Ponto de vista: Josette “Josie” Forbes Saltzman
*Algum momento posterior à narração atual*
O senso de realizar todos os meus desejos em plenitude sempre me pareceu distante ao extremo, apenas para não mencionar tal façanha impossível. Sempre soube desde a época juvenil em que devaneava sobre o amor, aquele amor, que tal sentimento – não a alegoria bonitinha mostrada em filmes e livros de romances, nem a representação monogâmica e heterossexual que explanava no meio do entretenimento e relações sociais – era algo imensurável.
Mesmo sabendo de todas as nuances e contratempos que poderiam ser proporcionadas, por vezes me vi na escuridão nefasta, á mercê de algo que nunca em nenhum momento da história alguém poderia representar explicitamente. Os prodígios do amor incondicional de Shakespeare morreram em seu nome em 1597, talvez a mais épica história de amor contada na história... Almas gêmeas, corações partidos, eterno.
Nunca desejei nada memorável. Historias de amor vem e vão a todo o momento, em cada esquina. Mesmo com tão pouco amor no mundo, o termo “amor” está fixada na ponta da língua da humanidade.
Imagina alguém sem pretensões de passar pelas devastações do amor; caminhar todos os dias pelo fio tênue que um sentimento tão abrangedor como tal pode ocasionar. Agora veja essa pessoa fomentar esta ligação dirigida a duas pessoas completamente distintas, com um detalhe em especial...
Romeu e Julieta foram a tal representação do amor épico há séculos e propagaram sua tragédia pelos séculos, nós temos uma proposta melhor nos tempos modernos.
- Jô... – ouvi a voz suave me chamando. Tinha uma ideia de quem seria, mas preferi me manter no que fazia, e aguardaria a chagada dela.
...
*Tempo atual*
1º Ato: As duas?
Desviei os olhos do relógio na parede marcando duas horas da tarde em ponto e direcionei a visão focando na minha irmã, os músculos travados e o coração palpitando acelerado como um veículo em fuga. Não ponderei o bastante minha expressão corporal, mas estava certa de que meus lábios estavam entreabertos e os olhos esbugalhados.
Oras pode ser que esteja levemente exagerando no estado de choque diante às circunstâncias.
A situação não soava anormal. Dado que minha relação com a dita-cuja estava indo razoavelmente bem, e Lizzie sabia disso. Apesar de todos os momentos a beira de um precipício, sobrevivemos e continuamos a caminhar. Os sentimentos foram reais, o fim do meu relacionamento, embora conturbado, foi uma decisão acalentado por nós duas. Fiz questão de mantermos contato para que algo trágico não venha a acontecer.
Aos domingos, eu e minha ex-namorada desbravamos por muitos cantos de Detroit depois do nosso rompimento: andamos de bicicleta por toda downtown, meu lugar preferido sem dúvidas é as margens do lago St. Clair, ás vezes as manhãs, ora as tardes, nós nos encontramos em frente ao monumento River Walk de soldadinhos do passado, e seguimos no meu carro até Zenith Coffee, para tomarmos café; às vezes, andamos de bicicleta. No mesmo dia. Vamos ao Instituto de Artes Detroit, onde ela mantém um acordo com a prefeitura da cidade – o órgão responsável pelo IAD – e a polícia municipal, o último decorrente de momentos anteriores.
Ela realiza apresentações musicais para os visitantes, apenas pede para que as crianças dos orfanatos ao redor pudessem visitar com certa frequência o local. Nem sempre ela podia se apresentar, nesses momentos deixava contatos. Embora moradores locais tivessem entrada gratuita, era um bom entretenimento para turistas. O que venho a ser conveniente para uma cidade que conheceu a verdadeira falência poucas décadas atrás.
Agora minha irmã estava pedindo para que eu trabalhasse com ela. Criamos uma rotina desde que terminamos, e se resumia a basicamente um tópico: encontros aos domingos. Nunca na semana. Apenas nos domingos éramos metade do que um dia fora nossa relação, e havia um bom motivo para tal. Durante a semana, sou apenas uma fotógrafa com o coração ainda partido.
Olhei para Lizzie sentada em sua cadeira de couro escuro, contrastando com a figura sentada; a pele clara, cabelos loiros com leves ondulações e a blusa de seda Gucci cor creme, assim como a calça social branca. Detrás, o céu ensolarado; e Detroit aos seus pés. Suspirei.
Sentia um profundo orgulho de Liz, havia reerguido a empresa da nossa família sozinha, a prodígio de nossa família que estava conquistando espaço no ramo empresarial do estado de Michigan, não tardaria para ganhar os Estados Unidos, logo, a América, para o mundo. O orgulho que sentia por ela é um dos sentimentos mais sinceros e partia do meu intrínseco; todavia, chegava a ser impossível não me comparar.
Uma fotógrafa, em contrapartida, a CEO que esta levantando uma Revista em uma cidade reconstruída.
- Por favor. – pediu a loira me fitando com seus olhos pidões. Uma expressão que ela só usa comigo ou alguém muito próximo, dragões andariam entre nós no momento em que Elizabeth Forbes Saltzman implorasse algo a alguém que não fosse de sua total e plena confiança, o que é um número extremamente baixo – Você é a melhor fotógrafa que eu conheço. – e se aproximou da mesa colocando os braços sobre a madeira reluzente, entrelaçado os dedos e mantendo sua postura ereta e confiante, explanando alto-controle. Conhecia-a por completo para saber que estava tentando me persuadir.
- Não vou trabalhar com minha ex, Lizzie! – exclamei, encostando minhas costas contra a cadeira onde estava sentada, em frente à sua mesa. Olhei para as grandes janelas de vidro sobre suas costas, buscando um meio de fazê-la reconsiderar quanto a minha participação, tudo que vi foi o céu azul, alguns prédios e um avião passando ao longe. O que eu esperava realmente? Suspirei. – E desde quanto ela trabalha como modelo? – questionei confusa, um vinco se formando na minha testa.
Que ela já se envolveu em tudo, não é uma novidade. Ainda sim, foi uma surpresa saber que ela estava inserida em um projeto deste nível. A loira pendeu o corpo para trás, encostando-se a cadeira, cruzou as pernas e pôs as mãos sobre a mesma.
- Ela me perguntou se eu tinha algo... – balançou os ombros – Para ela. E isso é totalmente ela – disse efetiva. Por fim, soltou um riso suave e sorriu despreocupada.
- Sobre o que se refere quando diz que é “totalmente ela”? – questionei com uma recente curiosidade. Todo meu conhecimento sobre a nova edição é de sua importância para SaltzMagazine, o resto, confiava plenamente no potencial de minha irmã.
A mesma enviesou o corpo para frente, se inclinou para abrir uma gaveta e da mesma retirou uma pasta azul, ela olhou para mim com um brilho vigente nos olhos e pôs o objeto sobre a mesa, na minha frente.
Com a confusão estampada na minha face, ela gesticulou para que eu pegasse a pasta. A parte que insistia para que eu recusasse sua proposta, a emocional, gritou para que me levantasse naquele mesmo momento e deixa-se nas mãos de Liz o contato de algum colega de profissão competente pra realizar tal tarefa. A outra parte, a curiosa frenética por respostas, que almejava mais... Acabou vencendo. A indagação latejava dentro de mim.
Inclinei-me da cadeira e peguei o objeto azul, com mais entusiasmos do que deveria. Na capa podia-se ler em letras entalhadas elegantes “Ficha de Modelos da Edição nº 54”, abri e a primeira coisa que meus olhos captaram foi a imagem que acredito estar impregnada na minha memória: os cabelos negros batendo no ombro e traços que revelavam alguma descendência oriental, junto aos olhos verdes claros da minha ex-namorada. Com certa dificuldade desci os olhos para a ficha abaixo de sua foto.
Nome: Penelope Park.
Idade: 27 anos.
Nacionalidade: Estadunidense.
Photoshoot: Relacionamentos do século XXI.
Observação: Nativa de Detroit, assumida como bissexual (observação da observação: prefere mulheres pela alta intolerância a masculinidade tóxica). Passou por alguns problemas recentemente. Apresentou exames de rotina (datado do dia 20 de Maio de 2025) e demonstra estar apta para a edição de Junho.
Após a ficha com letras digitada, ao canto, escrito a caneta preta com a letra bem desenha da minha irmã:
Convencer minha irmã a trabalhar com Green Eyes.
Fechei a pasta e balancei a cabeça sutilmente, olhei para Lizzie intumescida pela imagem da minha ex-namorada. O desconforto com o pensamento de que havia a possibilidade de trabalhar com ela provavelmente marcou minha expressão. Estaria quebrando uma rotina tão santificada no qual criei. Olhei para a loira, que me fitava fixamente com expectativa.
Conhecia aquela CEO literalmente minha vida inteira e tenho certeza de que não desistiria até que fizesse com que eu concordasse com sua proposta. Mesmo assim, seria relutante na esperança de que conseguiria, pelo menos uma vez, ganhar essa discussão calorosa de vontades entre mim e minha irmã.
- Liz... – seu nome saiu quase em um sussurro de repreensão. Ela não oscilou com semblante em aguardo pela minha resposta positiva – Não vou trabalhar com Penelope. – disse por fim. A loira soltou uma lufada de ar e encostou-se ao estofado da cadeira novamente.
- Não é só com Green Eyes. – disse com simplicidade – Vire a página. – gesticulou com uma das mãos para a pasta azul.
Olhei para o objeto sobre minhas mãos e voltei a fitar minha irmã com um leve franzimento na testa, ela me lançou um olhar divertido. Abri-o novamente, passando o mais rápido possível pela imagem da minha ex-namorada e me deparei com a página seguinte, com mais uma ficha de uma mulher desconhecida por mim. Diferente de Penelope, esta tinha cabelos castanhos puxados para o ruivo e olhos azuis; pareciam dóceis, mas não genuinamente dóceis, como um lobo em pele de cordeiro, extremamente tentadores.
Depois de analisar a figura detalhadamente, provavelmente mais do que o tempo aceitável, pois ouvi Liz rir por um momento. Desci os olhos para o que dizia em sua ficha.
Nome: Hope Andrea Mikaelson.
Idade: 26 anos.
Nacionalidade: Britânica.
Photoshoot: Relacionamentos do século XXI.
Observação: Uma alma nata voltada para artes visuais. Uma expert da cultura de Nova Orleans em razão de sua criação na cidade. Identifica-se como pansexual.
Ao canto, novamente com caneta preta e a letra da minha irmã:
Lembrete pessoal: Alertar ao mundo sobre seus flertes.
- O que significa isso? – questionei me referindo à frase escrita à caneta por ela. Lizzie sorriu minimamente e balançou os ombros.
- Por favor, irmãzinha. – pediu inclinando-se sobre a mesa e pondo ambas as mãos sobre a mesma – Também é sua empresa. – afirmou com os olhos fixos em mim – Se esta edição bater a meta, estou falando “se”... – disse comedida – SaltzMagazine vai ter uma afiliar em Nova York. – assim que terminou sua sentença, Liz sorriu amplamente. Já eu, nem esperei terminá-la, antes mesmo o sorriso de contentamento marcava toda minha expressão.
- Meu Deus Liz! – exclamei animada – É maravilhoso. – disse verdadeiramente contente.
A empresa da minha família, SaltzMagazine, antiga ForbesMagazine que mudou decorrente de outra Revista de denominação semelhante, declarou falência antes mesmo da concordata de Detroit em 2009, a primeira grande cidade dos Estados Unidos a pedir falência. Uma cidade que após isso, quase se entregou ao abandono, se não fosse pelos moradores locais resignados. Com a insistência, a cidade recebeu investimentos exteriores. O lugar que antes era notório por ser a cidade do automobilismo, o berço dos ritmos músicas Motown, do Techno, até mesmo ganhou o título de Cidade do Rock. Reinventou-se.
A área do automobilismo cresce a todo vapor, o rock é ouvida em cada esquina. Mas tantas outras portas se abriram.
ForbesMagazine foi criada em 1981 pela minha avó Elizabeth Forbes, uma revista voltada ao público feminino, com o final do segundo e o princípio do que hoje conhecemos como terceira onda do movimento feminista, abordava assuntos do momento, tratando sobre sexualidade, mulheres negras, aborto, e o que mais as mulheres percebessem que as incomodava. Vovó fez da revista um sucesso na época. Mas Detroit foi caindo em ruínas, em 1990 a revista já apresentava claros sinais de péssimo rendimento.
Em 1995, mesmo ano em que Lizzie e eu nascemos, mamãe que havia assumido o controle há dois anos, fechou as portas. Nós nos mudamos para Nova York, onde agora mamãe trabalha como redatoras de moda da New York Times. Ela havia deixado meu pai, Alaric, após seus problemas com bebida, que chegou a um ponto que foi impossível lidar com ele, o que realmente entendo. Atualmente ele é um dos cirurgiões principais do hospital de Manhattan, ainda sim, decidiram continuar separados e mamãe se casou novamente.
Ficamos em New York até o início da fase adulta. Lizzie desde cedo demonstrou interesse em reerguer a empresa da família, tanto que aos cinco anos começou a estudar idiomas, somando agora o espanhol, francês, italiano, português e japonês em seu arsenal linguístico. Com diploma em relações internacionais e administração e um pós-graduado com honra por mérito pela New York University em desenvolvimento humano. Ela buscou por investidores, o antigo prédio continuava no nome da nossa mãe, precisava apenas do pontapé inicial.
Aos 25 anos, em 2020, assumiu como diretora executiva, no topo da hierarquia operacional como CEO, tomou a responsabilidade de diretora de redação.
Com a mudança permanente de Lizzie para Detroit, me juntei a ela na cidade. Moramos por um tempo juntas em um dúplex de luxo na downtown, atualmente resido em um apartamento simples. Minha carreira naquele ponto já bem encaminhada como fotografa editorial e por vezes documental, me permitia conseguir com certa facilidade trabalhos autônomos. Foi no meu primeiro ano, em uma cidade dando passos um pouco mais largos após a grande queda, que eu a conheci.
Lizzie o fez primeiro, após participar de uma reunião no iate de um dos sócios, quando estava se retirando pelo píer do porto, Liz viu uma garota escorada em dos monumentos históricos, zonza decorrente do álcool em seu sangue. Essa garota atualmente é minha ex-namorada.
Por muito tempo Lizzie se dedicou completamente ao trabalho. Mas agora sei o quanto ela sente-se culpada por não participar ativamente da vida de Pedro. Ela considera assumir apenas o cargo de CEO, existem muitos outros profissionais na gestão da revista empenhados em fazê-la crescer que são capazes de continuar o bom desempenho da SaltzMagazine. Minha irmã merece um descanso depois de ser a filha prodígio que levantou a empresa hereditária.
E agora a hipótese de filial em Nova York. Realmente, a posição como uma das 100 mulheres jovens mais influentes da América do Norte fazia jus a ela.
- Então... Posso contar com a melhor fotógrafa do mundo? – perguntou tranquila.
Os olhos em um pedido velado pela minha afirmação. Suspirei pelo que achei ser a milésima vez no dia e assenti lentamente. Liz sorriu amplamente e esfregou as mãos uma na outra. Eufórica, levantou-se e foi até as janelas de vidro. Sorri para minha irmã, mesmo relutante à ideia, sabendo o quanto ela amava a visão do topo de tantos outros prédios da cidade, a população abaixo marcando pequenos pontos, os carros mostrando apenas um borrão... Tudo que conquistou. Levantei também, indo até a ela.
- Não me respondeu a nota na ficha dessa tal de Hope? – perguntei com a súbita curiosidade. Espantou-me de certa forma o quão fácil foi admitir a beleza da tal mulher, levando em consideração os últimos meses. A mulher que vi na pequena foto anexada é deslumbrante, não poderia negar nem que me esforçasse. O pensamento de talvez enfim ser capaz de superar ela... Interiormente despertou certa empolgação.
Os azuis camuflando algo a mais ficaram rodando no meu subconsciente.
- Hope Mikaelson. – respondeu canônica – A conheci em Nova Orleans, na viagem que tive com os acionistas, mês passado. – explicou-se, admirando a vista da janela, assim como eu – Após a tormenta sem fim, que pelos meus cálculos duraram exatas duas horas e dezessete minutos e diria que, uns quarenta segundos... A encontrei no Quartel Frances, lugar rico em beleza e cultura, por sinal. Brilhava na minha testa “turista”, ela se aproximou e conversamos. Ela me falou sobre as histórias da cidade, sobre o misticismo que paira. Foi interessante. – declarou por fim, e voltou a me fitar, com a mesma expressão suave de sempre.
- Ela esta na mesma sessão de fotos que Penelope, por qual motivo? – questionei interessada.
