suas corujas outra vez? – perguntei a Gerda. Ela estava quieta, examinava o mapa com cuidado. Seus olhos verdes não se levantaram do mapa.

- Não posso. Já interferi o bastante e aquelas corujas não são minhas, não seguem ordens. Eu lhes pedi um favor e elas concederam, mas não farão outra vez. Sartrox são sagrados e não bichos de estimação.

- O jeito é viajar a pé por essa direção e torcer para encontrarmos o que estamos procurando. – eu disse, não gostando do meu plano. – Droga. Não consigo formar algo decente. É uma péssima ideia.

- Sim, é. Use seu nariz, homem-lobo. – disse Huggin, ele esticou as asas de um jeito estranho, acho que o equivalente humano seria um estalar de dedos. Huggin voou por uma brecha da casa-arvore destruída com marcas de garras, sua forma negra passando pela abertura que Asynjor tinha feito para fugir.

Olhei para Asynjor com uma sobrancelha erguida, mas ela deu de ombros. Sabia menos do que eu. Então, a ideia surgiu.

- Merda. Como foi que não pensei nisso antes? – eu disse, bufando pra mim mesmo. Huggin tinha razão.

- O que? – perguntaram Asynjor e Gerda. Ambas fizeram careta uma para a outra.

- Meu faro.

- Hum? – Gerda ficou sem entender, mas Asynjor empalideceu no mesmo instante.

- Vincent, é muito arriscado. O Fenrir...

- Eu posso me controlar.

- Do que está falando? – O Cervo do outono trocou o peso em seus cascos. Ele trocou olhares com o seu outro irmão, o cervo da primavera.

- Sou um caçador por natureza, Dvalinn. Se entro no frenesi posso encontrar qualquer presa, não importa a distância. Meu faro e percepção se tornam perfeitos. Nada pode se esconder de mim quando começo uma caçada. É como um canto de sereia que meu lado animal é incapaz de ignorar. – eu disse, soando entusiasmado. – É o meio mais rápido de encontrar os demoníacos.

- Mas, você nunca cruzou com um deles antes. Como encontrará o rastro de algo que você nunca sentiu o cheiro? – perguntou Gerda.

- Não é neles que vou me concentrar. E sim nos angelicais. – respondi. Comecei a andar de um lado para o outro a medida que o plano se formava. – Não posso encontrar os demoníacos, afinal nunca os enfrentei diretamente. Apenas senti o pensamento do garoto demoníaco e não é o suficiente para que eu rastreie uma presa. Preciso do cheiro, o sabor do sangue se torna mais eficaz, mas não mordi nenhum angelical quando os enfrentei naquele dia.

- Eles provavelmente estão procurando esses lugares a séculos, Vincent. Séculos. Como espera que eles vão nos ajudar a encontrar algo assim em sete horas? Não entendo onde você quer chegar.

- Simples, Gerda. Os angelicais não sabem onde procurar, mas eu sei. E eles podem sentir a presença demoníaca. Basta que eu os leve até lá e o resto se torna óbvio. A medida que chegamos perto eles vão sentindo a presença demoníaca e o lugar se mostrará a eles. Aquilo é uma armadilha para angelicais.

- Vocês os usará como bússola. – disse ela, erguendo uma sobrancelha.

- E?

- E que muitos podem se ferir.

- Primeiro, muitos virarão pó se os demoníacos seguirem com seu plano de destruir os filhos da luz. E segundo... – levantei quatro dedos pra ela – Eu. Não. Me. Importo.

Gerda bufou e revirou os olhos pra mim. Ignorei sua reação e marquei nosso caminho no mapa.

- Como fará para se controlar no frenesi? – perguntou ela.

- Não vou me controlar. Gerda, o ponto é esse. Se eu me controlar, então não é um frenesi, será apenas mais uma caçada. Eu preciso me descontrolar para que o meu faro funcione.

- Não gosto dessa ideia. O Fenrir irá tentar tomar o controle.

- Ele estará muito ocupado para tentar. – eu disse, dando um meio sorriso que desapareceu bem depressa. – Gungnir me deu mais do que sabedoria. Enquanto estive inconsciente, além das minhas visões, também pude sentir meu próprio poder aumentar. Estou mais forte do que jamais estive.

Gerda não pareceu tão certa e pra falar a verdade nem eu. Eu realmente me sentia com mais poder, me sentia mais preparado para o que viria e tinha certeza que não havia muita coisa que pudesse me deter se eu resolvesse fazer algo. Ouvimos um rasgão no ar e o som de algo pesado e metálico caindo na grama. Fomos para ver que comoção era aquela. Ergui as sobrancelhas ao ver Huggin pousar em uma arvore, o corvo era tão grande que o galho se curvou com seu peso. Também contava muito o fato de ele estar estirado de barriga pra cima, as asas estiradas, o bico aberto e a língua para fora enquanto parecia completamente asmático.

- Nunca...diga que eu não... fiz nada por você. Cof! Cof! COOOF! – ele engasgou com a própria respiração enquanto tentava falar.

Olhei para a grama. Grilhões e correntes muito grossas foram jogados na grama, a cor do meu rosto sumiu ao perceber o que aquilo significava. Mil flashes de lembranças dos meus tempos como escravo de Asrael me vieram a mente. Minha respiração estava rápida agora, meu coração batia forte no peito. Não havia nada que eu odiasse mais do que correntes. Fui até elas sob passos lentos, me agachei e hesitei um pouco antes de toca-las.

