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História Severus Snape - Ligação Eterna - Depois do fim, a despedida


Escrita por: LegolaSH

Notas do Autor


Desculpem a imensa demora!
Boa leitura e Feliz Natal!

Capítulo 5 - Depois do fim, a despedida


— Vamos logo! Se perdermos o pôr do sol vamos ter vindo atoa. — Grindelwald tomava a frente na caminhada, se distanciando dos outros dois enquanto seguia a estreita trilha no chão da floresta.

— Ande mais devagar. Estamos aqui o dia inteiro, não da pra manter o seu ritmo. — Alvo se apoiou em uma das arvores, esticando as costas com uma expressão de dor antes de se virar para o garoto franzino ao seu nado. — Quer parar e descansar?

Severus negou com a cabeça.

— Não, eu estou bem, são só as poções. — Suas pernas doíam e sua respiração era pesada. Mesmo com o corpo do garoto se adaptando bem a transição lenta e gradual, ainda havia os efeitos colaterais.  — Não me olhe assim.

Citar o tratamento fez Severus ganhar uma expressão de desgosto do diretor, o que o incomodou bem mais do que o mal estar. Em algumas semanas ele estaria formado e Dumbledore não poderia mais lhe dar essas pequenas repressões silenciosas.

— Desculpe. — Alvo sorriu, como se nada o incomodasse, e continuou seu caminho pela trilha. O ômega sabia que aquele tipo de atitude não fazia bem para o convício que tinham, mas as vezes uma oposição ou outra sobre as decisões de Severus escapava de seu controle. — Hoje é um dia especial e não quero que se estresse. Além do mais, você está sorrindo e é isso que importa.

Dumbledore se focou naquele detalhe, a incomum expressão de felicidade no rosto do garoto, uma das únicas coisas que o fazia tolerar todo o tratamento.

— Tem que parar de se importar com o que os outros pensam, isso não vai te levar a nada. — Vindo de cima, bem adiante na trilha, a voz de Grindelwald soou alta na floresta silenciosa, chamando a atenção dos dois.

— É a primeira vez que ouço lição de moral de um criminoso. — Snape cruzou os braços em frente ao peito, erguendo uma sobrancelha para o velho mago a sua frente como uma criança birrenta.

O alfa e Alvo estava bem de novo, depois de uma série de brigas, mas diferente do diretor, Severus não conseguia esquecer os delitos de Gellert quando ele voltava com um presente.

Snape acreditava na justiça, e o mago tinha que pagar por todas as vidas que prejudicava constantemente.  

— Tomei decisões ruins sim, matei pessoas, mas sempre lutei pelo o que eu acreditava e nunca deixei ninguém ficar no meu caminho. — A resposta de Grindelwald deixou bem claro a falta de remorso, sorrindo e esperando o garoto o alcançar na trilha com as pernas curtas e magras. — É isso que você deveria fazer.

Gellert sempre achou o menino estranho, respondão demais para o tamanho que tinha, mas até ele aceitou melhor as escolhas de vida de Severus do que Alvo.

— Não vou matar alguém por não entender como eu sou. — O garoto revirou os olhos, preferindo manter o ritmo rápido ao lado do criminoso a encarar o sorriso forçado de Dumbledore. O diretor estava se esforçando, mas não era o bastante. — Não é assim que se consegue respeito.

Grindelwald podia facilmente discordar, já que até onde ele sabia, era muito respeitado.  

— Você se orgulha de dizer que não vai matar, estufa o peito, mas deveria pensar mais sobre isso. — Sorrindo, sem parecer minimamente ofendido, o alfa continuou a incentivá-lo. — As pessoas que não te aceitam não vão te mandar uma carta de repúdio, sabia? Elas não querem que gente como você exista e, se tiverem a chance, vão fazer algo a respeito.

Não era só para irritar Severus que o mago insistia. Gellert passou a realmente se importar com ele e não gostaria de ver a foto do garoto em um dos recortes do jornal na área de desaparecidos, como normalmente via os rostos de transitantes.

— Não me importo com a moral deles, eu cuido da minha. — Aquela preocupação velada não teve um bom efeito sobre Snape, muito pelo contrário, só o deixou mais irritado. Dumbledore era formal, o tratava como um aprendiz, mas as vezes o alfa esquecia essa linha e agia como se ele fosse mais importante que isso, o que era doloroso.

Eles estavam muito longe de ser uma família feliz. O diretor era um velho amargurado e Grindelwald era um criminoso cruel, muito distantes da imagem de pais que ele tinha feito em sua mente.

Quebrados demais para serem qualquer outra coisa se não restos.

Para ser justo, nem sua mãe se encaixava nesse padrão, sendo bem mais ausente do que o aceitável, e seu pai... ele não poderia saber, as lembranças eram distantes e distorcidas.

— Alvo te criou bem, você é um idiota orgulhoso que nem ele. — Gellert deixou escapar depois de um bom tempo em silêncio, caminhando sobre as folhas secas.

— Outra vez, você não é a melhor pessoa para falar isso. — Agora Severus teve que rir, balançando a cabeça em descrença.

— Eu nunca disse que não amava o idiota orgulhoso, só não quero que fique igual a ele. — O rosto de Grindelwald se contraiu enquanto ele também ria, as marcas da idade ficando profundas em volta dos seus olhos.

— Adoro quando falam de mim, mas não estou com muito fôlego para responder no momento. — Alvo os alcançou na caminhada, com muito esforço, e tentou participar da conversa.

Eles estavam chegando a um ponto decisivo no caminho e o ar ficava cada vez mais denso, a mata carregada de lembranças tristes e violentas.

— Você está bem? — Sem precisar se virar e ver o rosto tenso do diretor, Severus perguntou, mesmo sabendo que Alvo ficaria bem. Apesar do sentimento de perda, o ômega era resistente.

— Claro, não estou tão acabado assim. — Era uma meia verdade, mas Dumbledore colocou confiança o suficiente na voz para que os outros dois continuassem a andar, como se a pergunta fosse apenas sobre seu estado físico um pouco ofegante.

— Sabe que não foi isso que eu perguntei. — Severus não tinha medo de tocar na ferida, diferente de Gellert, que acelerou o passo para deixá-los novamente para trás. O alfa nunca estava por perto quando o assunto era ela.

— Eu... estou feliz de te trazer aqui. — Depois do que pareceu muito tempo de silêncio, Alvo respondeu, sincero como quase nunca era. Ele sorriu e colocou uma mão protetoramente sobre o ombro do garoto, fazendo juntos a última subida que dava para a clareira aberta.

A sua frente, dentro de uma enorme e cristalina fonte de água, estava o túmulo de Ariana Dumbledore. Em algum cemitério de Londres havia uma cripta com seu nome, mas era no interior daquela floresta, onde a ômega deu seu último suspiro, que Alvo e Gellert guardaram seus restos mortais.

Cada pedaço.

Tudo o que restou.

O que foi deixado para trás espalhado sobre a grama.

Estilhaçado.

Grindelwald foi rápido. Ele se aproximou da água, se ajoelhando na borda e fez uma oração silenciosa encarando a pequena ilha de onde as correntezas jorravam. Quando terminou, ele deu um olhar simples a Alvo e Severus e seguiu uma trilha mais adiante.

Snape nunca tinha sido trazido até ali antes, mas era fácil supor que o lugar atraia o alfa com a mesma força que o repelia. Gellert encava o túmulo com adoração e temor, e assim que terminou sua tarefa foi embora, como se a energia densa daquela região fosse difícil de suportar por mais de alguns minutos.  

Como uma fumaça viciante que te sufoca por dentro.

O garoto encarou o diretor ao seu lado, vendo que nos olhos claros do ômega não havia o medo, só a mais completa admiração. Eles então se aproximaram da fonte, e com toda a intimidade que tinha, Dumbledore se sentou sobre a boda, acariciando a água corrente como quem conforta uma criança.

Snape não se atreveu a chegar tão perto, ele se manteve ao lado de Alvo, mas a alguns bons passos da fonte.

— A existência é muito mais do que nascimento e réquiem. São objetivos, sonhos, vontades... — A voz do ômega veio calma, serena, como se o tema fosse o mais comum. — Existem pessoas vivas que já morreram, assim como almas que não aceitam partir. Ambos estão presos em limbos dolorosos.

O garoto sentia que deveria falar alguma coisa. Contestar, concordar ou, no mínimo, consolar o diretor, mas ele não tinha ideia de como fazer isso quando Alvo não parecia ao menos triste.

Sem ter palavras para dizer, Severus escolheu o silêncio, e encarando o túmulo de Ariana, ele de repente teve a certeza de que o diretor não falava da morte dela.

//////////

Um ano após os eventos de Ligação Eterna.

Aqui estava, décadas depois de se formar em Hogwarts e ser trazido para o túmulo pela primeira e última vez. Agora, ele vinha sozinho, com um buque de flores nas mãos e mais dois mortos por quem ficar de luto.

Encarar a fonte de água pareceu uma tarefa difícil em sua mente, mas quando chegou na floresta foi muito mais simples, até mesmo nostálgico. Doía como o inferno, mas também deixava um conforto quente.

Era impossível não sentir inveja.

Dentro de todo o carinho, amor e respeito que ele tinha por ela, havia também a inveja. Entretendo, não era algo ruim e corrosivo, mas sim um sentimento suave e travesso, como um irmão mais novo que aceita de mal humor uma peça de roupa usada que foi passada a ele.

Ariana era, de fato, como uma irmã que nunca pode conhecer, e chegava a ser impossível não invejar tudo que ela teve e ele não. Quando viva, a ômega conheceu o melhor de Alvo e Gellert, na época em não estavam afundados na depressão profunda trazia pela sua morte. Ela conheceu Grindelwald quando ele ainda não era um criminoso e teve ensinamentos de Alvo quando ele ainda via algum futuro para si mesmo que não fosse também a morte.

No final, os dois a escolheram, e preferiram partir com ela do que ficar. Era justo, e ele sabia disso, mas seria uma mentira se dissesse que não doeu.

Para ele sobrou os restos. Duas pessoas velhas, cansadas e já mortas a muito tempo. Coube a ele zelar pelos os cadáveres, superar e seguir em frente como fez depois que sua mãe se foi.

Mais uma vez, ele estava sozinho, e uma parte dele queria culpar Ariana por isso, por ela ter tirado dele o substituto do seu pai ausente e o da sua mãe morta. Por ter tirado os restos que ainda estavam no seu prato, o deixando sem mais migalhas para juntar e chamar de seu.

Um choro alto interrompeu seus pensamentos.

— Seve? Está tudo bem? — A voz de Narcisa o trouxe de volta para a realidade, e pela primeira vez desde que chegou, Snape desviou os olhos do túmulo de Ariana, encarando a amiga.

A floresta, normalmente silenciosa, agora entoava os berros de uma criança pequena e das vozes estranhas que se atreveram a manter a conversa em um tom alto pela distância.

Folhas se sacudiam no alto das copas em desavença ao som. 

— Estou bem, apenas me despedindo. — Severus sabia que a ômega não se atreveria a dar mais um passo em direção a clareira, se mantendo na linha das árvores e sobre a trilha estreita, não chegando mais perto nem mesmo para se certificar que tudo estava bem.

O professor perdeu completamente a noção do tempo, e uma rápida olhada para o céu justificou a preocupação de Narcisa. O sol não estava mais no mesmo lugar, no mínimo uma hora se passou e ele não tinha voltado.

— Fique à vontade, não queria interromper, mas você parecia triste. — A ômega sorriu, ambos ignorando os gritos chorosos vindos do meio da trilha.

— É um dia de luto e despedida, eu estou tão triste quanto deveria estar. — Severus não conseguiria esconder o sentimento pesado mesmo se quisesse, sendo claro pelo vínculo, e provavelmente foi a ligação que trouxe a ômega até ali, não precisando ver sua expressão abatida para se preocupar.

O choro parou, e o silêncio momentâneo pareceu acalmar a floresta e os espíritos que adormeciam ali.

— Ele deve estar muito orgulhoso de você. — Narcisa falou depois de um tempo, observando a grande estrutura com água e o amigo, seus olhos revessando entre os dois. A ômega sabia que era um momento particular, e respeitava isso, porém não pode deixar de ficar um pouco mais para garantir que o professor estava bem.

— Talvez, mas ele me ensinou a ser forte o suficiente para não me importar com isso. — Se mantendo firme, Severus sorriu para ela, pensando em tudo que o diretor tinha lhe passado. — Ele saiu do limbo, descansou, mesmo de luto eu entendo que isso foi o melhor. Não faz sentido querer que ele continuasse aqui sofrendo.

— Sentimentos não fazem sentido. — Narcisa insistiu no que acreditava, mas devolveu o sorriso, como se estivesse se dando por vencida. Ela fez uma pequena reverência ao lugar quase sagrado e foi embora pela mesma trilha que veio, deixando a clareira.

Voltando a encarar a fonte, Snape se aproximou dela devagar, tirando o laço que envolvia as rosas e o guardando no bolso.

— É difícil sem você, sem ter alguém para vingar. — O professor colocou as duas mãos na água, soltando as flores e assistindo enquanto flutuavam pela correnteza. — A minha mãe está em paz e você também. Sei que descansa com eles, onde é o seu lugar.

Se passou um ano, mas ainda não parecia real a falta da sombra de Ariana em sua vida. Dumbledore se foi na batalha e, em poucos meses, todos sabiam da morte de Grindelwald, mas os dois saíram da sua mente com certa facilidade. A responsabilidade de uma vingança, porém, era mais difícil superar.

Não era como se não lutasse por Eileen, mas Ariana era um Mártir que foi muito mais cravado nele. Talvez tenha sido culpa de Alvo, Gellert ou da sua própria mente, que preferia focar na criança que nunca conheceu do que na sua mãe morta.

Fosse como fosse, o professor sentiria uma estranha falta da tarefa quase divina de honrar aquele túmulo, ao mesmo tempo em que seus ombros eram mais leves.

Vendo que as rosas já estavam todas espalhadas na água, Severus resolveu que era hora de ir embora, caminhando devagar até a estreita trilha entre as arvores.

Conforme se afastava, o ar ficou mais suave, e o professor não conseguiu conter o sorriso quando viu as duas ômegas o esperando na frente de outro túmulo.

Esse era uma enorme lápide, trabalhada com entalhes no marfim e rodeada de floreiras vivas. Grindelwald tinha realmente honrado o corpo de seu ômega e gastou muito tempo construindo, escolhendo um lugar longe o suficiente do de Ariana, mas ainda na mesma área no centro da floresta.

Um bom descanso para os dois.

— Como você está? — Belatriz sorriu para ele, mas os olhos do professor foram diretos para a criança em seus braços, que ainda tinha lágrimas nos olhos da pequena crise de choro.