- Ah... – soltou uma risadinha e sorriu olhando para um ponto qualquer através das grandes janelas – Amor entre mulheres em esplendor no XXI. Você sabe. – disse entusiasmada. Engoli em seco e ri, mesma não sentindo motivos para tal façanha. Realmente, lembro-me de no papel ter algo relacionado, mas estava perdida de mais nos atrativos físicos da ficha, ainda sim Liz não saciou minhas dúvidas.
- Por que elas? – perguntei baixinho, incerta se queria saber realmente o que isso significava.
Concordei em trabalhar com minha ex-namorada, um ser de beleza fascinante que ultrapassava os limites aceitáveis para meu raciocínio coerente, e, a primeira pessoa depois que conheci Penelope no qual despertou em mim encanto por seus traços tão angelicais e atrativos de se observarem... Em apenas uma foto. E sim, provavelmente estava à beira de um gay panic por posteriormente ficar em uma sala com estas duas: uma desconhecida e minha ex-namorada. Oras, sou humana.
- Green & Blue Eyes vão fazer um duo, espero que não se importe irmãzinha. – disse despretensiosamente. Meus olhos expandiram-se em descrença com a constatação.
Teria que fotografar minha ex-namorada como casal fictício com esta outra mulher. Ótimo. Obrigada Elizabeth Forbes Saltzman. Muito obrigada. Acabou de fazer meu coração acelerar drasticamente.
- Não pensou em contratar modelos de verdade, não? – tentei na esperança que de alguma forma ela mudasse seus conceitos, mesmo sabendo a probabilidade de isto acontecer sequer existia.
- Quero pessoas reais. – as palavras soaram mais intensas do que julguei que ela desejava que saísse. Mas essa é minha irmã. Suas palavras me levaram a observações na pasta azul, no qual especificava termos relativamente pessoais e tal constatação me fez de prontidão entender o que Liz desejava transmitir.
Uma prodígio visionária que logo terá o mundo aos seus pés apenas por ser quem ela sempre foi destinada a ser.
- Tudo bem, vamos fazer isto acontecer. – concordei, olhando-a de perfil, a mesma com o olhar centrado num ponto em frente, exibindo o habitual sorrisinho confiante – Esta garota, Hope... – enrolei para expressar meu interesse iminente, algo que chamou minha atenção, fazendo com que franzisse o cenho antes de perguntar – Uhum, ela é de Nova Orleans, certo? – questionei, embora sabendo a resposta, e um pouco incerta se devia ou não me aprofundar. Lizzie ergue as sobrancelhas e virou a cabeça na minha direção.
- Ela está aqui pelo Projeto Heidelberg. – explicou, referindo-se a um projeto artístico urbano – No qual iremos abordar nessa adição, também – sorriu – Ela vai ser perfeita para o que eu quero. Assim que pedi sua participação, ela concordou. – completou, um lampeja astuto cintilou em seus olhos, o que me fez estreitar os olhos. Porém apenas maneei a cabeça sutilmente, assentindo. – A renomada jornalista Dana Lilien está escrevendo um artigo sobre SaltzMagazine. Assim que a edição desse mês for lançada e avaliada, será publicado no New York Times. Dependendo do teor da critica, ou a revisa cai na lama novamente, ou alcança o estrelato. – seu tom soava ponderoso, ainda sim, exalava uma tranquilidade invejável.
Sei que ela quer ser motivo de orgulho para nossa família, mas caramba, quer dar mais orgulho ainda para mamãe e vovó? Como se isso fosse algo remotamente possível.
- Vai ser um sucesso, Liz. – garanti completamente certa do que dizia. Ela balançou a cabeça em afirmação como reposta as minhas palavras. É uma mulher confiante, idealista e bem posicionada, acalentava suas preocupações nas enormes possibilidades de um desfecho positivo.
- Tenho você ao meu lado. – disse envaidecida olhando para mim. Sorri com isso e assenti, concordando com sua afirmação.
- Sempre. – disse simples e franzi o cenho com um imediato pensamento. Uma preocupação rondou minha cabeça após digerir tudo.
Certo, poderia passar completamente despercebido. É um pouco desonesto da minha parte com o julgamento da minha irmã, e com ela, mas depois do que passei, foi inevitável essa preocupação derivada de antigas experiências.
- Tem certeza, Liz? – o som saiu baixo e minhas sobrancelhas aproximaram-se em receio, vendo o semblante confuso da minha irmã, continuei – Em envolver ela em algo tão importante assim. – completei mais firme. Minha irmã me olhou de viés, inquieta.
- Jô... – murmurou resignada. – Nós nos encontramos às vezes e conversamos sobre isso. Peez salientou o broche de um ano que o AA condecora. Deveria perguntar á ela sobre tal, ficaria orgulhosa em conversar sobre isso com você. – declarou amena, olhando para mim com seus orbes claras, serenas e compreensivas.
Minha irmã sabia o que se passava e não me julgaria, ainda que não estivesse em consenso. Suspirei novamente. Falar sobre o problema dela sempre fazia com que me sentisse trepidante.
- É sério, Liz...? – murmurei essa espécie de pergunta e minha irmã me olhou cautelosa e assentiu com a cabeça – Um ano sem problemas com... Uhum... Aquilo? – repito o questionamento. Lizzie soltou um riso lascivo e virou-se para mim. Eu sabia, no entanto, e ela sabia que eu sabia.
- Evitar o termo não vai fazer com que suas causas e consequência se extinguem. – afirmou compenetrada – E sim, um ano sem uma gota de álcool no organismo. – ratificou.
- Sobre consequências eu sei muito bem. – murmurei para mim, mas Liz ouviu e me olhou compreensiva, maneando sutilmente a cabeça em afirmação.
- Green Eyes está se esforçando. – disse com um sorriso leve nos lábios, embora os olhos entregassem suas preocupações. Sorri com o apelido que minha irmã deu à Penelope. Seus olhos verdes certamente é um dos seus melhores atributos físicos – Apenas confie em mim. – pediu serena e assenti, assegurando de que não iria mais contestar sua decisão, não verbalmente.
- E Pedro? Estou com saudades do meu sobrinho. – mudei de assunto, agora concentrada em ter notícias do pequeno. Os lábios de Liz explanaram em um sorriso animado, que logo se transformou em um sorriso de saudades. Coloquei minha mão gentilmente em seu ombro e afaguei, buscando expressar todo meu apoio.
- Ainda está com Milton e a família dele em Atlanta. – disse com ar nostálgico. Sabia o quanto ela sentia saudades de Milton e Pedro, que estava há uma semana longe dela e se viam apenas por chamadas de vídeo.
- Preferiu o serviço ao invés da sogra. – tentei descontrair com um tom divertido, o que funcionou, pois a loira exibiu um sorrisinho de lado – Grande Workaholic. – brinquei, ainda que um clima pesaroso prevalecesse na conversa.
- Preferiria a guilhotina ao ter que compartilhar o ar com aquela mulher. – disse em divertimento, sorrindo para mim, logo voltou os olhos para as imponentes janelas de vidro – Ela me odeia. – assegurou insatisfeita com o fato, mas acomodada com a situação – E é recíproco.
Suas palavras voltaram minha mente para Penelope. Inferno.
Durante cinco anos que a conheço, ela nunca conversou sobre sua família. Mesmo tendo mais conhecimento sobre eles do que ela me contou, apenas soube que ela morou em uma comunidade de pescadores as margens do lago regional. Acredito fielmente que as verdades que ela escondia também revelariam a origem de seus vícios, mas não coube a mim pressiona-la, deveria partir dela. Em lapsos de julgamento, me martirizava por não leva-la ao limite, encurrala-la e exigir por respostas, assim poderia ser diferente?
- Liz... – chamei por minha irmã, que voltou sua atenção para mim – Ela está bem, tipo bem, mesmo? – não precisei citar seu nome, o olhar acalentador da loira foi o suficiente para que eu soubesse que ela havia compreendido.
- Vocês se encontram aos domingos, amanhã é domingo, por que não pergunta para ela, irmãzinha? – questionou avidamente e exibiu um sorriso encorajador. Suspirei, um hábito esperado em tal assunto.
Meus encontros com minha ex-namorada acontecem aos domingos, em praticamente todos os dias desses treze meses desde que terminamos nosso contato íntimo como algo além de amizade. Começou na terceira semana do rompimento, no qual em um domingo, ela me ligou falando de algo que a princípio não fazia sentido: sobre dias tristes e domingos... Até comentar que é o dia em que tem mais pretensões. Entendi de imediato que ela se referia ao seu vício em bebida alcoólica. Justificou como sendo um dia triste.
Soltou uma frase típica de Penelope, algo como “Domingos são o ponto de partida para ex-alcoólatras virarem alcoólatras atuais”, em uma seriedade no qual se eu não conhecesse, diria que era uma pesquisadora anunciando seu projeto. Pensei ser um meio para me manipular, e de alguma forma, fazer com que eu tivesse compaixão por ela...
Então ela me ligou em um domingo à tarde, o domingo seguinte em que ela constatou que domingos é o ponto de partida para uma recaída. Estava chorando, pois tinha se cortado com um caco de garrafa que havia acabo de quebrar, porque estava tentada em beber o conteúdo dela. Por Deus... O quanto vê-la daquela forma me destruía... Fui até seu apartamento decadente, joguei fora toda e qualquer gota de álcool possível e desde então, somos apenas nós aos domingos. Os domingos que por algum motivo não posso estar com ela, conversamos por telefone pelo menos por um curto período de tempo. Ainda sim, as lembranças do que vivi por causa de seu vício me atormentavam.
2º Ato: Pessoa boa, problema ruim.
...
Hoje é meu aniversário de 27 anos, sendo também o aniversário de Lizzie. Também completa hoje nove meses que Penelope e eu namoramos. Minha mãe Caroline organizou uma festa para comemorarmos em um pub requisitado perto do estádio dos Tigers, a noite foi reservada apenas para a comemoração do nosso aniversario. Mamãe e papai vieram de Nova York, vovó mesmo que tenha andado doente fez questão de aparecer também. Elogios pelo sucesso da SaltzMagazine não foram poupados e minha irmã sorria orgulhosa para as parabenizações que recebia. E bom, eu havia estado na cobertura no hemisfério norte registrando o derretimento de grandes calotas polares. Mas não é nada de mais.
Minha namorada, no entanto, assim que colou os olhos em mim depois que passei duas semanas longe de Detroit, me recebeu com beijos calorosos e exaltações do meu trabalho enriquecedor registrando um marco, devastador, da humanidade. Agora eu estava esperando-a na minha festa de aniversário, e a mesma estava duas horas atrasada.
O local estava cheio, meus amigos pessoais não eram muitos: alguns colegas de profissão, alguns conhecidos da infância que penduraram até os dias atuais. Da parte de Liz, muitos conhecidos, empresários, funcionários da revista, amigos. Ela fez questão de pelo menos hoje ignorar completamente os figurões de Detroit, convidando apenas pessoas no qual possuía afinidade, deixaria para bajular essas figuras importantes para o crescimento da Revista em outras ocasiões.
Penelope mais cedo comentou que iria cantar uma música especial para mim. Tinha um leve palpite de que seria do All Of Me, no qual ela já disse ser a descrição de seus sentimentos por mim. Em suas palavras românticas, ela disse que me trataria neste dia como a legítima princesa moderna que a Disney não seria capaz de fazer por merecer em me ter. Inclusive, me prometeu o mais belo buque de lírios, de todas as cores que ela achasse. A garota não brincava em serviço.
Duas horas atrasadas, uma blusa de uma banda de rock qualquer completamente desalinha, jaqueta, e os cabelos esvoaçados de um modo que eu acharia sexy em outras circunstâncias, mas o fato de que ela estava bem distante da sobriedade, me deixou preocupada.
No estado de embriaguez, tive certeza que ela não poderia ser capaz de cumprir o que comentou. Ela se aproximou de mim cambaleando, desviando das pessoas. Um descuidado ficou em seu caminho, o que resultou em um esbarrão. Penelope olhou-o zangada e empurrou o homem pelo ombro, o mesmo parecia prestes a iniciar uma discussão e me apressei em chegar até lá e pedi desculpas em nome da garota de cabelos negros, ele assentiu e voltou ao que fazia.
Penelope sorriu debilmente e pôs um de seus braços sobre meu ombro e depositou um selinho desajeitado nos meus lábios. O cheiro forte de álcool fez com que contorcesse involuntariamente o nariz, e de fato, estava insuportável o fedor absurdo de bebida barata que pairava sobre ela. Nunca tinha visto minha namorada nesse estado. Do que me recordo, desde que a conheço nunca a vi beber nada alcoólico, até hoje.
- Hey... – gritou sobre a música que tocava, chamando minha atenção para ela, a fitei, podendo sentir também um bafo de cigarro na sua boca – Vamos aproveitar... Sua. Festa. – suas palavras soavam emboladas, assim como ela ao todo.
Senti meu estômago embrulhar com seu estado de decadência. Fiquei de certa forma triste, esperava uma noite especial com minha namorada romântica e carinhosa, não essa pessoa alterada com o braço sobre meus ombros.
- Você está bêbada. – falei com a cabeça virada para ela, tentando aguentar o fedor insuportável de bebida ruim. Lembranças de quando era criança e presenciava o estado do meu pai quando se perdia no álcool vieram instantaneamente nas memórias, portanto balancei a cabeça sutilmente, tentando espantar tais memórias.
Penelope piscou os olhos, parecia perdida.
- Não... – fez gestos bruscos com a cabeça, negando sua condição – Vou cantar pra você agora. – disse enrolada, tentando parecer determinada.
Deu alguns passos em direção ao pequeno palco do pub, parou abruptamente no caminho e voltou, a centímetros de mim, tirou do bolso da jaqueta um lírio completamente amassado, gesticulou para que eu estendesse a mão e assim que fiz, colocou o que um dia fora uma flor na palma da minha mão. Virou-se e seguiu para o local onde estava o DJ. Fechei minha mão, suspirei e deixei com que a decepção me tomasse.
Ponderando seu estado, cheguei à conclusão que ela sobre aquele palco seria um desastre. Minha noite já estava razoavelmente estragada, não destruiria a de Lizzie também. Dei passos apressados para chegar até ela, que já havia falado com o DJ e se aproximava dos instrumentos musicais.
- Pen. – chamei-a. Dei uma corridinha e pus minha mão sobre seu braço para que ela me esperasse, ela virou bruscamente em minha direção, com o movimento abrupto, tirou meu braço sobre ela de forma bruta. Dei um passo para trás, tensa pela sua atitude violenta tão diferente da minha carinhosa namorada.
- Me deixa. – disse rude e subiu no maldito palco.
Ela pegou uma guitarra do suporte, aos tropeços e perdida na embriaguez, fez um sinal para o DJ parar com a música e soltou apenas um “vou cantar, calem a boca”. Após algumas notas desafinadas com o instrumento, irritou-se consigo mesma por não conseguir proporcionar nada além de notas agudas, tanto que jogou a guitarra no chão de qualquer jeito e saiu dali.
No dia seguinte, pediu desculpas e disse que há tempos isso não acontecia. Sempre que bebia, perdia completamente o controle. Disse também que não aconteceria novamente, que foi apenas um momento em que ela estava fraca. Papai me disse que ela é alcoólatra, como ele é. E sempre seria, e que teria que cuidar-se, assim como uma pessoa com diabetes. Pedi que ela pelo menos frequentasse o grupo de Alcoólatras Anônimos, que seria bom para ela. Ela falou que estava bem. Ela não estava bem.
...
*Play: One Republic - Future Looks Good*
A manhã de domingo estava sendo contemplada por um belo dia ensolarado. Permaneci parada em frente ao monumento River Walk, próximo ao lago, com minha bicicleta encostada na estrutura. Comia um taco vegano enquanto esperava pela minha ex-namorada.
- Recebeu a notificação? – a voz suave e divertida atrás de mim fez com que desse um pulinho de susto e soltei um grito abafado pela presença repentina dela. Recompus a postura e ela apareceu na minha frente, sorrindo genuinamente na minha direção – Oi.
- Que notificação? – perguntei alheia a sua pergunta, voltando minha atenção ao taco.
- Vamos trabalhar juntas. – disse simples, com os lábios curvados em um sorriso contido. Revirei os olhos pela sua animação – Dá pra mim? – apontou para o taco em minha mão. Bufei e involuntariamente meus olhos se reviraram novamente. Sempre comprava tacos. Penelope sempre queria os meus tacos, mesmo não tendo vontade de fato de comê-los. Sempre cedia. Estendi o que ainda tinha da minha comida para ela, que me olhou contente e o pegou da minha mão.
- Ah, sim. – murmurei – Parceiras então. – falei a contragosto.
- Sim, parceiras. – assentiu animada, terminou de comer meu taco e subiu na sua bicicleta, e fiz o mesmo – E tem a Hopey. – ressaltou astuta. Passamos a pedalar sobre a ciclovia nas margens do lago. Busquei nas minhas memórias o que diabos era “Hopey”, mas não encontrei nada, apenas um nome semelhante da...
