Capítulo 5 – Chapter Five
Eu estava completamente convencido de que Kim Haneul queria me testar, me levar até o limite e se divertir com o meu desespero. Era aquilo. Só podia ser aquilo. Apesar da mulher estar irritada comigo e ter motivos plausíveis para isso, a maneira como sentenciou aquelas palavras a mim parecia ter algo a mais por trás. A braveza saindo de sua boca. O tom baixo e audacioso que direcionou a mim. A expressão de poucos amigos mas ao mesmo tempo desafiadora. O que ela queria afinal? Jogar comigo?
Honestamente, era como se ela estivesse fazendo isso desde o início daquele dia. O jeito como me deixou se aproximar de si e tocar em sua pele, para segundos depois me afastar como se eu tivesse algum tipo de doença contagiosa que temesse contrair. A maneira como se preocupou em não me deixar sair de casa sem comer nada, me oferecendo uma simples maçã. Porra, eu nem gostava de maçãs. E para deixar tudo ainda mais confuso para mim, a forma como suas bochechas ficaram coradas e ela pareceu perder totalmente o rumo quando os bicos dos seus peitos roçaram contra a minha camiseta. O que aquela reação significava de verdade?
Bufei, frustrado com as inúmeras perguntas sem respostas. O único barulho que eu escutava era da água morna caindo contra o azulejo do banheiro. Apesar de não poder correr o risco de perder mais uma aula, eu sabia que a única coisa que abaixaria a minha temperatura era um banho quase gelado, enquanto ao meu redor tudo parecia insuportavelmente quente. Eu não estava doente, não, longe disso. Mesmo sentindo minha pele queimando como brasa e uma fraqueza misturada com sonolência típica de febre, a verdadeira razão dos meus sintomas tinha nome e sobrenome, e por algum motivo, eles não saíam da minha cabeça. O grande problema, no entanto, era que isso estava surtindo efeitos demais em meu corpo.
O álcool já parecia ter se dissipado do meu organismo há muito tempo, mas isso não significava que eu estivesse pensando com coerência, na verdade parecia bem ao contrário. Meus pensamentos estavam todos embaralhados e minhas ideias não pareciam fazer sentido algum, não quando pensar em Haneul estava me deixando despudoradamente duro e excitado.
Fechei os olhos com força e encostei minha testa contra a parede à minha frente, sentindo minha mão direita subir e descer lentamente pelo meu pau. Se me perguntassem quando foi que ela parou naquele lugar exótico eu não saberia responder, ao contrário do motivo para um ato tão indecente e impuro como aquele.
Estava óbvio.
Aquilo era errado. Pecaminosamente errado. Eu sabia que me odiaria segundos depois, sabia que não poderia colocar a culpa na bebida, sabia que não tinha desculpas boas o suficiente para fazer aquilo, até porque dessa vez eu não precisaria fingir interesse em Haneul para tentar conquistá-la, ela não estava aqui afinal. E eu sabia também, acima de tudo, que aquele tesão não era algo que desse para fingir de repente. Aquilo parecia ser estranhamente de verdade.
Mas como eu deixei isso acontecer?
Apertei minha base, observando a pele cobrir e descobrir a cabecinha. Oh, eu estava mesmo me tocando enquanto pensava na minha odiosa madrasta? Era carência, só podia ser e não tinha como ter outra explicação. Me perguntei em que mundo seria razoável cogitar a ideia de que eu sentia algum desejo por Haneul, mesmo que fosse pequeno, quase inexistente. Não, aquilo não fazia o menor sentido. Eu a odiava, odiava a sua presença, odiava a sua voz, odiava a sua máscara de boa moça, e o mais importante, odiava o que ela significava para o meu pai.
