É impossível continuar do jeito que está. Há limites para a cegueira, para a ilusão. E eu já ultrapassei todos os possíveis, todos os cabíveis. Hélia estava certa naquela conversa de anos atrás. Quanto tem de nós naquilo que odiamos? Eu sempre detestei essas mulheres que se humilham por amor, que aceitam toda e qualquer migalha, que não tem um pingo de amor próprio e respeito por si. Eu passei tantos anos sendo forte por mim, por meu filho, quando foi que me deixei fraquejar a esse ponto? A ponto de me descolar de mim de uma maneira que parece ser duas de mim. Duas estranhas, que não convergem, que não tem um ponto de ligação, a não ser usar a mesma matéria para existir. Eu não me reconheço mais.
Quanto foi que deixei uma paixão me cegar a tal ponto? Porque Goretti estava certa ontem. Isso não é amor. Paixão. Avassaladora. Inconsequente. Dependente. Ao mesmo tempo misturada com uma gratidão. Porque, na maior parte, eu sinto isso: gratidão.
Gratidão por ele me tirar de um torpor pós-morte do meu marido que vivi por tanto tempo, que não me dei conta. Gratidão por ele me mostrar que ainda é possível ser feliz. Gratidão por ele ter me escolhido, por ter nos dado uma oportunidade. Mesmo eu sabendo que essa escolha foi por outros motivos.
Mas agora chega. Acabou. E eu nem posso me sentir enganada, porque, diferente das outras duas mulheres, eu não fui enganada em nenhum momento. Não por ele. Somente por mim. Eu que me enganei achando que nós éramos mais fortes do que eles tem. Que era suficiente. Que era o futuro. E está tudo tão claro como essa canção.
O nosso nós esteve sustentado por gravetos. Por mentiras. Pelo sofrimento de uma mulher que não mereceu, que já pagou o suficiente e ainda teve que aguentar mais uma carga, calada, causada por uma mesquinhez e insensatez de quem queria garantir um triunfo. Banal.
So why don't we just play pretend
(Então por que não continuamos apenas fingindo)
Like we're not scared of what's coming next
(Como se não temêssemos o que está por vir)
Or scared of having nothing left?
(Ou temêssemos que possa não ter restado nada?)
Eu preciso dar um basta nisso. O ponto final não vai doer tanto. Ele já vem sendo dado desde o início. Desde aquele fatídico dia. Só me resta aproveitar esse momento. O último respiro. Eu nunca mais vou me sentir dessa maneira. Eu nunca mais quero me sentir dessa maneira.
É hora de pôr fim ao meu casamento.
***
– Dopotutto, cosa ti aspetti da questa relazione? (Afinal, o que você espera desse relacionamento?)
Às vezes eu odeio a Lídia. Principalmente quando ela está certa. Ela não precisa de muito para me tirar da órbita, mas nossa conversa finalizada pela brutalità delle tue parole… Ou é pelo simples fato de eu não sei come rispondere?
Dopotutto, cosa ti aspetti da questa relazione?
Eu não sabia como responder a isso. Como, se o simples fato de Hélia estar em um ambiente, il mio corpo clama por ela? É automático. Ele sempre será responsivo a ela. Basta ela aparecer e io e sono già al tuo fianco, como um daqueles insetos que ficam em torno de uma luz, que vi aqui uma vez. Sempre foi assim, desde o momento que a vi em Amalfi. Parada em frente a Fontana di Sant’Andrea. Os cachos vermelhos rebeldes, rivalizando com o vento, vestido leve e solto em seu corpo, enquanto ela olhava para os lados, à procura de alguém. E finalmente entendi ali porque o chafariz era considerado um ponto de encontro e troca, um ponto focal onde a vida dos seus habitantes se entrelaçava. Minha vida foi entrelaçada à dela. Pela simples visão dela. Muito antes de saber que a pessoa que tanto procurava, era a que eu também procurava.