- Hopey? – perguntei a ela em dúvida – Uhum... Hope, quis dizer. – a corrigi. Penelope deveria saber sobre sua companheira de sessão, certamente ela sabia. Já devia de ter se encontrado com Lizzie e acertado os detalhes, inclusive o fato de que teria companhia.
- Não. – ela negou prontamente – Hopey. – ressaltou vigente – Conversamos. – disse simples – Declarei que seria mais divertido chamá-la de Hopey, tipo honey. Ela concordou em discordar. – suas palavras soavam sérias, o que me fez rir do teor delas. No fundo, uma leve pontada de ciúmes me atingiu, no qual não tinha o mínimo controle sobre. O que diabos de bagunça estava se formando na minha cabeça?
- Então já flertou com ela. – falei resignada, lembrando-me das palavras de Lizzie na ficha da Mikaelson. Ela soltou uma risada misturada com a respiração ofegante por conta do exercício realizado.
- Nah. Ela flertou comigo. – falou como se não fosse nada. Virei minimamente a cabeça em sua direção, para vê-la concentrada na ciclovia, e voltei minha atenção para frente. Certo, a garota nova flertou com minha irmã e minha ex-namorada. Maravilha. Talvez aquele lobo sequer se escondesse sob a pele de cordeiro, e estava me arrependendo de sentir algo, não que eu pudesse controlar isso.
- Uhum... – murmurei sem saber o que comentar. Ela me olhou de viés, parecia hesitar sobre algo, por fim, abriu a boca:
- Quinta à noite vou tocar com a banda no PJ’s, quer ir? – perguntou, o timbre por pouco passou despercebido de tão baixo que ela falou. Segurei a vontade de soltar uma risada depreciativa, pois ela parecia muito acanhada em perguntar se eu queria ir
– Convidei Hopey. – acrescentou no mesmo tom. Claro, como se fosse um argumento positivo.
As fichas que analisei no dia anterior no escritório da minha irmã gritavam problema, tolice da minha parte velejar rumo à tempestade?
- Primeiro: a sessão é uma exceção. – referi ao nosso acordo e que o trabalho para a edição da Revista será um caso à parte – Nossos encontros continuam limitados aos domingos. Segundo: não vou ficar de vela para minha ex-namorada. – disse tentando soar irônica. Um pensamento a princípio desagradável.
- Primeiro: seria bom socializarmos antes, para criar uma atmosfera agridoce em nossa produção. – rebateu séria – Segundo: não é um encontro, sua bobinha. – falou divertida.
- “Atmosfera agridoce em nossa produção”, que porra é essa? – questionei, tentada em rir de suas palavras.
- Li em um livro que um contato de antemão entre o profissional da fotografia e seu objeto de trabalho pode alterar o resultado final positivamente. – falou apressada, e no final, soltou uma lufada de ar. Sorri com o que disse, sendo que claramente era algo imaginativo.
- Invenção sua. – afirmei com a entonação de zombaria. Penelope fingiu bufar, não que ela saiba que eu sei que ela fingiu.
- Como fotógrafa deveria saber disso. – respondeu emburrada. Sorri. Um dos motivos de ter me conquistado.
- Como fotógrafa, sei que está inventando. – cantarolei em afirmação. Vi seu peito subir e descer em suspiro pesado.
- Me rendo. – disse falsamente aborrecida – Só quero sair com minha velha amiga e minha nova amiga. Que por ironia do destino, são minhas colegas de trabalho. – seus lábios se curvaram em um bico após sua explicação, o que me fez sorrir. Sempre fazendo drama por nada e tratando com banalidade o que realmente deveria ter sua atenção.
- Fala como se dividimos um balcão em alguma loja de departamento. – zombei, ela me olhou e eu repeti o gesto, fitando-a brevemente.
- Não caçoe da minha profissão. – falou com falsa seriedade. Realmente, Penelope atualmente estava como balconista em uma loja de departamento na Midtown de Detroit, sei que não tardaria muito para que ela não estivesse mais. Constantemente mudava de emprego, e viver da música não chegava a ser o suficiente.
- Ser balconista não é profissão. Apenas proporciona uma renda. – afirmei sabiamente. Ela riu.
- Profissão temporária. – ressaltou – Sua família está criando um nome de relevância no mercado e você é muito incrível para não atingir todo seu sucesso. Hopey é filha de um britânico proprietário de terras de vinícola no “jardim da Inglaterra”, além dela ser puro talento como artista. – disse comedida – Acho que a única que vai ficar atrás de um balcão nessa vida sou eu. – disse com tom de zombaria, deu uma risadinha e calou-se. Sei que não era uma piada para ela.
- Tem uma chance real, aqui. – disse, buscando lhe transmitir conforto – Sabe. Ser modelo de uma revista. – falei, tentando empolgá-la. Era meu dever, certo? Não me soava como algo imposto a necessidade de fazê-la se sentir bem, todavia, gostava de pensar que era.
- O problema não é ter uma chance. O problema é que eu fodo com minhas chances. – e novamente, sua entonação a zombaria não soava nada além de depreciação. Suspirei pesarosa. Lembrei-me da minha irmã pedindo para que eu entrasse nessa conversa... Que mal há. Já estamos aqui.
- Lizzie disse que tá melhor... – antes que eu pudesse terminar minha sentença ela se apressou em assentir.
- E estou melhor. – afirmou convicta – Um ano sem nem chegar perto de álcool. – disse orgulhosa de si. Olhei-a de esguelha e deixei com que um sorriso genuíno preenchesse minha face.
- Vai dar tudo certo desta vez. – afirmei com afinco. O silêncio após isso pendurou, apenas os sons da movimentação ao nosso redor e da borracha do pneu das bicicletas sobre o asfalto se fez presente. Até ela comentar algo que primeiramente foi impossível de compreender e pedi para que ela repetisse.
- Queria seguir como cantora. – disse baixo, mas audível dessa vez.
Ela estava acanhada em demonstrar sua vontade, e sempre fora assim. Quanto mais desejava algo, mais fingia não desejar, tanto que quando precisava admitir algo que desejasse, ela ficava com receio de falar. Se eu não tomasse uma atitude, nunca teríamos tido um relacionamento romântico. E foi uma das coisas que mais me atraiu nela.
- Talento não te falta. – disse sincera, confiante das minhas palavras.
- Não me serve... – murmurou, negando resignada. Mesmo não querendo, me senti abatida com sua falta de confiança em si.
Antes de tudo desmoronar, fomos e somos amigas. Incontáveis vezes Penelope segurou minha mão quando os temores de não ser bem sucedida numa família de grandes empresarias apareceu e fui tomada por receios da minha carreira como fotógrafa. Ela sempre ficou ao meu lado quando minha família não podia desde que nos conhecemos. Exaltando meus valores e me empurrando mais e mais próxima do amor próprio. Ter que presenciá-la assim doía como inferno queimando.
- Tem interesse nessa tal de Hope? – perguntei mudando de assunto para não deixar ela desconfortável. E sinceramente, quem ficou desconfortável agora fui eu. Ela me olhou de relance e soltou uma risadinha.
- Não quero relacionamentos. – disse simples, e balançou os ombros, mais do que as pedaladas faziam – Não quero pessoas se metendo na minha vida. – disse com um ar implícito. Soltei uma risada sem humor e bufei com suas palavras.
- Se preocupar com você agora se chama “se metendo na minha vida”? – questionei sarcástica. Desviei os olhos da ciclovia por alguns segundos para olhá-la, a mesma ficou calada, concentrada em apenas mover as pernas sobre o pedal.
- Entendeu o que eu quis dizer... – disse quase em um sussurro. Revirei os olhos.
Penelope sempre seria Penelope: incapaz de lidar com seus próprios problemas, quiçá permitir que alguém a ajudasse.
- Já que não quer ninguém te atrapalhando, podemos cancelar os encontros de domingo. – falei efetivamente e acelerei os movimentos na bicicleta, me distanciando dela.
- Não! – bradou, agora chegando ao meu lado novamente – Eu gosto dos encontros de domingo. – falou cautelosa – E gostaria de um encontro na quinta... Vou tocar. – o som suave de sua voz é como um implícito convite. Suspirei, negando-me a ceder seu pedido. Iriamos trabalhar juntas, não havia sentido aprofundar a coisa toda.
- Disse que não era um encontro. – falei a primeira coisa que me venho em mente, muito melhor do que o “eu aceito” querendo fugir por meus lábios.
- Encontro de se encontrar. Não encontro pra transar. – respondeu canônica. Revirei os olhos, pela milésima vez no dia provavelmente. Talvez estivesse um pouco estressada com a coisa toda, e não pegou um bom momento debater tais assuntos.
- Era esse tipo de encontro que você tinha com sua colega de banda? – disse com desgosto – Os para transar. Enquanto namorávamos. – disse retórica.
Não exatamente ao pé da letra. De fato, enquanto namorávamos, presenciei uma colega de sua antiga banda beijando-a, demorou um pouco para que ela a afastasse. Foi o suficiente para que me enfurecesse obviamente. Tivemos uma briga no bar que ela cantava, Penelope estava bêbada, óbvio.
Aquele foi o primeiro dia que cogitei a ideia de terminarmos. Passei a não ter noção se quando encontrasse com ela seria sua versão sóbria ou embriagada.
Ela negava veemente procurar por ajuda, certa de que estava no controle. E ela o perdia, e me pedia desculpas. E virou uma bola de neve no qual acumulava varias situações traumáticas até atingir um ponto em que eu não poderia mais suportar seu alcoolismo e ser sua namorada. Foi o pontapé para que ela percebesse que não estava no controle: quando tive que abrir mão dos meus sentimentos românticos por ela.
- Não, Josie. – falou abatida.
- Esquece isso. – falei com descaso, foi desonesto da minha parte trazer à tona – É passado. Deve ficar no passado. – balancei os ombros como se não me importasse. A quem eu queria enganar? Importava-me. Mas me importava com ela, não com o que havia ocorrido fazia meses.
- Descul... – interrompi sua fala, buscando atingi-la nem que seja um pouco. Não podia me importar com ela desta forma...
- Por ter beijado outra garota enquanto tinha um maldito anel de compromisso no dedo. Tudo bem, desculpada. – tentei soar simplistas, mas tenho certeza que escorreram ironias dos meus lábios.
Oras, nem ao menos a culpava por isso. Eu sei que perdia Penelope quando ela bebia. E Penélope bêbeda não se importava em machucar meu coração. Penelope sóbria se importava em demasiado. Fechei os olhos com força brevemente, voltando meu foco na ciclovia.
- Foi mal. – disse, após isso se calou. O silêncio pendurou até estarmos em frente a um prédio abandonado que foi tomado e agora era alugados apartamentos de baixo custo. Penelope desceu de sua bicicleta, sem em momentos algum manter contato visual comigo. – Vamos ao Instituto hoje? – perguntou e finalmente me olhou.
Vi certo receio em pronunciar tais palavras e uma pontada de culpa chegou até mim. Penelope sóbria se importava em demasiado, e é sua única versão possível de atingir. Senti mal por depois de tanto tempo feri-la em sua sobriedade duradoura.
- Não. – falei tentando parecer firme, engoli em seco e continuei – Depois de sexta-feira acabou nosso contato. Seu broche de um ano me assegura que você pode andar com as próprias pernas agora. – falei em um fôlego. Mordi discretamente o lábio inferior, com medo de sua reação.
Poderia ser precipitado da minha parte, mas eu precisava de um tempo longe dela. E agora que tenho a certeza de que estava bem, poderia ser uma boa brecha, tanto para mim quanto a ela. Se será um jogada certeira é algo que não posso prever.
- Tudo bem. – ela assentiu com a cabeça, fitando um ponto qualquer da faixa pouco movimentada. Franzi o cenho, desconfiada por ela ter aceitado uma distância entre nós com tanta facilidade.
- Simples assim? – perguntei intrigada. Ela virou as orbes verdes em minha direção, com uma leve careta de indignação.
- Não é o que você quer? – questionou confusa. Penelope parecia querer demonstrar maturidade em relação a isso, ao mesmo tempo queria algo mais. Quase pude sorrir percebendo o quanto ela se esforça para ser boa para mim.
- Sim. – falei calma, buscando uma reação dela. Ela virou para as pessoas passando ao nosso lado na calçada, inquieta com algo. Até que se virou para mim novamente, me olhando cautelosa e um pouco nervosa.
- É serio? – questionou quase em clamor – Não vamos nos encontrar mais? – juntou as sobrancelhas em ansiedade.
Não poderia negar que adorava o tempo que passamos juntas. Antes de quaisquer coisas, somos amigas. Talvez seja um tempo que preciso ter para mim? Percebi que não estou morta, naquele sentido... Desde que nos nós separamos não consegui me aproximar de outra pessoa, pois minha cabeça estava sempre nela. Com tantas preocupações sobre seu estado e um medo devastador de que me ligassem dizendo que eu a tinha perdido por um acidente enquanto bêbada.
A constatação oficial de que ela não bebia desde que terminamos me fez respirar aliviada, agora precisava aproveitar deste ar.
- Quinta. Saímos eu, você, e essa Hope. – falei vigente – Sexta. O trabalho. Depois acabou. – completei, sendo o mais clara possível. Penelope me fitava inexpressiva, e por fim, assentiu. Suspirei um pouco aliviada, ela havia aceitado tranquilamente. Basta saber se eu poderia fazer o mesmo.
-.º.-
Quinta-feira chegou e busquei na memória desculpas convincentes o bastante para quebrar o compromisso que tenho com Penelope e a garota nova, Hope. Nada parecia o suficiente para parecer que estava desmarcando nosso compromisso casualmente.
Tudo soava como desespero, puro e singelo medo temeroso. Ligar para Penelope e dizer o quanto estava apavorada com possíveis caminhos passiveis de uma reaproximação mais íntima com ela, ainda mais depois de interromper nossos encontros aos domingos no qual seguíamos religiosamente, definitivamente estava fora de cogitação.
Penelope proporcionou muitos dores em meu âmago, enquanto delineada pelo alcoolismo, lhe dava uma falsa sensação de poder, beber lhe enchia de uma sensação avassaladoramente prazerosa. Voltando ao seu estado normal e sã, seus atos sobre a influência de uma droga tão popular e legal para consumo a derrubavam com uma força implacável. O pensamento de que ela sofrera assim como eu, me quebrava.
...
*Play: Pink (feat. Nate Ruess): Just Give Me a Reason*
Andei conversando com meu pai, com experiência no assunto, assim que as primeiras ocorrências com minha namorada se instauraram. Alaric pediu para que minhas ações fossem tomadas com certo cuidado, evitasse precipitações; ao mesmo tempo em que agisse com determinação. Assim que tomei consciência que ela estava doente; dependência química, me aprofundando mais adentro no problema, notei o quando ela sentia-se envergonhada sobre isso.
- Faça isso... – pedi quase em um sussurro. Levantei do sofá do meu apartamento e me aproximei dela, parada perto da porta com os braços cruzados sobre o peito olhando fixamente para o chão.
- Consigo controlar. – ela disse baixinho, quase se fez inaudível se eu não tivesse me aproximado dela. Alguns centímetros de distância da mulher de cabelos negros, busquei um contado mais legível com seus olhos, perdidos entre as mechas escuras caindo em seu rosto.
Ela ainda recusava-se a olhar em meus olhos, fitando o piso limpo da sala como se fosse algo incrível. Perdia ela gradativamente pelo seu vício, me colocar frente a esse imponente adversário e bradar contra suas ameaças sequer surtia efeito no desenrolar da batalha.
O sentimento de incapacidade me atingiu de forma devastadora quando aceitei que não poderia salvar ela dela mesma.
Senti meus olhos se embaçarem por lágrimas contidas. Segurei o quanto pude enquanto fitava-a deixando minha expressão de derrota transparecer por cada mínimo gesto. Fiquei em silêncio, ela nem ao menos ousou mexer-se, sua respiração parecia reprimida, evitando a todo custo movimentos bruscos.
Mesmo com meu impecável estado de saúde, me senti fisicamente fraca. Devastada pela arrebatadora percepção que há meses vinha negando no meu subconsciente. Penelope não permitia minha ajuda, nem a de alguém capacitado profissionalmente.
A exausta constatação de que eu jogava sozinha nesse relacionamento libertou as lágrimas insistentes. As permite que cumprissem seu trajeto, escorrendo de meus olhos e deslizando suavemente por minhas bochechas e caindo sobre a curva do meu rosto.
Subitamente fui surpreendida por dedos gentis e reconfortantes sobre minha pele, em minhas bochechas, acariciando docilmente a região com a finalidade de limpar as lágrimas que escorriam. Levantei a cabeça para capturar seus olhos normalmente tão límpidos agora avermelhados, não sei se devido às emoções apuradas ou a sua ressaca. Daqui em diante não importaria mais, pelo menos é o que o restante de minhas energias implorava para que eu fizesse.
Como me importaria menos?
