Foi beijá-lo, e Zoro soube que estava perdido.
— Te disse que o gosto era melhor que o cheiro.
Roronoa abriu os olhos puxados observando o loiro rir conhecedor. O moreno sentia que não era a primeira vez do rapaz naquela situação, naquele lugar.
Maldito conquistador de merda.
E ali Zoro também soube que sofreria pois, não era o primeiro e provavelmente não seria o último com ele. Muitos viriam depois , talvez mais do que poderia suportar .
Todos aqueles pensamentos passaram como um relâmpago por sua mente, enquanto observava Sanji sorrir.
E nada daquilo o impediu de se entregar.
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Ao contrário do que se diz por aí, o amor não é um jogo. E se o homem de cabelos verdes tivesse consciência disso antes de aceitar aquele desafio não teria sofrido tanto.
Ou não — pensou enquanto observava o rosto do cozinheiro sob as luzes piscantes da velha e conhecida pista de dança . Azul, roxo , vermelho e branco rodopiando numa miríade psicodélica sobre as bochechas coradas pela bebida e movimentação do homem loiro — Sanji era lindo demais para simplesmente não tentar.
Haviam se conhecido ali a alguns meses atrás. O professor de kendô costumava ser um homem recluso porém era fã de danceterias. Em sua concepção , havia alguma coisa de muito atraente em dançar no escuro em meio a desconhecidos.
O viu pela primeira vez em mais uma dentre tantas noites ordinárias onde ele balançava loucamente no compasso das batidas do DJ. Bebida na mão e o som do techno moendo sua mente. O beat era marcante e repetitivo, feito uma coceira no cérebro que era boa de coçar. Roronoa era grande fã do estilo e batia ponto naquela casa underground toda semana.
— Oe Zoro, tem um loiro na beira da pista que não tira os olhos de você. Caramba, ele é lindo ! — Luffy berrou de repente junto a seu ouvido fazendo com que o homem risse e direcionasse o olhar preguiçosamente pelo local indicado pelo amigo. Sua intenção era apenas satisfazer a leve curiosidade e ver de quem o moreno falava com tanta animação. Não costumava paquerar , na verdade o som costumava roubar toda sua atenção o deixando ligado por horas . Algumas vezes se envolvia com alguém e passavam a noite mas eram ocasiões espaçadas. O professor ia sempre na intenção de beber e curtir o set.
Porém , ao encontrar o detentor da admiração do amigo entendeu o que o outro queria dizer. O homem era uma verdadeira beleza brilhando sob o caleidoscópio de luzes.
— Caralho !
— Eu disse.
A bebida e aquele olhar penetrante cantaram fundo em sua alma fazendo com que ele se aproximasse num rompante do outro.
— E aí loirinho , quer dançar ?
— Bora Marimo.
Se apresentaram. Sanji era um cozinheiro recém chegado na cidade à procura de diversão. Zoro era um professor de kendô nascido e criado naquele lugar.
— Tá gostando do set ? — o de cabelos verdes perguntou a certa altura. Estavam naquela situação a algum tempo, trocando palavras , sorrisos e olhares , dançando e bebendo.
— Muito! Fico feliz de ter achado uma boate que toca um bom techno por aqui.
— A cena é boa. — Zoro concordou com um leve sorriso balançando a cabeça ao som das batidas. Mais um trago na cerveja e ele não poderia se sentir melhor.
— Quando terminar , vou sair pra fumar.
— Te acompanho.
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Do lado de fora , observava Sanji fumando debaixo da luz amarelada do poste. Os movimentos eram fluidos e sensuais , mão e cigarro se comportando como um só , como um par perfeito. Zoro tinha certeza que o homem era um fumante antigo. O outro fumava e dançava de olhos fechados , no ritmo da batida que vazava para fora do local. Se sentiu observado e resolveu perguntar:
— Que tanto olha Marimo?
— Essa sua sobrancelha sensual.
Abriu os olhos acinzentados e lançou um riso debochado antes de responder.
— Você está caidinho por mim.
— Não fui eu que comecei encarando.
— Você está caidinho por mim.
— Ok estou. Vamos pra minha casa?
.
No táxi, Zoro seguia implicando com aquele loiro que fazia seu coração bêbado bater frenético por uma noite. Trocavam farpas e toques como um prelúdio do que estava por vir.
— Que droga de cheiro era naquela fumaça sobrancelhas ?
— Qual fumaça Marino ?
— Do cigarro oras! Têm cheiro de fruta.
— Marlboro de melancia. Gostou?
— Achei uma merda.
Sanji riu identificando a ironia.
— O gosto é melhor que o cheiro pode apostar— disse acompanhado de uma piscadela.
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— Quer uma bebida? — Roronoa perguntou quando finalmente chegaram em seu apartamento. Apesar da implicância e dos leves toques no veículo , nenhum dos dois parecia com pressa de iniciar algo. O cozinheiro era uma companhia instigante que o desafiava o tempo todo. Beleza e boa conversa combinadas em um corpo magro de pernas compridas e boca inteligente.
— Claro. Posso fumar aqui?
