Pelos últimos três meses, Connor vinha começando seus dias tomando uma pílula pequena, branca e oval, toda manhã sem falta as seis em ponto, especificamente junto a um suco de laranja de uma marca específica. Preferencialmente, ele deveria a tomar com o estômago cheio, para ajudar na digestão, e não deveria dirigir para lugar nenhum, se ele achasse que não podia lutar com a sonolência.
Antes dela, Dr. Parker tinha o mandado tomar outro remédio, mas ele deixava Connor grogue demais para levantar da cama, na maioria dos dias bons, então eles trocaram. O depois desse o deixou energético demais, e fez sua mania pular como ela raramente pulava. Connor tinha se empenhado em um monte de novos projetos, enquanto tomava aquelas pílulas, mas ele também não conseguia dormir, ou se concentrar em só uma coisa de uma vez, e de vez em quando, depois de passar horas e horas andando em seu quarto de um lado para o outro e pulando parado no lugar, Connor não conseguia sentir seus dedos do pé mais.
Outra tentativa. Esse fez Connor suar demais, e ele não conseguia ficar em qualquer lugar longe de um ar condicionado sem começar a tentar arranjar uma briga. Foi muito breve. O próximo não ajudou em nada diminuindo seus problemas de raiva, e o depois desse o fez não sentir nada. Ele emagreceu ainda mais, e não se precisava ser um médico para dizer que isso não era bom para saúde dele.
Desde a primeira vez, ele quis desistir. Ele sentia como se nunca fosse viver bem, nunca fosse viver uma vida normal. Ser normal, e não quebrado. Não problemático. Não funcionou de primeira, e ele não tinha vontade nenhuma de tentar a segunda. Continuou falhando, e ele continuou só porque uma parte dele, uma parte ruim, se sentia feliz – familiar – sabendo que estava decepcionando o Dr. Parker e seus pais, vez depois de vez depois de vez.
Aí eles começaram com esse remédio.
Connor estava se sentindo bem. Melhor do que já tinha se sentido a sua vida inteira. Ainda haviam dias ruins, mas um pouco daquela névoa de raiva e depressão que sempre apertava seu cérebro e o impedia de fazer boas decisões tinha se dissipado. Ele conseguia rir, sorrir. Se irritar sem partir para o soco imediatamente. Era bom. O fazia se sentir tão incrível.
Uma vez–
Estava sendo um dia ruim. Ele tinha acabado de acordar, mas já sabia disso. Aí ele percebeu. O suco tinha acabado. Connor nem sabia porque isso tinha importado tanto para ele, mas tinha. Ele tinha ficado parado em frente da geladeira aberta, os olhos meio arregalados, a mão tremendo.
Ele não conseguia tomar o remédio sem aquele suco. Era estupido, e sem sentido, e Dr. Parker com certeza não tinha dito nada que daria a entender aquilo, mas, de vez em quando, as manias de Connor meio que davam uma pulada para fora, mesmo ele estando medicado. De vez em quando, ela precisava delas, de um jeito que ele nem entendia.
Ele precisava daquele suco.
Era sábado. Zoe não estava em casa, e Larry o disse que era estupido, e Cynthia o encarou com os olhos chorosos como se achasse que ele era louco e isso a magoasse incrivelmente. Havia aquela dica de medo nos olhos de seus pais, também. Sempre havia e sempre machucava. Connor saiu escondido de casa com o remédio, dinheiro e seu celular, sua barriga se revirando.
Ele ligou para Evan.
Aqueles ainda eram os dias em que ligações eram algo novo para eles. No dia anterior, Zoe tinha obrigado Connor a caminhar com ela e Connor tinha tirado fotos de árvores para mandar para Evan. Aquilo ainda não era a norma. Ainda.
Evan atendeu em alguns segundos.
Connor estava se sentindo ansioso e como um merda. Ele ligou para Evan e resmungou o que tinha acontecido depois de Evan o perguntar umas sete vezes, e o tempo todo ele se preparou para ser dito o quão idiota e infantil ele estava sendo.
Ao invés disso, Evan disse que ele também fazia umas coisas assim. Não disse que fazia sentido, que era certo e são e normal. Apenas... Apenas que ele também tinha uns hábitos estranhos sobre como tinha que tomar seus remédios.