– Poi, o que me diz? O que você quer, Nello? Quem? – Antes que eu sequer possa responder, qualunque cosa que meu cérebro pensasse como risposta, meu telefone tocava. – Bene, já tenho minha resposta.
Antes que eu pudesse dire qualquer cosa, olho para meu telefono e vejo o que a fez ter essa risposta. Sou jogado contra mia foto con Cristina, minha ex-mulher, ainda abraçados come dui amanti. Foto que nunca mudei porque eu ainda gosto dessa e das lembranças de momentos felici.
Sinto il mio cuore descompassato. É certo me sentir assim? O que isso quer dizer sobre io e Hélia?
I will leave my heart at the door
(Eu vou deixar meu coração na porta)
I won't say a word
(Sem dizer uma palavra)
They've all been said before, you know
(Todas já foram ditas antes, você sabe disso)
So why don't we just play pretend
(Então por que não continuamos apenas fingindo)
Like we're not scared of what's coming next
(Como se não temêssemos o que está por vir)
Or scared of having nothing left?
(Ou temêssemos que possa não ter restado nada?)
***
– Você não pode garantir, Leal. Não dá. Eu não acredito mais. E me dói, sabe. Me dói porque eu entrei nisso sabendo, você tem razão. Eu sabia. Mas não significa que não dói. Porque dói tanto…– Inevitavelmente lágrimas escorrem pelo meu rosto. Felizmente o restaurante não está muito cheio e estamos distante dos poucos casais presentes. Curioso eu ter escolhido nosso restaurante romântico favorito para nosso término. Seria uma linda forma de encerrar um ciclo ou masoquismo?
– Iolanda, eu…
– Você não me enganou, fica tranquilo. – Ofereço a ele um sorriso aguado. – Mas você tem que me entender. Eu nunca ficarei cem por cento tranquila, Leal. Isso é impossível. Eu tentei, juro que tentei. Mas não dá mais. – Minha voz fraqueja e pego um momento para respirar e tomar coragem para seguir adiante, mesmo com meu coração em frangalhos insistindo para que eu não faça isso. – Sempre terá alguma coisa que coloque você e ela na mesma sala, sendo protagonistas ou coadjuvantes importantes. É o aniversário do filho de vocês, casamentos, aniversário dos netos, festas de fim de ano, apresentações de danças... Sempre haverá um olhar, uma faísca... Sempre haverá um "e se?". – Rio amargamente, me lembrando da troca de olhares entre eles durante o show do final de semana passado. – Sempre haverá toques, brincadeiras e implicâncias. Sempre haverá isso. – Aponto para as fotos que foram tiradas dos dois juntos, rindo e distraídos, que recebemos hoje de Nelinha e Zeca no grupo da família. Como eu posso competir com isso? Quão tola eu fui para achar que a história deles tinha acabado?
– Eu sinto muito, Iolanda. Eu tentei seguir em frente, tentei seguir com esse relacionamento. Eu estava gostando dele, eu me dediquei a ele, nunca fui…
– Eu sei, Leal. Eu não invalido seu esforço. Mas ele não foi suficiente. Nossas ações dentro desse relacionamento deveriam ser fáceis, deveriam ser naturais. – Pego sua mão, num gesto quase involuntário, e acaricio. – Eu agradeço a você por ser honesto comigo, hoje e sempre. – Minha voz soa embargada de novo e me esforço para segurar o choro. – Você foi mais do que eu.
– Como assim, Iolanda? – Sinto uma leve hesitação em sua voz. Ele deve sentir, não é? Por isso me chamou aqui. Eu não disfarcei o suficiente… Mas depois de meses sustentando isso em gravetos e uma semana brigando comigo sobre como contar, eu não o julgo por ficar alarmado.
– Eu… Eu fiz algo que me arrependo todos os dias. Aliás, mais de um e… Um deles, relacionado a nós três. Primeiro foi… Foi aquele beijo, enquanto vocês estavam juntos.
