História O ceifador - O Piercing

                          Jimin

Abri a porta do estabelecimento e olhei em volta. Eu nunca tinha estado em um estúdio de tatuagens e piercings antes, apenas tinha visto naqueles programas de televisão onde o cara tem uma tatuagem horrorosa e quer cobrir. Era um lugar claro porém com cores escuras, cheio de fotos de piercings e tatuagens de todos os jeitos - e lugares.

  Fiquei quieto enquanto o Jungkook parecia que tinha entrado no paraíso, vendo todas as fotos e sorrindo largo enquanto apontava para uma tatuagem horrenda de um ceifador, com uma foice maior que a minha cara e uma alma do lado.

-"Que engraçado" - Falou enquanto ria.

  Arqueei uma das sobrancelhas. Aquele ser era tão gótico que achava graça de uma coisa daquelas, aposto que ele faria uma festa de aniversário em um cemitério.

-"O que tem de engraçado?" -Perguntei incrédulo.

-"Que sempre fazem o ceifador como uma caveira com capuz e vestido longo" -Explicou o motivo da graça.

-"Acho que é assim que deve ser, não é? Algo relacionado a morte tem que ser feio mesmo" - Dei de ombros.

  O sorriso do maior se fechou para uma expressão séria, o que me assustou um pouco. Acho que eu não deveria comentar esse tipo de coisa pra alguém que deveria fazer pactos, então uma coisa que eu deveria anotar: "Nunca se meta nos assuntos góticos de Jeon Jungkook".

  Logo uma loira cheia da tatuagens e piercings apareceu ali e deu um sorriso simpático. Eu tinha que admitir, ela era bonita, era um pouco mais alta que eu e tinha um cabelo preto com as pontas azuis, mas digamos que mulheres não era muito a minha praia. Me aproximei do balcão onde a mesma estava e tentei parecer o mais normal possível.

-"Esse louco quer fazer um piercing" -Falei e a loira riu baixinho.

-"Esse rapaz? Onde você quer fazer?" -Perguntou, se referindo ao Jungkook.

  O moreno apontou para a língua e a moça - que logo depois descobri que se chamava Bianca, um nome bem diferente, parecia de outro país - fez um sinal de positivo, como se aprovasse a escolha dele.

  Os dois começaram a conversar sobre idade - já que menores de idade não poderiam fazer sem os pais, mas graças a todos os deuses ele era de maior, cuidados que ele deveria tomar para não ter infecções, e obviamente sobre pagamento.

  E foi nesse momento em que eu me arrependi profundamente de ter ido naquele lugar.

-"Jimin, eu esqueci minha carteira, paga pra mim?" -O Jungkook pediu na cara de pau.

  Bati na minha própria cara, que fez o barulho quase fazer um eco no lugar. Eu deveria ter feito pole dance na cruz para ter que lidar com aquilo.

  Peguei minha carteira no bolso e tratei com o pagamento com a Bianca. Ainda bem que aquele negócio não era caro, mas eu iria cobrar do gótico depois.

-"Muito bem, Jungkook, pegue isso e vá ao banheiro" -A loira abriu uma embalagem de escova de dentes e deu para o mesmo -"Tem que higienizar bem, e depois vá no estúdio três" -Explicou.

  O maior foi lá escovar os dentes - que tirando sua pele era a única coisa que não era preto nele - enquanto eu esperava por ali mesmo, lendo uma revista sobre piercings e tatuagens, já que não tinha nada diferente.

  Eu nunca pensei em fazer alguma tatuagem ou piercing além de um terceiro furo na orelha na minha vida, nunca achei tão legal assim, sem contar que eu não tinha nada para deixar na minha pele para sempre. O Jungkook só podia ser um louco mesmo para colocar logo na língua sem nunca ter pesquisado sobre antes.

-"Jimin, vai ficar aí ou vai comigo?" -O gótico trevoso me perguntou.

  O que fazer? Ficar ali vendo fotos ou conferir alguns resmungos de dor do moreno mal educado? Com certeza os resmungos de dor.