Rasgando. Queimando. Era isso que elas faziam enquanto eu tentava rompê-las. Ao meu redor, os rostos de expectativa de todos os deuses. Eu queria impressiona-los, queria fazer seus rostos se tornarem assombro, queria que eles vissem a extensão da minha força e que eu era digno de ser o portador do Equilíbrio como Odin achava que eu era. Olhei para ele, o Pai de Todos estava mais distante do grupo. Gungnir em sua mão salpicava com suas faíscas azuis.

Seu olhar era severo. Desde que nasci ele nunca mudara, desde que fui trazido a Asgard ele nunca se alterava. Apenas aquele olhar de quem espera algo.

Eu só não sabia se esse algo era bom ou ruim.

- Você consegue. Quebrou Leyding sem esforço, também quebrará esta. – disse Tyr, seu olhar confiante. Sua barba levantou um pouco, coisa que sempre acontecia quando ele forçava um sorriso. Um sorriso que derreteu aos poucos com alguma ideia súbita. – Nem mesmo Odin conseguiria quebrar essas.

Ele era o único que sorria pra mim. Mas, mesmo ele também tinha aquele mesmo olhar de expectativa. Seus olhos muito pretos não conseguiam afogar aquilo. O olhar que todos os deuses tinham pra mim desde que fui trazido a Asgard. Como se esperassem algo de mim.

Algo que nãos lhes agradava.

Continuei a forçar as correntes. Quanto mais eu forçava, mais elas queimavam, mais se prendiam a mim. Eu sabia que tinha a força para quebra-las e eu queria muito ver o olhar de assombro e surpresa em Odin quando eu a quebrasse. Queria muito rir depois da cara dos anões quando vissem que mais uma de suas famosas correntes fora quebrada. Os três nanicos estavam perto de Odin, a cabeça na altura da cintura do Pai de Todos, os pequenos olhos cinzentos em mim e com a mesma expectativa de todos.

Rosnei baixo e forcei outra vez. Facilmente vi os elos dourados entortarem. Dei um impulso para frente e elas se quebraram com um alto CLANG e me vi livre. Me levantei e sacudi meus pelos, elos de corrente quebrados voaram para todos os lados. Os deuses se protegeram como puderam, as valquírias colocaram seus escudos para se protegerem com um alto OH, os elos pesados de metais batendo em seus escudos e reverberando pela colina como som de trovões.

Observei com prazer a expressão de assombro dos deuses e seres da floresta que se aproximaram. Eles estavam paralisados, a expressão dos anões era a mais impagável de todas. Pareciam que iam cair para trás, murmuravam baixo em sua língua estranha. Seus olhos desviaram lentamente para Odin, assim como todos os outros, então é claro que também olhei. Sua face não demonstrava nada, nem mesmo quando murmurou algo aos anões na mesma língua estranha e eles relutantemente bateram palmas. Todos começaram uma salva de palmas lenta, ainda expressavam assombro e tive de reprimir um sorriso, pois isso só parecia assusta-los mais.

Tyr se aproximou, como sempre o único. Quase tinha de se erguer na ponta dos pés para poder acariciar a lateral do meu pescoço. Me abaixei para que nossos olhos ficassem do mesmo nível.

- Muito bem. Você fez muito bem.

Por que ele parecia não tão certo de suas palavras?

 

Fui arrastado de volta da visão quando tirei rapidamente meus dedos das correntes. Respirei fundo algumas vezes. Senti algo deixando minha mente, se arrastando para longe dela. Eu sabia que era a fúria do Fenrir. Era óbvio que ele estava observando tudo. Olhei de canto de olho para Huggin, seus olhos vermelhos me observavam atentamente.

- Ele não sabia que as correntes eram pra mais que testar sua força, não é? – sussurrei.

- Não. Não sabia. Ele achava que os deuses o estavam ajudando a se tornar famoso. De certa forma era verdade, ele só não sabia que isso o ajudava a ficar famoso de um jeito ruim. Quando ele quebrou Dromi, foi a gota d’agua para Odin. O próprio Pai de Todos a testou em si mesmo e foi incapaz de quebra-las. Quando o Fenrir as rompeu com tão pouco esforço, ele viu que a força do Fenrir já ultrapassava a sua. Ele ordenou aos anões uma corrente que nem mesmo o mais poderoso dos deuses poderia quebrar.

- Gleipnir. – respondi.

- Exato. Enquanto os anões construíam Gleipnir...

- Deixa eu adivinhar, os deuses se desesperaram e fizeram uma besteira. Estou certo?

- Sim e não. Um deus se desesperou, o filho de Odin, o deus da vingança: Vidar. Ele sabia que a profecia se cumpriria a qualquer momento, que um dia o Fenrir engoliria Odin. Remoeu isso durante séculos, seu desejo de vingança apenas aumentando. Quando já não pôde mais se segurar, ele levou o Fenrir até as profundezas de Niflheim para mata-lo no gelo das terras de Hela. Teve o efeito oposto já que a neblina de Niflheim não é apenas neblina comum. Há magia, poder e escuridão naquelas terras. O Fenrir previu o que os deuses fariam, previu que o Caos um dia reinaria soberano os nove mundos e que o Caos e Equilíbrio eram uma coisa só.

- Ele não pôde entender essa verdade, como portador do Equilíbrio ele não conseguiu compreender como duas forças tão diferentes podiam ser a mesma entidade. No frio e na neblina de Niflheim ele enlouqueceu, conseguiu encontrar o caminho de volta, mas jamais seria o mesmo. – disse Gerda, ela cruzou os braços.

- Ele não tinha malicia, não tinha maldade e fazia tudo o que vocês pediam por mais estranho que fosse o pedido. – eu disse, tocando de novo as correntes. Gerda ergueu uma sobrancelha.

- O que quer dizer?