Delphini estava linda, os cabelos escuros caindo sobre seu rosto redondo e pálido, exceto pelas bochechas rosadas.

— Estou bem. — Indo até elas, Severus deixou um beijo casto na testa da amiga antes de se abaixar até sua mais nova afilhada, levando a mão até seus fios rebeldes.

— Podemos ir? Draco vai me matar pelo tempo que estamos com Alvo. — Narcisa entrou na conversa, sua voz bem menos compreensiva do que quando foi atrás de Snape minutos atrás. Agora ela segurava um pequeno embrulho nos braços, que se mantinha silencioso desde que chegaram. — Nunca vejo meu neto, não quero ser proibida de estar com ele.

A ômega estava satisfeita em ter o bebê no colo, sendo uma tortura não poder aproveitar o tempo com ele em um lugar mais agradável. Só não reclamaria mais porque sabia o quanto era importante para o professor trazer a criança junto.

— Nós já vamos, só me deixe terminar isso. — Severus também queria ir embora, então se apressou e pegou com cuidado o frágil bebê no colo, levando ele até a lápide. Os pequenos olhos de Alvo logo se desviaram da estrutura para o meio das arvores ao redor deles, focando em três figuras brancas a distância. — Você consegue ver, não é? Ainda vai honrar muito seu nome.

Os vultos também eram visíveis para Snape, mas as duas mulheres atrás dele não pareciam conseguir enxergar nada além de arvores e o horizonte entre elas.

— Espero que você seja melhor do que ele foi. — As palavras do professor arrancaram um resmungo baixo no minúsculo pacote nos seus braços, que começava a parecer incomodado.

Com tão poucos meses de idade, ele não deveria ficar longe do pai tanto tempo.

Seveus encarou as três figuras a sua frente mais uma vez, vendo enquanto guiavam a criança no meio deles através de um véu quase tão transparente como o ar. Terminou rápido, e logo o professor estava voltando para as mulheres e depositando o bebê no carrinho ao lado delas.

Sabia que aquela seria a primeira e última vez que os veria daquela forma e estava satisfeito com isso.

Estava na hora de deixar esse lugar para trás. 

— Já podemos aparatar até a carruagem? — Narcisa perguntou esperançosa, segurando a alça do carrinho e encarando todos ali. Ela não gostava daquela floresta e estaria grata por sentir o frio do interior de Londres outra vez.

Snape não respondeu, apenas acenando com a cabeça enquanto envolvia o pequeno Alvo com um feitiço de proteção antes que os três adultos erguerem a varinha e todos sumissem no ar.

A floresta podia descansar de novo, muito mais vazia do que já esteve em mais de sessenta anos.

//////////

O interior da enorme da carruagem era confortável, completamente almofadado nos bancos, e eles seguiram em um bom ritmo pelos bairros trouxas. Muitos encararam surpresos o modo de transporte incomum, mas era Londres, e o mundo acabaria antes que um inglês olhasse com mal olhos para uma carruagem.

Enquanto iam até o bairro bruxo onde estava a pacata casa de Sirius e Remus, os três adultos lá dentro conversavam. Belatriz queria aproveitar a viagem para criticar, não pela primeira vez, as escolhas de Severus.

— Eu sempre te disse que você precisava se livrar de Dumbledore, desistir de pagar essa dívida por ele te acolher ou qualquer coisa assim que vocês tivessem, mas em vez disso, você ficou como aprendiz até a morte dele. — A ômega carregava a filha no colo, mesmo tendo espaço suficiente para as duas no grande banco que ocupavam.

Ela encara Snape de frente, seus olhos firmes nele.  

— Nós tínhamos um objetivo em comum, depois disso eu me manteria mais afastado, mas as coisas não foram exatamente como eu imaginei. — Severus nunca contou com detalhes o que aconteceu na floresta um ano antes. Ele disse que havia uma ameaça e que todos se juntaram para resolver, porém ainda não estava pronto para falar mais do que isso.

A morte de Dumbledore foi como uma grande tranca sobre o assunto, ele nunca queria contar o suficiente para chegar nessa parte.

Snape não podia fingir que ficou surpreso quando viu o corpo caído do diretor, mas uma parte dele se recusou a acreditar por muitas horas. Muitos dias. Muitos meses.  

— Você está livre agora, retribuiu os anos de cuidados, pode deixar aquela escola. — Não queria parecer grossa ou insensível chamando a grande perda de livramento, mas Belatriz não conseguiu pensar em uma palavra melhor para usar.

Esse grande imprevisto poderia ter sido sim um ponto de libertação para Snape, mas na visão da ômega isso não aconteceu, já que ele continuava em Hogwarts.

— Não vai me convencer a largar meu emprego. — O homem também carregava um pacote no colo, querendo aproveitar o tempo com o bebê. Desde que tudo terminou, o resto do ano passado correu rápido e, quando finalmente Alvo nasceu, Severus estava trancado em Hogwarts querendo pôr as coisas em ordem.

O funeral.

A caça por um possível traidor.

Seu novo cargo. Diretor.

Ainda não parecia certo, mas era sua realidade agora, administrando tudo em Hogwarts.

Dumbledore garantiu, no testamento formal e em cartas deixadas para ele em seu escritório, que tudo estava resolvido. Acabado. Que cada ponto teve seu nó. Mas Snape não sabia se o repentino pedido de demissão vindo de Binns resolveu a falha de segurança que eles desconfiavam ter ou se sair de Hogwarts foi punição o suficiente.

Depois de um tempo, com muitos outros assuntos para resolver, Severus resolveu confiar em Dumbledore e deixou essa preocupação de lado.

— Eu só acho que dirigir Hogwarts se parece muito com uma passagem de manto, de mestre para aprendiz, e você tem potencial pra muito mais que isso! — Belatiz estava alheia a sua distração, continuando a falar como se o foco do amigo estivesse firme nela e não viajando por todo o resto.

— Gosto do meu cargo. — Queria que o assunto acabasse logo, cansado das conversas sobre como poderia ter uma vida melhor e mais feliz se abandonasse Hogwarts. Snape não queria deixar a escola, e por mais difícil que fosse fazer Belatriz acreditar, não era porque sentia que devia isso a Dumbledore.

— Hogwarts está ótima nas suas mãos, é um emprego de muito prestígio. — Narcisa interrompeu a pequena discussão, acariciando o cabelo do neto no colo de Severus enquanto pensava em algo que queria dizer. — Vocês se lembram de Astoria Greengrass?

— Muito vagamente. Ela é da família de Lucius, não é? — Se esforçando para achar um rosto que completasse aquele nome, Snape chegou até uma das antigas pretendentes de Draco, que acabou entrando para família Malfoy por outra união.

Era quase engraçado pensar nas várias listas de moças que Narcisa fazia pouco mais de um ano atrás. Antes do furacão Lupin Black entrar pelas portas da mansão.

— Sim, por casamento. A menina é tão nova e já está doente, uma tristeza. — A ômega disse desanimada, a voz fraca e baixa, mas dava para sentir pelo vínculo que ela gostaria de compartilhar a história. — Recebi uma carta avisando que ela teve o primeiro filho esse ano, nasceu poucos meses antes do Alvo. Um lindo garotinho loiro, Scorpius, mas duvido que fique com a mãe por muito tempo.

Pensar que poderia ser o seu filho no meio daquela situação, vendo a esposa morrer quando mal acabaram de ter um bebê, apertou o coração de Narcisa.

— Ela está tão mal assim? — Belatriz automaticamente apertou mais a filha no colo, por instinto, como se algo pudesse tentar separá-las. Nem mesmo a morte a afastaria de Delphini.

— Pelo que eu soube, foi um milagre ela ter suportado o parto. — Levantando os olhos para encarar a irmã, Narcisa se concentrou em falar tudo que sabia sem se deixar levar pelos sentimentos tristes. — Os médicos querem acreditar que ela ainda viva por mais alguns anos, mas não será o suficiente para o garoto chegar perto da idade adulta.

— Não é fácil lidar com uma perda assim na infância. Dê apoio se puder. — Snape também tentou não demostrar as emoções, não querendo que as duas percebessem o quanto esse assunto o perturbava. Crianças não deveriam crescer sem a mãe, e ele torcia para que pelo menos Scorpius não ficasse sozinho.

— Eles não são daqui, não temos muito contato, mas Lucius me garantiu que se acontecer algo a Astoria... quando acontecer algo a Astoria, daremos apoio ao seu sobrinho viúvo e o filho deles. — Era difícil não ser pessimista, e Narcisa preferiu encarar a realidade de frente, querendo se preparar para o pior. — Na foto o bebê se parecia tanto com Draco que eu quase chorei.

Ela e Lucius tinham muito pouco contato com o resto da família Malfoy, exceto em bailes e reuniões formais, porém a empatia que sentiu com aquela história foi imediata. Era como se Narcisa conhece bem a jovem garota acamada e seu filho. 

Belatriz sentiu o clima pesar na carruagem. A ômega, olhando do lado de fora, viu que demoraria mais alguns minutos até passarem pela entrada de segurança do bairro bruxo.

Era uma data especial, comemorariam um evento muito importante, e ela não queria chegar lá com eles tão cabisbaixos.

— É uma pena o Alvo não ter puxado a família Malfoy, ele é a cara do Harry em todos os sentidos. — Belatriz decidiu chamar a atenção de todos para o pequeno bebê no colo de Snape, e até Delphini o encarou com seus olhos curiosos.

— Acredite em mim, é sempre bom quando a criança se parece com o pai. — O comentário saiu de Narcisa sem que ela percebesse, e quando os dois outros adultos riram, o rosto da ômega ficou todo vermelho.

— Por Merlim, Narcisa! — Cobrindo a boca, Belatriz tinha uma expressão de pura surpresa. Não esperava algo assim da irmã, mas foi ótimo para aliviar a tensão. Precisavam se concentrar nas coisas boas da vida, na benção que tinham nos braços e do milagre que estavam indo comemorar.

Severus ainda ria enquanto ninava o bebê em seus braços.

— Acho tão adorável te ver com o Alvo, principalmente porque quando o Draco descobriu a gravidez você foi o primeiro a falar sobre... você sabe. — Belatriz assobiou enquanto movia a mão rápido em frente ao pescoço, o olhar se desviando até o bebê.

Narcisa revirou os olhos na mesma hora.

— Calem a boca, meu filho nunca faria isso! Não uma atrocidade dessas. — Ao ver a expressão de desgosto da ômega, os outros dois riram. Snape preferiu não comentar que, na época, Draco chegou a conversar com ele sobre essa possibilidade.

No final, ele escolheu ter o bebê, e agora todos tinham que se preparar para o grande problema que arrumaram ao tirar Alvo dele por tanto tempo.

— Estamos chegando, consigo ver a entrada daqui. — Belatriz se inclinou para perto da janela outra vez, vendo a carruagem começar a atravessar o pequeno portal de pedras para o bairro bruxo, as luzes do feitiço de segurança brilhando contra a parte de fora do veículo.

 Logo eles estavam parando em frente a uma bela casa, com um jardim decorado na frente e grandes janelas salientes.

Os três desceram e Narcisa tirou o carrinho de bebê da carruagem, completamente vazio, já que Alvo ainda estava no colo de Snape. Eles encaram a residência por um tempo, principalmente Belatriz, que a via pela primeira vez.

Na opinião da ômega, era simplesmente perfeita.

Dois andares grandes, uma decoração bem feita e uma entrada simpática. Belatriz podia se imaginar facilmente tomando chá sentada naquelas janelas. Entre as plantas que rodeavam a casa, ela reparou que havia muitas aromáticas que ajudavam na gravidez, e sorriu com esse detalhe.

Ela deu um beijo na testa da filha, e não pode deixar de se sentir mal por não ter conseguido proporcionar a ela tanto conforto durante a gestação. Delphini teve que ser uma pequena lutadora, uma sobrevivente igual a mãe.

Mal tiveram tempo de marchar até a porta, porque ela rapidamente foi aberta e uma figura muito irritada começou a gritar em direção a eles.

— Por que demoraram tanto com o meu filho? — Draco atravessou o pequeno jardim da frente quase correndo, tomando o bebê do colo de Snape e o apertando firmemente conta o peito. A criança parecia muito melhor agora, tentando usar as pequenas mãos para alcançar o rosto do pai.

— Sinto muito pela demora, eu acabei levando mais tempo para me despedir do que achei que levaria. — Não havia desculpa para dar que acalmasse o ômega enfurecido, então Severus disse apenas a verdade, torcendo para ser o suficiente.

O rosto de Draco estava ficando vermelho de raiva.

— Se hoje não fosse um dia muito especial, eu não deixaria vocês entrarem aqui. — Tentando encontrar a calma, ele apertou ainda mais Alvo no peito, os olhos indo do padrinho para sua mãe. Ele queria expulsar os dois dali. — Eu disse alguns minutos e vocês levaram horas!

O bebê mal se incomodou com os gritos do pai, sabendo que estava completamente seguro.

— Todos vocês, entrem! Eles vão chegar a qualquer momento, não quero estragar a surpresa. — A voz controlada de Harry veio da casa, e ver o alfa causou um efeito calmante quase instantâneo em Draco, que correu na direção no noivo e se afundou em um abraço com ele, a pequena criança entre os dois.

Todos estavam aliviados em ver Harry, mesmo que ele também parecesse irritado. Ninguém seria expulso, e isso por si só já era ótimo.

— É um dia feliz, mas também de perda. Faz um ano. — Mantendo a atenção só no noivo, o alfa voltou a falar, a voz baixa para que apenas o loiro ouvisse. — Não quero você assim.

— O que? — Draco levantou o rosto de seu peito na mesma hora, desviando o olhar para as pessoas que se aproximavam da entrada e depois de volta para Harry. Os dois estavam eufóricos esperando Alvo ser trazido de volta alguns minutos atrás, e agora isso? — Acha que eu estou errado?

— Nunca, sou mais esperto que isso, mas Severus estava se despedindo de Dumbledore e nós dois sabíamos que demoraria mais do que alguns minutos. — O alfa se apresou em dizer, balançando a cabeça enquanto tentava conter um sorriso. Draco sempre ficava lindo carregando o bebê. — Foi bom nosso filho estar lá e é melhor ainda agora que temos ele de volta. Vamos entrar.

Ele saiu do caminho, deixando o ômega ir para a sala enquanto Snape, Narcisa e Belatriz subiam os poucos degraus. Logo todos estavam do lado de dentro e a porta foi fechada.

— Quando eles vão chegar? — Draco perguntou enquanto se sentava no enorme sofá com Hermione e Ron. Harry demorou para responder, acomodando os novos convidados nas cadeiras próximas e garantindo que os que já estavam ali continuassem confortáveis.