Era como se aquele fosse o meu único papel e objetivo: odiá-la. Foi assim desde o dia em que a conheci. Desde o dia em que a vi pela primeira vez. Haneul parecia tão acanhada e vulnerável por ficar perto de mim. A maneira como hesitava em me encarar nos olhos. O jeito que ela tentava se mover lentamente apenas para não chamar a minha atenção. Eu jamais esqueceria como ela se comportou no jantar em que nos conhecemos, da mesma forma que não conseguia esquecer como Haneul ficava naquele pijama.
Puxei o ar entre os dentes, passando a bombear mais rápido. Eu observava minha mão acelerando, sentindo aquela queimação gostosa no pé da barriga. Estava quase lá. E a maneira irritadinha que Haneul falou comigo mais cedo? Os olhos pegando fogo e o tom zangado. Eu só pensava no quanto ela parecia querer me comer vivo pelo o que fiz com o pequeno Taemin, ao mesmo tempo que não entendia como ela tinha coragem e tamanha audácia de me ameaçar daquela maneira. Era um lado que eu não esperava ver em uma pessoa tão aparentemente sem graça.
Parecia totalmente o oposto da garota que vi mais cedo em minha cozinha, com aquela expressão de coitadinha e um comportamento suspeito. Ah, e o que falar de quando ficamos cara a cara? Do quão perto estávamos um do outro, a ponto de sentir os peitos dela tocar em mim. Pelo pouco que olhei, pareciam durinhos e redondos, bem marcadinhos na blusa do pijama. Pareciam caber perfeitamente em minhas mãos curiosas.
Pareciam… suculentos.
— Caralho! — Xinguei, sentindo-me contrair. Eu estava louco para gozar, notando o quão cheio eu estava. A ponta naturalmente rosada estava roxa, louca por um alívio. Desesperado, comecei a estocar minha própria mão, jogando a cabeça para trás e apertando as pálpebras fortemente. Mordi o lábio inferior, deixando minha mente pervertida me imaginar colocando um daqueles peitinhos na boca, mamando igual a um bebê faminto. Em questão de segundos, gozei deliciosamente em minha mão. Um rosnado escapou da minha boca, abri os olhos e vi minha porra escorrer junto a água. Eu tinha conseguido sujar até a parede. Aos poucos, senti minha respiração antes pesada ficar gradativamente mais leve e uma sensação de alívio dentro de mim, mais especificamente em meu ventre. Até o calor incômodo que antes sentia parecia amenizar.
Entretanto, bastou o tesão passar e o lado racional falar mais alto que o arrependimento que eu já sabia que iria sentir veio com tudo, rápido e forte. Me lavei e terminei o meu banho, pensando que mais horas de sono talvez fosse capaz de me fazer esquecer do ato que cometi. Eu colocaria a culpa na bebida e não estava me importando com tamanho cinismo, eu era apenas um garoto impulsivo e cheio de raiva que precisava extravasar de alguma forma. Mais tarde, me convenceria de que estava me imaginando com a garota que me chupou na casa de Jimin, a mesma que cometeu a loucura de entrar no vestiário masculino apenas para me dar prazer. Mal me lembrava do nome dela, mas de que isso era importante agora? Cheguei ao ápice pensando no que fizemos juntos e era nisso e somente nisso que eu acreditaria.
Eu tinha problemas demais para ter de lidar agora, e o último que precisava era começar a sentir tesão pela pessoa que mais odiava na minha vida.
Minha madrasta.
♤
— Hum? — Ao sair do banheiro, me surpreendi ao ver Taemin em meu quarto. O garotinho estava sentado na minha cama, com uma mochila de algum super-heroi nas costas e arrumado adequadamente para ir à escola. Fofo. Deixei um pequeno sorriso escapar, pensando no que faria a partir dali. Eu precisava pedir desculpas a ele, me sentia genuinamente arrependido por tê-lo magoado. Por um lado, eu sabia que a minha decisão de não voltar para casa tinha sido a melhor, porque depois do que o meu pai fez e do que eu mesmo fiz também, ficar perto de Taemin não seria nada confiável. Eu estava enfurecido pelo recente abandono paterno em um dia que a presença do senhor Jeon era só que eu precisava, além de não querer estar perto da irmã do menino. Mas de qualquer forma, Taemin não tinha nada haver com aquilo.