– A maior parte da culpa é minha, Iolanda. Eu era a pessoa que estava em um relacionamento. A traição foi minha e isso me custou tudo. Ela jamais vai me perdoar por fazer aquilo que ela me pediu para não fazer e que nós dois sabemos e testemunhamos o quanto traz dor e decepção. Mesmo que tenhamos conversado sobre isso, eu sei que ela não me perdoou. A culpa foi minha e–
– Não, foi nossa. Você estava em um relacionamento e eu não respeitei isso. Continuei indo para cima, mesmo sabendo que traria dor a outra pessoa. Eu estava cega. E isso também me custou. Custou a mim, Leal. A tudo que acredito. – Abaixo a cabeça, a vergonha dos meus atos ainda é algo que tenho que lidar. – Meu filho não fala muito bem comigo por causa disso, sabia? – Ri pelo nariz. – Ele sabe. Como me disse ontem, ele sempre soube. Por isso odiava nosso relacionamento e por isso não veio ao nosso casamento. E ele está certo em sentir isso. Essa não era a mãe que ele conhecia. A mãe que ele admirava.
– Iolanda, não seja dura com você. Ele te ama. A culpa não é sua, é minha e eu assumo isso.
– Se eu não quisesse, Leal, não teria acontecido. Eu fiz o que fiz consciente. Eu ignorei minha integridade, eu ignorei a sororidade, eu deliberadamente fiz mal a outra pessoa. Fiz o que sempre julguei. – Me controlo para não deixar a bile subir. – Sabe, – giro o vinho na taça sem propósito, incapaz de olhar para ele – eu achei que era por isso que tinham terminado pela primeira vez e fui lá falar com ela. Tentei contar, mas ela foi bem dura e eu vi que não sabia de nada. Me acovardei. Eu tive vergonha. E me senti idiota, bem tola. Aliás, fui chamada assim por ela e com razão. – Ri, bebendo o restante do vinho.
– Eu realmente não estou conseguindo entender o que quer dizer, Iolanda. – Sinto um pouco de negação em sua voz ou já estou bêbada?
– Eu vou chegar lá. – Me servi de mais vinho. – Eu achei que tinha separado vocês. Eu sei, vaidoso demais achar que tinha esse poder.
– Foi compreensível, nosso rompimento foi um pouco depois disso.
– Mas aí, eu esqueci isso. E, há – olhei o relógio na tela do celular – exatos 3 anos e 6 meses, eu revisitei isso. E me arrependo tanto, Leal… – Lágrimas tímidas caem por meu rosto de novo e o vejo me encarar sem reação. – Eu fui cruel. Eu fui pior ainda, tenho certeza de que meu filho cortaria relações comigo se soubesse o que fiz.
– Iolanda, o que… – Lá, a negação. Ele sabe.
– Eu sou a responsável por ela ter essas crises de ansiedade, Leal. A culpa é minha. Eu dei um gatilho a ela contando sobre essa traição, logo após…
– Iolanda… – Ele parecia sufocado. Bebeu a sua e a minha água. Choque e horror era tudo que seus olhos expunham.