— Em breve, Almofadinhas acabou de ligar. — Quando o alfa finalmente parou em frente ao noivo, não conseguiu mais evitar o sorriso. Seus olhos brilhavam, mas não era só de alegria.

— Você está nervoso. — Não foi uma pergunta, Draco podia sentir através vínculo e ler claramente nas ires verdes. Entretanto, era fácil imaginar o motivo. Todos estavam ansiosos pelos resultados do dia.

— Muito, quero ter boas notícias para comemorar. — Harry limpou as mãos suadas na calça, dando um beijo no loiro e nos cabelos de Alvo antes de sair de novo da sala para buscar mais chá.

O alfa queria se distrair com qualquer coisa que não fosse esperar o barulho da moto adaptada.

Não havia tantos convidados na casa, mas o suficiente para encher a sala, com quase uma dúzia de amigos e parentes próximos. Muitos que lutaram na floresta proibida estavam ali, incluindo Hagrid e madame Maxime, que ostentava sua prótese no lugar da perna.

Ela se recusou a ganhar uma nova, exibindo a amputação como uma marca de guerra.

Draco tentou se manter simpático, apesar de toda a raiva e agitação. Harry também estava irritado com o afastamento do filho, mas o alfa manteve esse sentimento o mais discreto possível no vínculo, não querendo pôr mais lenha no noivo.

Alvo só tinha três meses e não deveria ficar fora de casa por tanto tempo, qualquer um concordaria com isso, mas agora não havia mais nada a fazer a respeito. Precisavam seguir em frente.

— Gostei desse quadro, em que galeria compraram? — A voz de Narcisa fez o loiro a encarar, sentada em uma das poltronas ao lado do outro sofá. A irritação fez seu cérebro demorar para entender a situação.

Sua mãe apontava para uma das telas na parede.

Silêncio.

— O Ron quem pintou, foi um presente de formatura. — Hermione respondeu primeiro, a voz soando gentil e educada. A beta manteve a postura amigável até mesmo quando a Malfoy ignorou sua presença por completo.

— Trabalha com arte?  — Ela focava sua atenção no ruivo, muito surpresa que alguém de uma família tão humilde como a Weasley tivesse conseguido se tornar um artista.

— O que? Não! Eu sou um Auror em treinamento. — Ron se apresou em explicar, suas bochechas ficando vermelhas na mesma hora. — Isso é só uma coisa que eu fiz quando tinha muito tempo livre. Não é nada.

Apesar do alfa não esconder mais o hobbie há alguns meses, ele ainda evitava falar sobre isso, não sabendo lidar com os elogios.

— Bom, eu achei muito bem feito. — Narcisa não escondeu a decepção, sem ao menos conseguir manter a boca fechada antes de seu próximo comentário sair. — É reconfortante saber que alguém do círculo social do Draco tem um futuro nas mãos. Dons artísticos são ótimos.

Quando Narcisa se deu conta do que tinha dito, seu rosto ficou ainda mais pálido, recebendo um olhar cortante do filho. Não importava a ocasião, ela sentia que seria posta para fora.

— Eu tenho dezenove anos e sou uma das principais indicadas para começar a trabalhar na secretaria do ministério, que é o primeiro passo para qualquer um que queira concorrer a ministro um dia. — Hermione voltou a responder, mais uma vez com sua voz educada, se virando no sofá até encarar a ômega de frente. Se as coisas continuassem assim acabariam em uma briga e o melhor a fazer era cortar o assunto. — Pretendo bater o recorde do Remus e ser uma das principais indicadas ao cargo antes dos vinte e cinco. Se eu fosse você, não me preocupava tanto com o “círculo social do Draco”, todos temos ótimos futuros, nas artes ou não.  

Quando Granger viu o loiro ao seu lado sorrir, ela soube que tinha possivelmente evitado um desastre. Narcisa, por outro lado, não parecia disposta a manter a paz.

— Uma ministra? Beta? — A surpresa da mulher era genuína, como se nem mesmo por um segundo ela pudesse considerar aquela hipótese como séria.

Snape se apresou em resolver a situação.

— Acho melhor você não repetir isso ou vai acabar sendo realmente tirada dessa casa. — Ele puxou o braço da amiga, falando com a voz baixa e firme, mas todos que estavam envolvidos naquela conversa puderam ouvir. — Lembre-se de que não é você quem está no comando aqui, somos convidados.

Por sorte, ninguém fora daquele círculo prestava atenção em Narcisa e o estrago não foi maior.

— Gostei de você! Adoro quando colocam minha irmã no lugar dela. — Belatriz também correu para dentro do assunto, se desdobrando no sofá para estender a mão até Hermione. Delphini resmungou em seu colo, mas não chorou. — Ficaria muito feliz de ter uma ministra como você, o mundo mágico precisa disso.

— Obrigada. — A beta aceitou a oferta de paz, segurando firme a mão estendida para ela. Não foi a primeira vez e nem seria a última que Hermione ouviria aquele tipo de comentário, então preferiu relevar, focando na criança de olhos grande que a encarava. — Sua filha é uma graça.

— Ela é uma pestinha, mas é linda sim. — Belatriz aceitou com muito orgulho o elogio, não acompanhando a irmã e Snape quando os dois se levantaram de seus lugares e foram andar pela casa. Ela esperou que entrassem na cozinha para continuar. — Ei, não liguem para Cissa, tudo bem? Ela não é uma pessoa ruim, só precisa de tempo para digerir as coisas. Quando se cresce como a gente cresceu é difícil acompanhar as mudanças do mundo. Eu fui ser atendida por uma médica ômega pela primeira vez quando já tinha trinta anos, e só aconteceu porque estava bem longe de casa. Não temos contato com coisas assim.

Agora, dois ruivos idênticos tomavam os lugares vazios, atraídos de longe pela pequena e discreta confusão.

— Tenho certeza que ela vai se acostumar. — Hermione tentou manter sua concentração na mulher, e não nos gêmeos que claramente estavam loucos para se meter na conversa. Draco parecia com pouca paciência e uma brincadeira fora de hora não seria bom.

— E também, ela é a sogra do Harry, o problema é dele. — Fred não interpretou o olhar irritado do irmão, deixando o comentário escapar e rindo quando Jorge lhe bateu. Aquela conversa estava muito melhor do que a que eles estavam antes com tio de Harry e sua esposa.

— Infelizmente, não é um problema só dele. — Ninando o filho no colo, Draco encarou o ruivo, não se importando em esconder o desanimo. Lidar com Narcisa não estava sendo fácil. — Meu noivo já fez um buraco no piso de tanto andar?

O loiro resolveu se preocupar com outra coisa, algo que valesse a pena. Seu alfa precisava dele.

— Não, mas ele ta tentando muito. — Fred riu, encarando o irmão que balançava a cabeça envergonhado. Foi então que o ruivo percebeu o clima da sala. Harry não era o único tendo problemas para lidar com a preocupação. — Eu acho que deu tudo certo, se fosse notícia ruim já tinha chegado.

Draco concordou silenciosamente, se obrigando a relaxar no sofá enquanto os outros voltavam a conversar. O loiro não estava com humor para falar, seu coração e sua mente concentrados do outro lado do vínculo fincado em seu pescoço.

Harry tem sido incrível. Nada parecia bom o suficiente para descrever o quanto o alfa foi essencial para que Draco pudesse terminar aquele maldito último ano em Hogwarts, escondendo o status e uma gravidez. Ele ficou ao lado do namorado, apoiando cada decisão, mesmo quando seus olhos escureciam ao ouvir a palavra aborto.

O moreno não recuou, nem por um segundo. Não acusou e nem fez perguntas. Harry apenas se deitava do seu lado a noite e garantia que, por mais que ele quisesse a criança, aceitaria a decisão do ômega. Como prova, veio o pedido de noivado, com um jantar e uma poção concentrada vinda direta da sala de Snape.

Ele ficaria ao seu lado, tomando ou não, e eles passariam por todo o processo juntos.

Até Draco ficou surpreso quando jogou o frasco no lixo, chorando e querendo culpar a gravidez por se sentir tão emocionado. Ele sabia, por Merlim, que era uma péssima ideia. Dezoito anos não era nem de longe a idade ideal para ter um filho e eles provavelmente estavam abrindo mão de grandes chances nas suas vidas, inclusive a de ter aquela criança mais tarde, quando com certeza seria um momento mais feliz. 

Todos apoiariam o loiro se ele aceitasse o tratamento, todos cuja opinião importava, e ele quis aceitar, mas no fim foi egoísta e decidiu que iria adiante com a gestação. Egoísta por não escolher o melhor para o filho e para Harry, que mesmo querendo muito essa criança, sabia que não estava pronto para isso.

Foram meses se perguntando se tinha feito a escolha certa. Semanas inteiras de aulas perdias porque Draco não conseguia sair do quarto de tanto enjoou e dor, parte física, parte emocional.

O corpo esguio não ajudava a disfarçar a barriga crescente, mas com roupas largas e uma tolerância ilimitada para faltas, eles lidaram com esse pequeno detalhe. Um problema a menos.

Até que, enfim, veio a formatura, como um raio de sol no meio da tempestade.

O ômega já estava com seis meses, e Snape usou cada grama de influência que tinha como diretor para que Draco mal tivesse que aparecer na entrega do certificado. Quando o ano letivo oficialmente acabou e eles estavam no meio do ano seguinte, tudo se tornou infinitamente mais fácil.

Informar a família Malfoy foi, no mínimo, um grande desastre, mas como sempre a parte familiar de Harry veio como gelo em uma ferida recente. Agora todos os seus amigos e parentes sabiam da gravidez, o que oficialmente quebrava o segredo do status, mas pelo menos ele não teve que receber olhares de julgamento nem responder perguntas das pessoas que estudaram com ele.

Fora de Hogwarts, Draco não se sentia mais um adolescente irresponsável que perdia provas porque estava no banheiro do quarto vomitando. Porque tinha sido burro demais para usar uma camisinha. Fora de Hogwarts, o loiro era um jovem herdeiro, começando a administrar os negócios da família enquanto se preparava para a chegada do primeiro filho.

Ele não se sentia mais um fracasso e isso era ótimo, um peso enorme fora de seus ombros enquanto começava a planejar sua vida.

O interior de Londres lhe fez muito bem. A casa de Remus e Sirius era o refúgio perfeito para Draco se enfiar enquanto ainda lidava com tudo. Era aconchegante e modesta, e demorou pouco tempo até que a considerasse sua casa também.

Sem ter que fazer muito mais do que ir em uma reunião ou outra, onde era extremamente mal visto pela clara barriga de gestante, Draco passou a maior parte do que sobrou do ano na casa, ajudando Remus a lidar com os tratamentos para a coluna e evitando que ele quebrasse a própria cadeira de rodas em um ataque de raiva.

O lobisomem odiava aquela cadeira mais do que qualquer coisa.

Harry começou a trabalhar no ministério e Sirius achou que voltar a gerenciar as empresas da família com o irmão faria bem ao esposo. O alfa não queria deixar Remus sozinho, nunca mais, porém era fácil ver que com ele por perto Lupin se sentia mais impotente, e a presença de Draco ajudava.

Deixar Remus cuidar do genro grávido em vez de ser cuidado foi uma terapia para ele. Os dois ômegas se aproximaram muito e logo o lobisomem sentia que tinha outro filho. A distância causava mais dor em Sirius, que ligava no mínimo cinco vezes do trabalho para dizer coisas melosas no telefone sobre como queria estar com o esposo.

Se Regulus não fosse seu irmão, ele já teria sido demitido a muito tempo.

Então, depois de noventa dias, veio Alvo, e o nome foi ideia de Remus. Sirius odiou e Harry ficou relutante no começo, mas assim que ouviu a sugestão Draco soube que era um ótimo nome. Uma boa homenagem a um homem que, de muitas formas, foi um bom homem.

Narcisa, Lucius e Belatriz entraram na lista dos que não gostaram, mas Severus sorriu para o loiro quando recebeu a notícia. Talvez seu padrinho tenha ficado feliz com a homenagem ao seu antigo mentor, ou só estava contente com qualquer decisão de Draco. Snape era muito ligado a Alvo Dumbledore, mesmo que nem sempre admitisse.

O parto foi tranquilo, mas as semanas que o seguiram nem tanto. Draco se trancou no quarto dele e de Harry por dias com o bebê, seu lado ômega deixando apenas o alfa chegar perto. Ter uma gravidez sendo tão jovem tinha seus riscos, e a superproteção ao filhote era uma coisa esperada.

Draco nunca pensou que pudesse se sentir tão primitivo antes, mas os dias embolado em volta do seu bebê provaram que, apesar dos remédios, ele ainda tinha os instintos ômegas a flor da pele, só precisava dos motivos certos.

Mais uma vez, Harry foi essencial para que ele pudesse passar por um momento difícil.

Eles se enfiaram no quarto e cuidaram do pequeno Alvo até que Draco finalmente ganhou confiança o suficiente para andar pela casa com o bebê, e recentemente, ir com ele para fora da segurança daquelas paredes.

Esse foi um dos motivos que fez o sangue do loiro ferver ao ser separado de Alvo por tantas horas. Ele ainda superava essa fase, se acostumando devagar a deixar o filho com outras pessoas.

Snape podia ter um motivo nobre hoje, mas demoraria muito tempo para ele sair com seu filho de novo.

O ômega estava tão envolto nos próprios pensamentos que um leve puxão no vínculo o assustou.

— Eles estão vindo. — Draco falou de repente, alto o suficiente para quebrar as conversas paralelas, e logo todos estavam em silêncio, se acomodando em lugares estratégicos enquanto encaravam a porta.

O barulho da moto veio apenas alguns segundos depois, criando uma tensão no ar.

Harry tinha saído da cozinha antes mesmo do noivo falar, e agora esperava perto da entrada larga para a sala, de costa para a escada e a alguns metros da porta. Ninguém ousou ficar em seu caminho, era uma passarela reta e vazia do alfa até a parte da frente da casa.

De repente, o barulho da moto parou e foi substituído pelo familiar rangido da cadeira de rodas, o que apertou o coração do moreno e fez todos desanimarem.

Draco estava ao seu lado antes mesmo da cadeira terminar de subir a pequena escada para a porta, o filho no colo, parecendo bem mais agitado do que o normal. Tão pequeno, mas já era afetado pelas emoções no vínculo que demoraria anos para entender.

A porta se abriu e, como sempre, Sirius estava atrás de Remus o empurrando, com rosto completamente em branco.

Decepcionado, Harry tentou forçar um sorriso, querendo demostrar que estava tudo bem. Não foi dessa vez, mas eles continuariam tentando.