- Não chore. – pediu em tom baixo, quase em um sussurro desesperado. Mais lágrimas molharam meus olhos e desceram desgovernados pelo meu rosto, sendo paradas pelos dedos gentis dela – Por favor! – sua voz quase mínima se fez ouvida em tons mais elevados, implorando para serem acalentadas – Não por mim...
- Não importa o quanto eu tente te segurar, você é esquiva de mais... – comentei desolada, e desviei minha visão de seu rosto.
Penelope ouviu calada, não rebateu minhas palavras, não contestou nem explanou aos quatros cantos que eu havia dito uma blasfêmia.
Ela tirou sua mão suave do meu rosto, no ínterim em que virei para olhá-la fui recebida por braços sobre meus ombros e sua cabeça entre a curvatura do meu pescoço, um aperto firme empolado de desolação. Soube que ela sabia. Não funcionamos mais como um casal, e ela aceitava isso. Aceitava meus próximos passos como eu mesma não poderia.
Prontamente não me pareceu um fato acolhedor: sua desistência de mim. A aceitação quando declarei que deveríamos terminar me soava como se ela desistisse de sua recuperação.
“Só um segundo, não estamos quebrados, só tortos.
E podemos aprender a amar novamente...”
3º Ato: A garota de Nova Orleans.
...
Meses depois de terminarmos o que tínhamos, percebi que estava ligeiramente enganada. Penelope passou a frequentar o grupo de dependentes químicos Alcoólatras Anônimos, e realizava procedimentos de rotina no caso de alguma complicação decorrente do uso abundante de álcool. Apenas me incomodava, sendo de minha escolha, o fato de estar no escuro em relação à dúvida se frequentava algum psicólogo. Sua infância pouco conhecida por mim é esclarecedora quanto aos os demasiados problemas.
Desviei os olhos da ruiva logo adiante. Bati impaciente um dos pés que se mantinha repousando sobre o chão, o mesmo fazia com os dedos sobre o balcão livre de sujeiras do bar do PJ’s Lager House.
Evitei graciosamente meus instintos implorando para que me virasse meramente em direção à mulher no banco ao meu lado novamente, dediquei meus esforços em encarar cada movimento do bartender realizando seu serviço, nem processava o que de fato fazia, apenas o seguia com os olhos de forma automática. Ela tinha um aroma pra se dizer no mínimo exótico, inebriante. Sentia sua presença ao meu lado, sabia que olhava diretamente para mim, e maldição, poderia jurar sentir sua presença.
- Então... – a voz doce soou ao meu lado. Sabia de quem era e esperava esperançosamente que ela não dirigisse a palavra a mim – Josie né? – questionou com a voz suave, no qual forçava fazer meu cérebro achá-la enjoativa. O lobo na pele de um cordeiro, lembra-se Josette?
- Josette para estranhos. – rebati um pouco mais rude do que planejava, sem virar para encarar os olhos azuis no qual descobri serem muitos tentadores e hipnóticos. Mais ainda, pessoalmente. E ferozes como um animal...
Hope Mikaelson estava ao meu lado em calças skinnys de lavagem escura, botas até o joelho e uma camisa de algodão branca, carregando nos braços uma jaqueta jeans azul clara.
Chegamos no bar praticamente ao mesmo tempo, reconheci de imediato quando a vi indo se sentar nas bancadas frente ao bar. Ela igualmente me olhou com entendimento e exibiu um sorrisinho estranho. Evitaria uma aproximação com a mulher até não possuir mais opções, ou seja, quando avistasse minha ex-namorada.
Mas Hope não seguia com o mesmo raciocínio, e não sabia se culpava Lizzie ou Penelope por esse infortúnio. Talvez as duas. Os alertas vermelhos soavam a todo vapor quando notei a determinação na garota de Nova Orleans ao me fitar com curiosidade.
A ruiva estava relaxadamente sentada ao meu lado. Voltou sua atenção na direção aos frequentadores do PJ’s. Movimentação superior a uma noite de quinta me atingia na constatação de que a atração principal é bem requisitada entre o público. A banda no qual Penelope é a vocalista é a atração principal da noite.
- Josette Saltzman. – Hope pronúncia meu nome pausadamente e dirigiu um olhar astuto para mim, que fui convencida por forças exteriores a olhar em sua direção – Lizzie não poupou elogios a você. Park desde que nos conhecemos te enaltece de forma espantosa. Diria que você tem uma fã... Talvez conquiste outra. – a ruiva falava centrada, dizendo cada palavra de forma até delicada, terminando com um sorrisinho discreto e sugestivo.
Lobo, cordeiro, lobo, cordeiro...
- Que bom. – disse com um pouco de desconforto e exibi um sorriso falso em sua direção antes de voltar a não encará-la. Tarefa árdua por sinal. Veja bem, não gosto do jeito com qual Mikaelson me deixa nervosa.
- Soube que é fotógrafa. Uma grande fotógrafa. – disse calma e seu rosto foi adornado por um sorriso astuto. Por meios desconhecidos, me vi obrigada a fixar meus olhos na sua presença inquisitiva.
- Claro que sabe. Minha irmã lhe contratou, assim como a mim. – rebati tentando parecer impaciente. Meus planos de apagar a existência da mulher ao lado simbolicamente enfrentavam sérios riscos cada vez que a mesma abria a boca para sentenciar algo. Inferno, talvez eu queira saber mais dela.
- Meu tataravô foi um conhecido próximo de Joseph Necephore. – disse simples de forma despretensiosa, me olhando de esguelha. Ela estava se referindo ao pioneiro da arte da fotografia, um dos caras considerado pela história como o percursor da imagem impressa. Puxando assunto, obviamente, e me senti tola pela súbita vontade de prosseguir com a conversa.
- É assim que conquista garotas? – perguntei contida. Um sentimento de desconforto e lisonjeio pairava sobre mim duelando pelo domínio. Lizzie e Pen são a prova de que a garota é uma galanteadora nata, e não queria jogos na minha vida.
Por Deus, a ruiva extremamente atraente que havia joga charme para a minha irmã e flertou com minha ex-namorada me lançava uma espécie de cantada disfuncional que de alguma forma bizarra e anormal despertou em mim a vontade de continuarmos um diálogo.
- Não sei... – falou provocativa com um discreto sorrisinho de lado com o canto dos lábios – Sente-se conquistada? – e sorriu amplamente para mim.
Remexi inquieta no banco, voltando a batucar com a ponta dos dedos no plano do balcão. Evitei contado visual com Hope e, sobretudo, fugi de sua pergunta inconveniente. Sentia seus olhos fixos em mim, aumento alguns graus meu nível de desconforto. Pare de me deixar com os nervos à flor da pele, Mikaelson.
Existia um numero considerável de meses no qual não tive um contato mais apurado com outra pessoa, pela simples e direta questão de que ninguém parecia despertar certo... Fogo. O quão irônico seria logo a garota que minha ex-namorada está interessa possuir a capacidade de me acordar sexualmente... Ainda mais, o quão desesperador é o fato de a minha ex-namorada estar interessada por outra pessoa.
Pen é livre, assim como eu. Mas não deveria ser assim, pela mesma mulher. Acabei de conhecê-la, Hope Mikaelson não deveria ter essa capacidade.
Sua mão deu alguns toques no meu braço, um contado sutil e ligeiro, entretanto, estava prestes a proferir palavras nem um pouco gentis em sua direção, mas me calei quando notei que a mulher ao meu lado fazia isso para chamar minha atenção e apontava com o queixo em algum ponto detrás das minhas costas.
- Ei! – sobressaltei na bancada com a voz próxima em demasiado do meu ouvido e um beijo suave na maça do meu rosto, resultando também nos pelos da minha nuca eriçados... Detalhes – Você apareceu. – Penelope disse animada, virou-se para depositar um beijo na bochecha de Hope e foi se escorar no balcão na minha direita, sendo que a minha esquerda estava ocupada pela ruiva.
Respirei fundo e me ajeitei para que ficasse de costas para o bar, no mesmo sentido das duas.
- Disse que viria. – respondi comedia, evitando fitar alguma delas.
Por Deus, não saberia responder qual das duas exalava mais uma aura lasciva e tentadora. Penelope sempre emanou essa coisa toda... Hope é uma quente surpresa. Nesse exato momento me encontrava entre as duas e soava assustadoramente quente. Inferno, não tem ar-condicionado nesse bar? Oras, o que diabos esta acontecendo comigo?
Penelope olhou para a mulher ao meu lado com um sorriso contido, Hope também lhe fitava em uma espécie de transe que emanava provocações entre ela e sequer tentaram disfarçar a troca de olhares sem atenuantes. E eu presa no fogo cruzado.
- Hopey. – minha ex-namorada falou em uma entonação claramente provocativa, ainda fitando a artista. Olhei para a mulher na minha direita, parecia perdida nas intensas fixações de Penelope, e constatar isso foi reconfortante. Não sou só eu...
Não sou só eu!
Mordi levemente o lábio inferior e esfreguei as mãos sobre minhas coxas na tentativa de dissipar alguns pensamentos impróprios que surgiram.
- Que música vai cantar? – lancei a pergunta para Penelope, quebrando um silêncio meramente incomodo para mim, ainda que ambas parecessem confortáveis com a situação.
- Que música devo cantar Jojo? – desviou seus olhos para mim, cintilando resquícios de divertimento ao questionar.
- A banda não tem um repertório pronto para apresentações? – virei minha cabeça para Hope, que perguntou a Penelope com curiosidade.
- Às vezes sim, quando temos um trabalho mais formal. – explicou concisa – Aqui é apenas... Diversão. – balançou sutilmente os ombros franziu os lábios da maneira que costuma fazer em diálogos mundanos.
Hope balançou a cabeça em entendimento e sinalizou para o barman que trouxesse uma dose de whisky. Assim que o homem lhe serviu ela ergueu o copo em minha direção, um pedido velado para que lhe acompanhasse e neguei de prontidão. Prendi o ar quando vi seus olhos seguirem até Penelope com o mesmo intuito, engoli em seco quando a vocalista percebeu sua intenção.
Quando a mulher de olhos verdes balançou a cabaça energética e disse um “não” rechaçado, consegui respirar tranquila. Lancei um sorriso sincero em direção a ela, a mesma abaixou a cabeça e tentou esconder vestígios de um sorrisinho torpe.
- Posso sugerir uma música? – a ruiva perguntou, e voltou seu olhar para mim – Caso se importe, Josette Saltzman, posso retirar meu pedido. – disse aparentemente séria, seus olhos, no entanto, não negavam a provocação velada.
Tranquei a vontade animalesca de lhe dar uma resposta malcriada e dei de ombros, indiferente ao seu pedido. O que de fato estava, a probabilidade de que uma música que lembrasse meu antigo relacionamento com a vocalista ao meu lado saísse involuntariamente da minha boca eram gigantescas e despertavam sentimentos de cunho indesejado.
- Fale honey Hopey. – instigou Penelope, fitando a ruiva – Seu desejo e uma ordem. – disse em divertimento, Hope soltou um riso suave e verdadeiramente empolgado.
Intercalei meu foco entre as duas mulheres por duas vezes consecutivas e não pude evitar um pequeno sorriso de júbilo. Um sentimento bom. Não sei de onde surgiu nem sua finalidade, apenas soava certo esse encontro. O que aumentava de maneiras drásticas meu pânico interno.
- Uhm... – murmurou pensativa, percorreu os olhos pelo estabelecimento e voltou sua atenção para nós, fitando-me e logo olhou para a vocalista na minha esquerda – Deadcrush. – disse por fim fazendo Penelope sorriu.
- Alt-J... – falou quase em sussurro, como se apreciasse o que dizia – O que acha Jojo? – maneou a cabeça para minha direção com curiosidade. Ergui as sobrancelhas e explanei o sorriso animado que tentei prender. Balancei a cabeça em sinal positivo, recebendo das duas um semblante satisfeito.
Penelope depositou um beijo suave na minha bochecha, repetindo o gesto com Hope, murmurou um “vou lá” e seguiu calmamente para se juntar com o restante dos integrantes da sua nova banda.
As pessoas do seu novo grupo atingiam a marca do razoavelmente decente, diferente dos anteriores. Demonstravam cuidarem dela como ela precisava. Nisso refiro-me especificamente ao seu problema com bebidas. Quaisquer resquícios de dúvida sobre sua sobriedade evaporaram com a forma vigorosa no qual negou a oferta de Hope para uma dose.
O pensamento de que tal oferta acontecia rotineiramente despertou uma inesperada preocupação. Normalmente suas apresentações são em bares como esse, e pessoas no qual não obtinham conhecimento sobre seu estado lhe ofereciam bebidas alcoólicas constantemente... E ela negava, como negou agora. Porque fazia um ano que ela não bebia nada alcoólico.
Virei meu corpo em direção ao centro do estabelecimento, onde a banda irá tocar. Notei pela visão periférica Hope acomodar-se sobre o banco, atenta ao mesmo ponto em que meus olhos estavam.
Ponderei se deveria contar a ela sobre o alcoolismo de Penelope, para que o que acorreu anteriormente não voltasse a se repetir. Optei por manter-me distante desse fardo, nosso encontro no PJ’s já foi decretado como um momento único, uma ruptura nos sagrados encontros aos domingos de Penelope e eu. Em posteriores encontros entre elas, Penelope terá que ser sincera com Hope, e não me meterei nisto.
Um dos motivos dos pensamentos rondando minha mente entrou no meu campo de visão, um pouco atrás de si, uma baterista, um guitarrista e uma tecladista. A iluminação bem clara sobre a banda me deu total vislumbre de Penelope e seu visual despojado, que corria desde a calça jeans escura acompanhada de coturnos à jaqueta de couro sobre uma camisa da banda The 1975. O cabelo que antigamente deixava compridos agora atingia até seu ombro, contribuindo para que parecesse impossivelmente mais sexy ainda.
Os primeiros sons vieram de batidas rítmicas da bateria, seguida foi acompanhada pelos acordes da guitarra e então a voz que embora suave, soava intensa e devastadoramente ávida, cumprindo com o ritmo um pouco rouco e arrastado da música.
“Extraordinarily… Pretty teeth.
Beauty lingers… Out of reach.
You’re my DC oh Lee, ohh ohh ohhh…
Man Ray went cray cray… Over you.
Capturing… But never captured.
You’re my DC oh Lee, ohh ohh ohhh…”
Ouvi um suspiro ao meu lado e olhei para a mulher que me acompanhava. A garota de Nova Orleans fitava o palco com atenção e um brilho espontâneo nos olhos, notando minha atenção em sua direção, ela olhou para mim por segundos, apenas para exibir seu sorriso desafiador e voltou sua atenção para a vocalista.
Percebi que Hope Mikaelson, a britânica de 26 anos que caiu de paraquedas na minha vida, sofria dos mesmos sintomas que há anos me deixava enferma, e preciso saber o que pensar em relação a essa constatação.
-.º.-
O produtor de moda adjacente da SaltzMagazine estava organizando os detalhes do ensaio fotográfico, permaneceu na sala também a figurinista e o editor de moda, todos trabalhando para a sessão do dia. Sob ordens da mente genial e maquiavélica da minha irmã, a última sessão do dia seria justamente a de Penelope e Hope.
O nervosismo foi eminente quando finalizei os últimos cliques do que viria a ser uma representação singela da família. Fiquei sentada em um dos sofás para recepções observando todos os funcionários atarefados em seus afazeres. Lizzie conquistou funcionários leais que se empenhavam dia após dia pelo crescimento da Revista, revitalizando o orgulho abundante que despertava em mim. Todas suas conquistas acarretaram de seu potencial e competência.
Fazia meia hora que aguardava minhas modelos estarem prontas... E não pude conter as palpitações pelo meu corpo quando ambas as mulheres surgiram pela porta do camarim.
Penelope vestia um short jeans com bordas desfiadas e uma camisa de botões com alguns sobre seu busto desabotoados e um suspensório preto, junto a um chapéu panamá. Hope está em um macacão jeans, de short, e por baixo uma blusa de algodão branca, as madeixas ruivas em um coque perfeitamente desarrumado ressaltando os lindos brincos de argola que ela esta usando.
Apenas desprendi do estado torpente acarretado por causas naturais quando ouvi o produtor chamando pelo meu nome. De agora em diante serei a responsável interina do rumo da sessão, e foi uma surpresa enigmática e exultante a animação que senti entrelaçada a apreensão por saber que estaria com as duas, ditando ordens sobre ambas e... Proporcionando o melhor para que a Edição Nº54 fosse um completo sucesso.
- Park. Mikaelson. – chamei por elas para que prestassem atenção – Me acompanhem. – sinalizei para que me seguissem.
Fomos até onde fica os aparatos para a sessão fotográfica, o fundo de cor creme cercado por holofotes para a iluminação necessária, assim como duas bancadas de madeira ao canto. Na área que ficaremos estava apenas nós, sempre preferi que meu trabalho fosse feito em uma atmosfera privada, evitando possíveis distrações ou infortúnios interferindo para o bom desempenho e garantindo um resultado satisfatório.