Ele não tinha nada haver com a bagunça que Haneul estava causando a mim.
A toalha em minha cintura era a única coisa que me cobria. Meu peitoral desnudo e úmido me recordava que aquela não era a forma mais adequada de se conversar com uma criança, no entanto, quando eu teria aquela chance de novo?
Segurando com firmeza o pano em meu corpo, dei alguns passos em sua direção e me agachei em sua frente. Calmamente levei minha mão até o seu joelho, não querendo assustá-lo ou incomodá-lo de alguma forma. Depois de ontem, eu não queria fazer mais nada que fizesse Taemin querer se afastar de mim de novo.
— Oi Tae… — Falei, estranhando a hesitação que eu sentia em conversar com uma simples criança. Era um menino de cinco anos com uma altura que batia na minha cintura. Qual era o meu problema?
— Oi Hyung. — Curvou-se educadamente do mesmo jeito que fez quando nos conhecemos, só que agora ele não parecia tão contente. Não tinha um sorriso em seus lábios e o seu tom estava mais fraquinho, mas pelo menos ele me respondeu e aquilo já era alguma coisa.
— Aconteceu alguma coisa? — Usando o tom de voz mais suave que conseguia, eu perguntei.
— Minha Noona disse que ontem você estava muito triste e que queria ficar sozinho. Por isso que você não voltou para casa. — Murmurou de cabeça baixa e ombros caídos, parecendo ainda estar chateado. — E não porque o Hyung não gosta mais de mim.
Engoli a saliva com dificuldade. A mesma sensação que senti ontem ao ser “ignorado” por ele voltou com tudo, só que dessa vez bem pior, porque saber que Taemin chegou a cogitar a ideia de eu não gostar dele me incomodava muito. Incomodava demais. Quando o encontrei em frente ao meu quarto todo amoadinho eu já senti uma certa culpa me consumir por inteiro, mas ouvir aquilo era bem pior. Contudo, minha mente deu um nó ao perceber que, de certa forma, Haneul tentou limpar a minha imagem para o seu irmão. Mesmo com rancor de mim, ela ainda se deu o trabalho de explicar a situação para Taemin, quando poderia muito bem deixar como estava e me dá um papel de vilão naquela história.
— Você achou que eu não gostava mais de você porque não cumpri com a minha promessa? — Ele concordou com a cabeça, tímido. — Isso não é verdade, Tae. A sua irmã estava certa, ontem eu estava triste, por isso não voltei cedo para casa.
— Por que você estava triste?
— Porque ontem eu fui visitar a minha mãe no cemitério e isso me deixou triste. — Contei, pela primeira vez não me sentindo tão incomodado em falar sobre isso. Eu queria ser honesto com o garoto, deixar claro que minha ausência não era porque eu não gostava dele. Não podia deixá-lo pensar isso.
— A sua mamãe morreu, Hyung? — Taemin se apoiou em seus próprios joelhos e se ergueu, ficando na minha altura. Ele se aproximou e apoiou suas mãos em meus ombros molhados.
— Sim. — Forcei um sorriso, mas a maneira inocente e infantil que ele perguntou aquilo pareceu deixar o assunto menos tenso.
— A minha mamãe também foi embora, há muito tempo. Quando eu ainda era desse tamanhozinho. — Com o indicador e o polegar, demonstrou exageradamente o quão pequeno ele era na época, me fazendo rir. — Mas eu ainda tinha a minha Noona e ela cuidou muito bem de mim. — Sorriu abertamente, mostrando seus dentinhos de leite. — Se você quiser, ela pode cuidar de você também, Hyung! Assim você não vai ficar mais triste!