  Deixei a revista de lado e fomos até o estúdio três, assim como a Bianca falou. O Jungkook abriu a porta e eu curioso como sempre fiquei olhando em volta. Não era muito diferente da recepção, apenas tinha tintas e uma máquina que reconheci como a de marcar as pessoas para sempre, ou tatuagens, como queira.

  Tinha um cara sentado de costas, com cabelos vermelhos e que usava uma blusa de mangas curtas, mostrando seus braços e nuca todos tatuados, com desenhos que eu poderia considerar aleatórios. Também tinha vários piercings nas suas orelhas, que por sinal eram grandinhas, porém fofas.

  O Jungkook fechou a porta e pude ver que o tatuador se assustou, já que se encolheu antes de se virar com os olhos redondos bem abertos. 

-"Que susto, cruz credo" -Falou com uma voz grave.

  Não consegui conter uma risada baixa.

-"Desculpa" -O gótico falou com uma cara de poucos amigos.

-"Tudo bem, é você que vai colocar o piercing?" -O tatuado apontou para o moreno e o mesmo assentiu. -"Muito bem, senta aqui" -Falou e o Jungkook se sentou.

  Eu resolvi ficar em um pequeno sofá que tinha ali, encarando descaradamente o ser gótico com a língua para fora, esperando que a furasse. Eita garoto estranho.

-"Você vai furar também?" -O timbre grave do ruivo ali me tirou dos meus pensamentos.

-"Eu não" -Falei -"Pra que furar minha preciosa língua? Ela está bem assim"

  Uma risada ecoou no estúdio.

-"O piercing não é só bonito" -Piscou. -"Aliás, qual seu nome?"

-"Park Jimin"

-"E você é namorado dele?"

  Daquela vez eu que ri.

-"Até parece, ele é apenas meu vizinho estranho e gótico" -Falei sem me importar que o mesmo estava ouvindo.

  Já que não podia falar, eu podia afinal. 

-"Eu sou Park também" -A língua do Jungkook estava começando a ser furada, e eu já estava vendo seus olhos fechando, devia doer. -"Park Chanyeol, mas me chama só de Chanyeol mesmo porque odeio formalidades" -Enquanto falava eu só conseguia franzir o cenho por aquele troço estar saindo do outro lado da língua do gótico.

-"Ok então, Chanyeol" -Falei praticamente automaticamente, porque eu estava quase sentindo a dor em mim mesmo.

  Foram alguns minutos até terminarem. O Chanyeol deu um cubo de gelo para o Jungkook, falando que iria ajudar a não inchar e a diminuir um pouco a dor. Fiquei apenas vendo tudo quieto, porque seilá, vai que acontecesse algo e o garoto perdesse a língua.

  O moreno ficou colocando a língua para fora igual a uma criança para tentar ver o piercing, mas acho qur ele não pensa muito, já que tinha um espelho bem do lado dele. 

-"Quando você se acostumar, espere umas duas semanas para colocar uma pedra menor" -O ruivo falou enquanto fazia algo no celular.

-"Eo vô ficá faãndo axim?" -O Jungkook perguntou todo atrapalhado.

  Não conti minha risada. Ri mesmo. Ru sabia que iria acontecer aquilo, mesmo sabendo que ele fazia artes musicais, eu era um demônio mesmo. Senti o olhar congelante de Jeon sobre mim, então apenas engoli o riso e tentei disfarçar, olhando para outra coisa.

-"Não se preocupe, logo você vai falar normalmente" -O tatuado explicou tudo.

  Mais uma vez eles falaram sobre cuidados e precauções com a bolinha prateada. O Chanyeol era uma boa pessoa, e era engraçado como a capinha de seu celular era do APink.

  Acabei criando uma amizade com a Bianca também, talvez pelo fato dela ser de outro país e ser bem animada e meio louca. 

  O Jungkook ficou falando coisas nada a ver apenas para tentar se acostumar com o piercing, e falava que parecia que estava com uma bala infinita na boca.

-"Tá me irritando" -Reclamei.