Vejam onde me meti.
- Estou me sentindo muito gostosa. – a voz divertida de Penelope soou de forma despretensiosa, mexendo no suspensório despreocupada. Despertando em mim uma vontade enorme de revirar os olhos, e talvez sorrir.
- Também. – Hope disse e olhou para a cantora sob os cílios. Certo, agora tive que revirar os olhos. O arrependimento começava a se materializar no meu consciente.
- Está se sentindo gostosa? – a vocalista perguntou interessada, fitando Hope com júbilo.
- Não... Estou lhe achando gostosa, também. – respondeu a ruiva astutamente. Penelope riu baixinho pelo comentário e desviou os olhos.
Meu Deus, Elizabeth Forbes Saltzman eu te odeio.
- Viemos trabalhar, não paquerar. – reclamei tentando soar mais zangada possível e disfarçar o quanto a situação beira ao divertido. Ótimo. Não sorria, Josie. Não sorria. Não é algo bom. É mal. Sem sorrisos para aquelas duas mulheres.
- Estamos às ordens, bela fotógrafa. – Hope respondeu canônica, ainda sim suas palavras frisaram sua instigação desafiadora.
Escolhi manter-me quieta e agia em prol de completar os preparativos. Num último momento antes de começarmos a sessão fui em direção a minha bolsa pegar o pano de seis cores: vermelho, laranja, amarelo, verde, azul e roxo. Um símbolo de amor acima de quaisquer preconceitos. Peguei em mãos o que eu queria e fui até as mulheres prontas para serem cobaias diante minha lente. Conhecia Pen o suficiente para saber que ela estava levemente nervosa, em contraste com Hope, que aparentava exalar conforto com a situação.
Cheguei próxima a elas para dar algumas instruções de como deveria ser feito. E as duas trataram do assunto com maturidade e profissionalismo, acatando prontamente enquanto as instruía nas posições que melhor se adequariam para o ensaio.
As primeiras fotos seriam uma sugestão pessoal, e de certa forma uma surpresa para minha irmã. Ela adorará. E pelo sorriso de Penelope e Hope quando entreguei a bandeira LGBT+, aprovaram os resultados finais sem nem ao menos termos começado.
Pen abandonou o desconforto inicial e desempenhou muito bem sua tarefa. Hope manteve-se com toda a serenidade do começo. Quando pedi para que largassem a bandeira para mais alguns cliques, a artista deu uma sugestão, no mínimo... Perturbadora.
Hope teve a ideia surreal que atingia o absurdo de – sua personagem – ser fotografada dando um selinho em Penelope. Brilhante sugestão Mikaelson. Para piorar algo que aparente ser impossível declinar ainda mais, eu gostei de sua audaciosa sugestão. Por Deus, Penelope é minha ex-namorada que ainda nutro sentimentos e, não irei negar, Hope é alguém que eu desejei um envolvimento. Ela é divertida, e tivemos uma conversa agradável no decorrer da noite anterior.
Ora, ela foi agradável, não consigo negar.
E fizeram acontecer. Hope depositou um selinho casto nos lábios de Penelope, que após os cliques, exibiram sorrisos contente entre elas, e viraram com a mesma empolgação transparecendo na minha direção, ainda com a bandeira sobre as costas. E eu? Uma palpitação estranha onde não deveria e a boca seca em um momento importuno.
- Foram incríveis. – falei centrada quando a última foto foi finalizada.
Elas me olharam animadas e se aproximaram. O que foi um pouco desanimador devo admitir, havia duas obras de arte na minha frente, poderia passar a vida inteira às fotografados, registrando cada micro expressão delas.
- Podemos ver? – Hope perguntou exibindo um sorriso lindo, a pouco mais de um metro de mim. Penelope estava ao seu lado, olhando na minha direção com os tons esverdeados cintilando em um brilho diferente. Oh céus...
- Sim... – consegui dizer – Vem aqui. – gesticulei com a mão para que elas se aproximassem dos monitores onde as fotos estavam sendo exibidas.
Fiquei em frente ao teclado para pressionar o botão de passar as fotos e Hope ficou no meu lado direito e Pen no esquerdo. Em algumas imagens provavelmente pendurei mais do que deveria avaliando-as detalhadamente, e ninguém poderia me culpar. Estava orgulhosa do meu trabalho, de fato, mas contemplava as fotos como se fosse uma mera telespectadora.
As mulheres ao meu lado não demonstraram objeções a minha demora. Quando a imagem das duas com os lábios colados uma na outra apareceu, senti minhas bochechas levemente esquentadas. E não poderiam me culpar novamente, meus pensamentos nada próprios estavam a todo vapor. É quente, e sou humana. Não é minha culpa.
Levei um pequeno susto quando senti um braço sobre minha cintura, vindo do meu lado direito e repousando na minha pele pelo lado esquerdo. Hope estava com a mão em volta de mim. E deixei com que ficasse com a mão ali. Quando ela viu que não teria objeções da minha parte passou a desferir uma caricia suave na região. Então mais um braço passou sobre minha cintura e repousou no sentido oposto do da artista, Penelope aparentava certo receio, pois mal me tocava. Após alguns segundos com meu silêncio pelo seu ato, ela relaxou sua mão na minha cintura exposta pelo cropped.
E eu não poderia estar mais quente com a situação.
4º Ato: Matemática Simples.
E novamente no sábado me encontrava sentada na cadeira estofada em frente minha irmã gêmea. Lizzie estava recostada relaxadamente na sua cadeira e sorria com provocação. Devido ao ensaio fotográfico com minha ex-namorada e uma talvez provável futura namorada tiver sido um absoluto sucesso aos olhos da Diretora de Redação e também da minha querida irmã, esse é o motivo de seu sorriso quase maligno lançado na minha direção.
- Oh, me surpreendeu irmãzinha. – respondeu e proferiu um riso jocoso. Evitei bufar e parecer extremamente infantil, como minha irmã aparentava estar sendo.
- Apenas fiz meu trabalho. – rebati contida e me mexi inquieta na cadeira. A lembrança de Penelope e Hope dando um selinho vagava por minhas memórias, bem nítida. Nítidas até de mais para meu próprio bem. Para agravar, havia registros desse momento. Que eu registrei!
- Muito bem. – assentiu sutilmente ainda com o semblante de divertimento, que logo foi mudando para uma postura séria – Obrigada. Está maravilhoso. – acrescentou cautelosa, fitando-me com certa intensidade.
A edição é extremamente importante para minha irmã e a Revista fundada pelo nossa família, não havia motivos para me agradecer. Ainda sim, assenti e lancei a Lizzie um sorriso acolhedor.
Suspirei lembrando-me de um pequeno dilema pairando com insistência na minha cabeça. Fitei a mesa da minha irmã, tão limpa e higienizada que poderia ser feito uma cirurgia sobre a mesma que não ocorreria riscos de infecção... Levantei a cabeça para Liz, que me fitava com as sobrancelhas arqueadas como se pedisse para que eu prosseguisse com qualquer que seja o assunto me atormentando.
...
Estava assistindo One Day At The Time quando ouvi o toque padrão do meu telefone sobre a mesinha do centro entre os sofás. Revirei os olhos sabendo que só poderia ser Liz, ou Pedro que havia pegado o telefone do pai escondido. É uma sexta-feira à noite, quem mais me incomodaria? Só queria que fosse breve, depois do dia que tive com certas mulheres me tentando sem nem tentar.
- Oi Jo! – a voz animada e afável do outro lado da linha a princípio se fez estranha, entretanto a reconheci logo em seguida.
- Ahm, oi Hope. – respondi prolongadamente. Pensei um pouco sobre a razão de sua ligação em tal horário e nada me pareceu como uma explicação razoável. Afinal, há poucas horas estávamos juntas.
- Quer ir a um jogo de baseball? – perguntou empolgada num fôlego só.
Ponderei seu convite por um tempo. Certo, Hope estava me chamando para um encontro, não muito formal obviamente, mas para sairmos juntas. Soava como uma ideia agradável vê-la outra vez, bem-humorada como é, arrancava os melhores sentimentos de qualquer um, pois até quando tentei fugir de sua presença inquisitiva ela me fez gostar dela. Que mal há?
- Quando? – perguntei resignada. Internamente sei qual será minha resposta.
- Na outra semana, sexta-feira. – respondeu contida – Recebi cinco ingressos do Projeto Heidelberg e definitivamente não tenho cinco conhecidos na cidade para convidar. – disse em tom zombeteiro. Parei para pensar por certo momento na hipótese dela chamar a...
- Convidou mais alguém? – tentei soar o mais casual possível.
- Penelope? – riu baixinho – Chamei. Ela disse que ia ver. – respondeu simples. Engoli em seco – É jogo dos Tigers e Yankees. – explicou. Certo, gostava dos Yankees.
- Vou pensar, pode ser? – perguntei. Certo, um encontro com as duas. Certo, certo, certo... Está errado!
- Claro! – disse prontamente – Tem até algumas horas antes das 18hr de sexta-feira que vem para responder. – completou em divertimento.
Quatro episódios e meio depois que Hope me convidou para o jogo, meu telefone tocou novamente, desta vez o número de quem interrompia minha noite de sexta nem um pouco animada é minha ex-namorada.
- Jojo. – saudou. Sua voz tentava parecer animada, reconhecia facilmente sua entonação entusiasmada de sua tentativa de parecer ser.
- Penelope. – cumprimentei-a após seu silêncio. O vazio de palavras se estendeu ainda mais quando proferi seu nome. Franzi o cenho, confusa com sua atitude. Ela quem ligou para mim, não poderia esperar que eu dissesse algo. Embora talvez tivesse noção do que se trata a ligação.
- Hope me convidou para o jogo. – disse por fim, aparentava estar resignada em prosseguir – Também. – acrescentou, ressaltando que tinha conhecimento sobre meu envolvimento. Ou possível coligação já que não havia nada decidido.
- Sim. Ela disse que você ia ver... – falei prolongadamente, querendo que ela me desse alguma resposta se irá aceitar de fato o convite da artista ou não. Incomodou-me o fato de que não soube se queria uma afirmação positiva ou negativa da parte dela.
- Aceitou seu convite? – perguntou sobrepondo minha sugestão para que desse uma dica sobre sua decisão. Conhecia-a para saber que estava nervosa, lhe dei um sorriso reconfortante, mesmo sabendo que ela não veria do outro lado da linha, ela sentiria.
- Vai ir? – questionei amena. Ouvi um suspiro elevado.
- Queria te perguntar algo antes... – suas palavras receosas se estenderam em dúvida.
- Pois pergunte. – incentivei. Quando percebi que meu coração estava pulsando mais do que o ritmo normal, apenas aceitei. Sempre que Penelope se acanhava em perguntar algo, desmoronava minhas estruturas.
- Tem interesses românticos e sexuais na Hope? – perguntou apressada. Arregalei os olhos. Definitivamente me pegou desprevenida, e os ritmos cardíacos descompassados soltaram em disparada, tracei freneticamente os dedos no estofado do sofá.
- Oh, aonde quer chegar com isso? – questionei aérea. Ponderei se havia saído algum som da minha boca, minhas dúvidas foram sanadas quando ouvi uma risadinha nervosa do outro lado da linha.
- A mulher já deu em cima de nós duas... Se você cogita um envolvimento com ela, me diga que eu saio fora. – explicou na tentativa de soar neutra, mas, bom, conhecia-a o suficiente. – Okay?
- Abriria mão de ficar com ela para que eu fique? – perguntei amena. Um sorriso orgulhoso se intrometeu na minha expressão desconcentrada. Namorar com Penelope nunca foi um arrependimento, seus vícios não a definiam e nunca questionei a pessoa incrível no qual descobri que ela é. Além do mais, sei o quanto ela está se esforçando para essa conversa acontecer.
- Josie, abriria mão de qualquer coisa para te ver feliz... – declarou baixinho – Embora desta “coisa” em especial seja mais difícil... Gosto muito da companhia dela. Não sei o que ela realmente sente, mas parece gostar de você. Se quiser... Não vou ser um empecilho e só tenho a desejar que sejam felizes. – o tom calmo de sua voz me fez sorrir para o nada. Um pouco preocupada, de fato. Assim como Penelope desejava minha felicidade, tenho as mesmas preces por ela.
- Acredito que minha reposta tenha grande influência na sua resposta em relação ao convite. – comentei calma.
- Sim. Deixe-me saber se quer que eu saia de sua vida. Quero que seja feliz, e Hope é... – pausou – Incrível.
- Gosta dela? – questionei sentindo a curiosidade latente atingir meu peito. Notei prontamente a existência de uma atração forte entre elas desde que nós nos encontramos no bar. O que poderia ser caracterizada facilmente como apenas atração sexual. Queria saber o que seu coração estava sentindo, assim como ela fazia por mim.
- Josi. – a interrompi.
- Não me venha com “Josie”. – disse concentrada – Seja sincera comigo. Gosta dela? – pedi, com o tom necessário para que ela soubesse que apena aceitaria verdades. Não cabia a mim encurrala-la para se abrir sobre algo, entretanto a situação é descomum. Preciso saber!
- Gosto. – declarou após um longo suspirou. Mordi o lábio inferior com a única palavra dita, o movimento contínuo e inquieto com os dedos na borda do sofá, não tive dificuldades em absorver seu teor sincero.
- Posso pensar sobre meus próximos passos? – queria um tempo para considerar todos os aspectos. Brinquei distraidamente com as felpas da almofada no meu colo com mão oposta ao do telefone – Não quero me precipitar e acabar nos machucando. Mais ainda. – expliquei.
- Tudo bem! – disse imediatamente – Temos até algumas horas antes das 18hrs da próxima sexta-feira. – repetiu o que Hope havia dito para mim, e com certeza para ela. Sorri com isso.
...
- Hope me convidou também, tenho compromisso sexta. – disse indiferente – Jô... – Liz pronunciou arrastada – Não surgiu nessa sua cabecinha à hipótese de ter aquelas duas mulheres com um penhasco por você, para você. – disse centrada, completamente encostada em sua cadeira. Olhei para ela e franzi o cenho, negando minha mente a viajar para as possibilidades.
- Como? – engoli em seco assistindo minha irmã erguer as costas da cadeira e pôr os braços sobre a mesa, com um sorriso diabolicamente maldoso que eu sabia que gostaria mais do que poderia de suas próximas palavras.
- Você quer Hope e Penelope, Hope quer Penelope, Penelope quer Hope, Penelope e Hope querem você. É matemática simples. – disse canônica. Como se literalmente estivesse explicando um cálculo.
- O que?! Não... Não dá certo. Não é tão simples... – neguei, e balancei a cabeça em negação.
- Claro que é. Qual é irmãzinha... A ideia de ter aquelas duas ao mesmo tempo arrisca o funcionamento correto do seu sistema cardiovascular? – disse com os olhos azuis brilhando divertimento.
- Liz! Ficar com as duas ao mesmo tempo é insano... – insanamente bom – E se... E se elas não quiserem? Aposto que sua mente visionaria não previu isto. – acusei. Acomodei melhor na cadeira que estava sentada, desviando dos olhos da minha irmã.
- Josie. Veja isto. – apontou para a foto sobre a mesa, uma no qual Hope e Penelope estava olhando fixamente para a câmera, ou melhor, para quem estava segurando a câmera – Realmente. A perceptibilidade dos fatos. Como ousei cogitar o oposto. – gesticulou com as mãos dramaticamente, tripudiando do meu estado de negação.
- Lizzie! Não está ajudando! – exasperei.
- Jo, porque não? – questionou contida – As duas te querem, as duas se querem e você quer as duas. – disse com obviedade. Revirei sobre o estofado da cadeira que estava sentada.
- Isso é... Não sei... Não sei como poderia funcionar. – declarei. Olhei sobre as janelas de vidro, batucando os dedos na minha perna, não querendo olhar para o semblante diligente de Lizzie.
- Vamos lá, irmãzinha. – pediu. Voltou a recostar sobre a cadeira. Fitei-a.
- E se elas não quiserem? – questionei baixinho. Posso admirar que o problema não estivesse sendo sobre minha vontade; apenas para mim, não para minha irmã ou outra pessoa. Como se não fosse perceptível.
- Posso ligar pra Green e Blue Eyes agora mesmo e perguntar. – disse e se ergueu para pegar seu celular sobre a mesa. Sobressaltei da cadeira, levantando o braço para que ela não cumprisse o que havia dito.
- Não! Não... Eu... Eu... – murmurei. Eu o que? – Vou resolver isso, só me dê um tempo para pensar. – pedi e Liz balançou a cabeça em afirmação.
- Peez realmente disse que deixaria o caminho livre se quisesse? – questionou com a cabeça levemente pendida para o lado, como se pensasse em algo. Assenti – Considero o que mencionei. – pediu.