Eu sabia o que Taemin queria dizer ao sugerir aquilo, no entanto, por um segundo, deixei minha mente impertinente imaginar Haneul cuidando de mim de uma outra maneira. Uma maneira bem mais divertida. Inevitavelmente, lembrei do que fiz minutos atrás, pensando no quão melhor seria se fosse Haneul ali, se fosse ela quem estivesse me tocando e me fazendo chegar até o ápice.
Suspirei, querendo grunhir de raiva pelos meus próprios pensamentos, tentando afastar aquelas ideias tortas de minha cabeça. Eu não vou aceitar aquilo de jeito nenhum!
— Sabe o que me deixaria menos triste agora? — Me concentrei em retomar ao assunto, vendo Taemin negar com a cabeça e ficar curioso. — Se você aceitasse minhas desculpas por ontem.
— Eu aceito, Hyung! — Aceitou sem pestanejar, pulando em minha direção e passando seus bracinhos pelo meu pescoço, me abraçando. Por alguns segundos eu paralisei sem saber o que fazer, honestamente não esperando por aquela atitude, mas logo retribui o abraço, afagando as costas do menino.
Um problema a menos, pensei.
— Jungkook? — Nós nos afastamos ao ouvir a voz da última pessoa que eu precisava ver agora. Meu pai estava parado bem na passagem da porta, me encarando com uma expressão séria. Era a feição que ele geralmente usava quando ia me dar uma bronca quando eu era mais novo. — Onde você estava ontem?
Soltei uma risada de puro escárnio, duvidando por um segundo se eu havia escutado direito. Olhei para Taemin e notei que a animação que tinha em seu rosto foi sumindo gradativamente. Forcei um sorriso a ele na intenção de tranquilizá-lo, me erguendo e ficando em sua frente.
— Aonde acha que eu estava? — Retruquei de maneira retórica e ácida, cuspindo sarcasmo.
— Graças ao diretor do seu colégio, eu sei que não estava na aula. — Contou, ignorando o meu atrevimento. — Até porque você estava suspenso por um dia por ter ficado com uma garota no vestiário masculino e por ter brigado com um menino mais novo que você.
— É sério que você quer falar sobre isso?! — Questionei, desacreditando que aquele era o principal assunto da conversa. Eu tinha certeza que depois de ontem, as primeiras palavras do meu pai seria para pedir desculpas por não ter comparecido no túmulo da ex-esposa e depois dar suas justificativas vazias. Era o que eu esperava no fim. Mas pelo o que percebi, estava enganado. — Ontem você não apareceu no cemitério e quer falar sobre a merda de uma suspensão?!
— Abaixa o seu tom para falar comigo, Jungkook! — Me repreendeu como se eu fosse uma criança pequena aprendendo sobre bons modos. — Foi a primeira vez, em todos esses meses, que eu não fui com você ao túmulo da sua mãe. Mês após mês eu estava lá, levando flores para ela e tendo que aceitar que a mulher que mais amei na vida agora estava enterrada dentro de um caixão! Eu estava lá, mesmo que aquilo me matasse por dentro! Eu estava lá, tendo que fingir que ela me escutava mesmo quando não passava de ossos debaixo da terra!
— CALA A SUA BOCA! — Berrei, enfurecido.
Num piscar de olhos, fui em sua direção e fiquei cara a cara com o meu pai. Segurei a gola de sua blusa com minhas mãos e o empurrei, o pressionando contra a parede de maneira bruta. Quem me visse agora poderia jurar que de meus olhos saiam faíscas e que a qualquer momento eu sofreria de infarto pelos batimentos cardíacos desesperados. Quanto ao senhor Jeon, ele estava mais calmo do que deveria. Não tentou me impedir, muito menos me afastar. Se ficou surpreso ou assustado soube disfarçar muito bem, e de certa forma aquilo me deixava mais irado. Eu queria que ele respondesse a altura, queria que ele reagisse a altura, porque aí sim eu teria mais motivos para me vingar de si.