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O bate-papo e os toques cresciam. Roronoa sentia-se elétrico e Sanji se sentia a vontade. Quando finalmente se beijaram, o de cabelos loiros esfregou em sua cara o que tinha dito mais cedo " Te disse que o gosto era melhor que o cheiro ".
Zoro não pôde discordar.
O deitou em sua cama e o cozinheiro foi de bom grado. Amaram-se por horas , embriagados em vários sentidos , sentido tudo ao mesmo tempo. Suor quente escorrendo pela pele tornando-se frio pela brisa que entrava da janela. No escuro enxergavam tudo. Mãos se tornando olhos e o toque ganhando voz. Chiados e gemidos arrastados formando uma sinfonia única.
No outro dia , Zoro acordou com cheiro de café fresco infestando o apartamento. Ao chegar na cozinha , viu o loiro de costas em sua pia , a fumaça do cigarro de melancia subindo levemente ainda no início da carburação.
A cena incrivelmente doméstica o fez sorrir.
.
E agora estava ali mais uma vez. Após meses naquela situação . Mais uma noite indo atrás de Sanji naquela pista de dança. As luzes piscantes na pele branca e corada que ele sabia estar quente. Já a havia sentido tantas vezes sob seus dedos que poderia descrever temperatura e sensação com precisão impecável. Respirou fundo enquanto se aproximava. Contava com sua capacidade de manter a face estóica enquanto oferecia o coração numa bandeja. Apostando mais uma vez os cacos que foram sendo quebrados ao longo daquele " relacionamento ".
— Quer dançar loiro? — Perguntou logo se arrependendo da escolha de palavras. Já estavam dançando. O cozinheiro que trocava gracejos com um homem de cabelo preto, sardas e riso aberto na pista virou os olhos em sua direção e sorriu.
— Boa noite Marimo. Vem dançar com a gente!
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De alguma forma ele conseguiu. Ele sempre conseguia e era isso que o consolava. Apesar de tudo e todos que ele sabia passarem pela cama de Sanji ao longo daqueles meses , era para a casa dele que o loiro ia no final da noite.
Mal esperou adentrarem o apartamento e já tomou os lábios do outro com posse. O gosto do cigarro de melancia agora o esquentava pois queria dizer que estava beijando Sanji. O prensou na parede e tirou suas roupas. O jogo era uma faca de dois gumes machucando e acalentando seu coração. O loiro acompanhava o ritmo , deixando-se ser tomado pelas mãos sedentas e pelos beijos furiosos do professor de kendô. O apartamento tão conhecido lhe trazia uma sensação de paz e alerta. Ele sabia o que Zoro queria.
E era justamente o que ele não poderia lhe dar.
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— Fica comigo. — Roronoa murmurou no outro dia ao pé de seu ouvido. Estavam na cozinha , Sanji passava café e puxava o primeiro trago quando sentiu braços musculosos em volta de sua cintura e uma cabeça apoiada em seu ombro. O tom de voz que Zoro usava fez seu coração doer.
— Marimo… eu estou aqui.
— Sabe o que eu quero dizer. — o homem de cabelos verdes respondeu num muxoxo cansado.
Sanji virou-se encarando o professor, o olhar cinza e tempestuoso.
— Eu te disse Zoro. Não quero estar em um relacionamento sério. Quando você me conheceu eu lhe disse e venho dizendo desde então.
— Eu sei mas…já faz tanto tempo! Você conhece meus amigos , nós ficamos juntos sempre. Então eu pensei-
— Você pensou que eu poderia mudar de ideia. Mas eu não mudei. Eu não estou pronto pra estar só com uma pessoa. Eu gosto de você e gosto de estar com você. Nós nos divertimos muito nesse tempo mas-
— " Nós nos divertimos muito nesse tempo " — Zoro interrompeu o outro em tom de raiva. — Então é isso que eu sou ? Diversão?
O tom indignado do homem irritou o loiro de vez.
— Eu nunca te enganei. Você sabe que eu terminei um noivado de anos , que ainda não superei totalmente e às vezes fico com minha ex. Eu fui honesto Zoro.
— Com ela e a cidade toda. — respondeu com ódio, o veneno do ciúmes impregnando cada palavra.
— Sim ! Com ela , com você , com a porra da cidade toda Roronoa! E eu faço isso tranquilamente pois sou solteiro, entendeu?
A resposta do cozinheiro foi o estopim para que o professor levantasse a voz : — ENTÃO, POR QUE VEM PRA MINHA CASA , DORME COMIGO E FAZ CAFÉ DA MANHÃ ? POR QUE TROCA MENSAGENS , ME LIGA E ME BEIJA COMO SE EU FOSSE IMPORTANTE ??
As acusações gritadas fizeram com que o loiro respondesse no mesmo tom : — PORQUE VOCÊ É! MAS ISSO NÃO QUER DIZER QUE EU QUERIA UM RELACIONAMENTO SÉRIO COM VOCÊ , MERDA!