Aquele dia, indo para o supermercado se sentindo um pouco menos pesado, Connor percebeu que Evan era uma das pessoas que mais o entendia em sua vida.
Ele comprou o maldito suco, ainda no celular com Evan, e ele percebeu que, talvez, ele gostasse de Evan de um jeito diferente do que imaginativa primeiramente.
Ele não tinha achado que Evan poderia gostar dele de volta.
Agora, lá estavam eles.
“Você precisa se acalmar,” Zoe o disse de onde estava esparramada na cama de Connor, lendo uma revista e o julgando. As mechas dela ainda estavam azuis – a mãe deles tinha ficado chocada quando as viu. Tinham havido gritos.
Connor tentou prender seu cabelo de outro jeito.
“Eu estou calmo,” ele disse, soando completamente desesperado. Ou, ao menos, era assim que ele achava que tinha soado, se a risada alta de Zoe deveria ser levada em consideração.
Ela rolou na cama.
“É só Evan.”
“Exatamente. É Evan.”
Evan, que tinha concordado em ir num encontro com Connor. Esse Evan. Um Evan que nem parecia real. Que nem parecia possível. Connor puxou a sua cutícula, a dor subindo pelos seus dedos e o distraindo da ansiedade.
“Ele não se importa se você está com o cabelo solto ou com um coque, Connor.” Zoe revirou os olhos. “Não é– sério, não tem nenhuma diferença. Além do que, você literalmente usa a mesma roupa todos os dias. Como pode estar demorando tanto para se arrumar?”
“Porque hoje não é um dia qualquer.” Connor passou uma mão em seus cabelos de novo. E de novo. Bagunçou eles mais do que arrumou. “Eu deveria vestir algo diferente, não é? Para ele saber que eu considero algo especial.”
Connor encarou seu reflexo no espelho mais uma vez. Ele estava com olheiras. Elas tinham uma cor doentia roxa, e Connor teria apreciado muito se elas tivessem resolvido simplesmente desaparecer, só por hoje. Não era nem que ele não tinha dormido, mas mais uma genética ruim que tinha herdado de sua mãe. Cynthia também estava assim, sempre.
Pela primeira vez na sua vida, ele desejou ter algo mais de parecido com Larry do que Cynthia. Eca. Ele esperava que aquilo não se repetisse nunca.
“Um pouco de cor não iria te matar,” comentou Zoe.
“Ha, ha,” zombou Connor, puxando o lado de baixo de seu casaco preto. Zoe se levantou.
“Eu tô falando sério.” Ela passou por ele, direto para seu guarda-roupa. “Connor Murphy usando algo que não seja preto? Isso sim vai fazer Evan se sentir especial. Não, isso ia fazer chover. Simplesmente não é um acontecimento normal. Seria grande coisa.”
“Você é tão engraçada.”
“Os genes de comédia da família,” ela rebateu rapidamente, “tinham que cair em alguém, e obviamente não ia ser em você, sr. Rabugento.”
Connor estava sorrindo para ela, porém, e isso não passava uma aparência muito rabugenta. Zoe saiu de seu armário segurando uma camisa azul clara que Connor nem sabia como tinha acabado ali.
Sem nem perceber, ele fez uma careta.
“Vamos lá,” disse Zoe. “Faria seus olhos ficarem incríveis.”
“Meus olhos são castanhos.”
“Exatamente. Azul iria ressaltar eles.”
“Não, não iria.”
Connor olhou para Zoe, com certeza de que ela não tinha a mínima ideia do que estava falando. Zoe o encarou de volta, e jogou a blusa em suas mãos.
“Vai, Romeo. Por Evan.”
Ele cedeu, no final, mas quando Zoe pediu para fazer umas trancinhas no cabelo dele, Connor achou melhor pôr um fim naquilo e só ir com o cabelo solto mesmo.
Porque ele tinha que se trocar, Zoe tinha saído e ido fazer alguma outra coisa, e ele estava em seu quarto sozinho, olhando seu reflexo ansiosamente, quando Larry entrou.
“Você está usando a blusa que eu te dei aniversário ano passado,” ele disse, parecendo surpreso. Sua voz parecia pequena demais para realmente pertencer a Larry. Connor franziu as sobrancelhas.