-.º.-
O estádio Tigers INC estava lotado para a partida importante da liga. Foi difícil achar uma vaga no estacionamento, pois o mesmo estava abarrotado de carros por todas as extremidades. Saiam pessoas de todos os cantos em direção ao grande estádio, muitos com a cor azul escuro e azul claro junto ao branco do time da casa, os Tigers. Outros com camisetas brancas de listras pretas, dos NY Yankees. Essa última fazia parte do meu vestuário. O time no qual aprendi a torcer na minha estadia em Nova York.
De fato não sou apegada em jogos de baseball, porém seguia sendo um bom entretenimento nas horas de lazer. Mesmo nascendo em Detroit, minha vida praticamente todo é Nova York e passei a considerar os Yankees como meu time.
Levando em consideração quem estava ao meu lado, este lazer será outro patamar.
Hope estava parada próxima às escadas para entrar no estádio, esperando por mim. Diferente da maioria em massa que ia assistir ao jogo, ela não vestia camiseta de nenhum dos times. Constatar isso me fez sorrir com a percepção de que ela nem ao menos se importava em assistir ao jogo, mencionou o convite apenas pela companhia.
- Isso é felicidade em me ver? – perguntou com uma pitada de divertimento pelo meu sorriso em sua direção. Neguei com a cabeça e me contive em um semblante neutro. Aproximei-me dela, que estava em um dos degraus da escada, então batia na minha estatura, sendo que sou alguns centímetros mais alta que ela. Encostei uma das mãos no corrimão.
- Vamos. – falei apontando para dentro do grande prédio esférico, ela me olhou com o cenho em vinco com confusão.
- E a Park? – Hope questionou prontamente. Desviei meus olhos de sua direção, olhando para o topo das escadas.
- Ou ela já entrou ou está atrasada. – voltei a fitar a artista, explanando um sorriso de ironia na sua direção. Ela me olhou e soltou uma risada baixinha.
Penelope podia ser extremamente imprevisível com horários, preocupava-me quando estava atrasada pelas memórias lastimosas de eventos anteriores. No mais, estava acostumada com sua imprevisibilidade.
- Liga para ela. – disse simples, olhando para mim e mordendo levemente o lábio inferior. Inferno de mulher.
- Por que não faz? – questionei olhando-a nos olhos azuis, desafiando – Sei que tem o número dela – disse tentando soar zangada pelo fato de que ela tinha meu número sem que eu desse para ela, não que funcionasse. Seus sorrisos provocativos e rosto angelical, maldito lobo em pele de cordeiro.
- Sim, Liz me passou o das duas. – balançou os ombros, indiferente, me encarando de um jeito estranho. Que definitivamente me fez sentir bem.
- Minha irmã me apunhala pelas costas. – rebati embicando os lábios para então desviar os olhos do de Hope. A ouvi rir e segurei a vontade de imitar sua atitude.
- Se sente traída por sua irmã passar seu número para uma garota linda como eu? – sua voz doce parecia até ingênua, bom, apenas parecia, pois o teor de suas palavras fez com minhas bochechas esquentassem consideravelmente, abri a boca sem saber exatamente o que falar.
- Entendeu... Você entendeu! – murmurei resignada.
- Ei! – senti um par de mãos sobre meus ombros e sobressaltei de susto, logo pude sentir o aroma suave familiar – Quem é linda? As duas são? Porque as duas são. – disse estranhamente animada. Os pensamentos em minha cabeça viajaram para um cenário desagradável.
Virei a cabeça para poder analisar minha ex-namorada detalhadamente e quase suspirei de alívio quando percebi que ela estava bem e sã, e com um sorriso lindo nos lábios cobertos por uma fina camada de brilho. Oh, tão linda.
Uma câmera em minhas mãos nesse exato momento para registrar as duas beldades cairia muito bem.
- Pelo amor de Deus, Penelope. Pare de chegar assim. – reclamei pelo susto fazendo com que ela risse.
- Senhorita Park, está atrasada. – Hope disse com tom falso de severidade, fazendo a musicista elevar as sobrancelhas em um desafio velado.
- O que? – pegou seu telefone no bolso detrás da calça – São exatamente 18hrs. – mostrou a tele do aparelho para a Hope, que desta vez foi ela a erguer as sobrancelhas em provocação.
As duas possuíam alturas semelhantes, e por Penelope estar do meu lado, Hope ficou um pouco mais elevada que ela, fazendo a mesma erguer um pouco pra cima a cabeça para poder fita-la. E inferno, poderia passar o dia inteiro observando elas se encararam nessa atmosfera provocatória.
- Fofo sua pontualidade. – Hope diz após um tempo de silêncio – Mas o jogo começa essa hora, devemos entrar antes. Achei até mesmo que viriam juntas. – disse, intercalando os olhas entre mim e minha ex-namorada.
- O que...? Por quê? – questionei com uma pitada de nervosismo. O que diabos...?
- Sabe, são próximas... – deu de ombros, um sútil bico nos lábios.
- Como? – exasperei baixinho. Olhei para Penelope, que fitava o corrimão das escadas com falso interesse e voltei minha atenção para a ruiva.
- Qual é... Vocês já namoraram. – falou óbvia. Maravilha. E nem sei como me sinto pela garota na minha frente saber que já tive um relacionamento com a garota no meu lado. Estranho? Com certeza.
- E como sabe disso? Ah! Claro. Elizabeth Saltzman, aquela maldita CEO não sabe quando calar a boca. – murmurei desgosta. Tudo bem, estou apenas entre boas amigas e está tudo bem. Hope fitou de Penelope para mim e mordeu o lábio inferior, parecia ponderar algo. A mulher do meu lado deu de ombros e Hope fixou seus olhos azuis em mim.
- Na verdade... Uhum... Foi ela. – apontou com o queixo para a morena de olhos verdes. Deixei a mandíbula despencar com a surpresa que não deveria ter me surpreendido.
- Penelope! – repreendi. Inferno, como eu deveria agir com essa maldita interação. Bati de leve com a mão em seu ombro, a mesma olhou para mim e exibiu um sorriso suave. Revirei os olhos com sua atitude.
Uma atitude espontânea, sempre que minha ex-namorada agia de forma irritante para comigo, eu a repreendia, ela sorria, eu sorria, e na época que estávamos juntas, às vezes terminava numa cama, ou o lugar mais próximo e adequado.
- Qual é Jojo. É apenas Hope... – colocou uma de suas mãos sobre o ombro da garota de Nova Orleans – Uma aspirante à artista. – com a outra mão livre, Penelope apontou para Hope que lhe lançou um falso olhar de indignação – Sente vergonha por ter namorado alguém como eu? – questionou. Certo, demorei alguns segundos para distinguir se era uma pergunta séria ou o clima brincalhão ainda pendurava. Resolvi seguir pelo caminho seguro.
- Não. – explanei firme. Não queria que de alguma forma ela achasse que havia arrependimentos da minha parte pelo nosso relacionamento – Só não gosto que divulguem minha vida pessoal assim... – expliquei, intercalando entre os olhos verdes e azuis das mulheres presentes na minha frente – Não tenho vergonha do que tivemos. – afirmei com afinco.
- Do que se referem quando diz “alguém como você”? – Hope perguntou curiosa. Ela olhou para mim, depois focou em Penelope, o interesse estampado em seu semblante.
- É... – Pen pôs uma das mãos na nuca, olhando de viés para a ruiva, torceu os lábios sem saber como responderia. Oras, sobre isso especificamente minha adorável ex-namorada ainda não contou para a garota nova.
- Tudo bem se não quiser falar. – a artista gesticulou com a mão, garantindo que poderiam encerrar o assunto agora mesmo, pois não havia problemas.
- Não... Nós nos conhecemos o suficiente e se ainda está ao meu lado merece saber. – Penelope falou, o tom ameno e quase acanhado fez com que olhasse para ela com adoração, Hope deve ter notado o quão complicado é a questão para ela, pois a fitava da mesma forma que eu – É que... Jojo, pode explicar para ela, por favor. – me encarou, quase em desespero. Assenti e esbocei o melhor sorriso reconfortante que poderia lhe dar.
- Pen tem problemas com bebida, qualquer gota de álcool pode acarretar na perda total de seus limites. – expliquei olhando centrada para Hope.
Tenho grande atração pela mulher de Nova Orleans, e nem tentaria lutar para negar esse fato, não mais. Mas se a mesma fosse inconveniente com algum comentário sobre a dependência da minha ex-namorada, certamente viraria as costas e nunca mais trocaríamos uma palavra.
No fundo, sei que Mikaelson não é assim. A artista ergueu as sobrancelhas em constatação e voltou a olhar para Penelope, que encarava qualquer lugar que não fosse uma de nós.
- Por isso aquele dia no bar recusou o drink com tanta astucia... – murmurou em entendimento – Desculpa ter oferecid.-
- Pare. – a musicista lhe interrompeu – Não precisa se desculpar, você não sabia. – explicou terna, olhando para Hope com suavidade. Sabendo como ela se sentia sobre tal assunto, estava tão aliviada quando eu pela mulher na nossa frente ter compreendido sua dependência química.
-E... Ahm... – a artista começou entre múrmuros – Não sei se chego a ter o direito de perguntar, mas... Está bem? Em relação ao vício. Parece bem, e todas as vezes que conversamos parecia sóbria... Mas... – questionou.
Vi pela primeira vez Hope Mikaelson encabulada e quase pude sorrir com cena. Não foi uma pergunta maldosa, parecia até mesmo realmente apreensiva. Se em um futuro distante, ou não, Pen e ela tiverem um relacionamento, deixarei a mulher de olhos verdes sob excelentes cuidados.
- Estou sim. – Park imediatamente sanou seus receios – Faz um ano que não injeto uma gota de álcool no corpo. Estou bem. – declarou orgulhosa, notei seus olhos de relance sobre mim, para logo se voltarem à ruiva.
- E... Não sei se deveria perguntar... – e novamente Hope aparentava estar envergonhada ao questionar algo.
Secretamente considerei cativante a forma no qual ela tentava evitar direcionar um olhar para nós, mas as duas esferas azuis sempre acabavam intercalando entre mim e minha ex.
- Hope, já está a interrogando. – pontuei com divertimento, fazendo a mesma soltar uma risadinha embaraçada.
- Mande o que for. – Penelope incentivou.
- É em relação a vocês duas, então... – murmurou.
Ela queria saber se terminamos por conta dos problemas da musicista, não era a primeira que perguntava, mas foi a primeira no qual poderia responder sem que a inquietação me consumisse. Depois da aflição causada a mim em Hope saber que namorávamos, e sabendo que ela tem conhecimento sobre algo tão importante, passou a ser um sentimento bom que ela saiba sobre tudo.
- Se terminamos por conta do alcoolismo? – Penelope disse vigente, franzindo meramente as sobrancelhas, o que faz com que fique tão adorável... O timbre afetivo causou na artista um meio sorriso de compreensão – Sim. Foi por causa disso. – murmurou amargurada.
Virei-me para ela, queria dizer que não deveria se sentir assim sobre os acontecimentos, que talvez eu devesse ter tentado mais... Mas Hope voltou ao seu questionamento, e acho que poderia agradecê-la.
- E agora que está sóbria há tanto tempo, vocês pensam em... Uhum... Voltar? – e não, não poderia mais agradecê-la.
Olhei para a morena ao meu lado, sem saber o que diria. Certamente estava parecendo uma adolescente no momento, mas inferno. O que diabos eu diria? Não, não penso em voltarmos. Mas não sei se é exatamente uma verdade absoluta. Inferno, quero te beijar Hope Mikaelson, assim como quero beijar minha ex-namorada. Não sei!
- Não... – a voz suave, quase inaudível de Penelope soou.
Ela estava triste, Hope parecia triste em vê-la assim, e eu fiquei triste por tudo.
- Eu... Que tal irmos ver o jogo? Deve ter iniciado. Certamente já iniciou. Vamos. – atropelei entre palavras que nem ponderei se soaram desconexas ou coesas.
Subimos os degraus para o estádio dos Tigres, e depois engatamos em conversos banais pelo restante do dia. Por enquanto estava tudo bem, e aproveitei por completo a presença agradável das duas, entre risos e assuntos corriqueiros.
-.º.-
5º Ato: Amor não é para fracos.
Passou algumas semanas desde o dia do jogo, e o que minha irmã sugeriu alguns dias antes pairava na minha cabeça á todo momento, chegou ao ponto de atormentar meus sonhos. Reneguei minhas vontades íntimas e botei em prática o que havia combinado com Pen, tomando um tempo longe dela. Foram três domingos sem contado, e ela estava bem, segundo Hope e Lizzie.
Frequentei alguns lugares com Hope durante esses dias, fomos a bares requisitados nas noites de farra de Detroit, nunca no PJ’s Lager House, o bar favorito de Penelope para tocar. Não pisamos no Instituto de Artes também, mesmo Hope querendo ir lá. Passeamos nas margens do lago, foi divertido, ao mesmo tempo parecia faltar algo.
Sempre é ótimo; e sempre parece faltar algo quando estou com Mikaelson. Um vazio simbólico, ele não existe, ainda sim esta presente. Sentimento estranho, pois sinto falta de outra mão segurando a minha; de outro braço em volta da minha cintura; de outra risada nas conversas triviais.
Parece certo. Como se durante toda minha vida inconscientemente estivesse esperando por esses momentos. Poderia negar o quanto quisesse, todavia os fatos estavam na mesa. E Hope também queria mais, queríamos mais. Estava ciente disso. E ninguém deu o primeiro passo por semanas.
Tinha o conhecimento que Mikaelson se encontrava com Penelope também. Ao invés de me incomodar, o conhecimento desse fato me deixava surpreendentemente entusiasmada, um sentimento de expectativa apertando meu peito. Há quem quero enganar? Sorri contra a brisa marítima enquanto dava mais um clique do céu límpido do porto de Riverboat.
-.º.-
Quebrei meu protocolo pessoal e sugeri um encontro entre Penelope, Hope e eu, com muitos incentivos da parte da minha irmã.
E foi a melhor coisa que poderia ter feito.
Ocorreu em um domingo ensolarado, caminhamos nas margens do lago St. Clair, Penelope dessa vez tomou o taco vegano de Hope. Meus discretos gestos comemorativos por não ser a vítima escolhida da fatal musicista foram cortados quando Hope lançou olhares pidões na minha direção, percorrendo do que eu tinha em mãos aos meus olhos. E como sempre, terminei sem tacos. Algumas coisas não mudam.
Seguimos para o Instituto de Artes de Detroit, e Hope ficou maravilhada com os trabalhos dos habitantes locais expostos, com a arquitetura do estabelecimento, um dos patrimônios culturais mais importantes de Michigan; e tudo em relação à arte.
Disse que a cidade é maravilhosa e estenderia sua estadia por mais um tempo. Disse, olhando de mim para Penelope, como se quisesse dizer algo a mais.
“- Quero ficar mais um tempo... Acho que tenho mais o que descobrir em Detroit”
Seu compromisso com o projeto Heidelberg ainda pairava, e logo após o passeio pelo IAD, seguimos para os quarteirões rechaçados de projetos artísticos, a região onde o projeto predominava: esculturas; artesanatos; desenhos de todas as formas; pinturas de todas as técnicas. Hope estava empenhada na escultura de uma guitarra gigante de instrumentos desgasto, e Pen vinha ajudando-a a obter esse material com seus contatos musicais.
Tudo foi registrado pela lente da minha câmera, e logo mais iria diretamente para meus arquivos pessoais. Esses momentos... Esses são os momentos que sei que vou me pegar lembrando quando precisar de algo para acalmar o âmago. É algo incrível. Interagir com elas, ser apenas uma telespectadora entre suas interações. É como uma bela amizade... Mas existe mais. Um mais oculto.
Não poderia ter seguido uma decisão mais satisfatória. Senti... Viva.
-.º.-
Saímos algumas vezes. Nunca deixa de ser divertido. A companhia aquecia meu coração de uma maneira, no mínimo, diferente.
Hope é uma presença agradável, sempre aparecia com fatos históricos aleatórios no qual não tinha o mínimo interesse, mas gostava de vê-la falar sobre; uma amante nata da arte como um todo, sempre atenta nas novidades do cinema, amava contemplar uma exposição, e uma boa música. Esse último posso me identificar pessoalmente, pois amava ver Penelope cantar.
Minha ex-namorada é a mesma garota que conheci cinco anos atrás. Intensa e divertida, equilibrando majestosamente os elementos em uma personalidade única. E sua dependência química não retornou a ser um problema dentro do que estávamos criando, novamente, apenas com um delicioso acréscimo.
Amo minha interação com ambas, assim como amo quando elas interagiam. Penelope tinha um hobbi: o de atormentar incansavelmente Hope. A artista é levada a altos níveis de perturbação pelas mãos da musicista, ao ponto de revidar; descobri que a Mikaelson gostava de abraçar, e Park gosta de ser abraçada. E a cena sempre aquece meu coração a um ponto colossal.