- Quero dizer que vocês são os únicos culpados pelo seu próprio fim. Se ele não estivesse tentando destruir o meu mundo eu deixaria com prazer ele destruir o de vocês.

Gerda e Huggin me olharam como se não acreditassem no que eu estivesse dizendo. Com raiva, tentei erguer a merda dos grilhões, eram pesados demais. Gerda e Huggin se aproximaram, assim como Asynjor e Bianc. Juntos, conseguimos colocar a coleira e os grilhões em mim. Aquilo não poderia ser erguido nem por um C-17. Assim que estavam no lugar, aquela coisa quase me derrubou de cara na grama. Caí de joelhos e fiquei de quatro, meu braços tremendo com o esforço enorme. Se eu tentasse falar ia acabar caindo de cara.

- Nós seguiremos você pelo céu enquanto Asynjor, Gerda e Dvalinn o seguem por terra. Puxaremos as correntes assim que você estiver próximo dos angelicais, assim não correrá o risco de matar nenhum deles. – disse Huggin.

Ótimo. Prontos?

- Agora. – disse Gerda, flexionando as pernas para se preparar.

Fechei meus olhos. Era fácil ficar furioso, afinal eu estava sempre puto com alguma coisa. No momento, eu estava puto com os deuses por terem criado toda essa situação, estava puto comigo mesmo por ter concordado com isso, estava puto com Emily, pois se tivesse me ouvido estaríamos agora no mundo mortal encontrando outra forma de liberta-la de sua forma mortal sem toda a porra desse drama. E eu estava mais puto ainda porque o verdadeiro culpado estava se escondendo dos deuses no mundo mortal. Asrael, que na verdade era Loki. Eu queria estraçalha-lo em pedaços pequenos e devora-lo com um belo Pinot Grigio italiano ou simplesmente um dos uísques fortes preparado pelos Fianna.

Eu odiava correntes. Odiava ser detido, odiava ficar preso e ser submetido a qualquer um. Um rosnado alto subiu pela minha garganta, senti a mudança vindo da base da nuca e queimando pelo meu corpo, as bordas da minha visão ficaram vermelhas. De repente eu tinha força o suficiente para erguer a porra daquelas correntes malditas. Senti o cheiro no ar, farejei o vento em busca da minha presa. Eu queria um pedaço de bolo de anjo e ninguém ia me deter.

Minha visão se fechou em vermelho e quando voltei a abrir os olhos eu estava em outro lugar. Estava sentado na poltrona de um quarto que reconheci com facilidade, olhei para a cama de casal em estilo gótico e meu coração acelerou. Seu cabelo alaranjado estava espalhado pelo travesseiro, estava curto como costumava ser, os lábios cor de cereja meio entreabertos com a respiração tranquila, as pastas de casos e arquivos estavam espalhados por sua cama, o abajur ainda estava aceso e a janela aberta. Emily dormia ainda de jeans e com seus Converse surrados. Suspirei e balancei a cabeça, um meio sorriso no meu rosto.

Me ergui da poltrona e fui até ela. Tirei seus sapatos com cuidado para não acorda-la, me inclinei para lhe dar um beijo no rosto.

- Hum. Vincent. – sussurrou ela, virando-se levemente. Um de seus olhos verdes sonolentos se abriu.

- Durma, amor. – sussurrei de volta, meu nariz em seu cabelo. O perfume que sua pele exalava era muito puro, me acalmava de um jeito desconcertante.

- Eu estava sonhando com você. – murmurou ela, meio dormindo meio acordada. Me inclinei e encostei meus lábios nos dela. Emily entrelaçou os dedos no meu cabelo e me puxou pra ela para aprofundar o beijo. Tive de me obrigar a me afastar levemente, ela estava cansada e amanhã teria de acordar cedo, era melhor deixa-la dormir e guardar meu desejo pra depois. Beijei sua testa enquanto a cobria com o cobertor. Ela se ajeitou de lado para dormir.

- Feche os olhos antes o sono, anjo.

Não demorou muito e sua respiração voltou a ficar tranquila. Fui até a janela para fecha-la por causa do vento frio. No vidro vi meu próprio reflexo e algo mais. Atrás de mim havia alguém, mesmo no reflexo meio distorcido da noite eu pude vê-lo. Era louro, alto como eu, as mesmas feições e porte físico. Exceto por seus olhos.

Estes eram de um vermelho vívido.

Me virei lentamente e o encarei. Ele me encarou com o mesmo desprezo, dava até para confundir como meu reflexo, só o que desmentia isso era o fato de ele ser louro e meu cabelo ser branco. Até mesmo meus olhos também estavam vermelhos agora.

- Fenrir. – sussurrei.

Ele não disse nada, mostrou as presas pra mim. Olhei para Emily ainda adormecida na cama. O Fenrir deu um risinho no fundo de sua garganta.

- Você realmente acha que isso é real? – disse ele.

- Não sei. Mas, por via das dúvidas...

Invoquei meu poder de gelo e prendi seus pés. Quando ele olhou pra baixo ficou vulnerável, dei-lhe um soco forte no nariz e ouvi o estalo alto, então agarrei seu pescoço e o puxei para fora do gelo, torci seu pescoço com um audível CRAK. Arrastei-o para fora do quarto e fechei a porta cuidadosamente para não acordar Emily. Coloquei seu corpo flácido por cima do meu ombro enquanto o levava para fora. Joguei-o na rua, sua cabeça bateu com força no chão. Teria matado um humano normal. Me afastei de seu corpo para observa-lo, suas pupilas estavam dilatadas, não havia respiração e o pescoço estava meio torto.

- Espero que não me faça esperar por muito tempo, Fenrir. Detesto esperar. – resmunguei.