“É,” ele concordou, mesmo que ele não se lembrasse que a camisa tinha sido um presente de Larry. Ele não se lembrava um monte de coisas do ano passado. Só um embaralhado de nadas, realmente.
Larry deu um passo para frente. Ainda estava grudado na soleira da porta.
“Onde você vai?”
Por um segundo, o corpo de Connor tensionou, e ele percebeu que Larry podia simplesmente o proibir de sair da casa sozinho, e aí Connor teria que pular pela janela, o que faria Cynthia chorar e causaria um monte de brigas. Connor apertou suas mãos em punhos e se preparou para se defender, antes de perceber o tom de voz de Larry.
Ele não estava atacando. Não estava o interrogando, esperando por uma mentira. Larry só estava tentando jogar conversa fora.
Horrivelmente, ele só queria conversar com seu filho.
Até os ataques teriam sido melhores. Pelo menos Connor ia ter sabido como reagir a eles. Isso é simplesmente novo e confuso.
Ele puxou a barra da blusa.
“Vou sair,” resmungou.
Larry não tinha começado a o acusar de querer ir comprar drogas. Era estranho.
“Ah, bem– para onde, filho?”
Connor achava que essa era o jeito mais educado que Larry já tinha arranjado para fazer aquela pergunta. Mais leve. O deixava ainda mais tenso.
“Eu vou–” Ele ia mentir, antes de perceber que não tinha nada pronto. Connor encarou Larry, e soltou uma respiração desistente. “Eu vou num encontro.”
Não havia nada no mundo mais humilhante do que a quantidade de surpresa que apareceu no rosto de Larry, como se ele achasse que nunca no mundo que aquilo iria acontecer. Que nunca no mundo alguém iria querer Connor.
Bem, ao menos isso os dois tinham em comum.
“Ah,” soltou Larry. “Com– com aquela menina?”
“Quem?”
“A com o cabelo cheio de dreads e os olhos assustadores, você sabe a menina. Sua mãe falou que achava que vocês dois estavam namorando escondido, mas eu não tinha certeza–”
“Não é Alana.”
Connor olhou para a hora em seu celular. Ele iria ter que sair dali em dez minutos, se quisesse chegar na casa de Evan na hora que eles tinham programado. Era uma longa caminhada, a pé. Connor deveria acelerar aquilo tudo.
“A mãe precisa parar. Alana não é minha namorada. Não tem nenhum romance entre a gente.”
“Vamos lá,” seu pai riu forçadamente, tentando melhorar o clima, “ela tá com você o tempo todo, e você sabe como meninos e meninas funcionam–”
De repente, Connor se viu furioso, sem nem conseguir olhar para Larry nos olhos.
“Na verdade,” ele disse, rangendo os dentes, “na verdade, se você realmente quer saber – o que eu duvido – eu estou saindo com Evan. Evan Hansen, a mãe deu uma carona para ele uma vez e eu acabei passando a sexta fazendo massa com ele a mãe dele. Você sabe disso, não sabe? Foi você que me buscou lá. Eu não acho que você viu. Ele é loiro. Baixinho.”
Era como se alguém tivesse enfiado algodão pela sua garganta. Ele observou o rosto de Larry caindo e passando pelos cinco estados do luto ao mesmo tempo, e ele não acreditou que tinha realmente falado aquilo. Não havia como voltar atrás.
“Ah.” O rosto de Larry se retorceu. “Você é–”
“Gay?” Connor o lançou um sorriso. Não era um bonito. Eram dentes demais, raiva demais. “É.”
“Desde, ãh,” Larry engoliu em seco, ainda na porta. Por um segundo, parecia que ele estava analisando quais seriam os prós e contras de simplesmente sair correndo dali. “Desde quando você sabe?”
Connor fechou os olhos.
“Faz anos.”
Quando ele os abriu, Larry ainda estava o encarando, a boca um pouco aberta. Ele piscou, e Connor retrocedeu em seu quarto.
“Ah, Connor,” Larry balançou a cabeça, pálido, “todas aquelas piadas e comentários–”
“É.”
“Eu–”
“Eu não quero saber,” cuspiu Connor. Ele pegou sua carteira. “Eu tenho um encontro pai. Você pode gritar comigo por ser um viado e um desapontamento mais tarde.”
Connor foi passar por Larry, mas quando seus ombros bateram, Larry segurou o braço dele para o parar, o aperto tão forte que fez Connor se encolher. Quando percebeu isso, Larry o soltou.