-"Noxa, dixculpa xe eu to com uma bola no meo da boca" -Revirou os olhos.

  Foram longos minutos até chegarmos no prédio, o Jungkook falou que não iria agora, e que andaria por aí. Concordei com ele e acenei, indo para o meu apartamento, onde eu poderia finalmente arrumar a droga da bagunça do gato de satanás, que por sinal não tinha nome.

                     Jungkook

  Abri a porta do apartamento depois de ir tomar um Mocha e tirei meu casaco, jogando em qualquer lugar ali. Não estava com vontade nenhuma de falar, apesar que foi exatamente isso que o Chanyeol me mandou fazer. Não achei que iria ser tão estranho ter uma mísera bolinha na língua, mas pelo menos ficava geladinha de vez em quando.

-"Xin, Xeguei" -Falei o mais alto que pude.

-"Me chamou?" -O loiro apareceu ali com um avental rosa, enquanto segurava uma colher.

-"Xim, o que exta azendo?" -Perguntei.

-"Por que está falando estranho?" -Uma expressão confusa apareceu no seu rosto.

  Suspirei e abri a boca, apontando para a minha língua, onde o culpado estava ali brilhando e provavelmente zombando da minha cara. O Jin abriu a boca em forma de "O" e veio até mim, colocando a mão na minha boca, a fazendo abrir mais.

-"O que é isso? Colocaram isso em você? Eu tiro" -Falou desesperado e eu apenas o empurrei levemente.

-"É um pixing" -Falei.

-"Um o que?" -O Yoongi brotou magicamente dos infernos.

  Revirei os olhos e peguei meu celular, abrindo no bloco de notas e escrevendo o que eu queria, dando para o Jin, que leu atentamente.

-"É um piercing" -Leu.

-"Mas para o que serve?" -Meu hyung com cabelos cinzas questionou.

  Peguei o celular de novo e digitei que era bonito. Devolvi e os dois me encararam como se fossem juízes do mais severo julgamento. Franzi o cenho e levantei as mãos, perguntando o por quê daquelas caras.

-"Você colocou essa coisa na língua e não consegue falar decentemente só porque é bonito, Jeon Jungkook?" -Jin falou.

-"Se é pra ser bonito passa maquiagem" -Yoongi disse com os olhos cansados. -"Ou nasce de novo".

  Rangi os dentes mas não falei nada.

-"Que seja, você pode comer, certo?" -O loiro perguntou.

  Digitei no celular que não podia comer coisas sólidas por um tempinho, e o mais velho balançou a cabeça negativamente.

-"Eu estava fazendo panquecas" -Lamentou. -"Tudo bem, eu aprendi uma receita de sopa" -Sorriu e correu para a cozinha novamente.

  Dei de ombros e acompanhei o Yoongi com os olhos, que estava indo para uma pequena mesa que tinha na frente do sofá, e em cima da mesma tinha várias fotos, muitas mesmo. Cheguei perto e fiquei apenas encarando.

-"Preciso levar pelo menos três para a faculdade amanhã" -O mais velho disse mais para si mesmo do que para mim.

  Continuei quieto, apenas passei a mão em algumas fotos. Tinha de balanços, crianças brincando, um lago com pássaros perto. Eram bem bonitas, tinha que admitir, apesar de serem claras demais.

  Acabei vendo uma peculiar. Era a foto de uma borboleta, mas tinha algo atrás dela que me parecia familiar, era dois olhos com um óculos.

-"Exe é o Ximin?" -Perguntei e o Yoongi riu alto.

-"Xiumin é o apelido de um cara do meu curso" -Riu e eu o encarei sem nenhum riso no rosto. -"É o Jimin sim" -Finalmente respondeu.

  Balancei a cabeça e encarei de novo a foto. Percebi que o Yoongi não estava olhando e peguei a foto, colocando no bolso da calça e resolvi ir para a cozinha ver o que o Jin estava fazendo, mas acabei me surpreendendo ao ver alguém ali.

