Princesa de Troia
Tudo tem seu preço
Eu a amaldiçoo
Parte Única – Apolo POV
Eu não esperava me apaixonar por Cassandra… Mas é muito difícil para mim não me apaixonar por pessoas reclusas, elas são tão enigmáticas e a minha curiosidade é tão grande. Will, meu filho, para quem não sabe, diz que isso é mal de família e eu tenho certeza de que não posso discordar dele agora. Mas Cassandra era diferente e até hoje eu não entendo o que aconteceu, como eu, o Deus mais poderoso do Olimpo, depois do meu pai é claro, pude ser enganado por uma mortal.
Cassandra era princesa de Troia, profetisa, minha sacerdotisa. Era uma jovem tão bonita, com seus cabelos negros esvoaçados, seus brilhantes olhos negros e seu corpo perfeito, desenhado pelas próprias musas. Eu concedi a ela ainda em criança o dom da profecia, pois essa mortal enxergava através da névoa e de certo modo, possuía um dom natural para prever o futuro. A primeira profecia nós nunca nos esquecemos… A de Cassandra foi para mim:
“O feitiço do amor é forte,
em meio a escuridão um perderá sorte.
Sob a luz do Sol haverá uma traição,
onde o outro trará uma maldição.
Sem voz, o futuro se perderá,
em meio a guerra, seus dias terminará”
Mal sabia a jovem criança que tal profecia falava de nós dois e nosso relacionamento fadado ao fracasso. Com o passar dos anos, eu vi a jovem Cassandra crescer reclusa de seus irmãos e irmãs. Vi ela se transformar numa misteriosa profetisa. Acompanhei de longe cada profecia, cada desastre, cada dor… Vi meu apreço se tornar em amor e vi meu amor se tornar necessidade.
Uma noite qualquer, escutei o chamado de Cassandra “Oh Meu lorde protetor. Peço a tua ajuda. Um desastre se aproxima de Tróia e apenas você pode nos salvar”. Eu sabia do que ela falava, afinal eu também havia previsto a queda da grandiosa cidade-estado, mas não era função de um deus salvar cidades que estavam fadadas a ruína. Mas era Cassandra quem me clamava e me exaltava atrás de ajuda…
Apareci diante da jovem sacerdotisa. Ela me encarou com seus brilhantes olhos negros e me abraçou. Uma atitude nada digna de minha divindade, mas como senti ela apalpando meus músculos, deixei essa indiscrição passar, afinal, todo mortal deveria ter a chance de tocar em meu corpo perfeito pelo menos uma vez.
- Lorde Apolo, você veio - disse Cassandra, ainda abraçada a mim - Meu irmão, Páris está regressando a Tróia e ele está destinado a guiar nosso povo a morte. Eu preciso de sua ajuda, por favor.
- Mantenha a calma Cassandra, o futuro não é estático e nunca existe apenas um caminho - eu disse - A única coisa imutável é uma profecia, pois quando uma profecia é proferida, seu destino recai nas mãos das parcas e essa aí não são boa gente.
- O que posso fazer, meu Lorde? - perguntou ela, com o rosto muito próximo ao meu.
- Nesse ponto, nada - eu disse - Apenas alguém com a Clarividência pode prever como reverter um desastre e eu estou proibido de ceder a Clarividência a qualquer outro mortal, desde o incidente em Creta…
- Eu faço qualquer coisa por Tróia e por você, meu senhor - afirmou a princesa, colocando suas mãos em minha cintura.
Eu confesso a vocês que eu pela primeira vez em muito tempo, eu não sabia se devia beijá-la. Em primeiro lugar, as intenções de Cassandra eram incertas para mim. Em segundo lugar, eu era o deus patrono dela e somente por deixá-la me abraçar, eu devia estar quebrando um milhão de regras olimpianas (Não que eu não faça isso com regularidade). E terceiro, eu estava apaixonado e sempre que eu me apaixono, Afrodite dá um jeito de destruir tudo o que eu construí…
Mas eu não consegui resistir a tentação daquela misteriosa sacerdotisa e a beijei. E beijei. E beijei, com todo calor que o Sol tinha a oferecer. Cassandra rapidamente ofegou diante de tudo aquil e viu a necessidade de retirar sua toga real. Eu nunca precisei de muito para tirar minha toga dourada… Logo mais, Cassandra e eu estávamos na cama, onde eu poderia praticar algumas das milhares táticas sexuais que aprendi durante meus curtos mil e duzentos anos de vida.