“Ãh,” ele soltou, os olhos ainda não tendo voltado ao normal, “você quer– você quer as chaves do carro?”
Agora, os olhos de Connor se arregalaram também.
“O que?” perguntou, sua voz dando uma aumentada. Larry tateou pelos seus bolsos sem nem olhar para o que estava fazendo direito, até que ele achou a chave e a estendeu em direção a Connor.
“Para poder– poder buscar esse Evan.”
Connor as pegou rapidamente, e então fez a coisa mais sensata na qual podia pensar: ele correu escada abaixo.
Não era uma boa ideia dirigir quando não se conseguia nem enfiar a chave na ignição direito, de tanto que seus dedos estavam tremendo, então Connor passou uns dez minutos só parado dentro do carro de Larry apertando o volante, as juntas brancas.
Ele respirou fundo, usando todos os exercícios que já tinha aprendido, e quando ele não sentia mais seu peito queimando, ele tentou de novo. Dessa vez, a chave entrou de primeira.
Connor saiu da garagem daquela casa idiota, abriu a sua janela e ligou o volume do rádio até ele sentir o rap genérico que uma estação qualquer estava tocando fazendo seu pé tremer. Ele queria gritar, mas ao invés disso ele pensou em Evan, e no rosto de Evan, e ele pisou no acelerador com força.
Quando ele chegou, dois minutos adiantado, foi Heidi que abriu a porta. Ela sorriu para ele, muito doce e honestamente feliz por o ver, e Connor quis correr na outra direção. Ele não sabia o que havia com os Hansen, porque eles tinham aquele instinto em simplesmente confiar de primeira em Connor. Eles eram estranhos, também.
“Ele está vindo,” ela o contou, depois de um abraço desajeitado. “Você quer entrar e beber algo? Nós temos água.”
Connor balançou a cabeça.
“Obrigado, mas não, Heidi. Eu vou só esperar aqui.”
Ele estava muito ansioso para entrar. Connor tinha quase certeza de que, se ele sentasse, seu cérebro ia entrar em curto circuito e ele não ia conseguir se mover mais. Não. Ele ficou na varanda de Evan se remexendo e esperando e tentando não surtar.
Por um segundo, ele desejou um cigarro.
Então Evan saiu.
Objetivamente, ele parecia o mesmo de sempre, só que mais vermelho e mais ansioso. Isso não queria dizer que Connor não corou quando viu ele, e que seu estômago não se revirou. Os cantos dos lábios dele se levantaram sem ele nem ter que pensar nisso, e Connor se aproximou dele.
“Oi,” ele disse, sem a mínima ideia do que mais falar.
Evan sorriu também.
“Olá.”
Por um segundo, eles só ficaram em silêncio, tentando pensar em algo, mas tensos demais para conseguir. Aí Evan riu, e Connor se viu o seguindo. Toda a dureza que havia em seu ombro desapareceu de uma vez, como se uma corda tivesse sido cortada.
“Larry me emprestou o carro,” contou, mostrando as chaves para Evan.
“Legal.”
Connor abriu a porta para Evan entrar. Sua mãe tinha o ensinado como ser um cavalheiro, afinal de contas. Ele só escolhia não ser, na maior parte do tempo.
A primeira parada deles foi no a La Mode. Connor pediu um sorvete de baunilha para si, e um de chocolate para Evan, e depois que a atendente se distanciou, Evan se virou para ele com olhos muito reluzentes.
“Obrigado,” ele sussurrou, como ele sempre sussurrava quando Connor se lembrava que ele não gostava de fazer seu pedido em restaurantes.
“Sem problemas,” Connor disse, passando um braço por cima do ombro de Evan numa explosão de coragem.
Evan sorriu para ele, e aproximou a cabeça um pouco do braço Connor, e Connor se sentiu como o menino mais sortudo do mundo, mesmo que os sorvetes estivessem demorando séculos porque a atendente estava flertando com outra cliente.
Uns dez minutos depois, eles se sentaram numa mesa.
“Como foi o seu dia até agora?” perguntou Evan. Connor quase resmungou bom, mas aí ele se lembrou que era Evan.
Ele encolheu os ombros. Deu uma coçada em seus olhos, e tentou se convencer de que isso foi por razão nenhuma.