Primeiro não houve nada. Então, suas pupilas voltaram a se contrair e algo ruminou em sua garganta, um som perturbador, inumano e com som dual. Segundos depois percebi que essa era sua risada. Ele se levantou, segurou a própria cabeça e colocou o osso no lugar. Então, estreitou os olhos pra mim.

- Está mais acordado do que de costume. – sua voz era muito mais grossa, um som duplo que fazia os pelos se arrepiarem. – Gostei. Quem sabe assim você tem uma resistência um pouco mais duradoura do que da última vez.

- Estou mais forte agora.

- Oh, eu sei. Já te disseram que quanto mais forte você fica, mais eu me prendo a você? Gerda não lhe disse isso, não é? Ela está se arriscando um bocado ajudando você a tentar me destruir. O que ela não disse é que você poderá ser destruído no processo.

- Você acha que eu tenho metade de um cérebro como você? Um mais um é igual a dois, babaca. Eu sei exatamente para onde estou caminhando.

- Mas, não tem ideia de para quê está caminhando. Deuses. Nunca confie neles. Eles traem, eles mentem, eles nos usam como malditas ferramentas para seus trabalhos pesados! – rosnou ele, não conseguindo se controlar. Seu corpo começou a se quebrar, se contorcer e ficar maior. – Não somos nada pra eles! NADA!

- E você espera alguma outra coisa deles? Desde quando você se tornou tão fraco, Fenrir? Passou tanto tempo longe de seu verdadeiro corpo que se esqueceu como os deuses nos tratam. – eu disse, rindo amargamente.

- Se você me entende, então por que continua a ajuda-los a me destruir? – grunhiu ele, mudando para sua forma Crinos branco.

- Simples. Você quer destruir o meu mundo. É um lixo de mundo, eu concordo. Mas, é o meu lixo e infelizmente eu vivo lá, então você meio que me deixou sem escolha. – suspirei e lhe dei um sorrisinho debochado. – Vou me unir a qualquer deus que tiver poder o bastante para destruir você. Até mesmo Tyr.

Funcionou. Ele se colocou numa posição de ataque e desafio, baba escorria de sua boca conforme sua fúria aumentava exponencialmente.

- Foi Tyr quem ajudou a te prender e separa-lo de seu cerne de poder, levou sua Fúria. Você é apenas uma sombra do verdadeiro Fenrir simplesmente porque Tyr quis assim. Você era tão puta dos deuses quanto eu.

Ele rugiu alto e correu na minha direção. Mudei para a minha forma Crinos negra e pulei. Nos encontramos no ar, nossos corpos batendo com um som alto. Resumidamente foi um confronto entre garras e presas, rugidos altos, carne sendo dilacerada e fúria cega. Eu queria ele morto por muitos motivos diferentes, ele só precisou de um para cravar as presas no meu pescoço e me jogar para longe. Ele me queria morto simplesmente porque eu o irritei.

Cravei minhas garras no asfalto, elas fizeram aquele som irritante e fino ao deixar as marcas no chão. Olhei para ele, meu focinho recuando sobre os dentes.

Eu sei que foi você quem me mostrou aquela visão nas correntes.

- E ainda assim continua a ajuda-los! – ele rugiu pra mim, os pelos do pescoço arrepiados.

O que você achou que aconteceria? Que eu sentiria pena e tomaria seu lado? Que eu me importaria com o que eles fizeram com você só porque tem alguma semelhança com o que aconteceu comigo? Hah! Parece até que não me conhece.

Se antes ele estava furioso, então agora estava louco de ódio. Eu só esperava que fosse o bastante para mantê-lo longe da minha mente e desse tempo para que eu caçasse os anjos. Lutamos na rua deserta. Desviei de uma mordida que ele me daria na jugular e acertei minha garra em seu focinho, rasgando sua cara no processo. Ele berrou de dor e aproveitei sua distração para empurra-lo contra um carro. Amassamos o carro como se fosse apenas uma lata de refrigerante, o alarme morreu enquanto eu pressionava o corpo dele contra o capô.

- Muito bem. Ficou mais forte. – grunhiu ele, satisfeito.

Apertei minha garra em sua garganta e ele apertou a dele na minha. Ele fez força pra cima enquanto eu forçava pra baixo. Meus braços tremeram com o esforço de Hercules que eu fazia. Mesmo quase estourando uma veia da testa não consegui impedi-lo de se erguer e mostrar seu sorriso de lobo pra mim.

- Ainda não forte o bastante.

Com um gesto fácil ele me empurrou e fui de encontro aos latões de lixo do outro lado da rua. Capotei entre eles, lixo caindo por cima de mim e bati numa placa. Balancei a cabeça ao me sentir meio desorientado e uma sombra desceu sobre mim, olhei pra cima e o vi pulando, a lua atrás de sua figura que descia sobre mim como um meteoro. Rápido como um raio consegui me levantar, acertei uma patada em sua cara e ele acertou na minha. Ambos caímos para trás, os dois com o mesmo corte no focinho. Então rugimos e corremos em direção um ao outro.

Infelizmente, ele realmente era mais forte e quando batemos de frente outra vez, ambos cravando garras e presas um no outro, ele me jogou para o lado e cravou as presas na minha garganta. Ele torceu a mordida e ouvi o estalo vindo do meu pescoço. Imediatamente meu corpo ficou flácido e caí de cara na rua. Ele me virou com o focinho e encarei-o. Sua respiração se condensava no ar frio, o focinho recuado sobre as presas. Ele apertou uma pata no meu peito, as pontas de suas garras arranhando minha garganta.