Foram meses difíceis. O lobisomem teve que parar de lecionar depois da batalha e os cuidados intensos seguiram a maior parte das semanas seguintes. Lidar com a gravidez de Draco naquela cadeira foi uma tortura para Remus, e ele nunca se sentiu tão impotente em toda a sua vida.

Harry sabia o quanto era importante para o pai voltar a andar, o quanto ele precisava disso, mas se nunca viesse a acontecer, então o moreno se esforçaria ainda mais para compensar essa perda na vida do ômega.

A expressão do moreno vacilou, entretanto, ao ver Lupin levar as mãos até os apoios de braço da cadeira, fazendo força para se levantar.  

O ar da sala desapareceu, e todos prendiam a respiração enquanto Remus usava cada músculo dos braços para se por de pé com bastante dificuldade. Assim que sua coluna ficou reta, o primeiro instinto de Harry foi ir até ele, mas o ômega lhe deu um olhar certeiro.

Não se mova.

Tropeçando nos próprios pés descalços, Remus começou a caminhar, se movendo lentamente até o filho. Cada passo enviava uma pontada de dor por toda a espinha do lobisomem, mas em momento algum ele vacilou, seus olhos fixos nas ires verdes atrás das lentes dos óculos.

Era como olhar para uma criança de novo. Sua criança. Um filhote perdido que sempre ergueu as mãos para ele pedindo um abraço.

Hoje não seria diferente, e antes que Harry percebesse seus braços estavam no ar, esperando ansioso que Remus cruzasse os poucos metros que ainda havia entre eles para poder esconder o rosto em seu peito.

Quando finalmente chegou ao seu objetivo, as pernas do ômega já não tinham mais força, e todo seu peso foi jogado contra o corpo de Harry, que o sustentou com os braços firmes em suas costas.

— Eu estou aqui. — Remus sussurrou devagar, as mãos afagando o cabelo bagunçado do filho. Às vezes, em pânico, o jovem alfa se esquecia disso, que seu pai estava bem, saudável e vivo. Lupin estava ali para cuidar daquela família, que agora era maior do que nunca. — Sempre vou estar aqui para o meu filhote, ouviu? A cirurgia foi ótima, não vou a lugar nenhum.

Eles ficaram assim por um tempo, com Harry checando através do vínculo se o procedimento realmente não havia deixado nenhuma sequela.

Lupin respirou fundo antes de voltar a sustentar o próprio peso sem a ajuda do alfa, se afastando dele espaço o suficiente para puxar Draco para perto, envolvendo o loiro e o bebê naquele abraço.

Sirius, que ainda se mantinha a alguns passos de distância, sentiu que poderia chorar de alegria a qualquer momento.

— Temos muita coisa para comemorar hoje e eu fico imensamente feliz em ver todos vocês aqui. — Remus voltou a se afastar, dessa vez saindo dos braços do filho e do genro, se virando para encarar os convidados ali. Ele nunca esperaria tantos rostos amigos reunidos apenas para vê-lo depois da cirurgia — Eu disse claramente para o meu marido que não queria uma festa. Disse que era um risco e que odiaria chegar aqui e dar notícias ruins a pessoas que eu amo. Mas, como todos sabem, eu me casei com Sirius Black, e o céu cairia se ele não me aprontasse uma coisa dessas. 

Risadas baixas e contidas soaram no ar, principalmente vindas de Regulus, mas todos logo se obrigaram a ficar em silêncio novamente, ansiosos por mais informação sobre o quadro de Remus.

Ele estava de pé, mais firme do que esteve em meses, mas isso poderia ser temporário como outras melhoras que o ômega já teve.

— Foram tempos difíceis, e que Merlim seja testemunha de que passamos por isso. Estamos prontos para uma nova etapa. — Pensando em tudo que tinha a dizer, Lupin preferiu deixar sua saúde por último, focando seus olhos no pequeno Alvo enrolado nos braços do pai.  — Apesar dos ricos, nós lutamos. Apesar das dificuldades, nós chegamos até aqui. E, apesar das perdas, nós comemoramos, agradecemos cada dia, e brindamos as vidas que seguirão até muito depois que partirmos.

As xícaras de chá, copos de cerveja e taças de vinho foram erguidos no ar.

— Eu sou infinitamente grato por estar aqui hoje, de pé, com todos vocês, e espero poder continuar com minha família até o final, mesmo que um dia eu tenha que voltar para essa maldita cadeira. — O ômega queria fingir que estava livre daquele risco, que tudo de ruim já havia passado, mas mentir para si mesmo não anularia os fatos. — Os médicos disseram que era uma possibilidade, mas eu considero um aviso. Um alerta para que eu aproveitasse os bons momentos, e eu vou.

Todos assentiram com muito respeito, alguns olhos brilhando de orgulho e outros de lágrimas. Remus era um homem muito amado, e sua confiança tinha o poder de despertar um sentimento bom em que estivesse por perto.

— A verdade é que minhas pernas estão fracas. Como podem ver, andar é difícil e vou ter que reaprender movimentos básicos, mas se tudo der certo, a prática deve resolver esse problema. — Mesmo com o assunto delicado, Lupin sorriu, disposto a dar valor ao que tinha. Ele sabia que teve sorte e foi sincero ao dizer que aproveitaria a fase boa de sua saúde ao máximo. — A fraqueza é o grande mal, ela pode aumentar com o passar dos anos, e é provável que eu termine meus dias incapaz de me levantar, mas até lá, vou poder andar de novo!

A última frase foi dita com entusiasmo, a voz intensa soando decidida e firme, o que fez todos na sala gritarem de acordo. Era como se a força e determinação de Remus estivesse emanando dele e agindo nos convidados.

— O meu amor ainda é muito jovem para pensar nisso. Olhe para nós, é como um lindo casal adolescente. Todos pensam que eu e o Harry somos irmãos! Ninguém nunca disse isso, mas eu tenho certeza de que pensaram. — Sirius finalmente falou, com os olhos lacrimejando e um sorriso enorme no rosto. Ele abraçou o esposo por trás, o envolvendo em seus braços enquanto passava a encarar somente o ômega. — Eu sempre soube que envelheceria ao seu lado, mas o tempo passou muito mais rápido do que eu pude acompanhar. Nossa criança tem um filho! E em alguns anos, meus cabeços vão ficar brancos e você vai precisar de uma bengala. É difícil de acreditar.

O clima na casa agora era muito mais leve, suave e divertido. Da mesma forma que Lupin exalava força, Sirius evocava bom humor em cada palavra, como se pudesse fazer o sol se abrir em um dia nebuloso apenas com a atitude despreocupada e divertida de sempre.

Ele era o sustento de Remus desde muito antes do ômega realmente precisar de apoio. O alfa conseguia, como mágica, fazê-lo sorrir e se sentir vivo.

— Então você vai ficar bem? — Harry foi o primeiro a perguntar, a voz saindo uma grande mistura de preocupação e felicidade.

— Ainda vou andar por uns bons anos, não se preocupe. Quero poder pegar muito meu neto do colo ainda e aplaudir de pé quando Alvo se formar. Não vou voltar para essa cadeira antes disso, eu me recuso! — A animação de Remus queimava em seu peito, saindo por cada palavra. Draco sentiu vontade de envolver o outro ômega em mais um abraço, e sabia que seu noivo não estava muito diferente dele.

Além dos gritos, vieram os aplausos, e de repente a pequena casa estava em festa.

As pessoas ali sabiam que não seria fácil se recuperar ou lidar com as previsões ruins para o futuro, mas também sentiam que aquela família estava pronta para isso e queriam comemorar esse fato com eles.

— Aqui, sei que não gosta de ficar longe dele. — Enquanto as pessoas lentamente voltavam para seus núcleos de conversa, Draco deu alguns passos em direção a Remus e estendeu delicadamente o bebê. — Pode me ajudar com o banho?

Com Lupin, o loiro não tinha preocupação alguma com a criança, dentro ou fora de casa, e seu coração não pesou quando o outro ômega pegou a criança e a alinhou ao peito. Mais cedo naquele dia, na hora de entregar Alvo a Severus, não foi tão simples, mesmo ele confiando plenamente no padrinho.

— Claro, é um prazer ser útil. — Lupin deu um aperto firme no bebê e deixou um beijo longo em sua testa. Seu rosto pareceu menos animado quando encarou a escada com o andador adaptado na parede. Hoje o ômega não precisaria disso. — Pode carregá-lo até lá em cima? Eu ainda não me garanto com essas pernas.

Suspirando alto, Remus devolveu o bebê, dando uma cotovelada leve em Sirius quando o alfa riu do seu rosto emburrado. Black lhe deu um beijo na bochecha como pedido de desculpa, saindo para a sala com Harry para falar com os convidados.

Draco, por pouco, conseguiu conter o riso para não apanhar também. Ver as reações claras de Remus era sempre divertido. Tudo que envolvia as dificuldades em andar e a cadeira de rodas fazia Lupin ter as reações mais espontâneas e exageradas.

Era bom como eles lidavam com isso em família, sempre fazendo o lobisomem ver as coisas com um pouco mais de aceitação e normalidade.

— Eu devolvo ele assim que chegarmos no segundo andar. — Draco viu de canto de olho o noivo sorrir para eles. Harry sempre seria um alfa idiota, apaixonado e, convivendo mais com Sirius, o loiro teve a certeza absoluta de que não mudaria com o tempo.

— Em todos os meus anos morando nessa casa eu nunca achei a escada tão grande quanto agora. — Remus começou a subir os degraus, demorando uns bons minutos em cada um, e o loiro permaneceu sempre ao seu lado, subindo pacientemente até a parte de cima da residência.

— Você vai se recuperar logo. As poções são as melhores possíveis e a cirurgia deu certo, só precisa ter paciência. — Draco sorriu quando o outro ômega balançou a cabeça irritado, e por um momento o loiro jurou que ouviu o lobisomem rosnar. — Não existe caminho rápido, e você sabe disso.

— Eu sei, eu sei! Estou ouvindo isso a meses. — Contraindo a boca em uma linha fina, Lupin tentou controlar seu mal humor, cada passo escada acima fazendo seu sangue gelar. Quando chegou no último degrau, o ômega pensou que poderia chorar de alegria. — O topo, finalmente.

— Está tão ansioso assim pra mais um banho do Alvo? — O loiro entregou o bebê a Remus, vendo como o sorriso do lobisomem cresceu ao segurar o neto outra vez.

— Sempre, é o meu momento preferido do dia. — Apesar do tom de brincadeira, as palavras transbordavam uma sinceridade que fez Draco sorrir e balançar a cabeça. Seu filho tinha uma família incrível.

Os dois sumiram de vista no corredor do segundo andar, e Narcisa, que observava tudo com os dentes rangendo, deu alguns passos em direção a eles, mas uma mão em seu ombro a impediu.

— Eu sei que dói, sei que você queria estar lá, mas essa não é sua casa e Draco não chamou você. Não vai conseguir participar mais da vida do seu filho se forçar isso, assim só vai afastá-lo. — Severus estava ao seu lado, de onde não saiu praticamente o dia inteiro, e sua confiança era tão firme quanto o aperto de sua mão.

— E o que eu devo fazer? Ver ele criar meu neto sem mim? — A ômega manteve o tom baixo, olhando em volta e vendo todas aquelas pessoas felizes comemorando. Ela não tinha nada para comemorar além de um abandono.

Narcisa daria tudo para ouvir o que Lupin falava com seu filho. Para saber onde os dois iam com o seu neto. O que iam fazer.

Era ela quem deveria estar lá ao lado de Draco.

— Lupin nem se quer teve um-... — A raiva transbordava dela, mas a ômega nem ao menos pode terminar a frase, pôr aquele sentimento para fora, porque Harry apareceu bem a sua frente, um rosto frio e impiedoso.

— Mais chá? — O alfa forçou um sorriso, estendendo uma bandeja cheia de xícaras para ela e Snape, mas o medo impediu Narcisa de falar qualquer coisa. Harry sempre foi surpreendentemente calmo, sempre gentil, mesmo quando destratado da pior forma. Ela nunca tinha visto o garoto assim.

— Não, estamos bem. Obrigado. — Foi Severus quem respondeu, com um pedido de desculpas silencioso em seus olhos. Harry não reagiu, apenas seguiu em frente e passou a servir outros convidados. — Silêncio, por favor.

— Eu não sei como ter meu filho de volta. — Depois que a raiva passou, as camadas debaixo ficaram expostas, e logo Narcisa lagrimejava. A ômega estava perdida, e no fundo sabia que não tinha alguém para culpar que não fosse ela mesma.

Quando Draco anunciou a gravidez, Narcisa ficou tão decepcionada que se afastou, ficando ao lado de Lucius enquanto o alfa fazia discursos repletos de raiva para o filho deles e seu companheiro. Depois veio o noivado, e tudo parecia tão mais real. Seu filho estava grávido e noivo de um alfa que poderia acabar com a sua vida em um segundo.

Lucius, como sempre, lidou com as coisas muito mais rápido do que ela. Prático como o inferno. E depois de Draco responder para ele em algumas discussões, o alfa se acalmou e deixou que o filho arcasse com as consequências das próprias escolhas sem mais sermões.

Então, os dois voltaram a falar de negócios, como se uma gravidez na adolescência não fosse nada demais. Tudo tão normal entre eles quanto sempre foi. E Narcisa? Bom, agora ela era a outra avó, a que morava na casa que nunca visitavam. A que tinha que implorar para ver o neto.

Quando recebeu a notícia que Draco estava superprotetor com o filhote, ela veio correndo até a maldita casa minúscula no interior, mas seu filho nem mesmo saiu do quarto para vê-la. Ele mandou, gritando através de uma porta fechada, que era para ela ir embora.

Sirius e Remus, que a receberam na entrada da frente e a informaram que era melhor sair, cheiravam ao seu neto.

A primeira vez que sentiu o cheiro de Alvo foi impregnado nas roupas de Black e Lupin.

Eles podiam ver o seu neto, mas ela não.

— Espere, seja paciente e demostre o quanto isso é importante para você. Peça, antes de tentar tomar. E se ele disser não, respeite. — Snape começou a conduzir a ômega através da sala, a puxando suavemente pelo braço. Narcisa estava prestes a desabar e ele queria evitar uma cena.

— Vamos ver o jardim? Delphini está começando a ficar manhosa. — Belatriz apareceu do outro lado da ômega, entrelaçando o braço que não carregava a filha ao da irmã. Ela entendeu de longe a intenção de Severus e foi ao socorro dos dois. 

— Ótima ideia. — Sorrindo para as pessoas a sua volta, o beta tentou achar alguma coisa que se parecesse com uma porta dos fundos. Belatriz encontrou a saída primeiro, puxando os dois até uma varanda modesta na parte de trás da casa.