“Larry viu quando eu tava saindo de casa,” contou baixinho. “Ele me perguntou para onde eu ia e– eu disse que eu ia para um encontro com um menino. Eu saí do armário. Uhu!” Os olhos de Connor caíram em sua mão em cima da mesa, e em suas unhas pretas e ruídas. “Poderia ter ido melhor.”
Ele não percebeu que estava arrancando sua cutícula e fazendo ela sangrar até Evan ter segurado sua mão – o parado do jeito mais delicadamente possível, sim, e então entrelaçado seus dedos mesmo que não fosse necessário.
“O que ele disse?” perguntou, a voz mais preocupada do que Connor jamais tinha ouvido a voz de Evan soar. “Você precisa de algum lugar para passar a noite?”
“Não, não. Eu não fui expulso. Ele nem gritou comigo, o que, sério, é uma novidade na casa dos Murphy. Quer dizer, ele não falou nada homofóbico. Não hoje. Ele só não falou nada.”
Connor se esforçou em continuar respirando, e então ele percebeu que era só quando ele estava pensando em respirar que se tornava difícil. Se voltou para o rosto de Evan e esperou sua resposta.
“Tem algo– eu posso fazer qualquer coisa para te ajudar?”
“Ãh, sei lá.” A cabeça de Connor pendeu para o lado um pouco, envergonhado. “Acho que o segurar de mãos já está me acalmando um montão. Você sabe como apoiar as pessoas muito bem, Evan.”
O rosto de Evan brilhou mesmo com o elogio tendo saído super estranho e desajeitado. Connor sentiu a repentina vontade de beijar aqueles lábios macios dele, mas tudo que Connor fez foi enfiar uma colherada muito grande de sorvete em sua boca.
Nem tinha como ele ter certeza que Evan queria o mesmo.
Depois que ambos acabaram seus respectivos sorvetes, eles voltaram pro carro, mas eles não foram em direção a casa de ninguém. O sol ainda estava no céu, e o dia ainda era longo. Eles ainda queriam passar muito mais tempo um com os outros.
Evan se empenhou em achar algo de bom para ouvir no rádio, e ele nem tentou perguntar para onde eles estavam indo, muito entretido em sua busca. Connor acelerou pelas ruas meio abandonadas e mais distantes do centro, e ele sentiu como se aquele carro estivesse voando.
Era um daqueles momentos de calmaria extrema onde tudo era muito lento e muito rápido ao mesmo tempo. A música estava tocando baixa e alta e praticamente nem ali, e Evan estava balançando a cabeça ao ritmo dela muito ligeiramente, mas o suficiente para Connor perceber e rir, antes de o imitar.
Apesar de parecer estar morrendo de vergonha, Evan sorriu para ele.
Então eles pararam. Connor pulou para fora do carro, e correu para poder abrir a porta para Evan agora também, enquanto Evan ria e revirava os olhos e encarava o lugar onde eles estavam com confusão e curiosidade.
Parando em frente a cerca caída pela primeira vez em uns sete anos, Connor respirou fundo o cheiro do pomar abandonado – maçãs podres e madeira molhada e musgo, e algo que simplesmente gritava na sua cara sobre sua infância, e que teria o deixado muito tenso, se ele estivesse com qualquer pessoa a não ser Evan e, talvez, Zoe.
“Você gosta de árvores,” Connor sentiu a necessidade de dizer para Evan, mesmo que os dois soubessem disso muito bem, e deu uma batidinha no ombro do menino. “Vem.”
Ele achou que Evan iria ficar mais hesitante em pular a cerca, mas não. O menino parou e esperou ver como Connor ia fazer aquilo, e então foi muito devagar e com cuidado, mas, ainda assim, ele foi. Provavelmente suado, provavelmente incerto, mas indo.
Connor não pôde deixar de ficar orgulhoso.
Eles se enfiaram em meio às árvores muito grandes e pontudas, o sol entrando por buracos lá em cima e iluminando a trilha a sua frente o suficiente para que, quando Connor pensou em pegar seu celular e ligar à lanterna, ele decidiu que simplesmente não iria mudar nada.
Connor andou mais na frente, já que era ele que sabia exatamente onde eles estavam indo. Evan o deu uma cutucada delicada.