-"Ah, Jungkook, esqueci de falar" -O loiro falou enquanto cozinhava algo que deduzi ser a tal sopa. -"Esse é o Minhyuk, ele é do mesmo curso que eu" 

  O tal Minhyuk tinha um cabelo platinado, com um sorriso largo. Não resisti a olhar a alma dele, era rosa. Um rosa escuro. Então ele era do tipo que até esquecia da própria felicidade para ver a dos outros, ou que achava que só seria feliz com alguém.

-"Oi, prazer" -Falou e eu apenas levantei a mão e acenei brevemente.

-"Ele colocou um tal piercing e não está falando direito, é um retardado mesmo" -O Jin falou e o Minhyuk riu alto.

-"Eu tenho um amigo que já colocou, sei como é, fica bem engraçado quando fala" -Disse sem tirar o sorriso do rosto. -"Colocou aonde? Na ponta? No freio? No meio? É duplo?" -Tagarelou.

  De pessoas falando demais já não bastava o Jimin. Suspirei e apenas abri a boca, para que o platinado visse de uma vez. Ele abriu bem os olhos e a boca, analisando o piercing.

-"Nesse lugar é bem útil" -Disse com um sorriso estranho. -"Já tive um namorado com um piercing na língua, e nossa..." -Seu tom de voz mudou para um mais arrastado e baixo.

  Olhei pros lados com o cenho franzido. Aquele garoto era incrivelmente estranho, e aposto que até o Jin percebeu, já que começou a rir sem parar, quase caindo no chão.

-"Oh, desculpa se eu constrangi vocês" -Falou aparentemente preocupado.

  Eu apenas balancei a cabeça normalmente e resolvi ir para o meu quarto. O Jin falou que me avisaria quando a comida estivesse pronta. Fechei a porta e suspirei, mexendo a língua e sentindo uma dorzinha leve. Me joguei de barriga para baixo na cama e me incomodei um pouco antes de resolver abrir um pouco minhas asas.

  Eu me sentia tão bem com elas, com certeza não poderia viver sem as mesmas. Aquilo era uma tortura, não poder usá-las livremente e sair voando por aí.

  Estava apenas relaxando minhas asas e sentindo um frescos nas minhas penas, quando algo me veio a mente que me assustou.

  Como eu poderia cantar no dia seguinte na faculdade se nem falando eu estava conseguindo direito? Aquilo era muita burrice da minha parte. Soquei o travesseiro na minha cara antes de colocar minhas asas novamente na pulseira.

  Peguei meu celular e mandei uma mensagem para o Chanyeol, já que eu tinha pegado o número dele. 

JK: Eu tenho que cantar amanhã, como vou fazer isso?

  Esperei por um tempo até ter uma resposta.

PCY: Não vai ué.

  Bati na minha própria cara.

JK: Não posso.

PCY: Explica pro professor, quem sabe depois que você se acostumar, você não faça uma apresentação especial para compensar?

  Não era uma má ideia.

JK: Valeu.

PCY: Disponha, agora tenho que ir porque meu Baekkie está me esperando.

  Franzi o cenho. Nem sabia quem era esse tal "Baekkie", mas dei de ombros, afinal meu problema já estava resolvido.

  Eu iria dormir um pouco até a comida do Jin ficar pronta, mas decidi fazer trabalho extra. Digitei uma mensagem no celular e enviei, sorrindo satisfeito e bloqueando a tela.

  Deixei meu aparelho em cima da cama e fui para a cozinha, onde tive que comer a sopa - que por sinal era gostosa - enquanto ouvia as piadas do Minhyuk e sobre como ele estava sofrendo por um tal "crush".

-"O que é crush?" -Yoongi perguntou enquanto mordia uma panqueca, já que o Jin reclamou que não tinha feito á toa.

-"É uma pessoa que você gosta" -Resumiu. -"Meu crush é um filho da mãe que não me dá atenção, mas eu vou roubar um beijo dele um dia" -Riu.

  Eu fiquei em silêncio o tempo todo, tanto porque eu quis tanto, tanto por causa do piercing e também porque só quis me concentrar na comida. Eu tive que pedir para o Jin fazer mais vezes.