— ENTÃO O QUE VOCÊ QUER SANJI ? QUE PORRA VOCÊ QUER PODE ME EXPLICAR ? VOCÊ TRANSA COMIGO UM DIA E NO OUTRO VAI PRA CIDADE DA SUA EX COMER ELA! ME ACORDA COM CAFÉ DA MANHÃ E NA OUTRA SEMANA ESTÁ COM OUTRO NAQUELA BOATE! EU NÃO QUERO MAIS ISSO , NÃO QUERO MAIS SER USADO ASSIM !
O desabafo do homem de cabelos verdes combinado ao tom de profunda mágoa fizeram Sanji tremer. Fechou os olhos por um instante enquanto o outro se afastava e ia em direção a pequena mesa da cozinha.
Zoro sentou-se afobado apoiando os cotovelos , mãos sob os olhos tentando não chorar , tentando conservar o pouco de dignidade que lhe restava.
— Dá pra dizer o que sente por mim Sanji ? Se sente o mesmo que eu . — Perguntou num fio de voz. Ele sabia a resposta. Mas ainda precisava ouvir. Pra matar a esperança de vez.
— Sinto muito Zoro …
— Eu só queria que você sentisse sabe? — o de cabelos verdes interrompeu, revolta e mágoa misturadas em sua voz, o encarando em busca de respostas— Só queria que sentisse o mesmo que eu sinto droga!
— A escolha não é sua. Não sinto nada.
As palavras eram dolorosas e verdadeiras. Ele não amava Zoro. Não queria e nem amava ninguém naquele momento.
Roronoa assentiu de cabeça baixa
O loiro observava a cena sem saber o que fazer. Sentia a culpa apesar de todos os avisos que deu ao outro. O que eles tinham era casual. Mas o homem de cabelos verdes se aproximou demais, se apaixonou demais. Não era como se ele pudesse controlar essa merda afinal.
Sanji era um jogador também. Havia se tornado um após anos amando apenas uma mulher . Quando ela o deixou , sentiu-se uma casca vazia . A percepção de não saber mais quem era sem a outra pessoa a seu lado, doeu tanto que prometeu jamais se dedicar tanto e amar tanto alguém novamente.
Deixou a antiga casa e tornou-se um filho da lua. E foi na primeira madrugada que saiu naquela nova cidade onde estava disposto a fazer qualquer coisa para esquecer Nami que conheceu Zoro.
As ideias e corpos bateram mas ele não podia parar. Ainda amava a mulher de cabelos avermelhados e não queria usar o professor de Kendô como substituto.
Sabia que precisava ser livre. Precisava redescobrir quem era.
Mas cometeu um erro naquela primeira noite com Zoro. Ele ficou. Ele fez café da manhã , trocou telefones e confidências. Conheceu os amigos e tornou-se amigo dos amigos de Roronoa. Foi pra cama do homem tantas vezes que já tinha perdido a conta.
Conversavam às vezes sobre isso. Zoro implicava , como uma brincadeira no início, sobre o fato de Sanji ficar com todos. O loiro ria e usava desses momentos para deixar claro sua posição. Mas o tempo passou e as coisas se complicaram . Nami voltou a procurá-lo. Ele ainda a amava e cedeu. Ficavam sem compromisso, mas a mulher sabia que seu coração ainda pertencia a ela.
Eventualmente Sanji foi esquecendo Nami e tomou as possibilidades nas mãos. O sonho da liberdade de ser e conhecer de forma plena tudo o que pudesse na vida. Sem amarras e dependências , dedicando-se somente a si mesmo.
De repente , o mundo se tornou dele.
E por mais que tentasse ignorar , no fundo ele sabia que o coração de Zoro também.
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— É melhor eu ir . — o cozinheiro murmurou baixo depois de um tempo. O café esquecido durante a discussão esfriou e ele sentia que não cabia mais ali. Vestiu as roupas rapidamente passando os olhos pelo quarto , como se buscasse algo. Não queria deixar nada para trás. Não queria ter que voltar e encontrar aqueles olhos profundos e duros que o encaravam com mágoa.
Zoro permaneceu sentado na cozinha na mesma posição. Segurando o choro e o orgulho. O coração em frangalhos perguntava onde tinha errado. Por que algo que tinha tudo pra dar certo não deu pelo simples fato de uma das partes não querer. Um fato simples que mudava tudo.
Não dava mais , ele não conseguiria continuar a dividir Sanji. Queria exclusividade e segurança. Queria poder demonstrar seu afeto sem receios , queria compromisso e lealdade. Queria poder marcar o loiro e chamá-lo de seu.
E Sanji não queria isso.
Era doloroso mas ele entendia. Sentimentos não são controláveis e o cozinheiro estava em outro momento. Ele apostou , criou esperanças ,se arriscou e fez planos, mas no fim perdeu.
Observava o cigarro que se consumia sozinho apoiado na pia quando a porta do apartamento bateu. Sanji tinha partido . Havia aprendido com o loiro que cigarros brancos uma vez acesos se consumiam independente se eram tragados ou não. Riu sombrio pensando que o amor também era assim.
É realmente uma pena que nem todos os finais sejam felizes.
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