E, talvez, eu esteja me apaixonando por elas. E isso é assustador. Apenas o pensamento acelera drasticamente minhas palpitações, o ar chega a me faltar com a realização dos fatos. Estávamos criando algo, algo bom, algo grande, e estou morrendo de medo das milhares de formas com o que estamos criando acabar em lágrimas de dor.
E o frio na barriga, expectativa e o sorriso espontânea que surgia sempre que pensava nelas. Há tempos queria que fossemos para um próxima etapa, até agora sequer beijei uma das duas, o mesmo acontecia entre elas. Lizzie disse que amar é um ato de revolução, seja no mundo ou dentro de nós. Amor bem amado muda os paradigmas e concepções sobre a vida.
Oras, talvez esteja na hora de mudarmos alguns paradigmas e concepções.
...
Nós três estávamos sentadas embaixo do pé da escultura River Walk, a musicista e a artista ambas ao meu lado. É algo delas, quando estávamos juntas, sentarem cada uma ao meu lado, e eu amo isso. Hope esta lendo um livro, Penelope esta com um lado do fone no ouvido escutando música, e eu analisando as fotos na máquina em minhas mãos.
Ninguém estava realmente fazendo essas coisas. Eram besteiras naquele momento especifico.
Hope passava os olhos pelas palavras, sem sequer processar o que as mesmas significavam, foleava as páginas como se folheasse uma revista odontológica. Penelope respirava pesadamente, a música extremamente baixa, ecoando sem sentido pelos fones. A câmera em minhas mãos, com fotos de um trabalho recente, simplesmente não fazia o mínimo sentido.
A frase da garota de Nova Orleans rondando minha mente, e pelo estado da morena no meu outro lado, a de Penelope também.
“- eu quero beijar vocês.”
...
-.º.-
“Elwood Bar. Hoje de noite. Dica: Use roupas confortáveis, pretendo dançar muito com você.”
Reli a mensagem de Hope com um sorriso contido nos lábios. Mikaelson é uma dançarina fenomenal, uma ótima parceria em qualquer ritmo, enquanto Park parecia ter dois pés esquerdos e descontava tudo no vocal. Não era um problema de fato, gosto de dançar, e ela havia desistido de tentar. Em contrapartida, na época que estivemos juntas, Penelope foi sensacional no sexo. Sobre Hope não tinha uma opinião sobre esse quesito, mas... Inferno, devaneios impróprios. Retroceder.
“Sou quente, mas não sirvo pra vela, apenas dizendo...”
Li a mensagem seguida, essa de Penelope, e gargalhei com o que havia escrito.
“Espero vocês lá.”
Respondi no grupo. Larguei o celular na sala do estúdio, ponderei alguns segundos e peguei o celular de volta. Abri o bate-papo e as duas estavam em alguma brincadeira boba de emoji. Ri com isso.
“Mikaelson e Park, se comportam hoje.”
Escrevi apressada e repousei o celular definitivamente, seguindo para o meu trabalho.
Desde o momento em que o assunto “beijo” surgiu, mãos bobas e troca de olhares lascivos se intensificaram deliciosamente. A áurea sexual de que ambas emanavam estava me atormentando em noites solitárias.
É assustador o quanto as quero, em todos os sentidos possíveis. Extremamente assustador. Parece um compilado de filmes de terror, só que reais. Sem roteiro, sem efeitos especiais; medonho. Todavia, com a beleza de um romance em desenvolvimento. O magnetismo de uma ficção fantasiosa.
Acho que estou caindo. Um filme de ação, e a protagonista acabou de pular de um avião sem paraquedas.
E não, eu não queria que elas se comportassem. As quero energéticas, com as habituas disputas tolas entre si, que elas torçam os olhos com a presença de um desconhecido perto de mim, no qual sei perfeitamente que estão sentindo ciúmes, e isso me faz sentir extremamente desejada. Quero que disputem minha atenção de brincadeira, pois adorava ter atenção completa das duas sobre mim. É um pouco mesquinho da minha parte, e assumo. Mas não nego o quanto adorava tê-las apenas para mim.
-.º.-
Abri a porta de vidro do bar lentamente, deparando com a iluminação escassa na região do palco, da pista, e do bar, em contraste as leds coloridas acessas proporcionando o clima festivel que a noite requeria. Procurei por elas e consegui captar as duas sentadas no banco do bar. Como da primeira vez. Sorri.
Aproximei-me e prendi o lábio inferior para conter o sorriso ao vê-las, notando que ambas estavam apenas com uma garrafinha de água mineral na mão, foi inevitável meu contentamento. Não ingerimos absolutamente nada alcoólico quando saímos com Penelope. A musicista negou, refutou e recusou nossa atitude de várias formas diferentes, mas eu e a ruiva estávamos determinadas em fazê-lo, tanto que agora a garota de cabelos negros sequer contesta.
Quebrei o pouco de espaço que tinha entre nós para alcançá-las, mas fui impedida no caminho com uma cena que fez meu coração se contorcer em afeto; Penelope estava com a mão sobre a de Hope, sorrindo docilmente para a artista, que em troca lhe dava um sorriso caloroso.
Foi difícil me desprender da cena. Lamentei com desgosto não estar com minha câmera em mãos, para enfim anunciar minha presença, mesmo sabendo que poderia passar horas a fio observando-as.
- Meninas. – chamei, e imediatamente se viraram para me ver, ainda com lábios curvados em sorrisos apaziguadores.
A iluminação estava precária, mas apenas queria minha câmera comigo para capturar a cena das duas me olhando daquele jeito. Eu sei, já havia eternizado muitos momentos com as duas, e das duas, apenas desejava mais, muito mais. Fui recebida fisicamente por dois beijos, um em cada bochecha ao mesmo tempo e me juntei a elas nas bancadas do bar, que abriram espaço para que eu me sentasse no meio delas.
- Hope quer nos pintar. – Penelope disse, olhei para ela confusa – Não nos pintar, pintar nós. Como suas fotos. – explicou, o canto dos seus lábios curvando para cima querendo liberar um sorriso animado. Ouvi uma risadinha de Mikaelson ao meu lado e olhei para ela com a sobrancelha direita erguida.
- Isso. Se quiser Jo, adoraria fazer uma pintura de vocês. – disse a ruiva – Pen aceitou. – sorriu contente.
Claro que Penelope havia aceitado, a mulher é uma exibicionista que sabe que é uma obra de arte. É apenas uma pintura, com as garotas que eu gosto. Não há nada de errado, não tive problemas em concordar. Não é como se Hope não tivesse desenhado nós antes.
Passamos bons minutos apenas conversando sobre banalidades. Hope também contou como estava sendo sua experiência com o projeto Heidelberg, em como a visibilidade que a edição Nº 54 da SaltzMagazine impulsionou os rumos do projeto, que se expandia além das fronteiras de Detroit.
E Liz conseguiu, a edição foi um absoluto sucesso. A filial em Nova Iorque vai sair do papel, e minha irmã assumirá apenas como CEO da empresa, pelo menos até que Pedro tenha mais idade para não perder muito da vida do meu sobrinho. E provavelmente se mudará para Nova Iorque quando tudo estiver pronto.
Penelope foi demitida do antigo emprego, e está trabalhando como garçonete em um restaurante italiano. A facilidade no qual a morena trocava de emprego chagava a ser espantosa, embora compreensível. Desejava com todo meu coração que ela realizasse seus sonhos profissionais, e odiava o fato de que parecia que ela tinha desistido de lutar por suas realizações. Da mesma forma que me senti quando ela não fez nada além de aceitar o fim do nosso relacionamento.
As músicas ressoando nas caixas de som se encerraram, e o DJ da noite anunciou que assumiria. Hope olhou para mim com os olhos brilhosos e assenti, sabendo exatamente o que a ruiva queria. Antes de sair com a artista, olhei para Pen, que nos fitava com um sorriso enorme no rosto. Mandei um beijo no ar para ela, a mesma fingiu pegar e guardar no coração, logo piscando para mim. Sorri e deixei com que a garota de Nova Orleans me guiasse até a pista de dança, próximo o suficiente de onde Penelope estava.
Não esconderia que estava com medo de alguém aleatório ter a brilhante ideia de ir flertar com ela, uma mulher linda sentada sozinha. Definitivamente qualquer um teria este direito, ela estava solteira... Ainda... Apenas... Queria ficar atenta, e Hope pareceu ter o mesmo raciocínio que eu, pois até mesmo passou os braços pela minha cintura e me trouxe um pouco mais perto da musicista. Ótimo, melhor assim.
Aproveitei duas músicas com a ruiva colada em mim. Sinceramente nem prestei atenção na música, pude distinguir duas sonoridades distintas, o que supus serem duas músicas diferentes.
Estava completamente inebriada pela presença de Hope tão próxima a mim. Vez ou outro virava em direção a Pen, para certificar que tinha sua atenção, e a tinha. Joguei minhas costas contra o peito de Hope, que vagava os dedos pela minha cintura, atravessando por toda extensão da minha barriga, e repetindo esse processo. Mordi levemente o lábio inferior, sentido calafrios nos lugares onde seus dedos vagavam.
Quando vi um grupo de pessoas próximos de Pen não dei muita atenção. Apenas depois de um tempo, quando abruptamente Penelope se levantou e socou o rosto de um dos caras, que o pavor se assolou de mim. E Hope notou também.
Fomos apressadas até onde a morena estava, desviando de alguns corpos dançantes, a vi desferindo um segundo soco no rosto do mesmo cara, um terceiro ato foi interrompido quando duas das garotas do grupo interferiram, uma delas desferiu um tapa na cara de Pen, foi tempo o suficiente para que Hope empurrasse a mulher que ousou agredir nossa garota. Fiquei estagnada no lugar, sem saber o que diabos iria fazer. Inferno, as duas estavam brigando.
A briga tomou a atenção de boa parte do bar, e o homem que Penelope havia socado estava parado um pouco longe, rindo com dois outros caras e apontando para as quatro garotas zangadas. Certo, ele havia se esquecido de uma quinta, muito irada, e se Pen havia socado esse imbecil, sem dúvidas foi embasado em fortes motivos. Aproximei do homem e não poupei força na hora de espalmar a mão na sua face, o que o fez virar a cabeça para o lado.
-.º.-
- A noite foi ótima né. – quem disse foi Hope após alguns segundos de silêncio entre nós três.
- Maravilhosa. – rebati em ironia. Estávamos paradas na calçada frente ao bar no qual fomos expulsas pelos seguranças há pouco tempo.
- Minha boca está doendo. – Penelope se pronunciou, alisando a mandíbula com mão. Revirei os olhos e me aproximei dela, tirei sua mão e coloquei a minha no lugar, analisando seu rosto. Um corte na lateral do lábio inferior, parecia um pouco inchado e nada mais.
- O que diabos deu em você? – perguntei exigente, olhando para os esverdeados de seus olhos, que baixou a visão para o chão de concreto. – Em vocês! – exclamei, olhando de relance para Hope, estagnada ao nosso lado.
- Aquele otário estava fazendo comentários nojentos sobre vocês. – disse baixinho e olhou para a artista, e voltou a me fitar. Neguei sutilmente com a cabeça e suspirei pesadamente.
- E você, Mikaelson. Ao invés de parar a briga, apenas agravou. – disse e maneei a cabeça para o lado, lançando meu melhor olhar de seriedade à ruiva. Babacas como aquele homem não mereciam atenção, muito menos ser o motivo de ferimento nos rostos delas.
- Desculpa...? – não é um pedido de perdão da ruiva, a expressão indiferente em seu rosto contrariava completamente suas palavras – Vi encostarem em Pen e reagi. – deu de ombros. Olhei para ela, também tinha uma pequena sobreposição no lábio inferior, certamente inchado. Passei os dedos gentilmente pela região, para logo retirar e soltar um longo suspiro.
- Vamos para meu apartamento. – disse – Lá eu cuido... – pausei – Disso. – apontei para o rosto machucado das duas. Soltei o ar pesadamente e caminhei até o estacionamento na lateral do bar, sabendo que as duas me seguiam. A noite definitivamente não terminou como eu esperava.
-.º.-
Durante toda minha vida tive que ser a voz da razão, a pessoa sensata. Liz agia completamente ao oposto, não que a loira fosse imprudente, mas minha irmã tomava atitudes de momento. Era de praxe estar ao seu lado quando tomasse alguma decisão errada, mesma que a maioria fosse certa.
*Play: Fun feat. Janelle Monáe: We Are Young*
E agora tinha as duas garotas que eu gosto, sentadas no sofá do meu apartamento, imóveis e com cara de cãezinhos abandonados que me faz querer rir de suas expressões. Peguei uma pomada analgesia para passar onde havia as machucado, e me aproximei das duas, me sentando na mesinha próxima ao sofá.
Semicerrei os olhos, intercalando o olhar entre Hope e Penelope, que desviavam para qualquer canto quando eu as olhava. Não me aguentei com o padecimento das duas e soltei uma gargalhada. Recompus-me a tempo o suficiente para assistir ambas se fitarem com receio e depois virarem na minha direção com desconfiança.
- Não está brava com a gente? – a ruiva perguntou baixinho, me analisando de viés.
- Claro que não. – disse simples e sorri, peguei a pomada e sentei mais próximo da borda da mesinha para poder encurtar a distância até elas.
Cheguei até Penelope primeiro, o filete de sangue que havia saído por seu lábio inferior já estava seco, então apenas passei a pomada no canto da sua boca, com o máximo de cautela possível. Virei a cabeça para Hope e a vi nos encarando concentrada. Torci o tronco em sentido da artista, analisei onde estava inchado e passei com cuidado a pomada incolor na região.
Os olhos da artista estavam presos nos meus próprios lábios, e me esforcei como pude em ignorar esse fato. Cheguei a desviar os olhos, mas quando vi de relance Penelope na mesma situação, meu corpo tremeu em saber que estava sendo o foco da atenção das duas mulheres malditamente próximo de mim.
Terminei o trabalho e me ergui para largar a pomada no sofá ao lado, o momento em que voltei à posição original as palpitações por todo me corpo surgiram, os batimentos aceleraram e uma pulsação familiar no meio das pernas deu o ar da graça.
Hope esta com os lábios colados do de Penelope, e demorou segundos para que sentisse a mão de ambas grudadas na minha cintura. Pude contemplar a boca da ruiva se movendo vagarosamente sobre a musicista, o ritmo gradualmente foi aumentando ao ponto de me proporcionar o privilégio de ver a língua de ambas procurando espaço na boca uma da outra.
A quebra de contato vem com um ofego, os olhos de ambas misturando excitação e receio, a boca semiaberta e o ar de expectativa que direcionaram para mim foi tudo que notei antes de sentir Hope avançar na minha direção e colar nossas bocas, a princípio um contato puro, e sem interferência da minha parte, ela moveu preguiçosamente em busca de desfrutar do ato. Quando senti sua língua úmida em contato com a minha, soltei um gemido de satisfação.
Deveria pendurar por mais tempo, mas a necessidade por ar nos atingiu, infelizmente. Não consegui abri os olhos quando o beijo se encerrou, o tempo apenas para preencher meus pulmões, e antes que eu o fizesse, minha boca foi pressionada por um par de lábios carnudos, esses conhecidos de antigos carnavais. Penelope apenas jogou contra minha boca e permaneceu, partiu de mim me mover para aprofundarmos em algo mais carnal, e fui a primeira a desbravar o interior da sua boca, desfrutando com clamor dos saborosos lábios da cantora.
Afastemo-nos quando foi preciso, e a partir daí não tive coragem de abrir os olhos.
Acabei de beijar Hope, e Penelope. E elas se beijaram. Que não seja um sonho... Que não seja um sonho...
Levantei as pálpebras lentamente, quando tive visão o suficiente e não obtive a imagem das duas mulheres na minha frente, a decepção que senti com certeza não poderia ser mensurada. Meus sentidos avoados atormentando minha cabeça.
Impulsionei para levantar no intuito de jogar uma água na cara e sofrer com meus desejos intrínsecos, e duas mãos quentes sobre meus braços fizeram com que eu pulasse no lugar com o contato repentino. Olhei para meus lados, vendo a artista e a musicista sentada nas pontas extremas da pequena mesinha. Arregalei os olhos com a constatação de que foi real.
Não vi o momento em que elas se moveram, mas agora as duas me olham com expectativa. Hope com as sobrancelhas erguidas, respiração pesada pelos lábios parcialmente abertos, a coloração avermelhada como prova explicita de que fizemos. Penelope estava com as maças do rosto rosadas, e mordia suavemente os lábios que anteriormente estavam grudados nos meus e parecia ter se esquecido do baque que sofrera no local anteriormente.
Não foi um sonho.
“Então vamos deixar o mundo em chamas.