O Fenrir rosnou na minha cara, então começou a devorar o meu peito. O desgraçado estava usando uma das minhas táticas. Eu fazia isso quando queria matar minhas vítimas pelo pânico. Eu quebrava suas vertebras para paralisa-los do pescoço para baixo, então começava a devora-los devagar e com eles assistindo tudo em desespero. Não tentei me debater, não tentei gritar, não fiz qualquer ato para me tirar daquilo. Ao invés disso, fiz algo completamente perturbador.

Eu gargalhei. Gargalhei em alto e bom som.

O Fenrir levantou sua bocarra pingando e olhou pra mim como se não entendesse, seu hálito doce com o cheiro do meu sangue. Eu simplesmente não conseguia parar de rir e nem tinha ideia do motivo engraçado. Eu só me sentia um pouco menos preocupado, um pouco menos consciente, um pouco menos...são.

Fui trazido de volta para a superfície com todo o meu corpo queimando, um aperto insuportável na minha garganta e algo que puxava com muita força. Forcei contra a sensação.

- Merda! Com mais força! GRRR!!

Sons de passos, vozes altas demais e coisas que ainda me forçavam. Ouvi uma voz familiar no meu ouvido, uma voz doce e baixa. Era diferente da névoa vermelha na minha visão e falava numa língua que só o meu eu consciente conseguia entender. Falava sobre colinas verdes, florestas vastas e esparsas cobrindo a terra por quilômetros e quilômetros. Sobre a paz no som da neve caindo, o silencio no beijo que cada floco de neve dava ao se deitar sobre o chão ou sobre a água no oceano.

- Casa. O lar. – sussurrou a voz no meu ouvido.

Aos poucos meu coração parou de tentar sair do meu peito e a névoa vermelha cedeu. Eu podia distinguir formas, silhuetas e cheiros e sons e sensações...eu pude ver tudo com todos os meus sentidos. Percebi que eu estava preso por correntes muito pesadas, pessoas puxavam essas correntes com toda a força, eu estava deitado sobre a grama em algum lugar onde o sol era forte demais. Reconheci o rosto de Gerda e Bianc que puxavam a corrente, os rostos cobertos de suor. Dvalinn também ajudava, a corrente envolta de seu pescoço e seus cascos deslizando sobre a grama ao tentar me puxar. Também havia rostos que não reconheci, mas soube exatamente de quem se tratava ao ver as asas abertas em suas costas e os rostos incomuns.

Havia pelos menos doze deles, todos segurando as correntes como um imenso cabo de guerra. Um deles eu reconheci como o cara que eu quebrei o nariz daquela vez, acho que era Pietro o nome ou Pedro. Tanto faz, dava na mesma. Foi ele que rastreei, pois quando eu quebrara seu nariz naquele dia pude sentir o cheiro de seu sangue e isso ficou gravado na memória.

Todos lutavam contra a força das correntes que estavam presas em mim, os angelicais principalmente. Senti dedos leves no meu pescoço e lábios chegando perto da minha orelha.

- Arth’nid etòrmini, Hróð. (Acorde sua mente, filhote.)

Minha respiração veio com força aos meus pulmões ao ouvir o sussurro de Asynjor. Olhei lentamente para trás, ela estava sentada em cima de mim, o rosto retorcido em preocupação e seriedade, os olhos prateados fixos nos meus. Meu corpo inteiro relaxou e Asynjor suspirou aliviada ao me trazer de volta à ativa. Voltei a forma humana lentamente e ela saiu de cima de mim. Meu corpo estava tremulo sob as correntes, enquanto eles as tiravam de mim.

- Tem certeza de que é seguro? – perguntou Pietro, o anjo parecia com medo de se aproximar.

- Ele está bem agora. – disse Gerda, também respirando aliviada. Não deixei de notar suas mãos tremulas ao ajudar os outros a remover as correntes de mim. Asynjor tirou minha coleira e a jogou longe com desprezo.

- Nunca mais quero ver isso nele. Nunca mais. – disse ela, perturbada. Lutei para me erguer.

- Quer dizer então que estava nos procurando? – perguntou Pietro, olhando para Gerda. Seus olhos estavam meio desfocados e reconheci imediatamente. Emily costumava olhar pra mim desse mesmo jeito quando estava lendo minhas emoções através da minha aura. – Que jeito excêntrico.

- Não havia tempo. Como já expliquei, tem a ver com os demoníacos. – disse Asynjor, me ajeitando e tentando tirar a sujeira da minha roupa esfarrapada. Aparentemente houve um diálogo curto enquanto eu estava brincando de pega-pega com o Fenrir. Me perguntei por quanto tempo fiquei apagado.

- E vocês supostamente sabem da existência de um segundo forte? – perguntou ele com ceticismo na voz.

- Olha, não temos muito tempo a perder e nem mesmo você. Eles estão aprontando alguma, algo grande e que vocês não serão capazes de combater. Precisamos descobrir o que é e destruí-lo. Vocês precisam de mais tempo. – eu disse, passando a mão no cabelo com impaciência e para tentar manter minha mente no aqui e agora, ela estava perigosamente se arrastando para o Fenrir e isso me deixava meio por fora do que era real e o que não era.

- E como você sabe que precisamos de tempo? – perguntou uma loura no grupo, saindo de detrás de um outro. Era a mesma loura da outra vez e se minha memória perfeita não falhasse, então acho que o nome dela era Olivia. – Quem garante que não está nos arrastando para uma armadilha?

- É pagar pra ver, minha cara. Eu não tenho tempo pra lidar com o ceticismo de vocês, existe uma pessoa entre o seus que precisa de mais tempo para se aprimorar, pois ela pode ser sua única defesa na guerra contra os demoníacos. Só que se continuarem a discutir comigo, sua cidadezinha flutuante simplesmente vai despencar dos céus por causa da incompetência de vocês em se arriscar no escuro.