Como ele ousa falar da minha mãe assim? Da mulher que diz amar e que passou anos e anos ao lado dela. Suas recentes atitudes condizem com suas palavras podres, o que me dava mais certeza que meu pai pareceu passar por algum tipo de lavagem cerebral, porque não entrava na minha cabeça que aquele seu comportamento era por conta própria, que aquele era o seu normal. Custava acreditar que não tinha uma parcela de culpa de Haneul nisso, porque se ela não estivesse em nossas vidas tudo seria como antes. Tudo seria menos desgastante. Só que dessa vez eu não sabia se podia culpar apenas Kim Haneul por isso.
— Mas o que é isso? O que diabos vocês dois pensam que estão fazendo? — Uma terceira voz ecoou próximo a nós, e logo a silhueta de Haneul foi revelada, rumando em nossa direção para nos afastar. A garota deu um jeito de passar por deixado dos meus braços e se enfiar entre mim e meu pai, me obrigando a soltá-lo e dar alguns passos para trás. — Estão brigando na frente do meu irmão?!
Quando Haneul disse aquilo, me lembrei que o garoto ainda estava em meu quarto e olhar para ele foi instantâneo. Taemin estava encolhido no meio da minha cama, com os olhinhos cheios de lágrimas e os lábios tremendo. Ele estava com medo da briga. De mim.
Em segundos me arrependi amargamente por deixar a raiva me consumir e perder o controle. Não que eu me arrependesse de quase bater em meu próprio pai, meu ódio era tão grande que sentir remorso pela minha atitude seria impossível agora. Mas saber que Taemin presenciou aquilo me fazia sentir um peso estranho nos ombros.
— Jungkook foi suspenso da escola e você sabia disso! — Meu pai exasperou, apontando o dedo na cara de Haneul e simplesmente não dando a mínima para a presença do irmão dela. Confesso que se fosse em outra ocasião, vê-lo falar assim com a própria noiva significaria que eu estava conseguindo o que tanto queria: separá-los, porém, com Taemin aqui e o foco da conversa sendo eu, não consigo ver vantagem alguma. — Você foi cúmplice dele! Assinou o papel e manteve segredo ao invés de me contar!
Haneul engoliu em seco.
— E-eu só pensei que não fosse necessário porque-
— Pensou que não fosse necessário?! — Ele a interrompeu, repetindo suas palavras com incredulidade e impaciência. Haneul parecia nervosa e um pouco assustada também, a gagueira deixava isso bem claro, mas meu pai não pareceu se importar com isso, na verdade, ele parecia bravo até demais com ela. E, por alguma razão que eu não entendia, a maneira que ele estava a tratando parecia causar alguma coisa dentro de mim. Eu não sabia o que era, mas sabia que era desconfortável de sentir. — É sim, Haneul! Tudo que diz respeito ao meu filho é de extrema necessidade que eu tenha conhecimento!
— E por que? — Tomei a voz, voltando a me aproximar dele e consequentemente afastando Haneul de si. Pela visão periférica pude ver ela ir até a minha cama e pegar seu irmão no colo. Taemin rodou as perninhas em sua cintura, escondendo o rosto na curvatura do pescoço da irmã. Aquilo seria o suficiente para eu encerrar a discussão por aqui, entretanto, meu pai parecia querer ir além. Minha sobrancelha ergueu em puro desafio, porque eu sabia bem aonde o senhor Jeon queria chegar com tudo aquilo. — Quer saber com antecedência se eu vou surtar de novo? Se dessa vez você vai precisar me internar em uma clínica de reabilitação para eu ser vigiado vinte e quatro horas por dia?
— Do que estão falando? — Haneul perguntou em um tom baixo. Sua mão direita afagava as costas de Taemin, enquanto ela o balançava lentamente para tentar acalmá-lo.
