POV. Torajo.
Ah, verão... Aqui em Verade, os dias estão cada vez mais ensolarados, quentes e, olha, eu nem estou exagerando: está no nível de derreter. Sério, cada dia parece que o sol está tentando cozinhar todo mundo vivo e, para se ter noção, é de madrugada e deve estar uns 27 graus e eu sou um dos que mais sofre com isso. Não que eu goste de reclamar (talvez um pouco, vai), mas essa é fácil, uma das épocas do ano que eu mais odeio. Nem começou o verão direito e já quero o meu inverno de volta, para tomar meu quente café para me esquentar enquanto edito os vídeos.
Se fosse possível, com esse enorme calorão, eu pegava umas boas férias, sumia, passava o dia todo mergulhado na piscina só para me livrar desse forno ambulante que virou Verade. E olha, com certeza eu faria isso — se eu não tivesse que dar conta do Mundo Torajo, o canal que virou minha vida. É, eu sei que parece exagero, mas sério, essa é uma das minhas maiores preocupações agora. Aliás, talvez a maior de todas.
Nessas últimas duas semanas, ando trabalhando feito louco no canal. O nível de dedicação que eu estou dando ao Mundo Torajo parece até coisa de outro mundo. Estou trabalhando de um jeito que nunca trabalhei antes, e olha que eu já estou nessa brincadeira faz mais de três anos. Eu amo o canal, de verdade, mas ele anda sugando minha energia de um jeito absurdo. A minha rotina, que antes era sossegada, agora virou um loop infinito de produzir vídeo, criar roteiro, gravar, editar, produzir vídeo, criar roteiro... Meus dias e noites atualmente se resumem a praticamente isso.
Para falar a verdade, mal sobra tempo para qualquer outra coisa. Dormir virou um luxo, e comer direito também. Se não fosse o café que me mantém acordado, eu já teria caído. Inclusive, estou com uma xícara de café ao lado, e sabe que horas são? 00:28 da madrugada. Pois é. O mais novo vídeo do canal está ali, aberto para edição, mas quem disse que eu consigo me concentrar? Tem algo me distraindo, uma coisa que não sai da minha cabeça... Ou melhor, um alguém.
E esse alguém é o Morajo, meu irmão gêmeo que, só por conta de alguns minutos, se acha o mais velho e vive me zoando por isso. Desde aquele dia em que a gente quase se matou, lá naquela maldita usina do Algorítimos, as coisas mudaram. Ele tinha se jogado naquela loucura de cabeça naqueles algoritmos, tudo por impulso, e isso ainda pesa. Depois, nos reconciliamos, ele se livrou do tal algorítimo e voltou a morar comigo. Mas percebi que ultimamente ele está agindo de um jeito... sei lá... esquisito, é a palavra mais próxima.Tá impossível de ignorar. Na verdade, desde que ele saiu de lá, ele está esquisito, mas ultimamente está muito pior.
Não sou só eu que acho isso, aliás. A Zulmi, o Linn e até a Pessy — que mal começou a gravar vídeos com a gente faz uma semana — já notaram e comentaram comigo. Então, não, não é só coisa da minha cabeça. Morajo tá cada vez mais estranho de um jeito que não dá para fingir que está tudo bem. Cada dia ele está mais mal-humorado, cada vez mais calado, cada vez mais... sozinho. Ele anda se isolando, ignorando as pessoas e, quando fala, é só o básico e ainda de forma grosso, quase como se fosse por obrigação. Nem comigo ele fala direito e eu moro junto com ele! Se ele trocou mais de 20 palavras comigo essa semana, é muito. Ele só fica preso naquele quarto... Está me preocupando muito!
Tá...Eu sei muito bem que ele nunca foi o cara mais alegre e extrovertido do mundo. Muito pelo contrário, ele sempre foi meio na dele, o oposto de mim, até. Mas agora... ele está tão diferente,a ponto de me deixar incomodado, preocupado de verdade e eu tento disfarçar, mas não estou conseguindo mais.
Afinal, ele é meu irmão, e eu não consigo ignorar o jeito que ele mudou, nem deixar de me perguntar o que pode ter causado isso. Será que tem a ver com aquela coisa dos Algorítimos? Aquela substância maluca que ele estava obcecado? Não viaja, Torajo, eu mesmo vi toda aquela gosma saindo dele. Esses pensamentos já estão me deixando maluco.