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— Você acha que eu estou me saindo bem? — Depois de um bom tempo de silêncio confortável, Draco tomou coragem de perguntar. Suas mãos esfregavam a bucha macia na pele de Alvo e o loiro manteve os olhos fixos no filho, sem coragem de encarar Lupin ao seu lado.

Já fazia algum tempo que ele queria ter essa conversa com o ômega. Harry ajudava muito com as inseguranças, mas o alfa era tão inexperiente em ser pai quanto ele.

— E por que não estaria? São três meses sem uma única dor de ouvido por água, aprendeu rápido a dar banhos. — Remus sorriu, esbarrando seu braço no do genro para chamar sua atenção. — Está quase melhor que eu.

Draco demorou para encontrar seu olhar, respirando fundo antes de levantar o rosto.

— Não foi isso que eu quis dizer. — Sua voz saiu fraca, demonstrando toda a fragilidade que o vínculo estreito escondia. O loiro descobriu que era mais reservado sobre os próprios sentimentos do que achava, mas mesmo assim manteve a conexão com os sogros ativa, aberta apenas o suficiente para passar o essencial.

Gostava de sentir que Remus e Sirius estavam bem.

— Eu sei. — Agora foi a vez de Lupin desviar o olhar, pegando as roupinhas de Alvo na penteadeira em que pequena banheira de plástico estava apoiada. O lobisomem levou um bom tempo escolhendo o conjunto, os dedos se distraindo nervosamente no tecido macio. — Queria ter bons conselhos para dar, só que eu nunca vivi essa fase. Não tive uma gestação, não olhei um filhote tão pequeno. Sinto que sou um mentor falho nessa área, não sei se posso te dizer a coisa certa e tenho medo de arriscar falar algo e errar.

Remus odiava se sentir impotente. O lobisomem nunca se arrependeu de não ter engravidado, mas em momentos como esse, era frustrante não ter tido as experiências que ajudariam Draco.

Seu genro precisava de auxílio e ele não tinha nada além do que leu nos livros.

— Você sentia medo de estar fazendo as escolhas erradas enquanto criava o Harry? — Vendo todo o ânimo do outro ômega se esvair, Draco decidiu reformular as suas dúvidas. Alvo só tinha três meses, mas o peito do loiro já pesava com todas as possibilidades de fracassar. Ele poderia estragar a vida do filho de tantas maneiras que nem daria para contar.

Remus soltou um riso baixo.  

— Sentia isso o tempo todo. Tinha pesadelos com ele se machucando ou sofrendo sem que eu pudesse ajudar. Havia vezes que eu acordava no meio da noite e vinha até esse quarto para ver se ele ainda estava bem. — O ômega colocou as roupinhas em cima da cômoda e olhou em volta no quarto reformado. — Quando ele chorava eu entrava em desespero, me perguntando se era realmente capaz de fazer aquilo parar, de consolar e cuidar. E se ele parasse de chorar, mas continuassem com problemas?

Draco sabia que o sogro entenderia. Remus podia não enxergar, mas estava dando ao loiro toda a ajuda e apoio que ele precisava. Não era sobre a gestação ou cuidar de um filhote pequeno, era como lidar com o fato de que aquela vida dependia dele.

— E como isso passa? — Draco perguntou com mais firmeza. Ao ouvir as palavras de Lupin, um sentimento de reconhecimento e empatia brotou em seu peito, assim como um nó em sua garganta. Era um alívio saber que não estava doente com os resquícios da fase de superproteção, que esse tipo de medo era normal, mas ainda se sentia fraco em admitir os próprios receios.

Draco decidiu ter aquele filho e ele precisava se responsabilizar por isso, fazer o melhor possível para Alvo.

— Eu sinto muito, mas não passa. — Remus estava ansioso para ter algo a dizer ao genro, mas agora que tinha, se sentiu péssimo em ter que dar as más notícias. O ômega se via honrado por ter sido procurado para essa conversa, principalmente por saber o quão difícil era para Draco falar sobre o que se passava em seu peito.

— Estava preocupado que você dissesse isso. — Tirando o filho da banheira, o loiro o enrolou em uma toalha felpuda, se sentando com ele na cama. — Fico com medo de Alvo se machucar o tempo todo, medo de não estar lá se ele precisar de mim. Medo dele se engasgar ou cair no chão... medo de não ser um bom pai.

Remus só podia imaginar o quanto era difícil para o ômega dizer aquilo em voz alta.

— Você já é um ótimo pai, e toda essa preocupação é a prova disso. — Com calma, Lupin se aproximou da cama, se sentando suavemente ao lado do genro e do neto. Ele queria falar mais, porém sentia que, nesse momento, Draco precisava pôr mais algumas coisas para fora.

Demorou um tempo, o silêncio sendo quebrado apenas pelos resmungos baixos do bebê no ar, mas então o loiro voltou a falar. 

— E se eu não conseguir? E se ele não me amar? — As frases saiam como uma confissão, um pensamento sombrio que vinha direto da parte mais escura de sua mente. — Eu quero que o Alvo olhe pra mim com os mesmos olhos brilhantes que o Harry te olha. Quero ser capaz de fazer tudo pelo meu filho como você fez. Ter coragem pra me sacrificar, pra fazer dar certo e-...

Remus envolveu seu corpo em um abraço forte, afagando os fios loiros como sempre fazia com o cabelo do filho quando o alfa não estava bem. Mesmo sentados lado a lado na beirada da cama, o gesto foi confortável o suficiente para acalmar os nervos de Draco.

Alvo resmungou alegre com a mudança a sua volta.

— Você precisa respirar fundo e se acalmar. Eu sei que não é fácil, mas nesse estado você não consegue pensar direito, as coisas ruins nos seus pensamentos só ganham força quando você não raciocina. Elas parecem maiores no seu pânico, se alimentam da angústia e do medo. — Lupin manteve o abraço por alguns minutos, esperando até que a respiração de Draco engatasse em um ritmo calmo para soltar lentamente o genro. — Todos esses sentimentos que você sente são normais, eles veem juntos com as responsabilidades e não tem um jeito fácil de lidar com isso. Não existe um caminho rápido.

Remus aproveitou a oportunidade para se vingar, conseguindo arrancar um riso baixo do loiro.

— Não é bom quando é você ouvindo isso. — A risada leve ainda escapava dos lábios de Draco. Suas bochechas estavam vermelhas porque, agora que conseguia pensar melhor, o ômega se sentia envergonhado e exposto. — Sei que não estou lidando com a parte ruim da paternidade da melhor forma, mas tudo está sendo bem mais difícil do que eu pensei.

Remus queria despejar todo o carinho e afeição que tinha pelo genro sobre ele, dizendo o quanto tudo aquilo pelo qual o loiro estava passando era esperado, porém Draco ainda estava um pouco desconfortável com as próprias fragilidades e o lobisomem tinha que ir com calma.

— Você não controla suas emoções, boas ou ruins. Não é uma falha ter dificuldades para lidar com elas. — Lupin falou da forma mais tranquila que pode, deixando a admiração pelo genro transparecer em sua voz.

Draco já deveria ter se acostumado, mas era impossível não querer revirar os olhos com o a semelhança gritante entre seu noivo e os pais.

Será que Alvo se pareceria com Harry e ele?

— Eu fico muito feliz, de verdade, por você me ver como um exemplo de bom pai. Isso me deixa orgulhoso de mim mesmo e do Almofadinhas, nós nos esforçamos muito e ver que as coisas deram certo é o maior presente que poderíamos ter. — Depois de um bom tempo de espera, onde o ômega ao seu lado lidava com as coisas em sua cabeça, Remus voltou a falar. — Sinto isso olhando para o meu filho, para você e para o meu neto.

Draco finalmente levantou o rosto, encarando o sogro com um sorriso.

— Acha que seu filho ter engravidado alguém com dezoito anos é um sinal de que deu tudo certo? — O bom humor tomou conta do loiro por alguns segundos e ele começou a organizar melhor as próprias ideias. Remus disse que estava tudo bem ter medo e que isso só mostrava o quanto ele amava Alvo, então Draco tinha que acreditar nisso.

— Definitivamente, não é o que eu esperava, mas como eu poderia pensar outra coisa olhando pra vocês? — Sorrindo de volta, Lupin levou a mão até o ombro do loiro, dando um aperto firme antes de encarar o pequeno bebê em seu colo.  — Sou muito grato pela família que eu tenho, e vou passar o resto da minha vida repetindo isso.

— Acho que eu não pensei que fosse ter tanto medo porque não conhecia esse sentimento. É muito mais forte do que eu imaginava. — Draco não precisava, mas quis dar a pequena explicação. As palavras de Remus deram mais confiança ao loiro, que agora tinha uma outra experiência para comparar com a que estava tendo. Era reconfortante saber que não estava sendo paranoico, que suas dúvidas e medos eram válidos.

Tudo que estava sentindo era normal, e não uma consequência de ter engravidado tão cedo.

Um peso enorme foi embora com essa confirmação.

— Você tem que estar pronto, porque o amor que sente pelo Alvo só vai crescer, e com isso vão vir mais preocupações. — Lupin era imensamente grato por ver que Draco estava mais confiante, mesmo assim o lobisomem se arriscou a estragar isso dando um aviso que ele considerava importante. — Você diz que quer amar ele como eu amo o Harry, e eu digo que você já ama. Talvez não sinta tudo porque vocês só estão juntos a três meses e eu tenho meu filho há praticamente quatorze anos.

O tom de aviso não era hostil, mas praticamente obrigava Draco a prestar bastante atenção em cada palavra. Remus realmente queria que ele entendesse.

— Com o tempo você vai chegar lá, e vai doer na sua alma. Queima como o inferno. Você vai ver ele lindando com os próprios problemas e vai ter que aceitar que não pode interferir. Você vai sentir que é capaz de fazer qualquer coisa para evitar que ele sofra, mas não vai conseguir protegê-lo de tudo. — O que Lupin falava tinha muito peso, a experiência pessoal do lobisomem transbordando naquele relato.

Harry passou por um trauma muito grande quando era pequeno e Remus teve que lidar com o fato de que não podia tirar essa dor do filho. O ômega e Sirius passaram meses, anos, tentando ajudar da melhor forma possível, mas Draco sabia que a recuperação do moreno não foi fácil e muito menos rápida.

E então, apenas alguns meses atrás, veio a floresta proibida.

“Você vai sentir que é capaz de fazer qualquer coisa para evitar que ele sofra...”

— Eu queria dizer que não posso imaginar como é isso, mas eu vi a prova. — Draco não pensava muito sobre aquele dia. Na época era uma lembrança recorrente na sua cabeça, mas depois que descobriu a gravidez passado nenhum parecia importar. — Fico me perguntando se eu teria essa coragem, mas se Alvo já significa tudo pra mim com tão pouco tempo na minha vida, acho que não restam muitas dúvidas.

Agora, ele se permitiu voltar a pensar sobre a batalha, sobre tudo que estava em risco. Alvo poderia ter crescido sem um pai.

— Eu espero com toda a minha força que você nunca precise realmente pensar sobre isso. Saiba que não é pra ser uma escolha fácil. — Remus não se via como um grande herói ou se gabava do que aconteceu. Foi uma atitude desesperada onde o lobisomem não viu outra alternativa. Nenhum pai no mundo deveria ter que passar por isso, não era uma prova que todos precisassem enfrentar. — Acredito que todo o bom pai faria o que eu fiz, mas não julgo os que não fariam porque sei o peso da morte. Vejo nos seus olhos a sua decisão e fico feliz com a ideia de que isso não tem a menor importância, já que você e meu neto estão seguros.

Seria mentira se o ômega dissesse que seu peito não aqueceu ao ver aquela devoção cega ao bebê nos olhos de Draco, mas por Merlim, sua família ficaria longe de sacrifícios por um bom tempo.

O loiro não precisava disso para comprovar o quanto amava Alvo, a forma carinhosa e cheia de cuidado com que ele embalava o filho nos braços já era mais que o suficiente.

— Desculpa, você não deve gostar de falar sobre isso. — Draco balançou a cabeça, tentando não demonstrar como se sentia um idiota por ter tocado no assunto. Não era um tabu na casa, mas o loiro supôs que também não deveria ser o assunto favorito de Remus.

Eles estavam tendo uma conversa muito importante e a última coisa que o ômega queria, depois de receber tanta ajuda e conforto, era fazer Lupin se sentir mal.

— Não precisa se desculpar, eu sempre vou estar disposto a falar sobre o que for necessário para ajudar. É muito reconfortante ser útil. — Por um momento, Remus sentiu vontade de dar outro abraço no genro, mas se contentou em sorrir para ele. — As minhas feridas em relação aquele dia já cicatrizaram a muito tempo. Tudo deu certo e não tenho motivos para fingir que não aconteceu. Sirius fica com a cara amarrada quando alguém toca no assunto, mas nem ele se dói mais.

Draco também sorriu, e o vínculo entre eles era firme o suficiente para que o ômega entendesse que estava tudo bem. Ele podia falar sobre o que quisesse com Remus e isso dificilmente seria doloroso para o lobisomem.

Não precisava pisar em ovos quando se tratava da família. Se alguma conversa as incomodasse, as pessoas dessa casa simplesmente falariam.

Satisfeito com a feição alegre do genro, Remus se levantou e buscou as roupinhas que havia deixado na penteadeira. Um lindo conjunto marrom e verde. Ele também pegou sapatos confortáveis e uma blusa de frio grossa para suportar o frio de Londres.

— Estou ansioso para ver ele crescer, mas também não quero que o tempo passe. — Draco recebeu as peças e começou a vestir o filho, pensando em quanto tempo ainda tinha para fazer isso.

Logo Alvo não seria mais um bebê, e em alguns anos se vestiria sozinho.

— Esse é sem dúvidas o sentimento mais comum com qualquer pai. Não tenha pressa nem medo do futuro, é tudo que tenho pra te dizer sobre isso. —  Falar era mais fácil do que fazer, e Remus sabia muito bem disso, então tentou distrair o loiro com outra coisa. — Além do mais, Alvo pode ser o primeiro de muitos.

A imagem daquela casa lotada de crianças despertava um sentimento muito bom no lobisomem.

— É estranho, sabe? Eu sinto que vou ter mais filhos, mas não que vou engravidar. — Draco demorou ao pôr os pequenos sapatinhos em Alvo, brincando com o filho enquanto se permitia imaginar aquela possibilidade. — Eu não quero passar por outra gestação, e Harry diz que é por isso que me sinto assim.

Ter outro filho não era algo que discutiam com frequência, mas era óbvio que o moreno não ficava nem um pouco triste com essa possibilidade.