– Foi na videochamada que ela estava com Zeca. – Continuei sem me deixar abalar por sua reação. – Goretti foi chamá-lo porque Nelinha tinha descoberto a gravidez da pequena Vivi. Eu vi que a chamada não tinha sido encerrada e engatei numa conversa com a Goretti. – Vi a cor sumindo de seu rosto. – Por favor, não brigue com sua filha. Ela se arrependeu logo assim que fizemos. – “E eu não”, não consegui dizer. – Eu contei sobre o beijo. Eu agi por impulso porque ouvimos que Hélia disse que viria ao Brasil para o nascimento do Pedro. E eu acho que já sabia sobre a gravidez de Nelinha, elas estavam muito próximas e conversavam todos os dias. Eu agi por impulso, Leal, eu sei que não justifica e não tem um dia que eu me martirize por isso. Eu estava possessa, com ciúmes, me sentindo uma impostora, roubando o lugar de alguém e tentando impedir que esse alguém retome. – Engulo a vontade de fugir sem confessar meu maior crime. – Eu vi. Eu sou psicóloga, droga, eu reconheço isso de longe. Eu… – Pego minha coragem líquida, respira fundo. – Eu sou a responsável por isso. Eu fiz uma mulher desenvolver crises de pânico. Eu fui cruel a esse ponto. Além de me envolver com um homem comprometido, sabendo do ciúmes da parceira dele, eu joguei isso na cara dela de uma maneira tão dissimulada… – Ri sem humor. – Você se acha o cruel, que enganou duas mulheres, como você fica agora sabendo disso? Eu sou tão horrível quanto você, se não mais. Eu fiz e vi uma mulher se perder em sua própria mente, eu ainda lembro do olhar dela. Eu não tenho perdão.
Limpei as lágrimas grossas descendo do meu rosto, sem me importar muito com maquiagem escorrida. Bebi todo o vinho. Enchi a taça novamente e bebi tudo. Todos os movimentos acompanhados por sua falta de reação e assombro. Ele não reconheceu a mulher sentada à sua frente. E nem eu. Olho meu reflexo na janela. No que eu me transformei? No que nos transformamos? Que espécie de casal tão disfuncional nós somos?
Ele pede a conta e paga, enquanto esvazio a garrafa de vinho. O vinho do noivo da inimiga que só existiu na minha cabeça. A rival que nunca foi e/ou deveria ter sido, porque essa disputa, em primeiro lugar, não deveria ter acontecido e eu já entrei perdendo.
In vino veritas.
I know there is no tomorrow
(Eu sei que não há o amanhã)
***
Sinto o suor escorrer por todo meu corpo e grudá-lo ao terno branco gelo caro e de corte único que visto. O prazo se esgotou e io nada fiz. Olho para a recepção linda lá fora, exalando bellezza, requinte e brisa suave, como nosso primeiro encontro ufficiale em Amalfi. Tutto ao ar livre, como o espírito de minha futura moglie. Futura moglie? Rio sem humor. Eu não a chamo assim há um mês. Soaria errado. Soou vazio quando não vi o brilho nos occhi dela, na última vez que a chamei assim.
Ouço as batidas na porta. Meu telefone toca dentro do bolso do terno. Ela entra radiante. Perfezione assoluta di persona. Minha deusa. Vestida de noiva em um lindo vestido floral, que parecia mais bordado em seu corpo, com flores coloridas saindo de si. O longo decote, as costas nuas, enquanto girava para que eu a visse. Sinto il mio cuore descompassar. Minha rosa rossa. O cabelo loiro preso, com uma mechas soltas na frente, emoldurando seu rosto, transformando-a em uma deusa. Gravo essa imagem que os deuses me permitiram ver.
Um nó se forma em minha garganta. E ela vê. Ela sempre vê. O rosto antes feliz em me ver, tomado de choque. O buquê de rosa rossa cai no chão. E meu telefone vibra novamente em meu bolso.
Let this be our lesson in love
(Deixe essa ser a nossa lição no amor)
Let this be the way we remember us
(Deixe isso ser como iremos lembrar de nós)
I don't wanna be cruel or vicious
(Eu não quero ser cruel ou obsessiva)
And I ain't asking for forgiveness
(E eu não estou pedindo por qualquer perdão)
Seguro suas mãos pelo que parece uma eternidade. Não temos muito tempo, mas seria injusto apressar. Hélia parece voltar a si e vejo em seus occhi implorar para que eu me afaste.
– Você vai mesmo fazer isso? Agora? No dia que supostamente deveria ser o mais feliz de nossas vidas? Tanto tempo e no último minuto você faz isso? O bilhete…Você… Você nem ia fazer, não é? Tanto tempo, Antonello, você teve tanto tempo e só agora você vem… E ainda me pede calma?