Estou aqui com o vídeo pela metade, mas sabe de uma coisa? Não consigo continuar. Vou deixar esse vídeo para depois, ele que espere! Fecho o editor de vídeo, salvo o que já estava feito e desligo o computador. Meu canal já está com conteúdo garantido para as próximas duas semanas, então eu posso focar em outra coisa. Agora eu vou tentar descobrir o que está acontecendo com o Morajo.
Levanto-me e vou até o quarto dele. Morajo sempre dorme cedo, bem diferente de mim. Tipo, nove horas e ele já está totalmente apagado e estou preparado para o acordar e enfrentar seu mau humor.
Mas quando chego perto do quarto, ouço um ruído esquisito. São vozes. Pessoas falando. Estranho... eu não sou do tipo de invadir o espaço dos outros, mas aí é que está: esse tipo de coisa não é o Morajo.
O cara que mal consegue ficar acordado depois das nove está ali,parece estar bem acordado, mexendo no celular, e adivinha o que ele está fazendo? Parece estar passando shorts no YouTube, quando a gente faz quando estar morrendo de tédio. A cena não faz sentido nenhum. Definitivamente, tem algo errado...Não consigo tirar essa ideia da cabeça. Tem alguma coisa acontecendo com ele, e eu preciso descobrir o que é e vou aproveitar que ele está surpreendentemente acordado para tirar satisfação com ele.
Chego na porta do quarto que aparentemente estava só fechada, não trancada e bato três vezes de leve.
-Morajo, posso falar com você? -respiro e peço suavemente, tentando não parecer nervoso.
Nada... Aguardo uma reposta,mas apenas ouço o som do silêncio dele.
Lá dentro,o som das pessoas falando parou, provavelmente ele desligou o celular, deixando tudo ficar em silêncio por alguns segundos.
Ou quase, porque eu o ouço se mexendo, tipo tentando ajeitar alguma coisa.Tem um barulho abafado, parecia como se ele tivesse jogado algo no chão ou escondido alguma coisa embaixo da cama. Ele demora tanto que eu já estava quase perguntando de novo, mas aí ele responde, com uma voz meio impaciente:
- Espera um pouco aí...
Espero, um pouco surpreso. Normalmente, Morajo só abriria a porta, nem ia pedir para eu esperar, pois queria se "livrar logo de mim" para eu parar de encher seu saco.
Mas hoje tudo parece fora do normal, quer dizer, ultimamente. Depois de um tempinho — que para mim parece uma eternidade — ele finalmente fala para eu entrar.
Abro a porta e entro no quarto e,me deparo com uma cena não muito comum de se ver:Seu quarto estava todo bagunçado e sujo,com suas roupas espalhadas em todo canto, talheres,copos e pratos em sua cabeceira,livros e folhas de papéis amaçadas caídas.
Isso foge muito do meu irmão louco por organização e limpeza que eu costumo ver.
Mas analisar seu quarto não é o que vim fazer,logo desvio meu foco para ver o próprio Morajo,e noto o quão mal ele parecia.
O rosto está mais pálido do que eu lembro-sua pele vermelha tão viva estava quase rosa.Noto também aquelas olheiras pesadas, como se ele não tivesse dormido direito há semanas, e olha que às nove ele já está indo dormir.
- O que você quer? Veio falar do canal? - pergunta seco, evitando olhar diretamente,me encarando pelo reflexo da janela.
Muito estranho...
Tento manter o tom leve para não assustar, mas só de olhar para ele daquele jeito, sinto meu coração apertar.Tem algo muito errado.
-Na verdade, não, eu vim ver como você estava. Estou muito preocupado contigo. Está realmente tudo bem? Você está com uma cara péssima e anda muito estranho.
-Está tudo bem sim... Agora dá para sair? - Ele cruza o braço e diz seco e direto, apontando para a porta, como se quisesse acabar com a conversa o mais rápido possível, mas sei que é mentira para eu sair e deixá-lo em paz,mas ele não vai conseguir me convencer tão rápido a sair.