— Deve ser por isso. A gestação e o parto parecem muito difíceis. — Com Alvo pronto, Remus começou a arrumar as coisas no quarto, esvaziando a banheira de plástico e a guardando no banheiro acoplado ao quarto.

— Nada que uma poção forte não resolva. — Draco se levantou da cama e esperou o sogro na porta do quarto, agradecendo silenciosamente a ajuda. — Vamos?

Os dois desceram as escadas, em um ritmo tão lento quanto subiram, e assim que chegaram no primeiro andar Remus foi cercado por amigos. O loiro o deixou lidar com as perguntas e comprimentos gentis e foi procurar o noivo.

Severus apareceu na sua frente antes que achasse o alfa.

— O que minha mãe fez? — O ômega preferia fazer a pergunta diretamente para Harry, mas já que o padrinho veio primeiro, ele mataria sua curiosidade ali mesmo. — Eu senti no vínculo. Deve ter sido grave, porque Harry nunca reage a nenhuma provocação dela.

Vendo o olhar surpreso de Snape, Draco foi ainda mais direto. Ele sabia que algo havia acontecido e só queria um resumo rápido da história.

— Ela não fez nada, mas quase insinuou algo grave. — Snape demorou para responder, o que irritou seu afilhado, e quando finalmente disse alguma coisa não foi nada específico.  

— Vou falar com ele. — Draco passou por Severus, querendo resolver a situação o mais rápido possível, mas logo o beta estava na sua frente de novo.

— Não quer ver sua mãe primeiro? — O tom de voz de Snape deixou claro que não era realmente uma pergunta. Ele encarou o afilhado com um pedido claro nos olhos.

— E por que eu faria isso? Não foi ela quem saiu ofendida, foi? — Não importava o quanto Severus insistisse, o loiro não iria a lugar nenhum sem falar com o noivo primeiro.

Vendo a luta perdida a sua frente, o beta recuou.

— Draco, acho que vocês precisam conversar. — Ele foi o mais sincero possível, a voz baixa e a postura firme. O ômega era uma pessoa difícil e qualquer investida hostil ou incisiva poderia resultar em uma discussão.

— Primeiro eu vou até o meu alfa, depois dou uma olhada nela. — Draco queria dizer apenas não, mas faz tempo que estava evitando uma conversa com a sua mãe e talvez fosse melhor apenas resolver de uma vez.

— Ela está no jardim dos fundos. — Aquele era um ótimo começo, e Severus saiu com satisfação da frente do loiro, o observando chegar a Harry do outro lado da sala.

O alfa estava perto dos sofás, rindo com os gêmeos e Hermione de alguma coisa que, aparentemente, irritava Ron, já que o Weasley mais novo era o único emburrado.

Quando Draco chegou perto todos sorriram para ele, esperando que o loiro entrasse na conversa, mas ele apenas acenou e puxou Harry para longe com a mão livre.

— O que minha mãe fez? — Repetiu a pergunta quando estava a uma distância considerável do grupo. Os outros convidados ainda se distraiam tentando cumprimentar Remus, então dificilmente prestariam atenção na conversa.

— Adoro esse sabonete de bebê, fica sem cheiro. — Harry ignorou o noivo, estendendo os braços e pegando Alvo no colo. O bebê sorriu feliz para o pai, se alinhando rapidamente em seu peito.

Draco não se deu ao trabalho de responder, levantando uma sobrancelha e encarando o noivo com um olhar que deixava claro a urgência. Os dois gostavam quando o filho não tinha cheiro de rua depois de sair, mas não era a hora de falar sobre os banhos de Alvo.

— Eu estava servindo chá, acabei ouvindo um pouco da conversa dela e do Severus. — O moreno desistiu rápido da ideia de evitar aquela conversa. O ômega estava decidido e não tinha como ele escapar dali sem contar a história. — Não queria ouvir, sabe que eu não faço essas coisas, mas eu fiquei concentrado em não derramar as xícaras e não consegui controlar a audição.

Mesmo sabendo que não havia escapatória, Harry preparou o terreno com cuidado, enrolando para chegar ao ponto principal. Suas bochechas ficaram vermelhas ao admitir a intromissão que fez, mas a cena adorável não derreteu o mal humor de Draco.

— Acabei de ouvir uma versão horrível e nada didática sobre o que aconteceu e tudo que eu sei é que ele quase disse algum ruim. Eu espero que você esteja prestes a me dar mais informações que isso. — O loiro não se importava nem um pouco com o fato do noivo ter ouvido uma conversa particular. Era óbvio que ele nunca faria isso de propósito e perder tempo com isso era inútil. — E rápido.

Harry deu um longo suspiro antes de continuar.

— Não foi nada demais. Ela estava com ciúmes de você e do Aluado indo cuidar do Alvo e começou a desmerecer meu pai. — Não parecia “nada demais”, tanto para o alfa quando para o Draco furioso a sua frente, mas ele tinha que manter as coisas sob controle. — Ela ia insinuar que ele era inapropriado pra isso por nunca ter tido um filho. Eu cortei ela antes que terminasse a frase, então você não precisa arrancar a cabeça de ninguém. Desastre evitado.

O moreno se esforçou o máximo que pode para sorrir de forma alegre e descontraída. Ele não tinha levado para o pessoal e não havia motivos para o noivo lidar de outra forma.

— Só se for para você. — Draco levou uma das mãos, agora sem o peso do filho, até o rosto. Ele esfregou os dedos na pele fria em uma tentativa de se acalmar. — Eu estou cansado disso. Ela consegue constranger alguém em todo o evento que vai. Não tem mais avisos que eu possa dar! Você sabe o que ela disse pra Hermione?

Depois que Alvo nasceu, eles ficaram muito em casa, principalmente pela superproteção do loiro com o bebê, mas quando Draco começou a se sentir melhor, eles organizaram algumas reuniões.

Narcisa sempre dava um jeito de criar um clima ruim quando era convidada.

— Acabaram de me contar. — Balançando suavemente o filho, Harry desviou o olhar até os amigos, uma pequena onda de raiva passando pelo vínculo. A vida profissional de Hermione já estava sendo difícil o suficiente sem a beta ter que ouvir esse tipo de coisa dentro da sua segunda casa.

— Tenho vontade de acabar com isso e colocar ela pra fora de uma vez, daria tão menos trabalho. — Draco começou a andar em um pequeno círculo na frente do noivo, as mãos chacoalhando como se ele estivesse prestes a bater em alguém.

— Mas não é isso que você realmente quer, e nem eu. — No meio de tantos sentimentos fortes, Harry tentou se manter como a voz da ração, olhando em volta para todos os rostos familiares que vieram até ali comemorar. — Hoje não.

Não importava o que Narcisa pretendia dizer, ela era da família e não estragariam aquele dia a colocando para fora.

— O que você quer que eu faça? Dê outro aviso pra ela? — O loiro sorriu irônico, a voz irritada. Seus olhos se reviraram automaticamente. Era irritante para Draco pensar em todas as vezes que tentou explicar para sua mãe como as coisas funcionavam agora.

Nada na sua nova vida se parecia com o cotidiano da mansão Malfoy e ela se recusava a ver isso.

— Eu não sei, também não gosto desse clima ruim e é horrível ficar pedindo desculpas no nome dela. — Harry queria ter coisas positivas para dizer, algo que ajudasse a diminuir a irritação do noivo, mas ele não tinha nada, então foi sincero. — Essa casa está cheia de pessoas importantes pra nós e eu tenho que ficar olhando em volta toda a hora pra ver se alguém parece ofendido.

Surpreendentemente, a declaração fez Draco parar de andar e chacoalhar as mãos. É claro que Harry sempre se esquecia do quanto o loiro era narcisista. Concordar com ele era algo que sempre ajudava.

— É como ser babá de uma bomba relógio. — O ômega estava perdido, sem saber o que fazer para resolver essa situação do jeito mais rápido possível. De preferência, de forma definitiva.

Seus olhos foram até as portas que davam ao jardim dos fundos.

— Boa sorte tentando evitar uma explosão. Eu iria com você, mas essa conversa é particular e não acho que minha presença ajudaria em algo. — Harry leu tudo que precisava saber através do vínculo, sorrindo para o noivo como uma forma de incentivo.  — Narcisa me viu irritado pela primeira vez hoje, então talvez ela esteja em choque.

Conversar com a mãe faria bem ao loiro.

— Isso sim é uma coisa que eu gostaria de ver. — Draco, definitivamente, procuraria essa memória através da ligação mais tarde. Agora, ele precisava se concentrar na estressante tarefa a sua frente.

Dava para ver nas ires verdes o quanto Harry queria que ele fosse até o jardim e desse o seu melhor.

— Aqui, você vai precisar disso. — Sem muitas formas de ajudar, além de dar apoio, o alfa estendeu o braço livre e pegou uma das xícaras em uma bandeja próxima, a estendendo para Draco. — Chá de camomila, eu fiz bem forte.

O loiro bebeu o líquido quente em um gole só.

//////////

A tarde de Londres estava tradicionalmente nublada, e o céu era lindo visto da varanda dos fundos. Draco ficou parado um bom tempo nas portas de vidro antes de começar a caminhar até a mãe e Belatriz, que estavam sentadas na mesa de madeira no gramado.

Alvo se mexia tranquilo em seu colo. Harry ofereceu para continuar com ele, mas o loiro se sentiria muito melhor com o filho nos braços.

— Severus te mandou vir aqui? — Narcisa perguntou antes mesmo que Draco se sentasse a mesa, sem precisar virar o rosto para encará-lo nos olhos.

— Sim. — O loiro foi sincero, ocupando a cadeira que Belatriz havia acabado de deixar vaga. Sua tia não deu nenhuma explicação, apenas levou Delphini para dentro da casa depois de sorrir para ele.

— Você não viria se ele não pedisse, não é? — A voz de Narcisa transbordava escárnio. Ela cruzou os braços sobre o peito e continuou encarando o horizonte acima da cerca no fundo do quintal.

Draco não entraria naquele jogo.

— Harry também gostou da ideia, e não tem nada que eu não faça pra ver meu noivo feliz. — O loiro viu o rosto da mãe se contrair de raiva, e não pode deixar de sorrir com a pequena vitória. — Vamos conversar.

O tom firme deixou claro que Draco não se importava se a ômega queria ou não falar. Eles iriam resolver aquilo e ela não tinha direto a uma opinião contrária a isso.

— Você me excluiu da sua vida, me mandou embora e eu... eu não mereço isso. — Seu filho queria ir direto ao ponto e Narcisa daria isso a ele. Ela se virou na cadeira e olhou fixamente em seus olhos.  — Já tive que me distanciar da minha mãe, mas eu nunca, nunca, cheguei nem perto de ser a pessoa horrível que ela era. Então, por quê?

Um sentimento de revolta e indignação começou a brotar rápido no peito da ômega. As lembranças de quase duas décadas atrás encheram sua mente e isso foi deixando Narcisa nervosa.

Ela não era igual a sua mãe.

— As coisas mudaram. — Draco demorou para responder, percebendo que teria que ser a parte racional ali. — Sinceramente, não sei se você está mais envolvida. Eu tento te manter por perto, mas não me passa uma sensação boa. Você sempre parece incomodada com alguma coisa e isso me deixa ansioso. Eu penso em conversar com você, mas só de imaginar as suas reclamações sobre tudo que eu faço na minha vida eu desanimo.

O ômega se manteve calmo, ignorando o olhar carregado da mãe.

— Deixou essas pessoas tomarem o meu lugar. Me substituíram e o que sobra para mim? — Ela não parecia ter ouvido absolutamente nada, estava apenas colocando o que sentia para fora de uma maneira desordenada e raivosa.

A conversa não estava indo a lugar nenhum desse jeito, então Draco apenas apertou mais Alvo em seu peito, se preparando para aguentar tudo que a ômega descarregaria nele.

— Essa sua... vida nova, é afastada de tudo do qual eu fazia parte. Os seus novos amigos, as pessoas com quem você anda, me odeiam. — Narcisa, em momento algum, abaixou o tom. A raiva era mais forte do que qualquer outro sentimento.  —  Blasio e Pansy gostavam de mim, frequentavam a minha casa. Eram pessoas que me respeitavam, mas isso também não existe mais.

Draco pensou em contestar, explicar que ele, Pansy e Blasio tinha uma ótima relação, apesar de bem mais distantes que antes. O fato de ter escondido o status e a gravides não foi algo do qual os dois gostaram e isso causou algumas discussões, mas logo eles estavam bem de novo.

Pansy estava na luta para assumir as empresas do pai e Blasio estava tentando fugir dos casamentos com ômegas. Draco estava surpreendentemente a par da vida dele e, se o loiro fosse ter que descrever, ele diria que as coisas estavam até melhores com uma distância maior entre eles.

O ômega aproveitava alguns momentos com os dois, mas não o suficiente para começar a se irritar com as conversas, que sempre se tornavam relatos sexuais. Draco, definitivamente, não queria ouvir sobre o que eles faziam, e normalmente essa era a parte que ele os mandava embora.

— Ninguém te odeia, mãe, eles mal te conhecem. O problema é que, o pouco que conhecem, é horrível. Você não perdeu uma única oportunidade de estragar sua imagem com eles nas poucas vezes que se encontraram. — Resolvendo ignorar a parte sobre os ex-colegas de casa, o ômega se focou no que realmente importava. — É como se estivesse se esforçando muito para isso.

— Você só fala assim porque não sabe como eu me sinto com isso. — A ômega estava tão cega com aquele ódio que mal conseguia assimilar as palavras do filho. — Eu não queria ofender ninguém, mas tudo que eu falo está errado! Você não me da uma chance de realmente estar ao seu lado.

— Eu te dei todas as chances para você participar da minha vida. Quando eu contei da gravidez. Quando anunciei o meu noivado. Quando disse que ia me mudar para cá. — Draco tentou muito não se deixar levar. Ele queria ficar centrado e conduzir aquela conversa com o mínimo de emoção possível, mas naquele ponto a paciência acabou. — Você não me apoiou uma única vez, e agora vem dizer que estão roubando o seu lugar? Qual lugar?

Era impossível evitar o nervosismo quando sua mãe estava agindo sem o mínimo de coerência.

Draco podia puxar facilmente na memória o dia em que entrou na mansão e anunciou a gravidez, e a forma como sua mãe queria fazê-lo se sentir culpado por isso. Ela responsabilizava Harry, seus sogros, qualquer um, e passou dias repetindo o quanto estava decepcionada.

No anúncio do noivado, Narcisa fez birra, e não apareceu no jantar, deixando Lucius guiar sozinho a comemoração.

Meses depois, quando o fim do ano letivo se aproximava, a ômega começou a insistir que Draco e o bebê, e apenas os dois, se mudariam para a mansão após o parto.