Nós podemos queimar mais brilhante que sol.”
- Não foi um sonho... – as palavras saíram involuntariamente, nem consegui me escutar dizendo e passaria despercebido caso a risada doce da ruiva a minha esquerda não soasse.
- Não foi. – Hope confirmou. Sua mão atravessou minha visão e chegou até a de Penelope, que repousava sobre sua própria perna. A artista trousse a mão de Pen, e deixou com que a mesma ficasse sobre a minha perna, logo a ruiva deixou sua própria mão em cima da garota de olhos verdes, acariciando gentilmente a mão de Pen. A ruiva foi descendo para o interior da minha coxa, levando a mão de Park consigo. Todo o movimento sendo acompanhado minuciosamente por mim.
- Jojo, eu... – Penelope murmurou a minha direita, a voz coberta de incertezas. Ela puxou sua mão do meio entre a minha perna e os dedos de Hope, mas a mulher de Nova Orleans interferiu seu movimento, entrelaçando seus dedos nos dela.
- Eu amei beijar vocês. – desviei os olhos de Pen e encarei Hope, que intercalava os olhos entre mim e a musicista. Ela estava serena, a expressão suave e despreocupada automaticamente me acalmou, e com a mão de Penelope novamente sobre o tecido da minha calça relaxando imediatamente após a declaração da artista, surtiu efeito nela, igual a mim.
- Estou com medo... – a voz em sussurro vem no meu lado oposto, o tom sincero, a entrega com o qual foi dito fez com que meu lado protetor despertasse. Passei meu braço sobre os ombros de Penelope, trazendo a mulher até mim, a mesma repousou a cabeça no meu ombro e suspirou.
Hope se aproximou ainda mais de mim, encurtando os talvez dez centímetros de distância de seu rosto do meu. Ela depositou um selinho na minha boca e sorriu genuinamente, uma de suas mãos envolveu minha cintura, enquanto a outra tocou com gentileza no rosto da cantora, Penelope saltou com o gesto repentino, e suavizou no lugar quando a artista aproximou dos seus lábios para um beijo casto.
A mulher dos cabelos avermelhados se afastou alguns centímetros e retirou do caminho algumas mechas negras para poder olhar nos olhos verdes sem barreiras.
- Do que você tem medo? – Mikaelson questionou, focada em Penelope, com a mão ternamente em seu rosto.
- De machucar vocês. – disse em um sussurro. Hope exibiu um sorriso suave para ela.
- Compartilhamos do mesmo medo então. – a ruiva falou sincera. O jeito que ela falou parecia simples, como uma frase casual dita em um momento qualquer. Mas soube que havia mais, sempre houve mais. Ela se virou para me olhar, com o mesmo sorriso doce que distribuía à Pen. – Tenho sentimentos pelas duas. Sei que parece anormal, mas aprecio a companhia das duas, da mesma forma.
- Eu... – murmurei na busca de formular frases concretas que soassem entendíveis – E-eu gosto... Gosto de você Hope. – me virei para a morena na minha direita – Como sempre gostei de você. – os olhos verdes brilharam em contemplação, como brilhou no nosso primeiro beijo, e sorri com a imagem.
Não foi um erro. E não é estranho. Seguir os conselhos de Lizzie não foi um erro. Beijar Hope não foi um erro. Beijar Penelope não foi um erro. Nem é estranho. Minha vida seguia um curso seguro, o emprego dos meus sonhos e a presença segura da minha família me deu a garantia da zona do conforto, a sensação de que não precisava me arriscar para conquistar mais nada.
Mas, para amar precisei mais do que isso, para amar – duas mulheres – precisava de coragem. Realmente, uma revolução interior, que começo há cinco anos e parecia ter atingido o ápice naquele momento.
Para amar é fundamental coragem. Ninguém quer entregar sua parte mais vulnerável para alguém, sequer para duas pessoas, de livre e espontânea vontade. O coração, metaforicamente falando. E o caminho que aquela noite seguiu, indiferente a todas as consequências, não foi um erro. Senti indestrutível no momento que passei por cima de todos os meus medos e me permiti ceder ao amor. Deixei com que me amassem intimamente, e as amei.
E como as amei. Com dedos, língua, ofegos e prazer.
“Eu não tenho razão para fugir”
-.º.-
Despertei na manhã seguinte sobre um relevo macio. Ainda com os olhos fechados, me aconcheguei onde estava, fui recepcionada pelo aroma suave, e algo mais pairava no ar. Virei a cabeça pressionando o nariz contra o plano, sorri contra a pele macia em baixo de mim. Mordi com delicadeza a área, recebendo de volta um gemido da mulher sonolenta.
Levantei minha mão, repousando sobre a cintura desnuda da ruiva, percorri os dedos pela pele alva e pairei no seu seio livre de qualquer pano, ainda com os olhos fechados, massageei a região, a princípio apenas apertando suavemente o pedaço de carne, aprofundei em carícias mais intensas ao mover o punho em círculos enquanto aplicava pressão no seio direito de Hope, que após segundos dos meus afagos, soltou um gemido audível.
O som prazeroso aparentemente despertou a mulher atrás de mim, que desceu os braços ainda mais, envolvendo meu quadril em seu corpo. Penelope não fez mais nada além daquele movimento, e tive que agir. Enquanto acariciava a artista, rebolei sutilmente contra a musicista com o corpo colado ao meu, igualmente desprovido de roupa.
- Não faça isso... – a mulher dos olhos verdes resmungou, acariciando a região do meu ventre, a boca contra minha nuca embaralhada pelos fios do meu cabelo.
- Ela acordou me mordendo. – a voz da ruiva parcialmente em baixo de mim soou, ela tentou soar séria. – Será que devo me preocupar em contrair raiva, Pen? – questionou diretamente para a mulher atrás de mim, que riu contra a minha nuca e se aconchegou ainda mais em mim.
- Uhm... – Penelope murmurou fingindo pensar – Não quero te alarmar nem nada do tipo, mas... – disse sugestiva – Garota, procure um médico. – o peito de Hope subiu e desceu com a gargalhada que deu, e sorri contra a pele da ruiva pela brincadeira delas.
- Vocês são más comigo. – resmunguei.
- Te fizemos gozar tantas vezes, como podemos ser más com você? – o tom indiferente de Mikaelson me fez levantar o tronco da cama, e sentar em direção as duas mulheres, no qual fiz questão de expressar toda minha indignação.
- Ei. – exclamei e espalmei minha mão na coxa desnuda da ruiva que estava fora do lençol branco da minha cama. A mulher se ergueu na cama também, e se aproximou de mim, na intenção de que seus lábios tocassem os meus, antes de concretiza-lo, a empurrei pelos ombros para que voltasse, a mesma caiu no colchão com um sorriso de presunção.
- Só um beijinho Jo. – Hope resmungou. Penelope no outro lado riu, correndo com uma das mãos para o abdômen da garota de olhos azuis.
A musicista se ergueu minimamente na cama e se aproximou da artista, seguindo diretamente para os lábios da ruiva, pressionou-os com delicadeza, e não tardou em elevarem para um contato apurado, está nítido que ambas disputam pelo controle e domínio sobre o beijo.
O ar de ímpeto parecia jatos de fogo. Estava quente em demasiado a forma que as duas exploravam as bocas mutuamente, e descer a mão pelo lençol que me cobria da cintura para baixo foi inevitável. Estremeci quando meus dedos atingiram meu ponto pulsante, já úmido apenas com a imagem captada. As malditas souberam, sei que souberam assim que sorriram maliciosamente com as bocas praticamente coladas, e voltaram para o beijo.
Um beijo completamente erótico, pareciam comer a boca uma da outra e afundei dois dedos dentro de mim, buscando conforto com a cena excitante na minha frente. Com o polegar massageei o clitóris enquanto pressionava meus dedos contra meu interior, e movia os quadris contra os meus dedos. As duas me olharam de esguelha e continuaram comendo a boca uma da outra, e inferno, aprofundei os movimentos, sentindo uma sensação turbulenta se formando, estava perto. Muito perto.
Aprofundei os dois dedos dentro de mim e adicionei a outra mão na pressão furiosa contra meu ponto esponjoso de prazer. Não consegui mais prestar atenção nas duas beldades se insinuando pra me provocar, apenas fechei os olhos e deixei meus gemidos falarem por mim. Estava quase lá... Quase lá...
Fui interrompida com as duas mãos sobre meus pulsos, abri os olhos em desespero com minhas mãos sendo afastadas da minha vagina. Penelope e Hope estavam de joelhos na minha frente, assim como eu. Os olhos azuis e verdes, respectivamente, pareciam quase escuros. Elas afastaram minhas mãos do meu centro, e meus resmungos de protesto não surtiram efeito.
Penelope afundou os dois dedos que estavam dentro de mim na sua boca, chupando-as calmamente. Hope repetiu o ato, desfrutando da outra mão no qual me acariciava. Inferno, minha vagina pulsava contra o nada, tão desesperada quanto eu para ter sua libertação.
As duas se entreolharam, se viram para mim e sorriram com malícia. Após isso, Hope me puxou para cama, me deitando na mesma, subiu sobre meu peito, com as pernas envolta do meu corpo e uma visão exclusiva de sua vagina encharcada. E Penelope abriu minhas pernas e se acomodou entre elas, instigando toques sutis entre meus lábios de baixo, ocasionalmente barrando no meu clitóris.
E me deram muito mais orgasmos.
6º Ato: Alguns monstrinhos surgem...
Assumimos um relacionamento trilateral. Há um tempo, estamos juntas. E não poderia estar mais feliz. Beirava a não soar como real, eu as tinhas. Contei a minha irmã e minha mãe e ambas me apoiaram no meu relacionamento com ambas, Lizzie até de uma forma demasiada, protetora como sempre, todavia contente.
Hope alugou um loft na downtown de Detroit, o designer semelhante a um galpão passa despercebido nas paredes de tijolos claros, a mobília clen, mesclando o branco com algumas cores suaves de destaque; como o verde das plantas que Penelope adora; as almofadas indianas que eu colecionava; ou até mesmos os quadros autorais de Hope – inclusive um de mim e Penelope – reviviam o local e reivindicavam seu status de lar.
Ao adentrar na porta, na mesma parede, com duas grandes janelas de vidro em cada lado, a sala de estar, e no canto oposto, a cozinha. No meio, escadas de madeira que levavam ao – quarto – com a cama king size no centro. Passamos a compartilhar as despesas e vivemos juntas.
Ouvi múrmuros no andar de baixo, cochichos aparentemente zangados. Vesti meu short e uma regata, pronta, desci as escadas e virei à procura da fonte de barulho. Encontrei Hope e Pen, na cozinha, com o balcão no meio do caloroso debate em uma visível discussão. Estranhei, elas não tinham o hábito de se desentenderam por nada que não fosse quem conseguia me irritar mais.
Aproximei cautelosa delas, rezando internamente para que não me pressionassem em tomar partido para o lado de uma das duas. Tínhamos um esquema pronto: brigas por bobagem entre duas de nós possuíamos o direito de exigir da terceira parte uma posição. Em uma possível briga séria, deveríamos reagir com maturidade.
- Josie – Hope foi a primeira a notar minha presença, maneando a cabeça para que eu me aproximasse – Ainda bem que você está aqui. – exasperou – Diga a essa garot.– sua fala foi interrompida.
- Não, não! – interferiu Penelope, espalmando a mão no balcão – Diga a.– e outra que foi interrompida.
- Cale-se, você não tem o direito de se pronunciar. – rebateu Mikaelson, também espalmando as mãos no balcão, próximo a Pen. Ótimo, estou fodida. – Diga a está pessoa – apontou para a morena de olhos esverdeados, aproximou o indicador ao ponto de bater levemente no ombro de Pen – Que ela é mais bonita que eu. – disse simples.
- Não! Josie, diga a Hope que ela é mais bonita que eu. – rebateu Penelope, olhando-me com aflição.
Se olhassem pra mim agora, provavelmente veriam a famosa cara de poker, aflita por uma calorosa discussão entre ambas, e as mesmas discutindo bobagens. Literalmente! Deveria ter me acostumado? Deveria. Mas não me adaptei ainda a essa montanha-russa que é estar em um relacionamento com Penelope Park e Hope Mikaelson, apesar dos meses que se passaram desde que estamos unidas.
- Cale a boca Park. – exasperou Hope – Da Vinci não conseguiria atingir a perfeição que é você. Se ponha no seu lugar. – disse séria. Minha inexpressão atingiu a níveis abundantes de “o quê?!”
- Olha quem fala. As ondas musicais da guitarra de Jimi Hendrix deveria ser seu rosto. – rebateu Penelope. O pior, elas estavam sérias. Realmente sérias.
Revirei os olhos e ri levemente, maneei a cabeça em negação e fui preparar meu café da manhã, logo mais deveria me encontrar com Lizzie para discutirmos assuntos da sua mudança para Nova York. E sim, elas continuaram discutindo, acusando uma a outra de serem mais linda, e eu nem ao menos recebi um beijinho de bom-dia.
-.º.-
*Play: Alt-J – Deadcrush*
Deveria ter notado, nós deveríamos ter notado. Os sinais vinham desde um tempo atrás. Tolice de nossa parte fechar os olhos e fingir que não acontecia, a mais pura e imaculável tolice. Os problemas não somem, tenho exemplos de toda uma vida, deveria saber. Ainda sim, permite que prosseguisse. Os deliciosos momentos aparentavam ser um paraíso inatingível, inalcançável em memórias. Já descobri que amor não é tudo. Os mesmos erros...
Quando Penelope foi expulsa de sua banda por motivos que ela se recusou a nos contar no dia anterior a uma das tantas discussões bobas entre as duas, e tanto Hope quanto eu não queríamos a pressionar em revelar tal razão, algo já se desenrolava mal.
Deixamos, ela estava triste, foi assim por um tempo, não fomos mais ao PJ’s, ela não cantou mais, nem para nós, na nossa bolha. Mas deixamos, Hope e eu concordamos em não impor respostas à nossas perguntas, seguindo habitualmente apenas na preocupação velada. Hope às vezes necessitava de um tempo sozinha, assim como eu, e respeitávamos o espaço individual.
Park sempre foi reservada, e mesmo com incerteza se o que estávamos seguindo é o correto, damos o espaço que ela almejava. As brincadeiras foram as mesmas, nossos momentos perduram por mais um tempo, como a princípio fora. E não queria fazer nada que estragasse.
Lizzie se mudou para Nova Iorque, e fora nós, minha irmã é o único contado pessoal que Pen tem de mais próximo. Deveríamos ter nos preocupado mais com essa questão. Ela frequentemente parecia presa em devaneios, é claro que deveríamos nos atentar nessa questão. A conhecia, Hope também a conhece. Algo estava acontecendo.
Uma semana. Foi o período de tempo que precisou para tudo se inverter. Minha vó faleceu de ataque cardíaco, no terceiro dia dessa mesma semana. No primeiro dia, Penelope havia sumido. Apenas uma mensagem dizendo que está bem, nada mais. No último dia dessa última semana, ela apareceu.
Eu estava de luto, e Hope ao meu lado. Aguentando o pior de mim com determinação impetuosa. Aninhar-me em seus braços é o único consolo que tive nesses dias. Lizzie estava zangada com ela, eu a intendia, eu também estava. Inferno, minha namorada sumiu em um dos piores momentos da minha vida.
O fedor. Aquele cheiro nojento de bebida barata, o rosto coberto por uma fina camada de suor, o cheiro de cigarro impregnado. Em algum momento tudo deu erro. Eram 8 horas da noite, estava com a cabeça na curvatura do ombro de Hope, as luzes do loft todas apagadas, até mesmo o neon do prédio comercial logo a frente estava desligado. Digerindo a maré de situações horríveis que surgiram, em silêncio.
Hope estava cansada, como eu. Percebia pelas olheiras abaixo dos orbes azuis. Preocupada, como eu. Percebia pela forma recorrente que seus olhos lagrimejavam. Dizem que os olhos são a janela para a alma. Conseguia ver um fundo de verdade, ou fosse apenas nossa conexão... Estava caindo.
Ouvimos batidas na porta, batidas bruscas e desesperadas.
Mikaelson foi a primeira a se erguer, indo averiguar quem era. Levaram segundos para ela olhar no olho mágico e em seguida abrir apressada a porta, jogando os braços contra a pessoa do outro lado. Uma pessoa bêbada, roupas desaliadas, aparência desagradável. O pacote completo. As lágrimas rolaram por meu rosto densamente; saudades, preocupação, mágoa.
- Acho que perdi minhas chaves. – e foi tudo que Penelope disse. Depois de sete dias sumida, em um dos momentos mais devastadores para mim e minha família.
Óbvio que em algum momento tudo deu errado. O futuro é como uma folha de papel, totalmente maleável. Essas são as letras miúdas que ninguém lê, mesmo sabendo que elas existem, quando somos corajosas o suficiente para amar.
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