— De quando o Jungkook foi internado depois de sofrer um coma alcoólico. — De repente, a voz da minha tia soou no cômodo, chamando a atenção de todo mundo. Ao olhar para a porta, vi Yerin e Jimin paradinhos bem ali. Enquanto meu melhor amigo estava com as bochechas amassadas e o cabelo todo bagunçado porque provavelmente tinha acordado de uma vez com a gritaria, minha tia estava impecável como sempre. Mas o que mais me intrigava era a sua expressão. Eu conseguia ver a sombra de um sorriso maléfico querendo surgir em seus lábios. Jimin estava preocupado com a situação, já Yerin parecia estar adorando aquele showzinho todo.
No entanto, bastaram poucas palavras de Yerin para todo mundo fechar a boca. Ninguém ousou dizer mais um “a”. No meu quarto só podia ouvir as respirações pesadas de todos e sentir a tensão. Era quase palpável. Pensando de um jeito mais racional, o papel de Yerin nessa situação seria apaziguar e tentar resolver toda aquela confusão, mas a maneira como seus olhos estavam fixos em Haneul parecia ter segundas e terceiras intenções. Yerin não se importava comigo ou com o meu pai ao me expor daquela maneira, não quando parecia esperar alguma reação vindo da garota. Ah, ela sabia o que tinha feito, e o fato mais importante? Tinha sido proposital.
Yerin sabia também que eu odiava relembrar dos tempos sombrios que vivi no ano passado. Todos sabiam. Me dava calafrios. Vergonha. Depois que a minha mãe morreu, não consegui aceitar sua perda de maneira saudável, muito menos passar pelo luto com maturidade. Tive muitos problemas comigo mesmo e com as pessoas ao meu redor. No início meu pai e Jimin não brigavam, afinal eu estava passando por uma perda enorme, então o certo era serem compreensivos e maneirar quanto aos meus atos. Mas, quando percebi que não importava o que eu fizesse eu ainda sairia como a vítima na história, acabei esquecendo do bom senso e me aproveitando da situação.
Eu não queria mais ficar em casa, fazia qualquer coisa para evitar colocar os pés aqui dentro porque sabia que tudo iria me lembrar a minha mãe, mas também não queria mais ir para a escola. Não tinha mais forças para isso. Todos aqueles olhares de pena me irritavam. Ter que escutar um “sinto muito” de pessoas que nunca direcionou a palavra a mim me irritava. Ter que fingir estar prestando atenção em algum conteúdo novo que os professores passavam me irritava. Então minha decisão foi deixar os estudos de vez.
Foi nessa mesma época que comecei a buscar refúgio no álcool e acabei descobrindo que enquanto se está embriagado, aparentemente todos os seus problemas somem em um estalar de dedos. Magicamente. No começo era só uma vez por dia, eu saia de casa de manhã e ficava perambulando pela cidade, ou na casa de algum amigo que quisesse me abrigar, até dar o horário que eu achava melhor para ir em algum bar que aceitasse um menor de idade com dinheiro.
Jimin sempre me buscava e me levava de volta para casa. Meu pai cuidava de mim enquanto me dava algum tipo de sermão que eu nunca prestava atenção. Eles não brigavam de fato, mas ficavam chateados. Isso até eu tornar aquelas fugidinhas em maus hábitos.
O que era uma coisa que eu fazia apenas uma vez no dia, passou a se tornar recorrente. Eu praticamente morava nos bares do centro da cidade, tinha abandonado a escola, meus amigos e meu pai. Eu não queria saber de nada além de estar bêbado e dá sensação de conforto que o álcool me trazia e do fato que aquilo me fazia esquecer completamente da minha mãe. Era de manhã, de tarde e de noite.
E foi assim por um tempo, até eu sofrer um coma alcoólico e precisar ser internado no hospital.
— Jungkook… precisamos ir para a escola. — Com a voz baixa, Jimin pronunciou-se em meio aquele silêncio horripilante. Ele me conhecia perfeitamente bem para entender o que significava meus pulsos cerrados e meu olhar fumegante à minha tia, e era justamente por me conhecer que ele parecia querer me tirar dali o mais rápido possível.