Depois de aturar tudo isso da sua mãe, ele não iria ficar parado ouvindo ela dizer o quanto era a vítima.  

— E que tal hoje? Esse é um momento importante para minha família, e você simplesmente não consegue ser gentil, desrespeitando uma das madrinhas do seu neto. — Sem mais um pingo de paciência, Draco passou a aumentar a voz, os olhos fixos nos da ômega.

Minha família.

Narcisa abriu a boca várias vezes, mas ela não conseguiu dizer nada. Draco aproveitou essa brecha para investir ainda mais.

— Enquanto você não aceitar que o problema é você, não vamos chegar a lugar nenhum. É muito fácil dizer que eu te mantei embora da minha vida, que eu estou te privando das coisas, mas eu nunca fiz isso. — Estava jogando tudo na mãe, e sua esperança era que ela finalmente entendesse onde estava. A calma não resolveu antes e não era como se Draco conseguisse a manter agora. — Essas pessoas não roubaram o seu lugar, o lugar é delas, sempre foi. Você não tem espaço na minha vida porque não participou para isso.

O cérebro da ômega parecia processar as palavras devagar. O loiro quase podia ver as engrenagens girando lentamente e torcia para que o veredito fosse algo útil.

— Quer que eu suma de vez da sua vida? — Quando Narcisa falou, ela parecia completamente diferente de antes, mesmo que igualmente cega. Ela saiu da postura agressiva e pareceu desabar um uma triste e desesperada.

Por muito pouco, Draco conseguiu evitar revirar os olhos. Ela tinha perdido a raiva, o que era bom, mas ainda não estava aberta para realmente entender a situação.

— Não quero que você desapareça, mas são raras as ocasiões em que eu realmente sinto vontade de ficar com você por mais de algumas horas. É cansativo. — O loiro se manteve fiel a sinceridade, soando mais hostil do que o necessário em alguns momentos. — Você precisa mudar, e rápido. O tipo de pensamento que a senhora carrega não é bem vindo na minha casa, muito menos os seus olhares de reprovação e os comentários desnecessários. A sua antipatia pelo meu alfa e a sua birra com os meus sogros também não.

Silêncio no jardim frio.

Palavras pesadas demorando cada vez mais para serem digeridas.

— Ou você muda, cresce e se adapta, ou o seu espaço vai ficar cada vez menor. Não vou pedir paras as pessoas que eu amo, e que fazem de tudo por mim, para te aturarem só porque é minha mãe. — Assim que Draco terminou de falar, uma pergunta ficou clara nos olhos de Narcisa, a dor completamente exposta. — Eu também te amo, mas só amor não basta. Preciso amar a pessoa que você é, e estou muito longe disso.

De repente, a urgência começou a atingir a mente da ômega em ondas. Era como se ver em frente a um abismo, sem saber em que momento chegou tão perto. Ela ia cair se não fizesse nada.

— Eu posso mudar, mas preciso de tempo! — Quando Draco fez menção de se levantar da mesa com o bebê, Narcisa agarrou seu braço, o mantendo no lugar. — Por favor, me dê mais uma chance.

Ela parecia mais sensata assim, o choque a deixando sóbria rápido.

Não havia mais drama ou tentativas de superioridade, o que Draco achou muito bom. Ele já deveria ter dado esse ultimato a sua mãe a muito tempo.  

— Essa é sua chance, hoje. — O loiro concordou em ficar na mesa, mas não suavizou o tom de voz quando voltou a encarar a mãe nos olhos. — Peça desculpas a Hermione, e com muito respeito, porque ela não só é uma bruxa incrivelmente competente, como também é uma das madrinhas do Alvo e uma grande amiga.

Teriam que resolver agora de uma forma ou de outra. Se Narcisa se recusasse, então demoraria muito tempo até ela pisar naquela casa outra vez.         

— Vou me retratar com ela, eu prometo. — Ainda restava muita confusão nos olhos da ômega. Raiva. Tristeza. Medo. Tudo se misturava nas ires enquanto ela tentava lidar com suas opções da melhor forma possível. Narcisa não queria ir embora, e vendo o questionamento silencioso no rosto do filho, ela se adiantou em responder. — Não só com a Granger.

Ela não queria ficar fora da vida de Draco, não queria perder o crescimento de Alvo, e isso tinha um preço. Não importava o quanto ainda se sentisse indignada com aquele tratamento, uma parte dela começava a entender que merecia isso, e essa parte precisava crescer rápido.

Não restava tempo para pensar nem espaço para discutir, ela precisava engolir tudo aquilo e estar pronta para entrar na nova vida do ômega.

O silêncio voltou a pendurar no jardim, se mantendo por um bom tempo depois disso, cada um ocupado com os próprios pensamentos, decidindo o que fariam com o resultado daquela conversa.

Draco havia conseguido o que queria, mas não sentia que era uma vitória. Não ainda.

— Daqui pra frente, conforme você melhora, vou tentar te manter mais a par de tudo. — Se a ômega estava realmente disposta a colaborar, ele não via razões para dificultar isso. Draco pensou muito antes de continuar a falar, encarando o pequeno bebê em seu colo. — Daqui a um mês, Alvo vai ter uma consulta em um dos nossos hospitais. É um exame de rotina. Vamos eu, meu noivo e os pais dele. Se você quiser nos acompanhar, vai ser um prazer, desde que você não deixe ninguém desconfortável.

O loiro jurou para si mesmo que aquela era a última vez que ofereceria algo assim a Narcisa sem que a ômega merecesse o convite, e mesmo nunca tendo dito isso em voz alta, a implicação ficou óbvia quando voltou a encará-la.

Estava claro que Draco presaria pelo bem estar da sua família, e se a ômega ficasse no caminho, ele a deixaria para trás.

— Não vou causar problemas, só quero ajudar você e o meu neto. — Narcisa sentia as emoções a flor da pele, um bolo delas, mas se recusou a chorar ou abaixar a cabeça. O abismo havia se fechado, mas agora uma estrada longa e íngreme tomava o seu lugar.

— Nossa família é maior do que eu e Alvo, quanto mais rápido você entender isso, melhor.  — Draco não iria perdoar nem mesmo uma mínima desfeita. As coisas precisavam ser claras, os limites bem definidos.

O silêncio voltou outra vez, mas parecia um pouco menos denso.

— Pode pegar, mas vou pedir de volta logo. — Depois de alguns bons minutos pensando, Draco parou de ignorar o olhar fascinado da mãe em direção ao seu filho e estendeu o bebê até ela. — Vocês demoraram muito com ele hoje e não é bom quando o Alvo fica tanto tempo longe de mim.

Narcisa ficou completamente surpresa, seu rosto demonstrando o quanto a ômega não espera ouvir aquilo tão cedo.

— Obrigada.

//////////

— Fim de festa é um saco. Não tinha nem vinte pessoas aqui e olha essa bagunça! — Ron acabava de voltar da cozinha com uma bandeja vazia. Ele já tinha se livrado dos sapatos a muito tempo e seu casaco devia estar jogado em algum lugar pela casa.

Hermione riu do quanto o namorado parecia acabado.

— São só copos para lavar, não reclama. — Ela usava um pano para tirar as manchas e respingos de bebidas da mesa de centro, dos vários criados mudos e superfícies de apoio pela casa. — A gente ainda precisa falar de trabalho hoje, por mais que eu esteja feliz e não queira estragar isso.

A beta esticou as costas quando finalmente terminou o trabalho, olhando ao redor na sala.

Draco ainda não tinha descido, ele estava amamentando o filho no andar de cima, ganhando um tempo de folga depois de ajudar um pouco na limpeza. Harry estava esticado no tapete, a vassoura deitada ao seu lado como se fossem companheiros de trabalho em um momento de descanso.

O moreno não havia realmente terminado de varrer todo o cômodo, mas ninguém se atreveu a mandá-lo levantar.

Tinha sido um dia cheio e todos estavam exaustos de muitas formas.

— Adoro ouvir notícias do ministério, vai ser um prazer participar. — Remus parou no batente da porta, contemplando a mesma cena que Hermione. Ele sorriu para ela e mancou desajeitado até uma das poltronas. — A menos que seja algo particular.

O lobisomem se apresou em completar, não querendo se intrometer no que não tinha sido chamado.

— Longe disso, mas não quero ocupar seu tempo com o meu trabalho. Você já é o melhor mentor do mundo sem que eu fique cobrando ajuda o tempo todo. — A beta sorriu abertamente para ele, indo deixar o pano na lavanderia antes de começar a arrumar as almofadas nos dois sofás.

Depois que os convidados foram embora sobrou muita coisa para fazer, então Ron e Hermione continuaram na casa. Provavelmente eles iriam dormir ali, mas ninguém comentou nada sobre isso.

Não era como se os dois precisassem pedir, podiam vir a hora que quisessem e ninguém nunca os mandava embora.

No começo, quando Draco se mudou para aquela casa e antes da superproteção a Alvo, Ron e Hermione vinham com mais frequência, principalmente fugindo da casa do ruivo. Molly amava a beta com todo o seu coração, mas isso não significava que reagiu bem ao saber do relacionamento dela e do filho.

Não havia mulheres betas na família antes de Gina, e definitivamente a matriarca não achou que teria outra por casamento.

— Que ótimo, vamos ter uma reunião de trabalho em família. Eu acabei de por o Alvo na cama e preciso conversar sobre algo que não seja a paternidade. — Quando a voz de Draco chegou até a sala, ninguém tinha ânimo para virar a cabeça e encarar o loiro, então apenas esperaram ele terminar seu caminho até o centro do cômodo. — Não aguento mais responder como eu me sinto.

O trabalho do loiro, começando a administrar as várias empresas no nome Malfoy, era completamente diferente de qualquer coisa que faziam no ministério. Mesmo assim, sem ter nada a acrescentar que pudesse ser útil, Draco entrou na conversa.

— Não sei se vou conseguir me concentrar em trabalho, to nervoso com o exame médico. O excesso hormonal está na minha ficha, todos da administração sabem, mas não os meus colegas de equipe. — Harry resmungou do chão, colocando um dos braços sobre o rosto. O cheiro do seu ômega de volta na sala acalmou um pouco a ansiedade, mas ele não tinha forças para se levantar. — Depois do teste vem as missões em campo e eu não quero que as pessoas me evitem. Isso vai ser um desastre.

Entrar no ministério tinha sido mais fácil do que o moreno achou que seria. Ou talvez, o que era mais provável, ele tenha se preparado tanto para o pior que qualquer coisa mais suave que isso já era ótima.

Harry passou em todas as provas e testes físicos, e mesmo que a sua condição hormonal tenha chamado a atenção dos avaliadores, eles não viram nada em seu comportamento que validasse uma reprovação.

O alfa nunca perderia o controle, não depois de tudo que fez para chegar até ali.

Uma vez na equipe de recrutas, Harry fez um bom número de amigos e admiradores. As habilidades do alfa chamavam a atenção de qualquer um que passasse perto e todos sempre queriam assistir seus treinos.

— Harry, ainda vai demorar meses até lá, você tem tempo de fazer as pessoas te conhecerem. — Hermione entendia perfeitamente as preocupações do amigo, mas tinham que se manter otimistas. Nem todas as pessoas do mundo eram horríveis. — Quando descobrirem talvez seja um choque, mas eles já vão saber quem é você.

A beta queria acreditar nas próprias palavras com todo o seu coração, mas até ela, tentando muito ver pelo lado bom, tinha dúvidas.

O sufocante era que, de dentro do escritório, Hermione interagia muito pouco com Harry e Ron. Tudo que sobrava para a beta era torcer pelo melhor e tentar manter o moreno animado.

— Qualquer um que te evite por isso não é alguém que você quer ter por perto. — Draco entrou na conversa, se sentando ao lado do noivo no chão e trazendo a cabeça do alfa até o seu colo. — Eles vão estar te fazendo um favor. Poupando seu tempo.

Ele começou um carinho leve nos fios bagunçados, monitorando o vínculo atrás de alguma memória ruim envolvendo o treinamento de Auror.

Até agora as coisas estavam muito bem, o problema era como seriam depois do exame médico.

— E essa é uma ótima hora para você provar o quão competente é. Eu trouxe uns papeis e preciso da sua opinião. — A beta deu um grande sorriso na direção dos dois no chão, recolhendo a vassoura ao lado deles e se apresando em terminar a arrumação da casa.

— Obrigado por querer saber o que eu acho também. — Ron não perdeu a chance de resmungar quando a namorada passou por ele indo para a cozinha, ganhando um tapa leve e um beijo.

— Sem drama, você sabe que análise de casos vai ser a especialização do Harry. — Ela foi direto até a pia, sorrindo para Sirius, que terminava de lavar as várias xícaras e copos que eles haviam recolhido pela casa.

Ao ver que Hermione trazia ainda mais louça suja, o alfa não sorriu de volta.

Tudo parecia em ordem de novo, então ela foi até um dos armários e retirou sua bolsa, ignorando o peso e a levantando alto quando voltou para sala.

— Estão aqui! Pensei que seria uma opção divertida pra um pós-festa. — Ela chacoalhou a sacola de tecido como se fosse uma grande pinhata colorida e alegre, mas isso não gerou muita empolgação.

— Da próxima vez, traz só uma garrafa de rum. — Draco jogou o comentário no ar, rindo junto com os amigos, mesmo que todos soubessem que o loiro teria que ficar longe do álcool por um bom tempo.

Paternidade tinha seus custos, principalmente quando você ainda tinha que produzir leite.

— Eu sei que à primeira vista não parece ser tão interessante assim, mas... tem alguns casos bem diferentes. — A beta caminhou até a mesa de centro e espalhou os papeis sobre a madeira, começando a organizá-los. — Vou ter que entregar relatórios sobre eles em três dias e preciso muito que avaliem primeiro.

A discussão começou leve. Hermione explicou sobre alguns roubos de artefatos e desaparecimentos importantes, enquanto Ron e Harry, devidamente sentados ao seu lado, tentavam ver alguma ligação entre os casos.

Remus sempre comentava, com muito mais experiencia do que qualquer um ali, e seus conselhos foram anotados integralmente no bloco de notas de Hermione.

Draco não disse muita coisa, se preocupando em permanecer ao lado do noivo e tentar entender alguma coisa da conversa. Não demorou muito para sua mente começar a divagar.

O loiro precisava pensar sobre sua própria profissão. Algo para começar a trabalhar quando se estabelecesse bem como administrador. Seu pai tinha sugerido algumas formações que lhe dariam muita credibilidade e o loiro pensou sobre isso.

Medibruxo era sua favorita.

Quando leu a pequena lista de Lucius, Harry apontou logo para Auror. Como o idiota apaixonado que era, o alfa ficou animado com a ideia de trabalhar junto do noivo algum dia, mas Draco era bem mais realista que isso e sabia que esse era um caminho rápido para o desastre.