– Hélia, per favore…
– Per favore o escambau! – Ela se levanta, arremessando o copo de acqua que eu havia lhe entregado. – Honestidade sempre foi o maior ponto da nossa relação, desde o momento que nos vimos naquela maldita fonte! Meu Deus, eu sou uma idiota! Eu estava a ponto…
– Nosso relacionamento foi baseado num erro…. – Hélia parou de andar e se virou para mim.
– Erro, Antonello? – Sua voz quebrada me afundou ainda mais no erro de palavras. – Erro? Que erro?
– Eu me expressei mal! Eu… Eu queria dizer que… Como você disse, nosso maior ponto era honestidade, não amor. Deveria ser amor. – Meu telefone toca em cima da mesa e a tela acende trazendo o rosto de Cristina e eu abraçados. Quella maledetta foto!
– Não foi da sua parte, pelo visto. – Sua voz embargou novamente eu quase não consegui ouvir o que disse.
– Eu queria te dizer antes, mas fiquei com medo, com raiva.
– RAIVA DE QUE?
– De você voltar correndo para o maledetto! – Ela me olhou em choque. – Eu não queria deixar, eu não podia aceitar. Não quando meu corpo ainda clama pelo seu de uma maneira absurda, como ele chega a você antes mesmo que eu possa raciocinar. Meu corpo chega a você antes mesmo do meu cérebro, qualquer um pode ver isso. Se eu deixasse você ir… Eu seria visto como um cornuto idiota como foi apontado naquela manchete!
– Eu não sou volúvel, Antonello. – Sua voz começou fraca. – Eu não voltaria correndo para ele.
– Você não tem como saber, eu não deixei…
– Você não manda em mim, Antonello! Nunca mandou. Se eu quisesse voltar com o Leal, não seria seu orgulho e ego de macho imbecil que me impediria. Foi a incerteza de um futuro e o fato de eu não querer mais me cortar em pedaços para caber em um espaço em que eu não possa caber inteira, com toda a intensidade que eu tenho. Com você… – Sua voz embargou de novo. – Com você eu tinha uma possibilidade de futuro, que não me machucaria porque eu sabia onde estava pisando. Eu achei que um relacionamento baseado na amizade, na honestidade como o nosso era suficiente para você também, porque nunca, Antonello, eu nunca te enganei quanto a isso. Eu me apaixonei por você. Eu estava disposta ao risco por você. O único talvez que eu fui em frente. Ninguém fez minha cabeça…
– Você e Lídia conversaram que eu sei, ela me disse isso há dois meses, quando-
– E daí?
– Lo pensavo… Io vi como você fica perto de Leal desde que ouvi a conversa de vocês. Apesar de credere nell'amore que sente por mim, l'amore que sente por Leal ainda é forte. Mesmo com il dolore ainda por resolver, vocês se reencontraram, no? – Ela assentiu.
– Ainda assim, Nello, mesmo dividida porque o Leal por quem me apaixonei retornou depois da despedida das mágoas… Ainda assim o tempo que passamos juntos me curou de outras feridas. Eu agradeço isso. Eu te amo, Nello…
– … Eu não quero sua gratitudine…
– … Por um momento, tive medo desse sentimento ser mais gratidão que amor. Achei o mesmo de você. Me avisaram tanto sobre isso, mas eu senti que não. E por isso eu decidi seguir em frente.
– Io também ho parlato com outras pessoas. Cristina me disse que seria impossível você seguir com isso, con il matrimonio porque nos juntamos por motivos errados, não por amor.
– No início! – Esbraveja. Ela abre a boca para dizer mais uma coisa e se cala.