Ele nem consegue olhar para mim direito e isso só prova que ele já está escondendo algo de mim. Fica desviando o olhar como se não quisesse esconder algo... sei lá, o que, mas o jeito dele evita até fazer contato visual, e isso me deixa ainda mais nervoso.
-Morajo... - tento falar de novo, tentando não parecer invasivo, fazendo uma pausa para escolher as melhores palavras— Se tem alguma coisa errada, você pode contar para mim.
- Eu já disse que estou bem! - ele bufa irritando-se.
Tá certo que seu humor não é dos melhores,mas já irritando-se com coisas simples?
Eu já ia insistir de novo, mas daí, do nada, o Morajo explode: antes que eu pudesse reagir, ele levanta da cama e me empurra com tanta força que eu caio no chão, totalmente surpreso e meio atordoado.
A última coisa que eu esperava era que ele fosse reagir assim, como se eu tivesse invadido o maior segredo do mundo. E de repente, ele começa a me atacar, não fisicamente, mas com palavras. Com certeza, ele não estava normal.
-Eu sei muito bem que você não se importa, então para de agir como se se importasse! Você só pensa em você e nesse seu estúpido canal! E só liga para a sua opinião, nunca houve o que EU quero.
Eu apenas tinha feito uma pergunta e ele já explode assim? Essa mudança de humor não é nenhum pouco normal.
As palavras saem num tom agressivo, cheias de raiva e impaciência, e eu fico só consegui ficar parado ali no chão, ouvindo, surpreso e atordoado demais para responder.
A maneira como ele fala, com aquela intensidade que ele raramente usa,mesmo sempre estando de mal humor, me lembra da nossa briga feia de antes, a mesma que quase nos separou de vez. A diferença é que, agora, não está tão intenso, mas ainda assim é estranho, assustador até.
- Sabe de uma coisa? Eu te odeio com todas as minhas forças. Não aguento mais ter que suportar você... - ele para e aponta para mim, se afastando para perto da cama enquanto finalmente me encara diretamente e pude ver um ódio profundo exalando de seu olhar como se esperasse alguma reação da minha parte. Me fez gelar ainda mais... - Eu estou fardo com isso.Quer sab...
Senti meu sangue esquentando enquanto lágrimas ameaçavam cair do meu rosto,ele sabia muito bem me machucar e já estava pronto para responder, já vendo que teríamos outra briga feia, mas eu me forço a respirar fundo...
Me acalmo, porque sei que se eu responder do mesmo jeito, vai ser pior.
Eu precisava parar e acalmar, já que eu revidar ou só ficar ouvindo sem reação não vai ajudar em nada.
-Olha, Morajo... - interrompo o monólogo dele e me aproximo dele, segurando seu rosto para que ele olhasse no fundo de meus olhos que ainda mostravam o ódio. - Eu só queria saber se você está bem. Não precisa agir assim, cara. Isso não é normal, até para você, explodir por coisas tão pequenas assim.Eu não quero brigar de novo contigo, só queria saber como você estava...
Ele para, e o rosto dele parece perder a raiva de repente, dando lugar a uma expressão meio arrependida, como se tivesse acabado de perceber o que fez.
Ele olha para baixo como se estivesse com vergonha, e murmura um "Desculpa..." tão baixo que quase não ouvi.
Sei que ele se arrependeu, e isso me dá um pouco de esperança de que ele possa se abrir comigo. Apesar disso, fico um pouco preocupado: ele mudou completamente seu humor em menos de cinco minutos: de "normal" foi para irritado e irritado para triste e arrependido.
—A única coisa que eu quero é entender o que está acontecendo—digo com cuidado, soltando seu rosto e puxo ele para se sentar na cama e me acomodo ao seu lado- Se você está passando por alguma coisa, só me fala... A gente resolve juntos...
Ele suspira, continuando a olhar para baixo, e parece que algo se solta nele. Como se aquela defesa toda tivesse quebrado, pelo menos um pouco.
Ele ensaia algumas palavras antes de começar a falar, e as palavras saem mais rápido e baixo do que ele provavelmente pretendia.
-Eu... sei lá... Tem vezes que eu perco o controle. Sinto umas coisas absurdas, tudo parece ficar muito intenso de repente. Uma hora eu estou normal, na outra... é como se eu fosse explodir. Tudo que eu sinto fica... à flor da pele.