Claro que eu não me permiti fazer todas as loucuras que eu gostaria de fazer com aquela jovem princesa, afinal, mortais não são resistentes e flexíveis quanto nós, deuses. Já estava quase amanhecendo quando Cassandra e eu paramos. Ela estava evidentemente muito cansada depois de tudo o que havíamos feito… Então a deixei para cumprir minhas obrigações, que a cada dia que passavam consumiam ainda mais toda e qualquer energia que eu tinha. Todo o deus do Sol poderia lhe dizer a mesma coisa, mortal, essa maldita bola de fogo consome toda a sua vida…
Quando regressei a Tróia, encontrei minha jovem profetisa buscando a clarividência, coisa que ela nunca conseguiria sozinha. Cassandra não pareceu se importar com minha presença, o que despertou uma certa raiva dentro de mim, afinal, quem não se importa com a presença de um deus? Ainda mais um deus maravilhoso como eu…
- Cassandra - eu entoei seu nome da maneira mais poética que minha voz me permitiu.
- Lorde Apolo - disse ela, lançando-me um misterioso olhar - Estou tentando seguir sua ideia, estou tentando mudar uma previsão… Mudar o futuro de Tróia. E eu estou disposta a qualquer coisa por isso.
- Não me tente, Cassandra - eu afirmei - Você sabe que eu posso lhe dar o que deseja, mas todo poder exige um preço. A clarividência vai torná-la no recipiente mais carregado com o poder da profecia no mundo… Isso pode custar a sua própria mente.
- Não com meu amado deus do Sol ao meu lado - divagou a princesa de Tróia, se aproximando de mim, passando as mãos sobre minha pele - Agora vamos ao importante.
Tendo dito isso, nós passamos mais uma noite juntos… Acredito que Ártemis não tenha gostado de nos observar, pois fomos interrompidos naquela noite. Enquanto eu dava a Cassandra o poder ao qual ela ansiava, seu irmão, Páris, decidiu nos atrapalhar. Ele havia vindo anunciar a irmã que partiria para o casamento de Peleu, o rei de Ftia. O que ele não sabia é que Cassandra teria uma visão ainda em meus braços…
- Páris, não vá a esse casamento - gritou a garota por quem eu estava me apaixonando, mas seu irmão já havia ido.
- O que você viu? - perguntei, deslizando meus dedos sobre aquela fina pele branca, que possuía uma grande semelhança ao marfim.
- Ele vai causar nossa ruína… A deusa da Discórdia vai tentá-lo e ele vai cair direitinho nos planos dela - respondeu Cassandra, se afastando de mim e saindo de sua cama - Tróia vai a guerra… Mas ainda podemos salvar essa cidade.
E assim começaram os preparativos para a guerra, à beira da cama da princesa Cassandra. Ela me fez jurar que eu protegeria a cidade, sob qualquer circunstância, e eu, como um idiota apaixonado, fiz o que ela me pediu… Jurei por todas as forças da natureza, pelo poder Oculto do Oráculo de Delfos e pelo Rio Estige, é claro. Na hora, ninguém teria me convencido a fazer outra coisa, mas como eu queria que minha irmãzinha tivesse tentado me dissuadir.
Meses se passaram depois daquela noite e Cassandra ficava cada vez mais distante de mim. Negava meus desejos, desestimulava os meus cortejos e se fazia de sonsa. Eu não entendia o que estava acontecendo, como era possível estar perdidamente apaixonado em um momento e no instante seguinte afastar seu amante de todas as maneiras possíveis…
Quando Páris voltou daquele casamento trazendo consigo Helena, Rainha de Esparta. A corte de Tróia ficou ultrajada com aquele rapto, assim como grande parte do Conselho Olimpiano, mas Helena tinha um charme… Rapidamente ela esqueceu de seu passado em Esparta e fez com que todos os troianos também o fizessem. Ela era um deles agora. Cassandra, no entanto, era imune aos encantos de Helena e por isso, alertava a quem quisesse lhe ouvir sobre os perigos da presença de sua “cunhada”. Minha amada não era taxada de louca, pois eu lhe dava constantemente minha benção…
Um dia, quando os guerreiros de todos os cantos da Grécia estavam diante dos portões de Tróia, Cassandra me chamou… Ela suplicou que eu honrasse minha promessa, feita diante de juras de um amor a tanto esquecido por ela. Eu pensei que se a ajudasse, eu poderia reavê-la, mas nem mesmo assim ela quis saber de mim outra vez… Eu aniquilei milhares de meus súditos por ela e nada… Eu até mesmo me livrei do melhor guerreiro grego, Aquiles, com uma flechada em seu calcanhar. Mas Cassandra continuava a fugir. Eu realmente não entendia na época.