Por sorte, o loiro gostava apenas de ouvir e dar suas opiniões sobre a carreira do noivo, sem se interessar muito em se candidatar a ela no futuro.

— Amor, hora de abrir os cartões! — Sirius entrou na sala um bom tempo depois com vários envelopes coloridos nas mãos de diversos tamanhos. Ele foi o encarregado do trabalho mais longo, e suas mãos estavam levemente enrugadas de tanto ficarem molhadas na pia. — Alguns amigos não puderam vir, então eles mandaram lembranças. Tem até uns presentinhos no meio... desculpa interromper, é importante?

O alfa pareceu perceber tarde demais que estava invadindo uma reunião, olhando para os jovens adultos sorridentes e depois para o esposo.

— Acho que podemos fazer uma pausa. — Começando a reorganizar os papeis e suas próprias anotações, Hermione declarou um intervalo, para alívio de todos os outro ali e dela mesma.

— Isso seria ótimo. — Harry concordou na mesma hora, voltando a se deitar com a cabeça no colo de Draco.

Sabendo que podia andar até o marido sem atrapalhar mais nada, Sirius seguiu direto até a poltrona de Remus, despejando os vários envelopes em seu colo.

— Tudo para você. — O alfa ficou satisfeito encarando a pequena pilha sobre Lupin. Era sempre bom lembrar de todo o carinho e admiração que as pessoas sentiam pelo ômega.

— Quem diria que voltar a andar fosse me render tanta atenção, tem até chocolates. — Remus ergueu uma caixinha que tirou de dentro de um dos envelopes mais pesados, mostrando a marca cara para todos na sala. Os olhos que o encararam eram brilhantes e pidões, fazendo o lobisomem perceber seu erro. — Vou dar meio pedaço para cada um e nada a mais.

Logo todos estavam amontoados perto da poltrona de Remus, mendigando como crianças faminta por um pouco mais de doce. Sirius deveria mostrar maturidade, mas se juntou aos quatro no chão na forma de um enorme cachorro preto, atrapalhando os outros enquanto pulava em cima deles e tentava abocanhar as migalhas que Remus aceitava dividir.

Depois que o doce chique acabou, o lobisomem se viu quase obrigado a mancar cambaleando até a cozinha e fazer um chocolate quente. Não era de uma marca tão cara, mas as receitas do ômega estavam na sua família a gerações e cacau importado nenhum substituiria isso.

Foi uma boa forma de terminar a noite, cozinhando lentamente enquanto a conversa vinha alta da sala.

Remus ouviu pegadas arranharem o piso e logo uma mudança brusca surgiu no ar. Ele riu enquanto o marido envolvia seu corpo nos braços e apoiava o rosto em seu ombro.

Os anos futuros podiam ser cruéis o quanto quisessem, sua família ficaria bem.

//////////

— Como você está? — Harry franziu o rosto quando saiu pelas portas de vidro e se deparou com o frio do jardim dos fundos. Draco estava deitado na rede da varanda, o filho muito bem agasalhado descansando sobre seu peito.

Todos na casa já tinham ido dormir e, assim que deu boa noite aos pais e aos amigos, o alfa foi procurar o noivo para poder se deitar também.  

— Não tão bem quanto eu gostaria, mas não mal o suficiente pra isso ser um problema. — Draco respondeu preguiçosamente, levando uma das mãos até a testa. Ele estava com dor de cabeça, provavelmente por conta da conversa que teve mais cedo no jardim a frente dele.

— O dia foi cansativo, não quer vir descansar? — O alfa estava rezando silenciosamente para ouvir um “sim”, querendo escapar do frio direto para lenções quentes, mas no fundo sabia que seria muito improvável.

— Não. Fica aqui com a gente. — Com a voz manhosa, Draco esticou a mão na direção do noivo, querendo a presença dele por mais um tempo. Por toda a vida, se possível.

— Não vou a lugar nenhum sem você. — Sorrindo derrotado, Harry puxou uma das cadeiras para mais perto da rede, segurando a mão que foi estendida a ele. Os dois cabiam naquela rede juntos, mas Alvo estava dormindo e não arriscariam perder essa paz. — Nós não tivemos muito tempo pra conversar. Quer falar alguma coisa sobre a sua mãe?

Harry podia evitar esse assunto, já que pelo vínculo estava claro que as coisas haviam se resolvido, mas o alfa ainda gostava muito de conversar sobre as coisas.

O céu cairia antes que isso mudasse.

— Ela vê as coisas do jeito dela, mas eu dei um basta. Disse que se ela não mudasse era melhor ficar longe. — Draco não teve medo de soar agressivo demais ou insensível, sabendo que o noivo o conhecia melhor que isso. A prova de que Harry estava ao seu lado naquelas decisões era o carinho suave que o moreno fazia em sua mão. — Ela disse que ia mudar e eu a convidei pra próxima consulta do Alvo.

Silêncio.

— Não acha uma boa ideia? — Não era como se o loiro esperasse uma reação feliz e animada, mas Harry quase nunca ficava ser ter o que dizer.

— Qualquer coisa que envolva a sua mãe e eu no mesmo ambiente eu penso duas vezes antes de chamar de “boa ideia”. — Harry riu da própria piada, se concentrando nos movimentos que fazia conta os dedos suaves do ômega. — Mas fico feliz que você está deixando ela tentar se aproximar de novo.

A sinceridade escorria de sua voz e Draco nunca poderia esperar menos que isso dele.

— Minha mãe me disse tanta coisa absurda, e o pior é que ela acredita que é verdade. — O loiro se lembrava bem das palavras carregadas de Narcisa, da forma como ela parecia pôr sua alma nelas. — Acho que, apesar disso, ela pode mudar. Eu vi algo nos olhos dela. Antes de ir embora, o Severus me disse pra ter paciência, falou que a “Cissa” já surpreendeu muito ele. Belatriz também acha que só preciso esperar.

Os três eram muito próximos. Snape era como um irmão mais velho para as ômegas, então aquelas opiniões não eram nem um pouco imparciais.

— Eu acho que é questão de um milagre. — Harry não se sentia muito otimista em relação a sogra, a experiência própria falando mais alto do que a esperança.

— Não posso discordar disso. — O loiro riu e apertou a mão do noivo, levando o braço livre até o bebê em seu peito e o envolvendo delicadamente.

Eles podiam lidar com Narcisa Malfoy, não seria o fim do mundo.

— É bom acreditar em milagres de vez em quando. — Com a voz carregada de humor, Harry respondeu suave, deixando um beijo na mão do ômega. Draco revirou os olhos para isso.

— Cala a boca.  — Ele não encarou o noivo, passando a olhar fixamente para o céu escuro e nublado. Algumas estrelas eram tão brilhantes que conseguiam se destacar entre as nuvens confusas. — Se ela melhorar e eu não ter mais que participar desse teatro de grego dela, está ótimo.

Harry até tentou conter mais um riso por respeito a sogra, porém a expressão indignada de Draco o fez gargalhar, o som soando alto demais na noite fria e vazia.

O bairro em que estavam era perfeito. Mesmo agora, em um clima gelado tão deserto e morto, a vida se esgueirava por brechas na escuridão. Luzes de televisões e risos de crianças sempre aparecendo em algum lugar. A risada do alfa agora se juntava a esses requisitos de existência no ar.

Draco se permitiu imaginar se algum dos seus vizinhos estava, como eles, encarando a noite escura. Ele se perguntou se ouviam suas vozes baixas e suas risadas. Era como fazer parte de um pequeno ecossistema.

— Gosto de ficar aqui a noite, ver as estrelas e as arvores balançando com o vento. — Depois de um bom tempo apenas encarando o céu, a cerca média e os telhados alheios ao longe, Draco admitiu em voz alta. É claro que o noivo já sabia disso, mas era bom repetir. Era bom falar.

— Eu também, sempre foi um dos meus lugares preferidos da casa. — Harry sentiu seu peito encher de satisfação com as palavras do noivo, encarando o bom jardim que se estendia a frente deles.

Os dois então se olharam em silêncio, um pensamento em comum passando por eles e sendo compartilhado pelo vínculo.

Será que Alvo gostaria daquele jardim?

— Podemos passar a noite aqui? — Draco pediu, como uma criança que se recusava a entrar para dentro e tomar banho antes do jantar. Sua voz soou tão tranquila que Harry se sentiu mal só de pensar em recusar.

— O sereno é forte. — Desviando os olhos para o pequeno bebê, o alfa tentou se manter firme, querendo que Draco pensasse melhor sobre essa escolha.

— Mas eu gosto de esperar a neve. — O loiro olhou de volta para o céu, se concentrando apenas nas nuvens que se embolavam e chacoalhavam muitos metros acima deles.

 Como se tivessem sido chamados, os flocos começaram a cair lentamente.

Harry podia apenas esperar alguns minutos e tirar o noivo e o filho dali, já que o desejo de Draco havia se cumprido, mas ele não se moveu. Juntos, eles viram uma camada de neve começar a se formar sobre a grama, engrossando a cada minuto.

Nenhum dos dois disse mais nada, encarando o céu, a neve e o pequeno bebê que estava protegido da noite fria.

Tudo só ficaria mais difícil dali em diante.

A carreira de Harry no ministério. O futuro de Draco como herdeiro Malfoy. Hermione e Ron tentando planejar um noivado para algum ano em que estivessem estáveis nas suas carreiras igualmente complicadas. A saúde de Remus. E, junto com tudo isso, o crescimento de Alvo.

Em alguns momentos, parecia demais para lidar, mas em noites assim, quando a neve caia suave e a vizinhança amigável cochichava segredos em volta deles, a ansiedade e a esperança eram maiores que o medo. 


Notas Finais


Muito obrigada por continuarem comigo até aqui!

Eu espero, realmente, que vocês não estejam decepcionados, mas eu entendo caso estiverem. Muitos estavam ansiosos para ver o que aconteceu depois que Ligação Eterna acabou e, quando o capítulo finalmente veio, ele foi """curto""" e menos detalhado do que o normal. A questão é que não era isso que vocês queriam, uma explicação do que aconteceu, vocês queriam LER esses momentos. Queriam CAPÍTULOS mostrando esses momentos em tempo real. Uma continuação direta de Ligação Eterna, os capítulos 31, 32, 33... e não um spin-off com um pulo de tempo de um ano.

A questão é que mesmo eu tendo mais conteúdo para mostrar, esse conteúdo não seria o suficiente para encher capítulos inteiros, porque a trama principal já tinha acabado. Eu planejei a história para 30 capítulos e organizei os acontecimentos dentro desse espaço, e algumas coisas eu simplesmente não quis colocar, achei que não se encaixavam. Uma vez fora da história principal, as cenas ficaram inviáveis. Montar capítulos inteiros só para mostrar um ou outro acontecimento marcante não valia a pena nem pra mim nem pra vocês.

O spin-off foi a solução que eu mais gostei, um espaço para desenvolver melhor alguns personagens que não tiveram tempo suficiente de tela para isso e ainda, como um grande brinde, poder mostrar mais do que aconteceu depois do capítulo 30 sem ter que alongar Ligação Eterna (Que já é uma história enorme tanto em capítulos quanto em palavras).
Agora, com tudo definitivamente concluído, eu posso pensar na possibilidade de criar uma NOVA história, algo longe de Hogwarts e focado na vida adulta dos dois, alguns anos depois desse spin-off. Isso, é claro, são só ideias, porque apesar de ter algumas coisas planejadas e de ter, esperançosamente, já deixado os ganchos para isso, eu não sei se vale a pena inverter nessa nova história. Tenho MUITOS projetos, coisas que eu quero desesperadamente escrever, e eu adiei muito deles para fazer esse spin-off e poucos leitores migraram de L.E para cá.

Eu não estou reclamando! Nunca! Sou grata a todos os leitores e jamais pediria a vocês que lessem uma história pela qual não se interessaram, mas infelizmente ainda é um pouco frustrante sair de INACREDITÁVEIS 2 mil favoritos para menos de cem.

É lógico que as coisas não giram em torno de números e eu sei que provavelmente nenhuma das minhas histórias futuras vai fazer tanto sucesso quanto Ligação Eterna, mas por se tratar do mesmo universo eu acabei criando expectativas altas. Eu não posso adiar os projetos que tenho na minha cabeça para fazer uma continuação, um """segundo livro""", se for algo que as pessoas não querem ler.

Eu queria muito que vocês vissem no meu coração que não é birra, eu não estou emburrada e pedindo favoritos como uma criança, eu apenas estou dizendo que não adianta eu fazer algo que as pessoas não querem ler. Uma continuação é para os leitores, e não tenho condições de entrar em um projeto assim e arriscar estragar o universo de L.E com uma história que ninguém quer ler. As pessoas amam pedir sequências, mas quando sai elas não vão no cinema para ver, ou reclamam das coisas a mais, do quanto é diferente do primeiro, e isso dói muito. Eu não quero transformar Ligação Eterna em um “Velozes e furiosos” que nunca acaba, com livro 2, 3, 4 e tudo mais.

Então: Se vocês querem ver uma sequência, precisam querer com consciência, precisam pensar se é realmente isso que vocês desejam, porque SE e quando eu tiver tempo para parar e escrever sobre isso, eu preciso ter certeza que vocês estarão aqui para me dar apoio e, principalmente, consumir o meu conteúdo. Eu não sou nada sem vocês, sem apoio, sem críticas.

Preciso cuidar de outros projetos então, de qualquer forma, vai demorar para eu se quer pensar nisso.

Como essa história teve um engajamento menor, tenho como agradecer cada usuário pelo apoio. As vezes no meio da noite eu me perguntava “Onde eu me enfiei com mais uma história”, mas os comentários e vocês me motivavam a levar isso até o fim. Demorou, e muito, mas consegui concluir esse projeto graças a vocês.

Um obrigado a todos que leram e, ainda mais, aos que comentaram.

Agradeço: LumaRS019, leanleal, SrtaDigorry, EMiranda, daianemalfoy, Dessaune, ZeraZehel, BloodyJessy, Pakkun-chan (Primeiro usuário a ouvir sobre a ideia desse spin-off), Barb_Moony, FaFaVe, the_cherryy, HanaAkuma, Half-Blood_Prince, talibass, Belatrix2725, batata_do_yaoi_1200, FuinhaDeOculos, Flavuska, conelhinha, GeraldLucca, sofister, Indiazinha15, Mooneletricx.


Se eu esqueci de alguém, por favor, me perdoem, tentei listar todos que comentaram!

Um grande beijo pra todos você, obrigada mesmo pelo apoio, espero poder ter a honra de encontrar vocês em outros projetos meus!

Feliz Natal!


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