As palavras dele me pegam desprevenido. Estou aqui ouvindo e tentando entender o que ele está dizendo. E ele continua, meio hesitante, mas sem parar e presto atenção em cafa palavra dele.
- Os sentimentos... mudam o tempo todo. Tem horas que... que eu nem sinto que tenho controle. Tudo é tão... estranho. E, às vezes, me sinto como se fosse... sei lá, um impostor. Alguém que está fingindo ser eu mesmo. É como se eu nem fosse eu, entende? Além do mais, parece que eu estou aos poucos enlouquecendo.
Esse desabafo me deixou sem palavras, eu estou completamente chocado e cada vez mais preocupado, e só piora quando ele continua a falar.
- Ultimamente, eu mal tenho fome. Tipo... eu nem como direito, mas também não sinto vontade. E dormir? Sei lá, eu estou sempre com sono, mas quando deito, o sono some. Eu só fico ali, acordado, a cabeça cheia de pensamentos e a maioria, são nada bons.Além disso,sinto dor,muita dor...
Ok,agora isso está cada vez mais sério...Estou realmente começando a me preocupar, não é só mentalmente que ele está mal, fisicamente.
Depois que ele termina, vejo tampar a boca, como se estivesse se arrependendo de ter dito tanto. O olhar dele me diz tudo. Ele sabe que falou mais do que devia, que deixou escapar mais do que queria.
- Relaxa, você não falou demais, tá bom? E outra, eu sou seu irmão e preciso saber das coisas - tento aliviar o clima enquanto dou um leve tampinha em sua cabeça e, pela primeira vez, ele me encara por vontade própria.
Mesmo que eu diga isso e ele ache que falou demais, por dentro eu estou cheio de perguntas. Nada do que ele disse fez sentido e eu descobri muita coisa, mas uma coisa é certa: meu irmão está sofrendo com algo que está muito além do que ele consegue aguentar.
Olho bem para ele e agora vejo as olheiras fundas, seus olhos cianos muito vermelhos, o rosto pálido, o jeito cansado e estranho tudo fazia sentido ao mesmo não.O que quer que ele esteja enfrentando, claramente está drenando ele por completo e eu há alguns minutos fingindo que tudo estava normal.
Droga... Eu sou um péssimo irmão... Ele estava lutando sozinho contra o que quer que seja isso e eu preocupado com o canal e achando que isso era paranoia minha... Eu posso ter sido um péssimo irmão, Morajo, só que agora eu vou consertar meus erros e te ajudar... Nem que minha vida esteja em jogo.
-Morajo, acho melhor a gente ir ao hospital e descobrir o que é isso. Está de noite, mas o hospital ainda está aberto.
Levanto-me e agarro sua mão em direção à porta, pronto para levá-lo.
Para minha surpresa,ele solta minha mão da dele e me faz olhar para trás.
-Não... eu não preciso de hospital, Torajo... É só uma fase, vai passar... Isso não é nada, nem precisava ter te contado-suspiro observando a teimosia em pessoa balançar a cabeça em negação.
- Não é só uma fase! Olha para você, cara, está visível que você não está bem e todo mundo percebeu, só estávamos ignorando. Se você não melhorar em uns três dias, eu mesmo vou te levar, nem que eu tenha que te arrastar até lá. - Falo sério que chega a assustar, ele nunca me levou tão sério. E aí vem a cartada final para o convencer - E, se você não for, eu vou contar para os nossos pais.
Ele odeia que falo sobre o que acontece conosco a nossos pais, já que eles são muito ocupados e os odeia preocupar, principalmente nossa mãe, já que ele é bem próximo dela e ela mora em uma cidade vizinha, ficando bem difícil dela nos vir visitar, então ele odeia a deixar preocupada e sempre esconde as coisas ruins dela.
—Tá bom, mas não conta para ninguém, até para nossos amigos e muito menos para nossos pais. Eu... eu não quero que eles saibam. E nem adianta tentar me convencer - Morajo suspira, e percebo que ele ficou ainda mais tenso. Ele havia aceitado, apesar disso, torço que ele melhore para que não precisemos ir ao hospital.
Faço que sim com a cabeça meio contrariada, mas deixo claro:
-Morajo, se você continuar assim, não tem jeito. Eu vou contar, e não tem nada que você possa fazer para impedir.