Por um instante voltei a olhar para o meu pai, esse que já me encarava. Pude notar o seu pomo-de-adão subir e descer com dificuldade. Um suspiro escapou de sua boca e sua cabeça abaixou, parecendo desistir do que quer que fosse fazer ou falar. E, honestamente, era melhor assim. Me olhou com pesar pela última vez antes de dar as costas e sair do meu quarto. Não pensei em segui-lo ou chamá-lo, tanto por não querer falar com ele por agora, quanto por ter tido minha atenção tomada por Haneul.
Ainda com Taemin em seus braços, ela me encarava com um olhar estranho, diferente de todos os outros jeito que já me olhou, e eu sabia exatamente o que era aquilo. Pena. Haneul estava sentindo pena de mim pelo o que ouviu da minha tia. Era como se eu tivesse voltado meses atrás para ter que passar por isso de novo. Haneul deu um passo hesitante em minha direção e abriu a boca, mas nenhuma sílaba saiu de lá. Ela parecia perdida.
— Jungkook não irá para a escola hoje, Jimin. — Yerin falou, aproximando-se de mim e parando em minha frente. Fui obrigado a encará-la e aquilo me deixava mais zangado ainda. — Peço que me deixem sozinha com o meu sobrinho. Por favor.
Incerto se saia ou não, Jimin me encarou esperando por uma confirmação. Suspirei, assentindo com a cabeça. Ele olhou para Haneul e esperou que ela o acompanhasse. Nossos olhares se cruzaram pela última vez antes dela ir em direção a porta. Taemin despediu-se com um aceno de mão enquanto tinha a cabeça deitada no ombro direito de sua irmã. Juro que tentei sorrir para ele, me esforcei, mas não consegui. Não desta vez.
— Por que você contou aquilo? — Ao ouvir a porta ser fechada, perguntei entredentes, não fazendo questão de esconder a minha irritação.
— Porque você fez merda e eu estou tentando consertar. — Apontou o dedo em meu peito, enfiando a unha vermelha em minha pele e me empurrando levemente.
— O que? — Perguntei, confuso.
— Acha que eu não ouvi a conversinha de vocês ontem a noite?! — Debochou, revirando os olhos. Forcei minha mente a lembrar da presença de Yerin naquela hora, mas nada veio. Acho que eu estava tão concentrado em Haneul que esqueci de todo o resto. — Quando ela ficou nervosinha só porque você se esqueceu do pirralho.
— Não fala assim dele! — A repreendi, afastando a sua mão de mim de maneira rude.
— Parece que já se apegou a família Kim, querido. — Soltou uma risada cheia de sarcasmo. — Escuta aqui Jungkook, eu acho melhor você deixar esse sentimentalismo de lado e focar no que realmente importa que é o nosso plano. Ou está desistindo e aceitando o relacionamento do seu pai com aquela garota?
Me calei, porque afinal Yerin estava certa. Eu não estava colaborando em nada para conseguirmos o que queríamos, na verdade eu parecia estar afastando Haneul de mim cada vez mais, e se eu quisesse que aquilo desse certo, eu não poderia deixar nada mais ficar no meu caminho… nem mesmo o Taemin.
— E o que você está planejando? — Perguntei intrigado, decidindo deixar minha raiva de lado momentaneamente.
Yerin sorriu abertamente, com um brilho diferente nos olhos.
— Você irá fazer Haneul sentir pena de você, compaixão por você. Irá fazê-la acreditar que está conhecendo o seu lado mais vulnerável, mais fraco. Irá conquistar a confiança dela e convencê-la de que teve uma recaída por culpa do seu pai.
Minha tia segurou minhas bochechas com suas mãos e me encarou no fundo dos olhos, me fazendo prender a respiração sem nem perceber.
— E então, meu querido sobrinho, você irá beijar a sua querida madrasta.
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