– Nós nos juntamos para curar dois corações feridos e não é nisso que devia se basear la nostra relazione. Lídia me contou alguns detalhes de umas conversas de vocês e sei que–
– E? Quantas vezes eu tenho que te dizer que eu não sou volúvel? Lídia não me convenceu a ficar com você, caramba! Pelo contrário! Muito pelo contrário! – Respira fundo, tentando buscar o fôlego perdido com a explosão. – Eu não estou com você por gratidão. Eu juro que fiz tudo o que eu pude para não abrir mão de mim e ainda ter você. Minha gratidão por você foi por tudo o que vivi quando éramos apenas amigos e você me ajudou. Eu estou cansada de explicar isso. Faz tanto tempo que eu estou cansada de explicar isso a você e você sequer notou isso, tão preocupado em ouvir os conselhos de sua ex-mulher. Era mais fácil você ter vindo até mim, como eu fui até você. Mas você, pelo visto… – Ela pausa e seus ombros caem em derrota. – Não importa. É nítido. Não importa mais. – Sussurra a última frase.
Eu me aproximo e ela estende a mão, sinalizando para que eu me afaste. Se endireita em frente ao espelho, escondendo suas rachaduras, como muitas vezes eu vi. Para antes de sair, segurando-se na porta.
– Quanto de você tem naquilo que me acusa, Antonello?
Hélia sai, levando com ela qualquer resquício de mim.
It matters how this ends
(É importante como isso irá terminar)
'Cause what if I never love again?
(Porque e se eu jamais amar de novo?)
Meu telefono toca mais uma vez. A maledetta foto. Olho por todo o tempo de duração da chamada e sinto um ódio se apoderar de mim. O que foi que eu fiz? Levanto rápido enxugando as lágrimas que desceram sem ho capito e vou atrás de Hélia. Mas quando eu a encontro, vejo que ela está no altar, segurando o microfone com força, olhando para todos. Nossos olhares se encontram, mas já não falamos mais a mesma língua.
– Boa tarde a todos. – Ela pausa e olha para trás onde o pôr do sol aparecia e eu gelo sabendo que era para, neste momento, estarmos na parte final da celebração de nossa união. Como em nosso primeiro beijo. – Ou noite… – Ela diz num fio de voz. – Às vezes a gente prolonga demais nossa permanência em lugares que já estão expulsando a gente – ela me olha e sinto alguns olhares se voltarem para mim – e demoramos a perceber. Mas acredito que ninguém se conhece em vão. A vida nos une às pessoas com quem temos um propósito em comum. Ninguém chega em nossa vida por acaso, às vezes vem para abençoar – olha para seu filho – e às vezes para ensinar a gente a aprender algo com os outros. Sempre. Inclusive como não ser. – Seu olhar recai em mim. O desgosto toma conta de seu rosto. Sigo seu olhar, assim como todos, e vejo a ex do maledetto parada a cinco passos de mim. – Sejam a melhor pessoa que puderem ser para alguém, mas se não aceitarem, se retirem. Não são todas as pessoas que sabem lidar com o que é bom. Eu não posso mais abrir mão de mim e peço que vocês façam o mesmo consigo. – Ela enxugou algumas lágrimas errantes, antes de continuar. – Para finalizar, porque não pretendo me alongar mais, a essa altura todos perceberam que não haverá mais casamento. Mas, apesar disso, hoje ainda é um dia de celebração. Um ponto final nem sempre é ruim, mesmo quando é difícil de dar. Mesmo que pareça que vai te despedaçar. Vamos celebrar a isso. Aos pontos finais que significam recomeços. – Seu olhar recai sobre o maledetto por uma fração de segundo. – Para finalizar, agora de verdade, cito minha escritora favorita: “ainda bem que sempre existe outro dia. E outros sonhos. E outros risos. E outras pessoas. E outras coisas”. – Pegou uma das taças de champanhe que era destinadas a nós. – Eu brindo a isso.
Sua voz embargou no final e ela foi abraçada por seu filho. Meu telefone tocou novamente e dessa vez eu atendi.
– Você tem uma hora para chegar ao aeroporto.
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