Vejo ele fechar os olhos, como se estivesse tentando absorver o que eu disse, mas não responde nada, como se estivesse considerando minhas palavras.Geralmente, eu não sou tão sério e isso fez com que ele se assustasse um pouco.
A minha preocupação só aumentou, e agora a única coisa que eu posso fazer é ficar de olho nele. Esses próximos três dias vão ser longos.
-Morajo, você queria ficar sozinho, né? Eu já vou então, mas qualquer coisa é só chamar.
Apesar de querer ficar com ele, ele parecia mais cedo ficar sozinho e, para evitar que ele surte de novo, já estava saindo, mas a voz de Morajo me faz parar:
- Você pode ficar um pouco?... Eu não quero ficar sozinho... e só estava me distanciando para evitar que me descobrissem, mas já que você já descobriu... - pede ele contrariado e envergonhado coçando a cabeça, já que odeia parecer vulnerável, e eu lhe lanço um sorriso travesso mas carinhoso em resposta.
-A coisa está séria mesmo, né? - Brinco tentando aliviar o clima, já que ele era o "lobo solitário do grupo" — às vezes até mais que isso — e apesar de amar ficar com meu irmão, ele estar pedindo quer dizer que está sério a situação. - Tá,eu fico com você,só vou pegar minhas coisas.
Acho que essa foi a noite mais longa da minha vida. Voltei para o meu quarto depois da conversa com Morajo, mas o sono, que já era escasso, decidiu me abandonar de vez. Eu estava procurando um colchonete e um travesseiro para levar no quarto dele, mas minha cabeça estava longe; repetindo em ciclo tudo o que ele disse. Cada palavra, cada expressão cansada, o jeito como ele desviava o olhar... Aquilo não sai da minha mente.
Morajo está claramente doente, mas não é só físico. Ele está quebrado por dentro, de um jeito que eu nunca tinha visto antes. Não adianta ele tentar fingir que está bem, porque eu sei que ele não está. O que quer que seja que ele esteja passando, é muito mais profundo do que qualquer coisa que eu já vi e não tenho ideia do que seja.
E o pior de tudo é que ele não quer ajuda. Ele acha que pode resolver sozinho, como se fosse um problema qualquer. Isso me deixa louco.
Os três dias que ele pediu para esperar antes de procurar ajuda médica vão ser longos, isso é certo. Mas eu decido que não vou ficar de braços cruzados e ignorar... Não dessa vez...
Eu rapidamente volto ao quarto do Morajo e estendo o colchonete do lado e ponho o travesseiro enquanto olho de soslaio: Morajo está quieto, olhando para o teto, e não me diz nada, mas eu sei que ele sabe que estou ali.
O silêncio é pesado, mas eu tento ignorar. Não quero deixá-lo ainda mais desconfortável, então apenas deito e me ajeito no colchonete, virado na direção dele, atento a qualquer movimento.
-Valeu... - ele murmura baixinho tentando vencer o orgulho, e eu quase não ouço.
-Que isso, cara. Estou aqui para isso, lembra? - digo, tentando manter o tom leve, mas minha voz sai meio trêmula.
Sei lá, parece que, por mais que eu tente fazer isso parecer normal, nada nessa situação é normal. Nem de longe.
A noite vai passando devagar, e meu sono, que já era pouco, me abandona completamente. Deitado no colchonete, escuto cada movimento dele. Às vezes, ele vira de lado, suspira. Parece inquieto, perdido nos próprios pensamentos.
Eu até fecho os olhos, mas não consigo relaxar. Na minha mente, tudo o que ele falou fica se repetindo, num loop interminável. Ele não está com fome, ele não está dormindo, e ainda sente tudo de forma tão intensa, tão fora de controle.
O pior é que ele acha que pode resolver sozinho, que tudo isso vai simplesmente passar. Como se fosse só uma fase.
E eu? Eu estou aqui, sem saber o que fazer, só assistindo ele se perder cada vez mais. Isso está me deixando louco.
Os três dias que ele me pediu vão ser intermináveis, isso é certeza. Mas eu que não vou ficar só esperando, vendo ele se deteriorar.
Se ele não quer,eu vou cuidar dele mesmo se eu tiver o contrariando...Custe o que custar...
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