“Para onde você está me levando?” perguntou.
Connor sorriu, se abaixando para pegar um galho no chão. Ele o balançou um pouco, e lutou contra seu instinto adolescente estupido de o quebrar no meio.
“Você,” começou delicadamente, “não deveria ter me perguntado isso antes de me seguir para dentro de uma floresta no meio do nada?”
“Talvez.” Evan deu de ombros, chutando algumas folhas mortas. “Se eu não confiasse em você.”
E era por causa de frases assim que Evan Hansen seria a morte de Connor Murphy. Quer dizer, sério? Ele não percebia o quão rápido ele estava fazendo o coração de Connor bater? Era um verdadeiro perigo.
“Eu sou legalmente obrigado a dizer que isso não é uma boa decisão,” brincou Connor, usando o galho caído que tinha pegado para bater em outros galhos que ainda estavam em suas árvores e estavam atrapalhando o caminho.
“Eu acho que é,” apontou Evan, aproximando sua cabeça do ouvido de Connor só por um segundinho, antes de voltar mais para trás.
Connor ainda podia sentir a respiração dele fazendo cócegas em seu pescoço. Ele sorriu um pouco, e então ele não conseguiu parar.
“É o que todo mundo diz antes de fazer uma decisão ruim,” mas ele olhou para trás, e Evan finalmente viu sua expressão e percebeu que Connor estava fazendo piadas autodepreciativas e não sendo autodepreciativas – grande diferença.
Ele sorriu para Connor, e os dois continuaram a andar.
“Me conte fatos interessantes sobre árvores,” pediu Connor e Evan praticamente pulou de animação onde estava parado, antes de começar a falar muito rapidamente.
Ele falou o nome de todas as árvores pelas quais eles passaram e mais um monte de coisas, e Connor não entendia grande parte do que estava saindo de sua boca, mas ele ainda prestou tanta atenção que provavelmente conseguiria repetir as palavras de Evan mais tarde.
Ele só adorava ouvir a voz de Evan daquele jeito – confiante. Ele sabia do que estava falando e ele sabia disso. Não era apenas o fato de Evan se sentir bem sobre si mesmo, mas o fato de que ele se sentia bem sendo si mesmo com Connor.
Aquilo era bom.
Aquilo o fazia se sentir tão bem.
Eles conversaram, e eles andaram. Tudo era silencioso e fresco e com um quê de outono, a estação preferida dele. Connor podia ouvir cada passo que eles davam, e o barulho de folhas secas e laranjas sendo esmagadas embaixo de seus pés era um barulho estranhamente gostoso de se ouvir, se ele fosse ser sincero. O ombro dele ficava batendo no de Evan, mas de um jeito bom.
Finalmente, a trilha deu uma virada, ajudando Connor a se localizar em onde exatamente nela eles estavam.
“Estamos chegando,” avisou, e quando a floresta se partiu num campo aberto, a grama dourada emoldurada por grandes macieiras, ele deu espaço para Evan ir na frente e aproveitar a vista pela primeira vez.
Havia algo de incrivelmente natural e de parar a respiração com aquilo, como algo que você só iria poder ver durante um sonho, onde o mundo era perfeito demais e você não conseguia sentir dor, realmente. Connor respirou, e ele se sentiu leve, pondo uma mão no ombro de Evan.
“Eu e Zoe costumávamos brincar de pipa, aqui,” contou, de repente com a voz muito nostálgica. “A gente não vem aqui desde que fechou, mas eu sempre quis ver como que o lugar tinha acabado.”
E eu decidi que eu queria ver isso com você do meu lado.
Ele podia sentir os olhos de Evan em si. Ele podia sentir o por do sol reluzindo um laranja metálico nos seus cabelos. Ambas as coisas o faziam se sentir quente demais, então ele se aproximou de uma das árvores. Um dia, ela era cheia de maçãs. Connor se lembrava disso. Mas anos crescendo sem nenhum cuidado transformou suas frutas numas coisinhas de cores e cheiros errados, caídas no chão ao redor da árvore e atraindo mosquinha.
“Nojento,” sussurrou Connor, pegando uma. Ele a apertou com força, e ela se partiu ao meio, pedaços marrons e gordos saindo de dentro dela. O rosto de Connor se iluminou e ele se virou para Evan. “Acha que a gente pode comer?”