Eles se entreolharam. A loura, Olivia, estreitou os olhos pra mim depois de arregala-los. Aposto que ela sacou exatamente de quem eu estava falando, mas não ia dizer nada já que eu podia muito bem só estar jogando verde. Os anjos conversaram entre si, então Olivia se virou pra mim.

- Onde fica o segundo forte?

- Esse é o ponto. Não sabemos a localização exata. – eu disse.

- Mas, sabemos que fica naquela direção. – Bianc apontou para o sudeste. Todos olharam para lá. Olivia considerou por um instante, então voltou seus olhos azuis fluorescentes pra mim.

- E se você estiver errado?

- Eu nunca erro. Acho que a última vez em que salvei o traseiro emplumado de vocês prova isso, não acha?

Ela fez uma careta, então conversou baixo com seu grupo e assentiu.

- Jenna, Floyd, Daiana e Stein, vocês ficam e vigiem a área. Pietro, Novaes e Hishimura, vocês vem comigo. O restante fará o reconhecimento da área caso seja preciso levantar acampamento. Se eu não voltar em quatro horas, mandem notícias a Asferia e contem o que aconteceu.

- Entendido. – responderam todos. Eles começaram a se espalhar, apenas três ficaram perto de Olivia. Ela voltou sua atenção pra mim.

- Vamos.

                                                                            

 

                                                                              ***

 

Não vou gastar muito do seu tempo e nem desperdiçar o meu dizendo como foi que encontramos aquele lugar. Apenas imagine dois lobisomens correndo feito loucos por terra ao tentar acompanhar pássaros gigantes no céu. Aqueles cretinos não diminuíram a velocidade nenhuma vez e nem pareciam preocupados conosco, o que pra mim estava ótimo.

Era simplesmente muito bom poder gastar energia assim, correndo na minha forma animal. Só que isso trazia lembranças da minha última imersão no parque de diversões do Fenrir e não era algo que eu quisesse me concentrar muito. A cada vez que isso acontecia eu me sentia menos são, menos conectado com a realidade e com o que me cercava. Quem garantia que nada disso era real? Quem podia me dar a certeza absoluta de que eu não estava agora, deitado na minha cama com Emily e tendo esse pesadelo de novecentas e oitenta e duas páginas? Como é que as pessoas não piravam com isso? Eu não tinha nem ideia. Só me limitei a correr e correr.

A um sinal invisível os nefilins diminuíram a velocidade e começaram a fazer voltas espiraladas como um bando de urubus ao desceram para o chão. Olhei para Asynjor pelo canto do olho.

Encontraram. – declarei o óbvio.

Ela estreitou os olhos, um grunhido ruminando em seu peito. Nós os alcançamos segundos depois que o último deles desceu para o chão. O terreno era meio acidentado, lembrava muito algumas florestas na tundra siberiana onde tudo parecia continuar primitivo como no primórdio dos tempos.

Exceto pela cidade além da imaginação lá embaixo.

- Puta merda. – sussurrei, me agachando atrás de uma árvore.

Parecia uma cidade medieval no topo de uma montanha. Casas pequenas feitas de pedra, um castelo gigantesco no alto, a aldeia em volta. Exceto pelo trem que cortava a cidade, os postes de luz nas ruas, dirigíveis que aportavam no alto em uma espécie de porto, a cidade seguindo uma linha futurista de prédios iluminados e as pessoas com roupas mescladas entre o atual e o medieval. Olhei para as roupas dos angelicais a minha volta. Claramente tinham o estilo Steampunk, com seus adereços entre o atual e o século passado todos predominantes em preto e cobre.

Daqui dava para ver o estilo dos habitantes da cidade demoníaca e bufei para aquilo.

- Cyberpunk. Interessante.

Basicamente uma rixa entre Steampunks e Cyberpunks. Capuletos e Montecchios. Eu queria rir. Olivia revirou os olhos como se pudesse ler minha mente.

- Fomos nós quem inventamos o estilo. Angelicais e Demoníacos existem a centenas de anos e sempre nos vestimos assim. Alguém saiu para o mundo mortal sem permissão e acabou influenciando a cultura humana. Foram eles que nomearam como Steampunk e Cyberpunk, não nós. Influenciar a cultura humana é proibido a menos que seja necessário.

- Como vamos entrar? – perguntou Pietro, agachando-se ao meu lado.

- Não vamos. Já encontramos a cidade, agora devemos reportar a Asferia e esperar o comando dos anciões para a destruirmos. Não deve demorar muito, já estão de sobre aviso que estamos aqui. – respondeu Olivia, estreitando os olhos para a cidade. – Nunca vi uma aura assim.

- Você percorreu todo esse caminho para ficar olhando? – eu disse.

- Já desobedeci as ordens dos meus superiores antes, lembra? Não me dei muito bem. – ela pareceu empalidecer. Deve ter levado uma boa bronca de seus “superiores”. – Além do mais, olha só o tamanho disso. Nunca conseguiríamos passar despercebidos. Demoníacos podem farejar angelicais a quilômetros de distância. Nossa aura nos condena, assim como nós também podemos senti-los. Este é o mais perto que vou chegar. Não é permitido entrar lá.

- Deve ser uma merda não ter auto estima, não é? – perguntei, olhando-a atentamente.

- O que?

- Só fazer o que mandam, ainda que seja necessário quebrar as regras, não ter opinião própria. Vocês me lembraram os caras que eu conheci na guerra civil. Todos jovens, todos ávidos em seguir ordens e nem sabiam para quê exatamente estavam lutando. Derramar tanto sangue por algodão. Tsc!