Quando o cerco a cidade afunilou, Cassandra clamou por mim outra vez. Porém eu exigi a verdade em troca de meus serviços. Cassandra, princesa de Tróia, sentou-se diante de mim, com seus cabelos negros ao vento e visualizou a mim, como se tentasse ler a minha alma. Eu pedi que ela me dissesse a verdade e foi isso que ela fez…
- Lorde Apolo, por mais que me doa admitir isso, eu o enganei - afirmou a princesa - Eu sabia que tu era o único deus capaz de me ajudar. Meu patrono e também o deus da profecia, era óbvio que saberias como mudar o futuro.
- E clarividência impediu alguma de suas visões? - perguntei - Isso tudo valeu o preço que você pagou? Que eu paguei?
- Eu faria tudo outra vez se fosse necessário.
E assim, meu coração fora partido pela primeira vez… Isso era diferente de toda a dor de perda que eu havia experimentado anteriormente… Dafne fora arrancada de mim pelas flechas do Cupido… Hipólita perdera a cabeça para satisfazer aos desejos de Hera… Ciparisso havia destroçado seu próprio coração… E agora Cassandra havia mentido para mim, traído minha confiança, me tornado um nada…
Mas uma coisa é certa, nunca, jamais, brinque com o ego de um deus, ainda mais com o meu. Me levantei diante da jovem a quem um dia eu amara e entoei um canto maligno. Nem mesmo a beleza e a doçura de minha voz conseguiram suavizar aquele clima sombrio e macabro que havia assumido diante de nós… Eu mataria Cassandra, apenas faria com que ela sofresse.
- Minha Cassandra, princesa traidora, amor despedaçado. Sobre a luz do Sol, eu lhe digo a morte lhe será pouco, nem agora nem nunca. Suas profecias selarão o teu destino e o destino de Tróia. E tu serás fadada a nunca mais ser ouvida… Ninguém nunca mais acreditará em ti…
- Por favor Lorde Apolo, não! - gritava Cassandra, ao ser envolta pelos espíritos da profecia.
Aqueles antigos seres primordiais das profecias pairavam ao redor de Cassandra, garantido que minha maldição fosse cumprida exatamente como eu havia entoado. A morte será pouco para ela…
Depois que eu a abandonei, Cassandra previu o início do fim de sua terra e de seu povo. Ela profetizou a morte dos irmãos e da mãe. Depois viu seu povo morrer de fome. Viu Páris recebendo um cavalo de madeira e viu o exército grego destruindo sua cidade. A princesa se desesperou quando tudo o que ela previu começou a acontecer. Ela tentava alertar a todos, mas ninguém a escutava, afinal, nem mesmo a magia de Helena poderia fazer com que a escutassem…
Eu assisti de camarote a ruína de Tróia, sentado ao lado de minha irmãzinha e minha querida (e odiada) prima, Atena. Nós três não demonstramos emoção alguma com as mortes que havíamos causado, mas ainda assim podia-se escutar as risadas de Eris e de Ares ecoarem por todos os cantos… Afinal a guerra e a discórdia andam juntos, com o amor sempre a seu encalço. Eu sabia que Afrodite também ria, mas não de Tróia e sim de mim, o deus que havia sido enganado por uma mortal que ansiava pelo poder.
No final da guerra, me certifiquei que Meleneu levasse Cassandra para Esparta, onde ela teria a chance de recomeçar, porque, no final das contas, eu ainda amava aquela desgraçada… E o amor nos faz cometer loucuras, até mesmo um ser perfeito como eu.
Acho que no final das contas Will estava errado, nem sempre as pessoas mais obscuras são as mais emotivas. Nem sempre a paixão será correspondida… E nem sempre o amor irá triunfar, sobre isso eu gostaria de dizer que uma vez escutei um mortal dizer “Deus não joga dados”, mas ele está errado, pelo menos no quesito do amor, Afrodite ama dados tanto quanto ama seus espelhos…
Falando em Will, ele veio me fazer uma visitinha… E é claro veio me pedir que no próximo capítulo eu conte a vocês sobre a mãe dele. Crianças, sempre querendo saber como os pais se conheceram… Até a próxima, companheiros e companheiras mortais.
Muitos usuários deixam de postar por falta de comentários, estimule o trabalho deles, deixando um comentário.
Para comentar e incentivar o autor, Cadastre-se ou Acesse sua Conta.