“Não,” Evan respondeu imediatamente. Então, ele pensou um pouco. “Quer dizer, eu não acho que vá te matar. Mas provavelmente causaria uma baita de uma dor de barriga, sabe?”
Connor concordou com a cabeça, derrubando a maçã estragada de volta no chão e a dando um chute para longe. Era meio triste pensar que era isso que tinha acontecido com um dos lugares que mais marcou sua infância, mas, ao mesmo tempo, parecia certo. Se encaixa em como todo resto tinha acabado.
“Vamos achar um lugar bom para sentar,” ele contou para Evan. “Eu quero ver o pôr do sol com você. Sabe, como se a gente tivesse num filme clichê e bem merda.”
Foi isso que eles fizeram. Eles se sentaram de perna de índio no meio do campo, apoiados em suas mãos enquanto viam o céu ir de azul claro para laranja para rosado e então para um azul mais escuro. A natureza era linda, Connor percebeu.
Ele até tirou uma foto e mandou para Zoe.
Depois disso, ele pensou em ligar sua lanterna, de novo, mas Evan disse que eles podiam guardar isso para quando estivessem voltando pela trilha. Agora, ele tinha dito, eles podiam só ver as estrelas.
Connor não estava olhando para elas, porém.
Ele estava olhando para Evan.
O cabelo loiro do menino estava uma bagunça como ele nunca tinha estado antes, e ele tinha um sorriso muito grande e inocente como se ele fosse uma criança criada na cidade que nunca tinha visto nenhuma constelação de verdade. Seus olhos pareciam brilhar mais do que qualquer estrela jamais poderia, chamar por Connor mais do que qualquer outra coisa no mundo.
Connor deu uma longa respiração para se preparar, medo se revirando em seu estômago enquanto ouvia louva deuses fazendo barulho e a vozinha malvada na sua cabeça o dizendo o quão idiota ele era e o quão errado aquilo tudo poderia dar.
Ainda.
Connor olhou para os olhos de Evan, e arrancou um monte de grama do chão, e então só respirou o mais fundo possível.
“Eu gosto de você.”
O mundo não acabou. Ao invés, Evan virou a cabeça para ele e o lançou o maior sorriso que qualquer pessoa já tinha lançado para Connor, as bochechas vermelhas daquele jeito que fazia a barriga de Connor se revirar.
“Obrigado,” ele disse, e então ele estava corando ainda mais, abaixando os olhos um pouco, mas ainda lançando umas olhadas para Connor. “Eu– eu gosto de você também.”
Connor balançou a cabeça.
“Não, não. Eu quero dizer gosto gosto de você.”
Evan riu, um lindo, tímido som, como tudo que tinha a ver com Evan, aos olhos de Connor. Ele levantou uma mão para tocar a bochecha de Connor, seu polegar roçando na maçã do rosto de Connor como o toque de um fantasma.
“Eu sei. Eu queria dizer assim também.”
“Certeza?”
“Por que eu teria concordado em vir aqui se eu não gostasse de você?”
“Porque você é uma ótima pessoa,” comentou Connor, e ambos Evan e Connor sabiam que Evan tinha vergonha de dizer não para as pessoas, e por isso ele sempre acabava arrastado para lugares que não queria ir.
“Esse não é o caso.”
“Sério?”
“Seríssimo,” concordou Evan, polegar ainda delicado e quente fazendo carinho no rosto de Connor. Ele parecia tão real, naquele momento. Connor se sentia tão real, mesmo que ele não pudesse sentir o chão em baixo de seus pés, ou o ar em seus pulmões, ou, realmente, qualquer coisa a não ser o nariz de Evan, tão perto que ele trombava com o nariz de Connor.
As bocas dele estavam tão próximas que um vento muito forte faria eles se beijarem. E Connor realmente queria–
“Eu quero te beijar,” ele avisou para Evan.
“Eu quero também,” mas Evan não se aproximou, e então Connor ficou parado também. Ele pôs uma mão em cima da mão de Evan em sua bochecha, e olhou para os olhos de repente muito hesitantes e cheios de medo de Evan.
Connor franziu as sobrancelhas.
Evan abaixou a mão, olhos brilhando.
“Eu tenho um segredo que eu preciso te contar antes,” disse. “Algo que pode te fazer mudar de ideia.”
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