- É diferente, homem-lobo. – sibilou ela, irritada. Depois apenas suspirou e balançou a cabeça. – Eu não espero que você entenda. Você não tem honra.

- E é por isso que sei que posso fazer o que eu quiser. Eu não me prendo a dogmas.

Me levantei e ignorei seu chamado, desci correndo a colina, meu corpo junto ao chão. Asynjor me acompanhou logo depois junto com Gerda, Huggin voava mais acima, assim como Bianc. Mudei para a forma lupina, assim não chamaria atenção. Pra eles provavelmente seria apenas um carro bem grande, um vira-lata perambulando por aí. Asynjor fez o mesmo.

Vincent, você está arriscando muito. Está propondo muito. – disse ela, preocupada.

Eu não tenho medo dos riscos. Nunca tive. Preciso saber o que eles escondem lá, o que estão preparando para os angelicais.

- Então, é melhor sermos rápidos, porque se formos pegos lá dentro não teremos chance nenhuma.

Olhei para o meu outro lado. O cara do nariz, Pietro, me acompanhava facilmente ao descer pela colina, usava a proteção das arvores para ficar fora de vista. Bufei pra ele.

Espero que não fique de castigo por minha causa. Odiaria se seus superiores te deixassem sem TV por uma semana. – zombei.

- Pode rir, homem-lobo. Apenas respeitamos as ideias daqueles que sabem mais do que nós, que enxergam mais longe do que nós. Você pode dizer o mesmo?

Claro que posso. Estou enxergando uma poeira sendo levantada ao norte da cidade. Aquilo é movimentação de veículos. É a nossa entrada, pois provavelmente será a mais movimentada. Muito fácil nos perderem de vista lá.

- Não era disso que eu estava falando. – resmungou ele.

Concentrem-se vocês dois! Vamos entrar na cidade, descobrir seja lá o que for e dar o fora de lá. – ralhou Asynjor. Pietro e eu calamos a boca.

Percorremos o caminho em silencio, cautelosos. Meus instintos me gritavam alertas que só fui entender quando chegamos ofegantes em frente aos portões da doca da cidade e por onde o trem também passava. Ele deu um alto assovio, soltando fumaça preta. Havia muita movimentação de veículos ali, apinhado de pessoas que desembarcavam do trem e carros futuristas ao redor. Paramos próximos da estrada, todos agachados atrás dos arbustos. Carros passavam por nós em um fluxo contínuo.

Gerda, será que você pode...

- Vincent, você sabe que não posso interferir diretamente. – disse ela, erguendo uma sobrancelha pra mim. Seus olhos estavam meio perturbados, assombrados de um jeito estranho.

Só dessa vez. Não precisa me ajudar lá dentro, apenas ajude o angelical aqui a parecer mais demoníaco. – eu disse, tentando usar meu tom mais persuasivo. Ela suspirou e revirou os olhos pra mim.

- Certo. Esperem aqui.

Ela desapareceu no ar, o vento a desfazendo em perfume de campo e algo mais. Demorou poucos minutos e ela apareceu novamente com uma muda de roupas estranhas pretas e azuis, assim como uma máscara de gás azul típica do estilo Cyber.

- Eu com certeza não vou vestir isso. – resmungou ele, parecendo ultrajado.

Então, fique pra trás. Não vou esperar estando tão perto de onde eu queria. – resmunguei, já dando um passo pra frente.

Pietro grunhiu ao pegar as roupas e correr para atrás de uma arvore grossa. Roupas começaram a ser jogadas para todo lado.

- Você me deve uma, homem-lobo.

Quando eu salvar o seu traseiro pela segunda vez, aí é você quem estará me devendo, penugem.

Ele riu baixo atrás da árvore e continuei a observar a cidade. Era muito estranho, meus instintos estavam em alvoroço. A cidade não possuía defesas, não havia exércitos próximos ou qualquer outra coisa para protege-la da visão angelical. A cidade das pirâmides que eu destruí possuía uma espécie de escudo imperceptível que tornava a cidade invisível aos olhos e sentidos angelicais. Porém, essa cidade, muito maior do que a outra, não tinha defesa alguma. Era tudo muito estranho.

- Espero que você tenha encantado essas roupas, senhorita. Afinal, roupas não escondem auras angelicais. Eles vão me notar assim que eu pisar naqueles portões. – disse Pietro, limpando o suor de sua testa. Ele exalava ferômonios do medo.

- Vocês angelicais aprendem a esconder suas auras da visão demoníaca. Use sua habilidade. – disse Gerda, dando de ombros. Simples assim.

- Não é um dom ilimitado, é como prender a respiração. Só consigo fazer isso por meia hora.

- Então, vocês tem meia hora para fazer o milagre de descobrir o segredo da cidade. Boa sorte. – disse ela, cruzando os braços e se recostando em uma arvore. Eu queria rir.

Tic-tac, tic-tac. O relógio não para, angelical. Vamos!

Não corremos quando saímos da proteção das árvores e ficamos expostos na estrada movimentada, mas pareceu que os joelhos trêmulos de Pietro queriam fazer exatamente isso toda vez que um carro barulhento passava por nós. Ele era muito lento ou eu que estava muito impaciente. Acho que rolava as duas coisas.

O que os demoníacos escondiam que podia ter a ver comigo? Que podia ter a ver com o segredo de Gungnir que eu ainda não entendia? Eu não fazia ideia. Era exatamente isso o que me impulsionou a entrar pelos portões apinhados de pessoas e veículos estranhos e não me importar que meu corpo estivesse fraco por causa da minha recente batalha com o Fenrir. Estava meio difícil não me deixar me distrair pelas cores, rostos e cheiros ao meu redor. Ouvi Pietro suspirar aliviado quando passamos pelos portões.

- Passamos. – sussurrou ele, a máscara de gás distorcendo sua voz para um timbre mais grave. – Para onde agora?

Vamos seguir o fluxo de pessoas até mais para o centro. Podemos perguntar nos estabelecimentos sobre o lugar. Deve ter algum bar ou algo do tipo com pessoas tagarelas o bastante para nós dar essa informação sem perceber.

- Certo. Eu esperava que fosse mais difícil. – disse ele, rindo baixo.

Andamos pela multidão e fomos para mais um pouco dentro da cidade, observando tudo ao redor. Ia começar a chover a qualquer momento, pois o céu estava formando nuvens pesadas e cinzentas, trovões baixos soavam no alto. Isso era ótimo, pois se havia algo que pudesse me rastrear perderia meu cheiro na chuva.

TSSSSK!

Algo me atingiu no pescoço e me virei, rosnando alto para o que quer que fosse. Carros saíram de becos, derrapando em alto e bom som, faróis ligados em nós, pessoas saindo de carros. Asynjor não perdeu tempo e se colocou na forma Crinos, assim como eu. Só que meus músculos estavam ficando moles e só depois entendi por que. Tirei o dardo tranquilizante do meu pescoço. Mais dardos voaram quando rugi para eles e acertaram a mim e Asynjor, protegemos o angelical como pudemos.

Soldados cyber armados vieram em nossa direção, bradando ordens com aqueles olhos cor de lava e atirando tranquilizantes em nós.

CORRE, PIETRO! – berrei, quase caindo por causa da sonolência. O angelical aturdido abriu suas asas e alçou voo.

Ele não foi muito longe. Pois, um chicote em brasa saiu do nada e segurou seus pés antes que ele pudesse subir mais. O chicote o puxou pra baixo e ele despencou em cima de um carro, amassando-o inteiro e estourando os vidros. Protegi meu rosto, assim como os soldados próximos. Meu corpo sonolento caiu de joelhos e voltei a forma humana, lutei pra me manter consciente enquanto mãos me prendiam e me erguiam. Ouvi o som de correntes e armas sendo engatilhadas, lasers apontavam para o meu peito assim como vários feixes de lanterna. Juntei as sobrancelhas.

Botas pesadas pisaram no vidro atrás de mim, então alguém se colocou a vista. Era uma mulher. Estava toda de preto, sua roupa era colada no corpo e grossa como tweed. Havia uma insígnia em seu braço esquerdo. Era um brasão vermelho de grifo com duas cabeças, em cima dele havia o olho que tudo vê e embaixo havia cinco vértices militares o que poderia indicar sua patente militar elevada, já que cada soldado só parecia ter uma ou nenhuma.  

Seus cabelos longos e castanhos ondulavam sob o vento de tempestade. Ela usava óculos estranhos, pareciam eletrônicos, pois uma luz azul piscava na lateral esquerda. Parecia um daqueles óculos de esquiador com uma lente azul que refletia minha cara pasma e furiosa. O canto de seus lábios carnudos deram um meio sorriso.

- Não acharam que seria tão fácil desta vez, não é? – sua voz era sedosa.

Meu corpo estava tão mole que eu nem conseguia me erguer nas minhas próprias pernas, mas tive forças para rosnar pra ela. Seu sorriso desapareceu e ela me encarou por um instante antes de olhar para Pietro que resmungava de dor em cima do carro.

- O que faremos com este, comandante? – disse um dos soldados, cutucando a perna de Pietro com a arma.

A comandante apertou um dispositivo em seus óculos. A lente mudou de azul para vermelho. Ela torceu os lábios em desprezo e acenou para dois caras pegarem Pietro.

- É um angelical, tenente. Ele vai para onde todos eles vão.

- Para a fornalha. Vamos! – o tenente empurrou seus homens e eles pegarem Pietro de qualquer jeito, arrastando-o pelas asas. O arrastaram para outro carro. Lutei contra o aperto dos demoníacos, os pés dos dois grandalhões derraparam na terra e rugi alto ao ver Pietro sendo levado para longe. Mais dois soldados vieram me segurar, um deles bateu na dobra do meu joelho com a coronha da arma e caí na frente deles, minhas presas tocando meu lábio inferior. A comandante me olhou com interesse.

- Esse é forte, hein. Talvez Helene tenha algum interesse nele.

- Senhora, ele estava junto com um angelical, não é melhor manda-lo para a fornalha também? – questionou uma soldado demoníaca. Ela suspirou e eu sabia que ela estava revirando os olhos apesar de eu não poder ver.

- Use o cérebro pelo menos uma vez na sua vida, Naomi. Se um lobisomem está andando com angelicais, boa coisa não deve ser. Aparentemente os sacos de penas estão fazendo amigos novos. Ele pode saber de algo relevante sobre eles. Vamos leva-lo para Helene.

- E você...realmente acha...que vou dizer algo a você? – eu ri aos sussurros, sem força.

 A comandante virou-se pra mim e se agachou até que nossos olhos estivessem no mesmo nível. Ela tocou minha bochecha e sorriu docemente.

- Você não vai precisar abrir essa boca linda pra me dizer o que eu quero saber.

Ela se ergueu e pegou a arma de um deles. Ouvi Asynjor grunhir em torpor para tentar me defender. Eu tinha que tira-la dessa enrascada. Não podia deixa-la correr nenhum risco por minha causa. Fiz força pra me levantar, encarando a comandante com ódio.

- Faça o seu pior, vadia. – rosnei.

Ela deu um risinho fraco e esperei que atirasse na minha cara. Ao invés disso, ela acertou a arma na minha testa com toda a força. Apaguei no mesmo instante.



 



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